História 21 Days - No escuro

 

No dia seguinte eu levantei cedo para ir ver os imóveis com a Kayla, ela me mandou uma mensagem na noite anterior com o horário e que me esperaria na frente do meu condomínio.

Passei pela sala e encontrei Zayn e Elena na cozinha, tomando café. Com toda a confusão de ontem à noite, eles preferiram ficar no meu apartamento, hoje procuraram um hotel próximo a minha casa.

— Bom dia! — Os cumprimentei — Vou sair com Kayla, em busca de alguns imóveis.

Zayn assentiu.

— Bom dia Blair! E eu e Elena iremos procurar aqueles hotéis hoje.

— Sabe que eu não me importo de ficarem aqui, né? Tem um quarto sobrando e a companhia de vocês é ótima.

— Não queremos incomodar você — Elena disse.

— E quando o meu irmão e minha cunhada incomodariam?

— Vamos pensar nisso maninha — Zayn sorriu — Dormiu bem?

Suspirei. Caminhei até o bule com café e me servi.

A verdade é que eu não havia dormido bem, as lembranças de ontem não me deixaram pregar os olhos, tentei disfarçar as olheiras com base e corretivo, mas não sei se surgiu muito efeito. Só em pensar na possibilidade de Georgina estar viva, um arrepio se espalhava por todo o meu corpo. Foram dias e noites com a imagem do corpo desacordado dela, estirado na cama, em minha memória.

Eu podia fechar os olhos e ver aquela cena de novo.

Eu não sabia o que pensar, se era apenas um plano idiota do imbecil do meu ex namorado, ou se aquela carta realmente havia sido escrita por ela.

Não contei a ninguém.

Eu sabia que tinha que contar para Liam, mas ainda estava tentando digerir tudo o que aconteceu nas últimas 24 horas.

— Na medida do possível, sim — respondi meu irmão — E você?

— Também, é um pouco traumático ser preso por algo que você não fez. Muitas coisas passam pela sua cabeça em momentos como este.

Assenti.

— Eu imagino — bebi um gole do café — Sinto muito que isso tenha acontecido com você.

— Você não tem culpa — ele mordeu um pedaço de seu sanduiche, depois de mastigar e engolir, se voltou para mim — Tenho certeza que tem dedo de Louis nisso.

E tinha e eu sabia, ele havia me contado com aquele sorriso maldito de “eu ganhei” no rosto.

Bebi o restante do café e coloquei a xícara na pia, não conversaria mais sobre esse assunto, não quando Elena estava ali na frente ouvindo tudo, quanto menos pessoas estivessem envolvidas, melhor seria.

— Nos vemos mais tarde? Talvez eu almoce com Kayla hoje.

— Também iremos almoçar fora, fique tranquila. — meu irmão disse.

— Até mais tarde Blair — Elena acenou para mim quando eu saia da cozinha.

Peguei minha bolsa que havia deixado em cima do sofá e sai do apartamento.

Cinco minutos depois, como dizia o horário marcado, Kayla estava na frente do meu condomínio.

— Pontual — falei.

— Estou ansiosa, na verdade mal dormi de noite de tanta ansiedade.

— Tenho certeza que encontraremos um lugar incrível para sua loja.

— Nossa loja — ela enlaçou seu braço no meu e fez sinal para um táxi que virava a nossa esquina — Estava pensando ontem sobre isso, o que acha de além de cuidar da contabilidade, nos tornarmos sócias?

— Não sei...

— Sem pressão, você tem alguns dias para pensar ainda.

Assenti.

— Prometo pensar com carinho.

Entramos dentro do táxi e Kayla deu o primeiro endereço.

Não era longe de onde eu moro, por isso não demorou nem trinta minutos para chegarmos.

— Você deve ser Kayla Griffin — Uma mulher se aproximou de nós —

Eu sou Anne Marie, a corretora de imóveis.

— Você deve ter me reconhecido pelos cabelos rosas do whatsapp —

Kayla brincou — Prazer, essa é minha amiga Blair McGrawn.

Cumprimentei rapidamente, apertando sua mão.

— Esse é um imóvel que gosto bastante, mas como disse para você ontem, ainda temos mais dois para ver — ela sorriu.

Nos aproximamos do local, era um imóvel bem com cara de loja, já conseguia imaginar o slogan da loja, as placas e se fosse grande o bastante por dentro, o desfile poderia acontecer ali.

— Conforme a sua preferência, separei os três lugares maiores que tenho até hoje.

— Ótimo — Kayla sorriu.

Entramos no imóvel.

Uma sala grande nos cercava, paredes brancas com os pisos da mesma cor. Havia um pequeno cômodo nos fundos, fechado por uma porta marrom escuro.

— Aquele é o banheiro — Anne disse — Esse é o imóvel mais simples que tenho, mas é possível fazer reformas mesmo estando alugado, já que você quer para uma loja.

— Ainda sim, é simples demais — Kayla disse — O que acha Blair?

— Podemos ver todos para depois decidir — falei.

Ela assentiu e partimos para o segundo endereço, dessa vez, fomos com Anne que estava com seu carro.

 

Depois de visitarmos os três endereços, ficamos com o último. Era um imóvel grande com dois andares, no primeiro, tivemos a ideia de ficar a parte administrativa da loja, como contábeis, RH, financeiro, departamento pessoal e até mesmo onde seria elaborado todo o marketing. E embaixo seria a loja, com dois banheiros, que felizmente não precisaríamos construir e a área dos provadores, que essa parte teríamos que arrumar.

Com o imóvel escolhido, Kayla ainda acertou alguns detalhes com Anne, para depois estarmos livres para podermos almoçar.

— Estou animada — ela disse, enquanto esperávamos o nosso pedido no McDonald’s.

Ela havia insistido que comecemos um fast food.

— Confesso que também estou — sorri — A loja vai ficar incrível.

— Sim! Mal posso esperar para assinar toda a papelada com Anne e finalmente pensar na montagem da loja.

— Irei ajudar no que precisar.

— Isso quer dizer que vai ser minha sócia?

— Isso quer dizer que estou pensando ainda. Você me fez a proposta há... duas horas? Preciso de uns dias ainda.

— Tudo bem, prometo tentar controlar minha ansiedade até você finalmente decidir.

Nossos pedidos ficaram prontos e nos levantamos para pega-los.

Nos sentamos próximas a janela.

Conversamos e rimos bastante, era divertido estar com Kayla. Ela não me pressionava a contar nada, sabia que tudo viria no seu tempo, ela é uma boa amiga. Todo o tempo que fiquei com ela, não pensei em nada que me afligisse, apenas a sua loja e os planos para um futuro, um futuro que nem sabia se teria.

Nos despedimos depois, marcando que nos encontraríamos em breve para finalmente começarmos os preparativos para a loja.

Quando cheguei no meu apartamento só Zayn estava na sala, assistindo televisão.

— Onde está Elena?

— Ela saiu para comprar algumas coisas femininas — ele sorriu — Como foi a busca?

Joguei minha bolsa na poltrona e me sentei ao seu lado.

— Encontramos um excelente imóvel, amanhã Kayla irá acertar o contrato com a corretora.

— Que ótimo!

— Ela me convidou para ser sua sócia — falei.

— E você aceitou?

— Estou pensando se irei ou não. Abrir uma loja nunca esteve nos meus planos.

— Eu entendo, mas você cursou administração porque gosta da área, acho que está na hora de ter o seu próprio lugar e se for dividi-lo com uma garota amiga que gosta, é melhor ainda.

— Você tem razão, irei pensar mais um pouco, ver os pros e os contras disso tudo.

— Blair sendo Blair — ele riu.

Sorri, mas de repente todo o peso de ontem se alojou nos meus ombros.

— O que aconteceu? Ficou séria do nada.

— Preciso te mostrar uma coisa.

Me levantei e peguei dentro da bolsa o envelope que continha o recado que desde ontem não me deixava pregar os olhos. Estendi a meu irmão que não demorou para abri-lo e ler o que estava escrito.

Eu vi ele ficar pálido, como se não acreditasse no que estava vendo, provavelmente da mesma forma que eu fiquei quando li.

— Essa letra...

— Georgina — completei — Eu não sei se é mais uma brincadeira sem graça de Louis ou se realmente ela está viva. Só sei que do nada isso apareceu na minha bolsa junto com um pen drive.

— Onde está o pen drive?

— Eu o destruí e era o vídeo da sex tape.

— Você viu? — Zayn perguntou, parecia constrangido por saber que sua irmã o viu transando com sua antiga melhor amiga.

— O suficiente para saber que era a sex tape — respondi e isso pareceu o aliviar.

— Você acha que ela está viva? Como? Nós fomos no enterro dela, eu vi o corpo dela sendo levado para o hospital.

— Eu não sei, por isso te mostrei. Estou confusa e isso não me deixou dormir à noite toda, o caixão de Georgina estava fechado, então não diz muita coisa.

— Os pais delas choravam abraçados naquela caixa preta — ele se levantou, visivelmente atordoado — Aquilo não me parecia fingimento.

— Por isso estou confusa Zayn, tudo apontava para o falecimento dela e agora isso, ou ela está viva, ou Louis sabe copiar a caligrafia de minha antiga melhor amiga muito bem.

Ele respirou fundo.

— Preciso de um tempo — ele me devolveu a carta — Irei tomar um banho e colocar os pensamentos em ordem, mas acho que Liam deveria saber disso.

Assenti.

— Eu sei, irei me encontrar com ele amanhã e mostrar a carta.

Já havia até mandado a mensagem enquanto eu e Kayla olhávamos os imóveis.

— Tudo bem, podemos conversar depois?

— Sim, eu também precisei de um tempo para digerir tudo.

Ele concordou e foi para o quarto de hóspedes. Eu sabia que para Zayn estava sendo ainda mais difícil, ele parecia gostar de Georgina quando estavam juntos, mesmo que tenha sido da forma mais errada possível, saber que ela poderia estar viva, me deixava com uma sensação de medo e felicidade e acredito que com ele, era ainda mais intenso.

A campainha tocou e eu me levantei para ver quem era, quando abri a porta uma Elena visivelmente envergonhada sorria.

— Me esqueci de levar as chaves — sorriu tímida — Comprei algumas verduras para fazer a janta.

Ela entrou para dentro e eu estava fechando, quando a porta entreaberta do apartamento de Harry me chamou a atenção.

Franzi as sobrancelhas. Ele nunca deixava a porta aberta, mesmo que aqui fosse um condomínio seguro, era estranho.

Contrariando a mim mesmo fui até a sua porta e coloquei a cabeça para dentro da sala de estar. Não havia sinal dele.

Entrei no apartamento e ouvi o barulho do chuveiro ligado junto com a voz de Harry cantando uma versão sofrida de Don’t let me down dos Beatles.

Sorri, ele era um bom apreciador de músicas no chuveiro. Meu peito apertou de saudades, como sempre acontecia quando eu pensava em Harry.

Decidida a sair do apartamento ao ver que a porta entreaberta não se passava de um esquecimento, parei ao ver um monte de papeis em cima da mesa de centro na sala.

Muitas pinturas, inclusive uma que notei bem ao me aproximar.

Era eu.

Eu estava pintada de uma forma tão real que parecia uma fotografia. Ao lado do retrato havia um papel meio fechado, de longe vi que ele tinha algo escrito e não aguentando minha curiosidade o peguei e abri.

“Ainda lembro como se fosse ontem quando Blair McGrawn entrou em minha vida, com sua arrogância, suas poucas palavras e seu costume hábito de me ver e me xingar, sem perceber me apaixonei perdidamente, tão rápido como um foguete, tão forte como um furacão. Eu me vi preso em seu olhar, nos seus poucos sorrisos e no seu corpo, tão maravilhosamente esculpido, como se Deus tivesse reservado apenas um dia para aperfeiçoar todos os seus detalhes. 

Em mais de três anos sendo o seu vizinho e poucos meses namorando com ela, percebi coisas que acho que nem ela percebe.

Como quando suas sobrancelhas franzem quando está mentindo ou quando está confusa, ou quando seus lábios ficam em uma reta fina quando está terrivelmente brava.

São detalhes que percebi desde o primeiro ano quando começamos a discutir. Era engraçado tira-la do sério, mais ainda ter sua atenção sobre mim, aqueles eram momentos em que eu aproveitava para fazer de tudo para chamar sua atenção, talvez eu tenha errado com as táticas? Não sei, só sei que três anos depois eu estava com a garota.

E caramba... eu vi a paixão que sentia por ela se transformar no mais verdadeiro amor, tão rápido e tão forte, da mesma forma que o primeiro sentimento me domou.

Os melhores dias foram os que passei do lado dela, com seu olhar apaixonado sobre mim, com suas, agora, leves, irritações sobre meus maus hábitos. Cada detalhe que eu nem sei se ela percebeu porque quando estávamos felizes, ela terminou comigo.

Ver que ela estava mentindo para me proteger foi a pior sensação.

Não é como se ela não confiasse, é como se ela estivesse com medo.

E eu me sinto ridículo por não poder ajudar, por estar no escuro, sem saber como agir.

Não posso me aproximar, não posso ter ela de volta, ela simplesmente me afastou.

E dói.

Dói demais.

Lembro um dia quando minha sábia avó disse: a pior dor é a de um coração partido.

Ela estava certa, sem perceber Blair partiu meu coração.

Partiu ao não me dizer a verdade.

Partiu ao me privar de protege-la.

Partiu ao dizer que não me amava, mesmo quando eu via com clareza que ela estava mentindo.

Mas as palavras…mesmo quando não verdadeiras, ainda dói, porque no momento que ela soltou aquela frase, ela queria que fosse verdade.

E saber disso, me matava por dentro.

Estou no escuro.

Não sei se me aproximo, não sei se sigo em frente, ou se simplesmente espero por ela.

Estou confuso porque estou no escuro.

Apenas uma coisa eu enxergo com clareza: eu amo Blair McGrawn.

Não quero desistir dela.

Não quero ter que dizer adeus.

Quero que ela me diga o que está passando, quero que ela deposite toda a sua confiança em mim.

Quero que ela me ame novamente.

Quero sentir os seus braços envolta de mim, naquele abraços que só nós dois conseguimos entender.

Quero tudo que envolva o amor da minha vida.

Sem medo, sem inseguranças, apenas amor.

Cheguei em um momento que estou escrevendo uma carta, que provavelmente nunca chegará até ela, porque ela está passando por coisas demais para dar atenção e sofrer por um relacionamento recente.

Mas ouvi de Ali, que desabar ajuda.

Eu não quero contar tudo que me aflige para os meus amigos, mas escrever está me ajudando a por todos os meus pensamentos em ordem.

Não sei o que será daqui para frente, não sei o que nos aguarda.

Só sei que a amo e estou no escuro”

As lágrimas vieram tão forte enquanto lia que precisei me sentar para acalmar meu coração.

Saber a forma como ele se sentia, a forma como quebrei seu coração, me destruía. Eu não queria provocar tudo isso, eu o amo, mas eu tenho tanto medo.

A verdade é que eu também estou no escuro.

Sem saber o que fazer, sem saber como agir e sem estruturas para continuar.

Ele foi apaixonado por mim desde o primeiro dia.... com todas as suas implicâncias e comportamentos que me tiravam do sério. Ele já havia me dito isso, mas ler de forma tão aberta em uma carta me fazia o ama-lo ainda mais.

“Eu vou ter mesmo que me livrar dele com as minhas próprias mãos? “

As palavras frias de Louis me fizeram recuar, deixei os papeis sobre a mesa e levantei. Eu não podia, simplesmente não podia colocar a vida do meu amor em risco.

Quando estava preste a sair vi Harry parado em minha frente, os olhos tão marejados como os meus.