Quando eu estava no quinto ano, recebi algumas cartas de amor. Sempre achei isso brega, mas naquele dia algo me comoveu. As palavras daquela carta não pareciam pertencer a um romance qualquer. Era estranho ler algo escrito por um garotinho de 10 anos e pensar que ele era apenas um bobo. Mas ele sempre foi mais do que isso, e ele sabia disso. As palavras estavam escritas em um papel branco, guardado em um envelope vermelho com o símbolo prateado de uma flor de lótus.
Pensei que fosse apenas uma paixão tola, mas estava enganada. Depois de tantos anos, recebi outra carta. O mesmo envelope branco com o símbolo prateado de uma flor de lótus, e o mesmo papel branco com palavras escritas em tinta vermelha.
Será que era ele? Parecia impossível. Há seis anos não recebo cartas, e essa não poderia ser tão desagradável quanto as anteriores, certo? Espero que não, seria muita coincidência.
Guardo o envelope na gaveta vazia da minha escrivaninha. Sinto a maciez do papel e o leve cheiro de hortelã e maçã verde. É agradável.
"Aproveite o presente, minha pequena."
Um pronome possessivo escrito em caligrafia cursiva, sem discriminação ou bullying contra mim ou a sociedade. Impressionante.
A caixa preta tem uma fita vermelha com um laço no centro. Rapidamente, caminho até a minha cama e retiro a fita. Um papel fino e branco está em cima do tecido vinho. Ele adora vermelho, e por coincidência, eu também. Retiro o papel fino e toco no tecido macio. A qualidade é impecável. Deslizo meus dedos no tecido de algodão, é tão leve e macio como um travesseiro.
Tiro o babydoll preto e sinto um calafrio percorrer meu corpo exposto. Olho para a varanda e vejo a porta de vidro aberta, apenas a cortina branca se movimentando com o vento gélido.
Meu cabelo se solta do coque frouxo e minha franja cai sobre o meu olho esquerdo. Retiro os fios escuros e deslizo minhas mãos pelo cabelo, enrolando-o. Me abaixo para pegar um grampo pequena de cor clara, azul claro com o design de uma flor. Mas quando ergo a cabeça novamente, vejo o reflexo de uma sombra escura atrás da cortina bege.
Solto o grampo e meu cabelo se desfaz antes que eu possa terminar de prendê-lo. Meu coração dispara e sinto uma dor no estômago. Uma veia fina e verde mostra inchaço na minha mão esquerda, é agonizante.
Jesus Cristo. Será que estou ficando louca?
Talvez seja esquizofrenia. Seria impossível um homem morto invadir a privacidade de alguém. Ninguém ressuscita antes do julgamento final.
Passo a língua pelos meus lábios carnudos e tento afastar os pensamentos intrusivos. Retiro a franja dos meus olhos novamente, minhas mãos tocam as mechas e as coloco atrás das orelhas. Solto a respiração e observo meu reflexo no espelho. Meus olhos analisam a estrutura opaca do quarto grande e aparentemente não há nada de errado.
Com certeza foi apenas um vulto.
Sou assustada por batidas fortes na porta, acompanhadas de gritos.
— Bela! — Uma voz fina e impaciente me chama. — Espero que esteja pronta, porque vamos te trancar nesse maldito quarto.— Minha mãe resmunga, quase desisto de ir.
— Não se preocupe, já estou pronta. Só vou passar perfume. — Na verdade, estou apenas usando um conjunto de sutiã e calcinha preta. A única coisa que fiz foi tomar banho e vestir algo qualquer para ler a carta e abrir a caixa preta.
Observo o vestido longo e me pergunto se seria loucura usá-lo para uma noite especial.
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