Taehyung não sabia se devia dizer alguma coisa ou simplesmente ficar quieto. Queria se desculpar com Yoongi, mas o mais velho parecia tão chateado que ele tinha medo de piorar a situação. Claro, sua mãe o ensinou a sempre pedir desculpas se ele tivesse feito algo errado, porém, a expressão de Yoongi não era nada encorajadora. Taehyung se sentia mal por ter feito o outro se preocupar, pois Yoongi estava sempre lá para ele. O mais velho o ajudava com tudo, qualquer coisa, e sempre estava lá caso Taehyung precisasse.
Talvez ele devesse mesmo se desculpar.
– Yoongi hyung... – Taehyung começou. Yoongi havia acabado de estacionar o carro em frente de seu pequeno prédio. – Eu... Me desculpe.
Yoongi tirou as mãos do volante e bagunçou as mechas desbotadas, que alternavam entre um rosa claro e o loiro do cabelo descolorido. Taehyung apertava os dedos das mãos e mordia os lábios, aguardando alguma resposta ou reação.
– Eu te desculpo, Taehyung. – O mais velho finalmente respondeu, soltando um longo suspiro. – Mas não faça mais isso.
– Sim hyung. – Ele abaixou a cabeça, se sentindo mil vezes mais arrependido.
– Eu fico... – Yoongi fez uma pausa e desviou o olhar. – Feliz de saber que você finalmente fez um amigo na escola. Mas não se esqueça de avisar onde você está, que horas vai voltar... Essas coisas. Não é nem para mim que você tem que dizer, mas para Namjoon. – Yoongi voltou a olhar para o garoto. – Merda Taehyung, você não sabe o quanto ele se preocupa com você.
– Eu...
– Bem mais do que você imagina. – Yoongi respirou fundo. – Desculpa.
– Tudo bem, eu sei que eu estava errado. – Taehyung forçou um sorriso. – Não vai acontecer outra vez.
Taehyung sentiu Yoongi tocar em sua perna e olhou para cima. Encontrar os olhos tristes do outro o fez sentir ainda pior.
– Olha, não quero brigar com você de novo tá? – O mais velho sorriu fraco e deu uns tapinhas na coxa de Taehyung. – Você sabe que eu odeio fazer isso.
– Eu sei. – Taehyung tirou o cinto e abriu a porta do carro. – Obrigado hyung.
– Namjoon já sabe que eu peguei você lá. – Yoongi ligou novamente o motor do carro. – Mas prepare-se para o pior, ele estava uma arara.
– Eu imagino... – O mais novo mordeu novamente os lábios e fechou a porta do carro. – Até depois, hyung.
– Se cuida... – Taehyung ia dar meia volta para entrar no prédio, mas Yoongi o chamou antes. – Tae!
– Hm?
– Esse Jeongguk... – O loiro limpou a garganta. – Como ele... Ele não é... Bom...
– Ele não é como Jimin. – Taehyung não conhecia Jeongguk muito bem. Eles haviam se conhecido fazia apenas alguns dias. Não sabia realmente como o garoto era, mas gostava de estar com ele e não queria que Yoongi pensasse que ele era um idiota como seu ex melhor amigo.
– Ótimo. – Yoongi respondeu, virando a cabeça para frente e colocando as duas mãos no volante. – Até.
X
Taehyung parou em frente à porta do apartamento e respirou fundo. Sabia que quanto entrasse, encontraria um Namjoon furioso. Mas como teria que passar por aquilo de qualquer jeito, virou a chave na fechadura e entrou.
– Namjoon hyun... – Taehyung começou baixinho, mas quando viu Namjoon se levantar do sofá e andar até ele, congelou.
– Kim Taehyung! – Seu irmão ergueu a voz. – Taehyung se encolheu todo e fechou os olhos, pronto para receber uma grande bronca. No entanto, só sentiu braços cansados o envolverem em um abraço apertado.
– Hyung...
– Ela me pediu para cuidar de você. – Namjoon disse baixinho. Sua voz parecia fraca, cansada. Taehyung colocou os braços ao redor de Namjoon e descansou a cabeça em seu ombro. – Você é meu irmão e minha responsabilidade.
Taehyung ficou em silêncio. Não sabia o que deveria falar. Devia se desculpar, mas sentia que Namjoon tinha mais a dizer. Fora que, a culpa pesava em seu peito.
– Eu estava tão preocupado, droga, Taehyungie... – Namjoon o apertou ainda mais antes de soltá-lo um pouco, apenas para poder olhá-lo nos olhos. – Por que você faz isso comigo? Hm?
– Desculpe. – Disse baixinho, com medo de desviar dos olhos preocupados de Namjoon. – Eu devia ter avisado... Desculpe.
– Sim você devia. – Namjoon bufou. – E eu estava furioso, podia ter quebrado tudo nessa casa. – Ele riu nervoso e soltou Taehyung. – Não estou acostumado com você saindo de casa e andando por ai com outra pessoa sem ser Yoongi. Como vou saber se está bem? Se está seguro?
Taehyung encarou os pés. Queria garantir que estava bem na casa de Jeongguk, mas não sabia se Namjoon iria acreditar.
– Eu vou chamar uma pizza. – Namjoon tirou o celular do bolso. – Você deve estar morrendo de fome não é?
– Um pouco. – Taehyung colocou uma das mãos sobre a barriga, se lembrando que não havia comido nada desde o almoço.
Depois de discar e fazer o pedido, Namjoon sinalizou com a cabeça para que Taehyung sentasse no sofá. Ele o fez, esperando pacientemente a companhia de seu irmão.
– Taehyung. – Namjoon se sentou ao seu lado e respirou fundo. – Eu sei que não tenho sido o melhor irmão que você poderia ter. – Ele faz uma pausa, apertando os olhos e fazendo uma careta. Taehyung sabia que era difícil para ele dizer aquelas palavras. – Mas eu estou tentando, sério. Juro que vou ser melhor para você.
– Eu sei hyung. – Taehyung sorriu. Confiava em Namjoon, nunca deixou de confiar. Acontece que com o passar dos anos, muitas coisas mudaram. Muitas coisas aconteceram ao redor deles, coisas essas que acabam mudando Namjoon e Taehyung, tornando um pouco difícil de conviver normalmente.
– Mas você tem que colaborar comigo. – Namjoon o tocou no ombro. – Nós somos irmãos, mas também somos amigos. Não somos?
Taehyung apenas acenou com a cabeça. Automaticamente acabou se lembrando de algumas cenas de sua infância, quando ele e Namjoon ainda brincavam juntos e contavam tudo um para o outro.
– Não quero que esconda nada de mim, pode fazer isso? – Taehyung olhou para cima e acenou novamente. – Eu não vou gritar com você... Só se for estritamente necessário.
– Ok hyung.
– Eu sei que tendo a ser muito cabeça quente, mas você sabe... É que o trabalho me tira do sério.
– Eu sei hyung, você se esforça demais... – Ele encarou suas mãos. Queria poder fazer algo para colaborar com as despesas.
– Mas sei que vamos conseguir, não é? – Namjoon sorriu e Taehyung abriu um sorriso pequeno. – Começando por hoje... Onde você estava mesmo?
– Na casa de Jeongguk. – Taehyung respondeu prontamente. Queria começar com o pé direito. Esperava que a naturalidade de suas conversas retornasse, assim como era antes. – Ele é um colega da escola, um garoto novo.
– Hm. –Namjoon acenou com a cabeça. – Ele é legal? Te tratou bem?
– Sim hyung. – Taehyung respondeu. Sabia que estava falando a verdade.
– Certo, mas me avise da próxima vez que for ficar lá ok? Por que aí posso ficar tranquilo e posso avisar Yoongi e pedir para ele te buscar.
– Ok.
– Mas alguma coisa que queira me contar? – Namjoon bateu as duas mãos em suas pernas e se preparou para levantar do sofá.
Taehyung tentou manter uma expressão nula. Tinha muitas coisas guardadas em seu coração, mas não sabia como colocar para fora. Não queria atormentar Namjoon com tantos problemas. Tinha o caso do uniforme, as coisas que Jiae lhe disse, Jimin e como estava se sentindo em relação a Jeongguk... Era muita coisa. Namjoon não merecia esquentar a cabeça com aquilo tudo.
– Não, tá tudo bem. – Taehyung sorriu, parte feliz e parte sentindo remorso. Ouvia uma voz no fundo de sua cabeça que dizia que tinha que contar tudo para Namjoon. Mas sua própria voz mandava ficar quieto.
– Muito bem! – Namjoon sorriu e ajudou Taehyung a levantar do sofá. – Que tal você arrumar a mesa para comermos? E como castigo, vai lavar a louça hoje.
– Mas hyung! É pizza, podemos comer com as mãos! – Taehyung disse manhoso.
– Eu sei, mas tenho que te castigar de alguma forma. – Namjoon piscou um dos olhos, e Taehyung soltou um “humpf”. Mas se sentia feliz por dentro, finalmente estava conseguindo o antigo Namjoon de volta. Mesmo que a sua parte mandona e chata estivesse vindo junto com a parte legal e gentil.
Talvez enfim conseguissem ser uma família novamente.
X
Taehyung estava com um bom humor inacreditável. Estava sentando na carteira da sala de aula, meia hora antes do horário que normalmente chegava. Havia acordado cedo, porque combinara com Namjoon de fazer panquecas para o café da manhã. Nenhum dos dois era um exímio cozinheiro, mas conseguiram fazer pelo menos uma panqueca cair direito na panela, e não no chão. Ah, fora aquela que grudou no teto da cozinha. Achou que Namjoon ia ficar bravo por ter sujado o teto, mas ele apenas riu, assegurando Taehyung de que os dois dariam conta daquilo depois. Passar mais tempo juntos estava fazendo muito bem para eles, por mais que as coisas ainda estivessem ruins.
Taehyung sabia que ainda levava uma vida difícil e que Namjoon ainda trabalhava demais.
A ideia de arranjar um emprego pairou sobre sua cabeça novamente.
Se conseguisse um emprego de meio período, seria capaz de ajudar Namjoon com as contas da casa. Se trabalhasse em algum lugar que oferecesse desconto para funcionários, poderia até trazer comida ou outros artigos necessários com certo desconto. Não conseguia parar de pensar em ajudar Namjoon, pelo menos a pagar suas coisas. Por mais que tivesse bolsa integral na escola, alguns materiais ainda precisavam ser comprados com seu próprio dinheiro.
Seu uniforme era uma delas.
Passou as mãos em seus braços desnudos e fez uma careta. Precisava comprar uma camisa nova e também um blazer. Congelaria no frio se continuasse a andar por ai apenas com a camisa de manga curta, que devia ser usada no verão.
É, um emprego seria uma boa ideia.
Namjoon não o permitiria, porém. Sabia que o irmão não o deixaria arranjar um emprego.
Mas ele não precisaria saber.
Não agora.
Novamente, parte de sua cabeça dizia para ele contar tudo para o irmão, enquanto a outra parte, dizia que poderia contar depois.
Estava confuso.
Mal percebeu que a sala já estava quase cheia. Os alunos chegavam pouco a pouco, sentando nas carteiras ou se aglomerando em grupinhos para conversar. Taehyung encarou a porta, esperando ansiosamente pela chegada do novato, Jeongguk. Sabia que ele não iria faltar hoje. Jeongguk não o disse isso, mas Taehyung sentia.
Dito e feito.
A porta se abriu, mas não como do dia anterior. Jeongguk a empurrou e depois fechou normalmente. O professor ainda não estava na sala, então não abriu a boca para dizer “com licença”. Taehyung sorriu, talvez nem com o professor na sala Jeongguk faria isso, não fazia o jeito dele.
– Bom dia, TaeTae. – O garoto passou pela mesa de Taehyung e sorriu, logo largando a mochila no chão e sentando em sua própria carteira.
– Bom dia. – Taehyung se virou de lado. Não conseguia segurar o sorriso.
– E aí? Como foi? – Jeongguk cruzou os braços em cima da mesa. Estava olhando fixamente para Taehyung.
– Huh? Como foi o que?
– Levou bronca? Apanhou? Seus pais devem ter brigado com você.
– Ah... – Taehyung pressionou os lábios um contra o outro antes de responder. Como falaria para Jeongguk que ele não tinha pais?
– Eu imagino como deve ter sido. – O garoto se encostou na cadeira e esticou as pernas por cima da mesa. – Os meus são um pé no saco, eu faço qualquer coisa e eles já vem me dar bronca e falar besteiras. – Jeongguk fez uma bola com o chiclete que estava mascando, fazendo Taehyung se assustar quando a dita bola estourou. – Isso quando eles estão em casa.
Taehyung encarou a mesa. Não queria esconder de garoto o caso de seus pais. Queria pelo menos dizer que ele não os tinha, que vivia com o irmão em um apartamento menor que o banheiro de Jeongguk. Mas não sabia como. Não sabia se o garoto iria aceitar aquilo. Não sabia como Jeongguk iria reagir. Estava com medo de perdê-lo assim como perdeu Jimin.
Mas não, Jeongguk não era como Jimin. Ele entenderia.
Porém, Taehyung não se sentia confortável em falar sobre aquilo ali, na sala de aula.
– Você não está muito afim de conversar, não é? – Jeongguk se ajeitou na cadeira, ficando mais perto de Taehyung. – Deve ter sido difícil ontem. – Ele o olhava com uma expressão compressiva no rosto.
– Não é isso, Jeongguk... – Taehyung desviou o olhar. – É que não quero falar disso aqui... Agora.
– Oh. – Jeongguk acenou com a cabeça e olhou ao redor. – Não precisa dizer nada aqui perto desses idiotas. – Ele sorriu de canto. – Podemos falar em outro lugar, depois...
– Seria bom. – Taehyung sorriu, ganhando outro sorriso charmoso de Jeongguk.
É, ele teria de ser diferente de Jimin.
Enfim a professora chegou à sala. Taehyung se virou para frente e se preparou para assistir a aula. A professora porém andou até sua mesa e parou perto dela.
– Kim Taehyung. – Ela disse e ele respondeu um “sim”. – O orientador quer falar com você.
Taehyung arregalou os olhos. Nunca havia falado com o orientador. Qual seria o motivo? Ele não fazia nada que fosse motivo de ser chamado. A professora voltou para frente da sala e começou a organizar uns papeis. A turma toda virou seu olhar para Taehyung, que se encolheu na carteira antes de levantar. Olhou para trás e viu Jeongguk com uma sobrancelha arqueada, provavelmente tão confuso quanto ele. Para evitar mais problemas, ele logo se levantou e saiu rapidamente da sala, sem querer olhar para os alunos que mantinham sua atenção nele.
Taehyung fechou a porta da sala com cuidado. Mal sabia onde era a sala do tal orientador. Deveria ser perto da diretoria, onde ele assinou os papeis para a entrega da bolsa de estudos. Andou a passos receosos pelos corredores vazios da escola, pois todas as turmas estavam tendo aula. Encontrou uma porta no mesmo corredor da diretoria, na qual havia uma placa que dizia “Orientação Educacional”. Bateu na porta e esperou.
– Pode entrar! – Ouviu uma voz sair de dentro de sala e abriu a porta.
– Com licença... – Disse baixinho enquanto fechava a porta atrás de si. Quem estava atrás da mesa era um homem jovem, não aparentando ter mais que vinte e poucos anos.
– Sente-se, por favor. – O rapaz disse, sorrindo para Taehyung. – Você deve ser Kim Taehyung, não é?
– Sim senhor. – Ele respondeu, sentando em uma das cadeiras.
– Eu sou Kim Seokjin. – Ele apontou para uma placa de pedra sobre a mesa, onde havia seu nome. – Orientador Educacional desta escola.
– É um prazer... – Taehyung sorriu fraco, preocupado com o motivo de estar sentado ali. Seokjin parecia simpático, apesar de tudo. O mais velho estendeu a mão e Taehyung a apertou, se sentindo um pouco menos tenso quando viu um sorriso nos lábios de Seokjin.
– Pode me chamar de Jin, se quiser. – Seokjin colocou os braços sobre a mesa e guardou alguns documentos. – Taehyung, você sabe por que está aqui?
– Hm... Não senhor... – Taehyung se encolheu na cadeira estofada. – Quer dizer, Jin...
– Hyung. – Seokjin corrigiu. – Jin hyung está bom. Não gosto que os alunos me chamem de outro jeito. – Ele sorri. – Me faz parecer velho e chato.
Taehyung sorriu também. Talvez Seokjin não fosse como seus professores rabugentos.
Batidas na porta puderam ser ouvidas, e Taehyung se virou na cadeira.
– Pode entrar! – Seokjin disse alto, e a porta se abriu.
Taehyung queria se enfiar debaixo do tapete.
Um Namjoon apressado e arfando entrou na sala, lançando um olhar mortífero para Taehyung.
Oh ow.
– Com licença, Senhor Orientador. – Namjoon ajeitou a gravata e fechou a porta. – Eu vim correndo do trabalho...
– Tudo bem, eu posso te dar uma justificativa. – Seokjin sorriu e mostrou a cadeira com a mão. – Sente-se, por favor.
Namjoon fez o que fora pedido. Taehyung desviou o olhar para um pequeno boneco que estava em cima da mesa de Seokjin. Não sabia exatamente de qual personagem era, mas sabia que pertencia a um jogo.
– Que bom que pode vir, – Seokjin abaixou o olhar para ler um papel. – Kim Namjoon. Precisamos conversar sobre Taehyung.
– Claro, pode prosseguir... – Namjoon respondeu. Sua respiração já estava quase voltando ao normal.
– Se que é difícil cuidar de uma casa e de um irmão mais novo, além de todas as despesas e tarifas que isso envolve... Mas peço que preste mais atenção às coisas que acontecem com ele aqui dentro. – Seokjin começou, seu rosto se tornando sério de repente. – Seu irmão te contou o que aconteceu esses dias?
– Hm... Não... – Namjoon olhou para Taehyung e esse arregalou os olhos.
O episódio do refeitório.
– Bom, Namjoon... – Seokjin fez uma pausa. – Perdão, posso te chamar de Namjoon?
– Claro, claro... – O mais velho dos Kim colocou uma das mãos na testa e a outra tamborilava em cima da mesa de madeira escura.
– Aqui nessa escola nós levamos muito a sério brigas e conflitos entre alunos. – Seokjin desviou seu olhar para Taehyung. – E esperamos que ambos responsáveis e alunos também levem a sério.
Namjoon lançou outro de seus olhares para Taehyung, que abaixou a cabeça e mordeu o lábio inferior.
Devia ter contado.
Pelo menos Namjoon já saberia mesmo antes de ser chamado.
Talvez nem fosse necessário...
Mas ele não queria que Namjoon soubesse, não dessa forma. Não queria que ele soubesse o quão fraco seu irmão era. Tinha vergonha de mostrar que ainda era aquele garotinho que se escondia no armário de casa quando tinha medo.
Não queria que Namjoon tivesse vergonha dele.
– O que houve? Taehyung se envolveu em uma briga? – Namjoon perguntou assustado.
– Você quer dizer para ele? Taehyung?
Taehyung ficou estático. Por um lado, queria contar. Porém, além de não desejar chatear o irmão, não sabia como dizer. Tinha medo de entregar Jiae, porque não sabia o que Seokjin iria fazer a respeito disso. E se a garota o importunasse ainda mais? Além disso, estava com medo do que Namjoon iria pensar. Com certeza o mais velho o acharia ainda mais criança do que já achava.
“Quando é que você vai crescer?”
– Taehyung, responda. – Namjoon soou forte, autoritário. Estava furioso. – Ele te fez uma pergunta.
– Tudo bem. – Seokjin interviu. – Então eu posso dizer...
– Não! – Taehyung interrompeu o mais velho. – Desculpa... Eu posso dizer o que houve.
Seokjin sorriu de leve e fez um sinal com a mão, dando a palavra para Taehyung. Namjoon o encarava como se Taehyung houvesse comido o ultimo biscoito do pote sem permissão. O mas novo respirou fundo e disse a primeira coisa que lhe veio à cabeça.
– Eu estava brigando. – Disse baixinho. Sabia que era mentira e também sabia que Seokjin detinha a verdade sobre o que aconteceu, mas queria pensar que o mais velho não o denunciaria.
Taehyung levantou os olhos e encontrou um orientador confuso. Jin o olhava com uma expressão de pura duvida. O mais novo então tentou dizer com o olhar o que não podia dizer com palavras, já que Namjoon estava ali do seu lado, escutando tudo.
– O que? – Namjoon finalmente se pronunciou. – Uma briga? Taehyung! – O mais velho dos irmãos Kim estava quase se levantando da cadeira. Estava visivelmente irritado. – Foi isso mesmo? – Ele se virou para Seokjin, que automaticamente lançou um olhar para Taehyung.
O mais novo retornou o olhar, e Seokjin soltou um suspiro, havia entendido. Taehyung se ajeitou na cadeira e esperou pelo pior. O que estava pensando? Dizer que havia brigado era melhor do que dizer que uma garota estava o importunando? No calor daquele momento parecia uma opção melhor. Claro que Namjoon ficaria furioso, bem mais do que já estava, mas pelo menos não acharia Taehyung patético.
– Foi... Foi sim. – Seokjin respondeu, dando uma última olhada em Taehyung. O mais velho parecia preocupado. – Taehyung pode te explicar melhor.
– Não precisa me explicar nada! – Namjoon ergueu a voz e pegou Taehyung pelo pulso, chamando a atenção do garoto. – Você sabe muito bem o quão difícil foi você entrar aqui nessa escola, como pode fazer uma coisa dessas? – Ele olhava para o irmão diretamente nos olhos, fazendo Taehyung se encolher de vergonha e culpa.
– Desculpa...
– Desculpa? – Namjoon sorriu nervoso, um sorriso que parecia mais uma careta. – Acha que se desculpar para mim vai mudar o que aconteceu? Acha que se desculpar vai manter você aqui nessa escola?
– Namjoon. – Seokjin limpou a garganta. – Por favor, você poderia se acalmar um pouco? Não vamos expulsar Taehyung.
Namjoon soltou do pulso de Taehyung e sentou novamente na cadeira, suspirando.
– Só esteja ciente de que isso não pode acontecer outra vez. Taehyung é um ótimo aluno, tanto em comportamento quanto em notas. Não queremos expulsá-lo e nem nada do tipo. – Seokjin disse enquanto alternava o olhar entre os dois irmãos. – Não sei como são as coisas na casa de vocês, mas o dialogo é indispensável. – Ele encarou Taehyung, que abaixou a cabeça logo em seguida. – Eu adoraria ajudá-los no que precisarem, é só...
– Não precisamos disso, com todo respeito. – Namjoon se levantou da cadeira. – Eu e Taehyung somos uma família e sabemos agir como uma, não vamos precisar dos seus serviços porque não temos problemas... – Namjoon pegou Taehyung pelo ombro e cerrou os dentes. – Certo Taehyung?
O mais novo se limitou a acenar com a cabeça, não querendo encontrar o olhar furioso de Namjoon e nem o olhar preocupado de Seokjin.
– Com sua licença, estamos de saída. – Namjoon sorriu amarelo e começou a puxar Taehyung para porta, porém Seokjin se levantou e os impediu.
– Gostaria de falar com Taehyung mais um pouco, mas você pode ir. – Seokjin sorriu e entregou uma folha de papel para o irmão mais velho. – Aqui está sua justificativa. Sinto muito por atrapalhar seu dia de trabalho.
– Tudo bem...
– Só tenha em mente que eu não chamaria Taehyung aqui caso vocês não tivessem problemas. – Ele continuou, recebendo um suspiro de Namjoon como resposta.
– Eu terei isso em mente sim. – Namjoon colocou a mão na maçaneta da porta. – Passar bem, Kim Seokjin. – E com isso, saiu da sala.
Taehyung seguiu Seokjin com os olhos até o mais velho sentar novamente em seu lugar. O garoto engoliu em seco quando o orientador o olhou nos olhos.
– Taehyung. – Ele começou, apoiando os cotovelos em cima da mesa. – Eu só quero te ajudar, saiba disso.
– Sim hyung. – Respondeu baixo, sentindo todo o peso da mentira que havia acabado de contar.
– Não vou fazer nada para te prejudicar, pelo contrário... Mas preciso que você colabore. – Ele piscou algumas vezes, esperando alguma reação de Taehyung, que não veio. – Quer me contar por que mentiu?
Taehyung sabia porque havia mentido. Tinha vergonha de mostrar uma imagem frágil e patética para o irmão. Namjoon sempre cuidou dele, sempre foi um exemplo que Taehyung queria seguir, sempre foi valente, esperto e possuidor de várias outras qualidades que só foram aumentando com o tempo. Mas e Taehyung? O que ele era? Ainda se sentia a mesma criança assustada de sempre, aquela que corria para dentro do armário quando escutava seu padrasto gritar com sua mãe. Era ainda a mesma criança que pulava para a cama do irmão quando chovia forte e trovões faziam estrondos. Ainda era o mesmo garoto tímido que tinha medo de fazer amigos, porque o único que tivera o abandonou, deixando mais uma cicatriz que custava a sarar. Ainda era aquele garotinho que sentia falta da mãe e medo das noites escuras, aquele que Namjoon segurava com os dois braços e dizia “vai ficar tudo bem". O que havia mudado desde então? Muita coisa, porém Taehyung ainda era o mesmo.
– Não quero que ele saiba da verdade. – Respondeu simplesmente.
– A culpa não foi sua, você sabe que foi Jiae que te fez cair. – Seokjin virou a cabeça, estava com aquela expressão preocupada e confusa no rosto. – Sabe também que ela te assediou e te disse coisas que não se dizem.
Taehyung piscou os olhos, estava sentindo lágrimas surgirem. Não queria chorar ali. Aquele era para ser o começo de um tempo novo, de um Taehyung novo. Mas aquelas lágrimas eram a prova de que ele ainda era o mesmo e de que as coisas não iriam melhorar tão rápido assim.
– Como sabe disso? – Perguntou, fazendo Seokjin morder os lábios. – Como sabe que foi Jiae? Como sabe o que ela me disse?
– Alguém me contou. Alguém que viu a coisa toda.
Taehyung encarou novamente aquele bonequinho em cima da mesa. Quem poderia ter contado? Todo mundo viu o que aconteceu no refeitório, mas ninguém se importaria em contar para o orientador. Ninguém acusaria Jiae, mas sim, acusariam Taehyung. Estava confuso. Além do mais, quando estava na sala de aula com Jiae, somente Kei estava junto e ela não faria nada disso, já que era amiga da garota.
Não poderia ser Jeongguk, ele não sabia o que tinha acontecido entre ele e Jiae. Certo, ele havia visto o que houve no refeitório, mas não parecia de seu feitio sair contando para o orientador. Jeongguk era um encrenqueiro, ele mesmo disse que mudou de escola várias vezes por seu comportamento. Não fazia sentido ele ter ido até Seokjin para dizer isso.
Não era Jeongguk, Nem Kei, nem nenhum dos alunos que estavam no refeitório... Taehyung não conseguia pensar em ninguém.
A não ser que...
Jimin.
Taehyung segurou novamente a vontade de chorar. Pensar que Jimin havia dito aquilo tudo para Seokjin o deixava com uma sensação estranha. Incomodava-o o fato do garoto “se preocupar” com ele, porque ele não tinha motivo para fazer isso. Jimin havia abandonado Taehyung, então por quê? Não fazia sentido.
– De qualquer forma... – Seokjin quebrou o silêncio. – Não é nada bom mentir para seu irmão, Taehyung. Apesar de ser um pouco esquentadinho e estressado, ele se preocupa com você. Não minta para ele...
– Eu sei disso... – Taehyung engoliu o choro. Sabia que estava fazendo a coisa errada, mas não podia evitar.
– Eu quero te ajudar, Taehyung. – O orientador lhe entregou um lenço de papel. – Não precisa me dizer agora, mas pense direitinho sobre isso e venha falar comigo depois da aula qualquer dia desses... Prometo que não digo nada para Namjoon. Você que tem que dizer, e eu posso te ajudar com isso. – Seokjin sorriu fraco. – Sei que vocês tem problemas financeiros e também sei que vocês só tem um ao outro. Não é fácil estudar numa escola dessas com essas condições, eu estou ciente disso. Mas você não precisa lutar contra isso sozinho. Namjoon vai te ajudar se você conversar com ele.
– Não consigo fazer isso...
– Talvez não agora... – Jin sorriu. – Mas quem sabe depois que você me contar tudinho e conversarmos sobre isso? Não precisa ficar guardando essas coisas. Estou disposto a te ajudar, mas você precisa confiar em mim.
– Tá bom, Jin hyung. – Taehyung finalmente levantou a cabeça e esboçou um sorriso. Seokjin estava mesmo sendo muito gentil com ele, diferente de todo mundo naquela escola, excluindo Jeongguk, claro.
– Promete que vai vir me ver quando se sentir pronto? – Seokjin se levantou da cadeira e abriu a porta para Taehyung.
– Sim! Eu prometo. – O mais novo respondeu e ganhou um afago na cabeça. Havia se decidido, ia confiar em Seokjin. As coisas haviam de melhorar...
Nem que para isso ele precisasse de ajuda de um desconhecido.
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