NO PERÍODO QUE SE SEGUIU, agucei os ouvidos e treinei os olhos. Aprendi a deixar meus sentidos sempre alertas, como um bicho à espera de uma presa para matar a fome. Foi meu jeito de sobreviver. Buscava todas as gotas que escorriam das conversas. Até que um dia pingou mais uma na casa da minha avó, de novo em uma conversa segredada.
- Ela nunca ligou? Não acredito! E nunca quis saber da menina? - perguntou a amiga curiosa, tentando inteirar-se do assunto escondido.
Parei de desenhar, minhas mãos suavam. O céu azul que eu pintava acinzentou.
- Na verdade, ela tentou. Queria, sim, saber da filha. - Ligou aqui?
- Imagina se teria coragem! Não, aqui, não, de jeito nenhum! Ligou pra Yuri, que sempre a pintou mais boazinha do que de fato era.
Meu coração disparou de um jeito que achei que ele bateria na garganta. Imaginei um telefone tocando ao longe, em uma tarde de sol e céu azul. Como no meu desenho.
Uma nova peça do meu quebra-cabeça: minha mãe tinha uma amiga chamada Yuri. Mais uma revelação ecoando dentro de mim. No entanto, ainda demoraria um bom tempo para que eu a encontrasse pessoalmente, o que só viria a acontecer dois anos depois, quando eu já podia sair sozinha e soube a quem perguntar sobre ela.
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