Um
Como sempre acordo bastante tarde – hábito que passei a perceber que possuo desde que passei a dormir fora de bunkers. Ainda mais nas luxuosas camas de colchão d’água da cobertura. À sensação de que estou afundando em um mar de sonhos me faz ficar presa por horas de sono, principalmente porque agora Setrákus Ra está dando uma folga na parte de invasão dos meus sonhos, ainda mais depois das brincadeiras silenciosas que Adam e eu fazemos agora que estamos juntos no mesmo quarto toda noite antes de dormir.
Tem obviamente o problema de Quatro e Oito aparecerem aqui do nada no meio de um teleporte, óbvio; ou de Três aparecer com seu poder de atravessar as paredes. Só que esse é o lado bom de ser a Garde mais velha e com os poderes mais bem desenvolvidos, nenhum deles teria a audácia de aparecer em meu quarto do nada. A eu também derrubei um monstro caçador de Gardes quase sozinha, nada demais.
Enfim, dessa vez quando eu acordo é diferente. Posso já sentir o cheiro de alguma gororoba vegetariana que Marina e Oito novamente vão tentar empurrar para gente, mas que eu gentilmente – só que não – vou recusar e acabar comendo alguma comida congelada no freezer, talvez pizza. Tenho que admitir que embora gordurosa a pizza daqui é ótima. Tento me levantar espantando a preguiça do meu ser quando encontro a cama do meu lado vazia. Isso não é muita novidade, Adam sempre acorda mais cedo que eu. Só que eu o encontro no canto do quarto preparando uma mala de viagem. Sinto um palpitar no meu coração na mesma hora. Ele teria me avisado se estivéssemos próximos de sermos invadidos e com certeza não estaria arrumando a mala com tanta serenidade. Percebo então que ele está pondo pouca roupa e reserva um espaço da mala alguma coisa especial.
- Vai viajar? – pergunto não conseguindo conter mais meu silêncio.
Dust que está na sua forma de husky siberiano dormindo num sofá grande que temos no quarto chega a levantar as orelhas por causa da tonalidade que uso.
Adam para de arruma a bagagem na mesma hora e olha pra mim. Ele me encara de modo sério.
- Esqueci de falar, vou com Henry para o rancho em Wisconsin. – ele fala de modo casual. – Vamos levar algumas peças que possam ajudar no conserto da nave.
Reviro os olhos na mesma hora. Claro que ele iria fazer esse negócio de ir ver como a nave está. Em tese, os Cêpans que sabem alguma coisa de mecânica em Lorien ficaram no rancho com Lexa – ela deve estar muito feliz com isso, só que não. E os outros devem ficar aqui e nos ajudar no nosso treinamento, só que temos um problema. Adelina não tem pulso firme, então ninguém respeita muito bem ela, Crayton está mais preocupado com Ella do que com o resto das coisas. Sobrou tudo para as costas de Henry. Não sei como as coisas serão agora que ele vai embora por algum tempo.
- Eles já têm o Adamus lá, isso não é tipo a mesma coisa que você? – pergunto mal-humorada para provocá-lo.
Adam faz uma careta na mesma hora e começa a fechar a mala. Já deve ter se dado por satisfeito com tudo que arrumou na bagagem dele.
- Eu sei um bocado de coisas também Um, posso tentar ajudar na manutenção da nave de alguma forma. – o modo como ele me responde soa como se eu tivesse lhe ofendido ou pior. Sei que de alguma forma Adam se sente um pouco inferior a Adamus.
Ele é sua contra parte de uma linha do tempo futurista onde tem o mesmo Legado de Geokinese que eu. Além dele ter um Legado, ele voltou no tempo em impediu minha morte além da de Dois e Três. Eu sei que Adam ajudou ele em tudo isso pelas sombras, mas os louros sempre foram para Adamus, que acabou também virando meu mentor. Eu sei que os dois se respeitam e de alguma forma até tem uma certa relação quase paternal, mas não tenho dúvidas que Adam quer mostrar ser tão importante quando o outro para todos nós, me sinto mal por ter falado de forma tão direta.
- Eu sei que sabe. – digo procurando dizer algo para ele ficar, mas não consigo. Adam e Lexa montaram um aparato para invadirmos uma base militar do governo em colaboração dos mogs, sei o que ele consegue fazer. – Só vai ser chato ter que ficar sozinha com os pirralhos...
- Bom, só espero que não tente me impedir de ir me deixando inconscientemente. – Adam fala rindo, só que sua expressão é séria pra mim.
À última vez que descordamos sobre algo foi quando ele queria continuar com seu disfarce de Comandante na base mogadoriana de West Virginia. E eu não queria mais ele lá, como não sou lá muito de diplomacia eu meio que tive que o arrastas de lá. Pensar na gente saindo de lá com Sandor desesperado recontratados Nove, só que por meu desleixo Cinco quase foi morto num combate e ficou em coma por semanas.
- E você deve se inteirar mais com a Garde Um. – Posso ver um sorriso debochado em Adam se formar, esse é o tipo comportamento que eu teria para provocar alguém. Ver uma pessoa fazer comigo é muito irritante. – Eles não são tão irritantes assim.
Imagina, não que todos eles sejam ruins. A Seis é legal e Quatro desde que começou a ficar com ela começou a ficar mais badass, agora o resto são um bando de esquisitos. Oito parece ser maneiro, mas essa mistura de palhaço com coisas zen me dá nos nervos, e eu até gosto da Maggie. Ela é muito meiga e fofa e sempre foi legal comigo, embora tenha um péssimo gosto para escolher as pessoas com quem vai sair. Muito triste mesmo ela e Nove estarem juntos. Três é mais esquisito de todos e isolado, por isso para mim seria o mais fácil de se conviver se fosse para escolher um deles para ficar conversando – porque ele não iria ficar puxando papo. Cinco é uma mistura de Três e Nove, hora ele esquisitão e hora é bizarro então eu não sei muito o que falar dele. Marina e Ella só andam juntas, parecem aquelas meninhas que adoram fofocar sobre tudo e dar risadinhas em segredo, embora não me pareçam más pessoas.
- Mal posso esperar para fazer isso... – murmuro desgostosa.
- Bom, você querendo ou não vai ter que aceitar. – Adam firma a voz agora. – Será só pelo fim de semana, na segunda nós voltaremos. Henry está ansioso para treinar vocês.
- As coisas só melhoram.
- Já chega Um! – Adam fala batendo na mala. - Será que pode parar de agir como se fosse criança. Vocês são da mesma raça e a última esperança do mundo, se saíram muito bem na Índia pelo que vi, mas estão muito longe de derrotarem Ra. Ele é quase invencível e pode tirar seus Legados, já contou isso para o resto da Garde? Ou está tão preocupada em ignorar eles que está escondendo uma das mais importantes informações que temos.
Sinto uma vontade gigantesca de socar a cara de Adam nesse momento. Não porque eu ache que ele está errado, mas porque ele fica questionando o tempo todo o que eu devo fazer como se eu fosse inconsequente. Fico tão furiosa que saio batendo perna em direção a porta do quarto e saio batendo ela com tanta força que quando ouço baque dela se fechando temo que tenha quebrado alguma coisa. Por mais que eu tenha meus problemas com Nove, esse apartamento é de Sandor e eu não tenho tanta antipatia por ele para demolir o apartamento num ataque de raiva.
Vou pisando fundo sem rumo até a sala de estar e encontro Adelina limpando obsessivamente uma mancha de algum líquido de um dos sofás luxuosos. Enquanto ela faz isso, a enorme tv de 60 polegadas está ligada na CNN, onde um homem de cinquenta anos muito bonito que parece o George Clonney aparece sorrindo conversando com um tal de Sanderson. Eles parecem falar sobre avanços tecnológicos e na saúde e dizem que tudo será explicado melhor no dia 28 de Agosto – daqui há 25 dias.
- Parece estressada Um. – Adelina comenta quando percebe que estou parada olhando para a TV.
Nunca conversei muito com a Cêpan de Marina. Ela é a última das nossas Cêpans Mentoras, já que Lexa é um tipo totalmente bizarra de pessoa em Lorien que não se encaixava em nada na nossa sociedade utópica. É meio desconcertante falar com Adelina por causa disso, falar com ela é lembrar-me de Hilde. Minha Cêpan que foi morta quando os mogs me acharam pela primeira vez.
- Mais ou menos, não estou num bom dia. – comento meio sem paciência. – Estou precisando abstrair um pouco.
Olhos de Adelina se iluminam um pouco como se tivesse acabado de ter uma ideia. Sinto que não vou gostar nada dessa sugestão.
- Pode me ajudar com a limpeza da casa, vocês fazem uma verdadeira bagunça aqui, ou se quiser ajudar na cozinha com Marina e Oito. Tenho certeza que eles iriam adorar uma mãozinha para fazer o almoço.
Ótimo. Serviços domésticos. Não que eu não tenha feito isso antes quando estava em fuga com Hilde ou quando fiquei escondida no bunker, só que não me agrada muito ficar nessa coisa de empregadinha dos outros. Tudo bem que deveríamos dividir as tarefas alguma hora. Acho que em determinado momento não conseguirei mais me esconder disso. Só que por enquanto não estou disposta a isso.
- Acho que vou passar dessa vez. – digo sorrindo de maneira educada.
- Bom faça como quiser. – ela fala dando de ombros. – Procure dar uma ida na Sala de Aula, aposto que você irá se divertir lá. Lembro que você era meio calma na época da viagem para cá, acho que algumas pessoas mudam. Nove e Seis não, aqueles dois sempre gostaram de uma confusão.
Acho engraçado em pensar que eu me tornei uma pessoa revoltada depois de velha. Até que faz um sentido meio triste; sou a mais velha da Garde. Me lembro perfeitamente de tudo que aconteceu naquele dia horrível. Pode-se dizer então que quando entrei na adolescência eu comecei a agir como uma criança traumatizada.
Mesmo assim a ideia de ir treinar me agrada um pouco. Sem dúvidas socar alguma coisa vai aliviar muito bem toda essa tensão que estou por causa da minha vontade de socar a cara de Adam.
- Okay Adel, vou para a Sala de Aula treinar.
- A... – a posso ver que a Cêpan tinha esperanças que eu iria acabar mudando de ideia e lhe ajudando a varrer a casa. – Tudo bem, acredito que Nove e Dois estejam lá. Só espero que estejam treinando mesmo.
Só de imaginar Nove e Maggie fazendo alguma coisa na Sala de Aula fez ter vontade de desistir. Só que sendo Maggie essa probabilidade é bastante baixa de ser verdade, no máximo uns beijinhos. Isso eu não irei julgar ninguém.
::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
Acerto um golpe de direita na segunda costela do boneco e desvio para o lado como se ele fosse revidar, revido o golpe fictício com um chute elevado na altura da cabeça do mog de plástico e em seguida me jogo para o lado dando uma sequência de socos no peito e externo dele. Termino a minha sequência de golpes com um cruzado no queixo do mog, a cabeça dele chega a vira completamente para trás e o plástico se expande se dilatando com a potência do meu golpe fazendo a cabeça fica pendente para o lado como se eu tivesse arrancado o pescoço do mogadoriano do lugar do seu corpo.
Quase me sinto mal por isso. Quase. Vou caminhar para o canto onde Nove me mostrou que haviam os mogadorianos para treinarmos golpes quando percebo que destruí todos eles para extravasar minha raiva. Dou um sorriso constrangido, não me sinto tão mal quanto deveria por destruir os brinquedos de Nove. Tenho certeza que com toda essa grana e luxo ele e Sandor podem arrumar quantos quiserem dessas coisas.
Só que depois de destroçar vários mogs de plástico, ao invés da raiva que eu sinto de Adam passar, o que eu começo a sentir e outra coisa. Eu acho que ele realmente tem razão. Estou muito distante de toda a Garde. Supostamente eu deveria ser a primeira deles a guardiã que protege a todos, mas ao invés disso, eu sou a mais distante e esquisita de todos. Fui treinada por um mogadoriano e namoro um mogadoriano, basicamente todas as missões que tivemos até agora ou eu fiquei de fora, ou então estava numa missão com Adam. Então nem conheço todos da Garde. Marina, Ella, Oito e Três são completos estranhos pra mim por exemplo.
Chuto o meu oponente derrotado no chão e resmungo. É impressionante que mesmo quando Adam é meu oponente imaginário ele consegue me deixar irritada com sua chatice do que eu sempre tenho que fazer e sempre estar certo no final.
Saio da sala de aula e vou tomar um banho para relaxar no meu quarto. Adam já não estava mais lá quando eu voltei, provavelmente já levou suas coisas para a sala de estar e está se preparando para sua saída com Henry na viagem da alegria em rumo ao rancho de Lexa. A ducha que tomo é rápida, pois tenho que pensar em alguma coisa para falar com os outros, não pensei em nada muito legal para ser promovida da noite pro dia na relações públicas da Garde.
Quando saio do banho me arrumo com qualquer roupa que acho no armário e vou direto para a sala de jantar. Não queria admitir, mas estou faminta. Minha raiva me fez esquecer de algo vital para mim, só que agora ela veio dobrada. E tenho que ir às pressas porque com q quantidade de bocas que há nesse apartamento, provavelmente se eu não for, irei ficar com fome tendo que comer sobras.
Encontro um grupo de Gardes ainda comendo o almoço. Ella – pelo menos eu acho que seja a garota, já que de relente ela parece ter 16 anos. Nunca fui vê-la enquanto estava desmaiada, agora me sinto mal, ela está idêntica a menina que morreu é assustador, Marina e Oito estão sentados comendo a gororoba vegetariana. Bifes de tofu com outras coisas, só o cheio me deixou com náuseas. Encontro também John e Seis do outro lado da mesa comendo o que parece ser lasanha congelada (algo que é mais comestível, embora provavelmente mais nocivo).
- Ei você é a Um não é? – Oito pergunta abrindo um sorriso largo no rosto. Já percebi que ele é do tipo brincalhão e risonho. Desde que não tente aprontar comigo, vou gostar dele. – O pessoal adora falar de você.
- A valeu, você nos deu um trabalhão para te achar. – digo rindo. Mas é a verdade, Oito nos deu um puta trabalho pra chegarmos até ele.
Oito apenas ri como se fosse uma grande piada depois troca olhares com Marina. John e Seis se entreolham também e em seguida e eu troco olhares com Ella. Essa deve ser a mesa das pessoas que só fazem cagada pela causa lórica.
- Se quiser provar, está uma delícia o tofu. – Marina fala levantando o prato. – Oito não come carne, então nós estamos testando a culinária vegetariana daqui.
- Não valeu... – murmuro sorrindo.
De alguma forma eu sinto Ella na minha mente reparado todo o meu nojo pela comida. A garota parece se conter para não rir, é então que tenho uma ideia. Essa garota sabe falar com as pessoas por telecinese. Só pode ser isso.
Ella, você pode me escutar? Pergunto mentalmente olhando diretamente para a menina. Como se fosse para responder a minha pergunta ela bate com mais força seu garfo no prato.
- Tudo bem Ella? – John pergunta rápido de maneira preocupada. Depois que ela entrou em coma por quatro dias todos na casa ficaram zelosos com a garota.
- Sim... – Ella fala dando um sorriso fraco para John e se voltando em em seguida para todos na mesa, parando em minha direção. – Foi só uma tontura.
Marina a encara como se soubesse que a garota está mentindo. E todos ficam parados por mais um minuto até que finalmente voltamos a comer. Por um momento acho que foi só minha imaginação e que ela não tem o poder de ler mentes quando finalmente ouço. Desculpa Um, ainda não me acostumei com esse poder.
Tenho que me controlar para não sorrir. Com esse Legado vamos poder fazer um plano perfeito para reunir a Garde e nos integrarmos sem nenhum Cêpan chato para nos perturbar. Minha cara Ella, temos que conversar sobre uma coisa, primeiro me diga. Você conseguiria falar com todos os membros da Garde ao mesmo tempo?
Ella começa a olhar de um lado para o outro como se estivesse assistindo uma partida de tênis rápida. Sinto vontade de chutar a canela dela para que aprenda a ser menos óbvia. Acho que consigo falar com todos eles, se não for ao mesmo tempo eu posso falar com cada de cada vez, mas o resultado seria o mesmo. Por que?
Não esboce nenhuma reação. Já a aviso antes que dê na cara de novo o que estamos tramando. Tenho um plano para conseguirmos fazer toda a Garde ficar junta sem essa chatice de treinamento.
Sério? E qual é? Ouço a empolgação de Ella em minha mente.
Começo a explicar a garota todo o meu plano enquanto continuamos a terminamos a nossa comida. Posso ver que Ella se segura para não esboçar nenhuma emoção. Estamos tão concentradas no nosso plano que ignoramos as piadas de Oito que só Marina e John conseguem rir, Seis parece só revirar os olhos e ficar com uma expressão tensa de vez em quando ao achar que ninguém a esta olhando.
Mais tarde no mesmo dia eu encontro Adam saindo da oficina de Sandor com sua mala parecendo bem mais pesada. Quando nos encaramos ele parece estar pronto para brigar de novo, mas só invés disso, eu sorrio para ele.
- Já está de saída mog-boy? – pergunto de maneira ferina me jogando em seus braços.
Adam me segura meio incerto e abre um sorriso meio nervoso como se já soubesse que vou fazer alguma coisa muito louca e insana.
- Vou meu bem, estava pegando algumas coisas na Oficina que Henry havia me pedido.
Posso sentir o canhão mogadoriano que ele sempre carrega escondido na sua jaqueta. Isso me deixa nervosa, não gosto de imaginar Adam sendo um traidor do seu povo andando por ai com um canozinho reluzente e um Cêpan de meia-idade do Quatro enquanto eu estou aqui organizando eventos de integração da Garde.
- Se divirta na sua festa com os Cêpans no rancho. – digo brincando com ele.
- Por que acho que você vai aprontar alguma coisa se está me falando isso? – Adam fala arqueando a sobrancelha.
- Eu? – pergunto fazendo voz de inocente e dou um beijo em Adam. – Claro que não, só vou seguir sua ideia e tentar fazer alguma coisa para integrar toda a Garde.
Adam parece engolir a seco quando me ouve falar isso. Acho que ele já deve ter se repreendido umas quinze vezes pela conversa que tivemos mais cedo.
- Só tente não fazer um desastre nacional. – ele suplica. – Por que tenho a ligeira a impressão que isso vai dar muito errado.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.