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História A Little Bit In Love With You (Ryujin - ITZY) - Hurts Like Heaven


Escrita por: Michs_

Notas do Autor


Boa leitura aaaaa

Capítulo 9 - Hurts Like Heaven


Fanfic / Fanfiction A Little Bit In Love With You (Ryujin - ITZY) - Hurts Like Heaven

  






 

—Acho melhor você ir embora antes que eu jogue toda essa comida na sua cara.


 

  Foi isso o que eu me imaginei dizendo, mas não, infelizmente eu não disse.  

 

  A vontade de realmente pegar aquela comida toda e jogar em Sunhi era muito forte, mas tive plena certeza de que isso me traria mais consequências do que benefícios, então tive de trabalhar muito a minha cabeça para não agir precipitadamente.

  Por mais que parecesse quase impossível, consegui (em um único segundo) me convencer a manter a calma, pois sabia que, quando eles fossem embora, eu poderia ficar a sós novamente com Alex, e essa me parecia uma recompensa boa o bastante para suportar aquela situação.

  Na realidade, essa era única motivação que eu tinha. Pouco me importava ser rude com Sunhi e Namoo, e eu o faria sem problema algum em outra ocasião onde Alex não estivesse envolvida. Eu não era idiota, tive a capacidade de perceber que poderia colocar minha noite em risco caso magoasse os amigos dela, e como o calor no meu ventre falava mais alto, decidi ceder.

 

  Mas é claro que... essa não seria uma tarefa fácil.


 

  Respirei fundo mais UMA vez e abri um sorriso tão falso quanto o dela, se é que era possível.


 

  —Que gesto lindo o seu. - Ironizei num tom explicitamente passivo agressivo.

  —Nah, nós compramos comida mais do que suficiente, vamos todos comer bem! - Namoo me fez um sinal de positivo com a mão, e sorriu tão abertamente que pude ver todos os dentes de sua boca. 

  Alex passou por trás dele e levantou as sobrancelhas para mim, parecendo ter estranhado seu ato tanto quanto eu, mas ao mesmo tempo achou graça. 

  —O que vocês trouxeram? - Ela perguntou após ter deixado os copos e os talheres na mesa, se dirigindo até a pia. 

  Quando a vi lavando as mãos, a segui para copiar seu ato e mostrar para Sunhi que ao menos eu não era uma porca e me higienizava antes de cada refeição.  

—Tteokbokki e alguns acompanhamentos. 

  —Hm, você gosta de tteokbokki, não é? - Alex se virou para mim com uma expressão fofa quando me coloquei ao seu lado. 

  —Gosto. - Assenti com um sorrisinho. 

  Parecia idiota, mas fiquei feliz por saber que ela se lembrava desse fato sobre mim. 

  —Menos mal, hm? - Comentou baixinho enquanto se secava, e então me beijou brevemente na bochecha. 

  Suspirei e comecei a lavar minhas mãos, não conseguindo deixar de sorrir por aquele simples ato. 

  Alex já não estava mais perto de mim, conseguia a ouvir conversando animadamente com Namoo mais a fundo, mas nem por isso deixei de sorrir. Minha bochecha começou a formigar no local em que ela tinha beijado, e eu quis que ela fizesse pelo menos mais cem vezes para saciar meu desejo por mais. 

  Ela era tão… sei lá. 

 

  —Vai demorar muito? 

  Todo o meu sorriso foi pelo ralo junto com a água quando ouvi aquela voz atrás de mim. Me esforcei muito para não revirar os olhos, e depois de demorar mais alguns segundos de propósito, sequei minhas mãos e me virei para Sunhi. 

  —Pronto. - Respondi de mau grado e passei por ela fazendo pouco caso. 

  Oras, ela queria enganar a quem? Certeza que nunca lava as mãos antes de comer… Isso é coisa de gente educada, e ela está longe de ser, se quer saber. 

  Alex e Namoo já estavam sentados, então andei até a mesa e me sentei na cadeira ao lado dela, fingindo estar tão contente quanto. 

  —Toma. - Namoo me ofereceu uma dose de Soju. 

  —Não… - Alex foi mais rápida que eu e pegou o copo primeiro. - Acho melhor não. 

  —Por que? - Questionei de imediato, afinal, um pouco de Soju seria muito bom para me ajudar a aguentar as horas que estavam por vir. 

  —Você se lembra do que aconteceu da última vez que bebeu, não é? - Me encarou com um sorrisinho sugestivo. 

  —E acha justo me proibir e eu ter que assistir vocês? 

  —Eu não estou te proibindo. Você pode, se quiser, mas não acho uma boa ideia… - Devolveu o copo para Namoo e pegou uma das latas de refrigerante. - E eu não vou beber Soju. 

  —Hum… - Sorri rendida de novo ao ver ela dividir o refrigerante dela comigo, mesmo que tivessem outros ali. 

  Era normal eu me importar com cada pequena coisa que ela estava fazendo? Não sei, talvez estivesse precisando de uma camisa de força...

  —Aposto que foi ela quem deu mais trabalho naquela noite. - Sunhi se sentou ao lado de Namoo, ficando de frente para mim. 

  —Hm, um pouco… - Me entregou um par de hashis e começou a se servir. - Mas eu gostei de cuidar da Ryujin, foi divertido. 

  —Ela é do tipo que se solta? - Namoo sorriu de boca cheia. 

  —Uhum… - Murmurou enquanto mastigava. 

  —Então ela deve ficar um pouco mais simpática embriagada. - Sunhi comentou como quem não queria nada, mas eu sei muito bem o que ela quis dizer. 

  —É, tem gente que nem com a ajuda da bebida consegue…  - Rebati no mesmo tom que ela, e para não precisar falar pelos próximos dez segundos, enchi minha boca de tteokbokki. 

  —Tipo a Sunhi. - Namoo apontou para ela com o polegar e dessa vez cobriu a boca para falar. Nunca fiquei tão feliz por ver ele dizendo algo. - Ela fica tão chata… 

  Alex soltou uma risadinha e concordou com a cabeça. Como os dois estavam rindo, me permiti soltar algumas risadinhas fracas apenas para a provocar. 

  —Cala a boca, Namoo. - Sunhi o ameaçou entredentes, parecendo extremamente irritada. 

  —Okay, não está mais aqui quem falou… - Levantou uma mão e voltou a comer sem dar muita bola. - Mas então, Ryujin… - Me olhou com curiosidade. - Como foi a viagem? 

  Tratei de terminar de mastigar, e depois de beber um pouco do meu refrigerante intercalei meus olhares entre ele e Alex, que também parecia interessada. Não fiz questão de olhar para Sunhi, para mim não fazia diferença ela ligar ou não. Na verdade, até desejei que ela não ligasse, pois assim seria obrigada a me ouvir falar.

  —Foi… bom. - Fiz uma leve careta enquanto pesava os prós e os contras. - Não tivemos liberdade para fazer o que queríamos, e trabalhamos sem parar na maioria dos dias, mas pudemos passear por alguns lugares legais e fizemos várias compras. - Dei de ombros com um sorrisinho. 

  Foi uma boa experiência, mas na circunstância atual eu não sentiria saudades daquele país tão cedo.

  Mas, obviamente, eles não precisavam saber que eu quase colapsei por causa de um certo alguém que estava ao meu lado.

  —É, já é algo… pensei que Minji não deixaria vocês saírem do hotel, de tão preocupada que ela estava. - Namoo imitou uma das expressões que Minji costumava fazer quando se sentia receosa. 

  —Nós meio que tínhamos o dever de sair, deve ser por isso. 

  —Por que dever? - Alex me olhou de canto enquanto bebia. 

  —Tínhamos que gravar uma espécie de MV para Nobody like you, e precisávamos de lugares bonitos. 

  —Hum, aquela música que a Alex se recusa a ouvir porque é você quem vai mostrar? - Sunhi arqueou uma sobrancelha para nós duas. 

  —Hummmmmm. - Namoo nos direcionou um olhar mais do que insinuante. - Uma declaração de amor da Ryujin? Que romântico.

  —Não… - Neguei com a cabeça e comecei a brincar com os hashis em meio à comida, nem ao menos percebendo que estava sorrindo feito uma boba pela fala dele. Pedi aos céus para que ao menos eu não estivesse corada. - É só... uma música.

  —Seria cômico se a Alex odiasse a música depois desse suspense todo. - Sunhi, mais uma vez, abriu a boca para vomitar suas bobagens. 

  —Eu vou amar, certeza… - Alex pousou a mão acima da minha perna esquerda e acariciou minha coxa com afeto. 

  —Ela vai amar. - Repeti para Sunhi caso ela não tenha ouvido direito, e ainda a encarando, voltei a comer com um pouco mais de arrogância.  

  —É, como você mesma disse, é só uma música… - Deu de ombros como se enganasse alguém com aquela fingida despreocupação. Que atriz de quinta… - Oh… - De repente mudou sua expressão e olhou para debaixo da mesa. - Que susto!  

  Por pura curiosidade, também olhei para nossos pés, e ali encontrei uma pequena bola de pêlos brancos. 

  —Luca! - Sorri e logo o chamei com os dedos, largando meus hashis na mesa para poder o pegar. - Você apareceu… - O trouxe para meu colo assim que ele se esfregou na minha perna. 

  —Você não me viu o dia todo e vai direto para o colo dela? - Alex reclamou também sorrindo e fez carinho nele por alguns momentos. 

  —Eu disse que ele se apegou. - A provoquei e passei a acariciá-lo com apenas uma mão, usando a outra para voltar a comer. 

  —É claro, você mal dá atenção pra ele… - Sunhi a acusou. 

  —É claro que não! - Se defendeu com uma entonação bem humorada, ao mesmo tempo que deveras ofendida.

  —Só usa ele para ganhar likes nas fotos. - Adotou um tom provocativo e um sorrisinho ridiculamente atrevido.

  Oras, desde quando ela se via no direito de implicar com Alex assim? Parecia horrível na voz dela.

  —Isso não é verdade… - Usou o hashi para brincar com a comida como uma criança insatisfeita, olhando de canto para Luca como se estivesse se questionando se era verdade. Sério que ela tinha se deixado levar pelas besteiras de Sunhi? - Hm, por falar nisso. - Voltou ao seu estado normal, novamente esboçando seu costumeiro sorrisinho na face. - Semana passada... - Deu uma breve pausa para beber mais de seu refrigerante. - Um perfil muito esquisito começou a curtir todas as minhas fotos no Instagram, tipo, todas mesmo!

  Foi a minha vez de beber o refrigerante. 

  Levei o copo à boca numa velocidade notável, tamanha foi a minha intenção de mascarar a culpa e a vergonha que senti por saber que era responsável por aquilo. Bebi meu refrigerante lentamente enquanto esperava alguém dizer algo para que eu apenas escutasse em silêncio. 

  Céus. eu me senti terrivelmente constrangida… 

  —Esquisito como? - Namoo também sorriu, parecendo curioso. 

  —Eu não sei, quando fui olhar o perfil, só tinham fotos daquele desenho de hamsters.

  —Hamtaro? 

  —Isso… E depois eu descobri que esse mesmo perfil me seguia em todas as outras redes sociais. 

  —Bizarro... - Sunhi concluiu com um tom desgostoso. - Acho melhor você trocar a fechadura da sua porta, apenas por garantia. - Soltou uma risadinha debochada. 

  Okay, talvez isso tenha me deixado um pouquinho insultada… 

  —Ah, qual é... - Dei de ombros como se não fosse importante. - Não é como se tivesse um psicopata por trás desse perfil. 

  —Você acha? - Alex me encarou com o mesmo sorrisinho. 

  —Sim… - Fiz um bico e passeei com a ponta dos dedos pela superfície da mesa, inconscientemente fazendo charme como se quisesse justificar uma atitude duvidosa. - Provavelmente é apenas um admirador secreto ou algo do tipo… Você deveria se sentir lisonjeada. 

  —Jeito esquisito de admirar… - Sunhi levantou as sobrancelhas e voltou a comer. 

  —Não é esquisito. - Rebati. - Quem sabe a pessoa só é muito tímida… 

  —Tem noção de que está defendendo uma pessoa que provavelmente quer beijar a mesma boca que você…? - Namoo me encarou de modo sugestivo. 

  Fiquei sem ter o que dizer por alguns momentos, e acabei de me sentindo levemente pressionada pela atenção que todos os três me deram conforme esperavam minha resposta, especialmente Alex. 

  —Bom… - Não consegui esconder meu divertido sentimento de contradição, então deixei que um sorrisinho crescesse aos poucos. - Eu não acho que seja uma grande ameaça pra mim. 

  —Não tem medo da concorrência…? - Alex usou de um tom tão sugestivo quanto o de Namoo, me olhando de cima abaixo com olhos interessados e instigantes. 

  —Nem um pouco… - Copiei seu ato e mordi o lábio inferior discretamente, flertando com ela na cara dura sem me importar com os outros dois. 

  Como era bom saber da verdade… 

  Se fosse outro perfil além do meu que tivesse a stalkeado, certamente estaria me mordendo de ciúmes naquele momento, então no final das contas agradeci por ela ter tocado nesse assunto, pois assim pude reafirmar um pouco mais o meu suposto desapego. 

  —Mentirosa… - Desceu seu olhar por mim mais uma vez, parando para observar o movimento circular de meus dedos nos pêlos do Luca. 

  Naquele caso, mais do que tudo, desejei ter a capacidade de saber o que se passava em sua mente para me olhar dessa forma...

  —Se forem se atracar, me avisem antes para eu poder ir embora. - Mais uma vez fomos atrapalhadas. 

  —Você iria mesmo? - Movi o rosto para a fitar com um forte tom de esperança. 

  Não parecia ser uma má ideia… Mas Alex, como a boa estraga prazeres que era, resolveu soltar uma risadinha abafada e se virar de volta para a mesa. 

  Logo ela mudou de assunto, e eu voltei a enfiar tteokbokki goela abaixo para não precisar socializar.  

  Confesso que me dediquei a comer bem mais do que estava acostumada, pois deduzi que, quanto mais rápido a comida acabasse, mais rápido eles iriam embora.

  Quer dizer, assim eu esperei do fundo do coração que fosse...

 

  Então, com Luca em meu colo, optei por ficar em silêncio para poder digerir a comida sem que tivesse que engolir junto a ela as idiotices que Sunhi chamava de indiretas, e desse modo me dispus a somente ouvir o que os três conversavam. Pelo contrário que parecia ser, não foi uma atitude que me deixou desconfortável; escutar a voz de Alex enquanto ela dialogava sobre os mais triviais assuntos era bem melhor do que eu me lembrava, e por isso acabou sendo uma bela forma de entretenimento. 

  Vez ou outra, ela e Namoo tentavam me inserir nos assuntos por meio de perguntas, e eu achei isso bem fofo da parte deles, mesmo que Sunhi ficasse com uma cara lavada toda vez que eu abria a boca.

  E, por falar nela, tenho que dizer que me surpreendi ao ver o quão disposta ela estava para provar para todos o quão boa amiga era para Alex. Sempre arranjava uma ponte nos assuntos para jogar situações “divertidas” pela qual passaram juntas, e como se não fosse desnecessário o bastante, ainda tentava mostrar que a conhecia melhor do que qualquer um ali conforme revelava traços da personalidade dela.

  Pelo visto minhas palavras a atingiram em cheio no orgulho… 

 

  Quando a comida finalmente acabou (deixo aqui um agradecimento ao Namoo, que comeu praticamente a metade sozinho), nos ocupamos em limpar as coisas antes de mais nada. 

  Eu estava ajudando Alex com a louça enquanto Namoo e Sunhi arrumavam a mesa, e eu vi ali uma boa oportunidade para a confrontar. 

  —Quando é que eles vão embora, hein? - Colei nossos corpos de lado, secando um dos copos que ela tinha acabado de lavar. Usei um tom baixo e calmo, porque querendo ou não, a culpa não era dela.

  —Está incomodada? - Me olhou de canto e sorriu fraco.

  —Já não está mais do que óbvio?

  —Não… você parece tão feliz com a visita deles. - Ironizou.

  —Engraçadinha… - A olhei feio. - Estou falando sério. 

  —Hm… E o que você quer que eu faça? 

  —Que mande eles embora! - Sussurrei com ênfase.

  —Eu não posso fazer isso, Ryujin. - Me olhou com franqueza. 

  —Eu sei que não… - Continuei e secar a louça com uma feição mimada. - Mas você perguntou o que eu queria, e não o que podia.

  Ela sorriu e balançou a cabeça em negativo, voltando à sua tarefa.  

  —Bom, isso não estaria acontecendo se você tivesse dito que sentiu minha falta. 

  Estreitei os olhos em desconfiança. 

  —Você teria mesmo deixado de atender a porta se eu tivesse feito isso? 

  Alex adotou uma expressão mais infantil, propositalmente demorando para me dar a resposta, e com um cinismo enorme apoiou as mãos na borda da pia para me fitar. 

  —Sim. 

  Retiro o que eu disse sobre não ser culpa dela, porque era sim, toda dela. 

  Travei o maxilar e larguei o copo de qualquer forma junto aos outros, colocando uma mão na cintura para transmitir melhor a minha indignação. 

  —Diz que está brincando com a minha cara.

  —Não estou. 

  Apertei os olhos e rangi os dentes, pedindo para alguma força superior que me desse a capacidade para não a xingar de todos os piores nomes possíveis. 

  —Você é uma cretina, Alexia… eu juro. - Fechei os dedos ao redor do pano para liberar um pouco a raiva. 

 

   —Problemas no paraíso, garotas? - Namoo se aproximou, e depois de ter colocado o resto da louça na pia, se inseriu no nosso meio e colocou os braços ao redor de nossos ombros, usando de um tom bem humorado para nos abordar. 

  —Nunca… - Alex intercalou seu olhar entre ele e eu, usando daquele sorrisinho maldito para implicar ainda mais.

  —Mesmo…? - Ele juntou as sobrancelhas, não parecendo convencido. - Você está com uma cara tão esquisita. 

  —Só estou um pouco cansada. 

  —É, ela só precisa descansar um pouco. - Me pronunciei e deixei explícito o meu sarcasmo. - Ou ficar inconsciente… por alguns instantes. - Olhei para o copo e voltei a segurá-lo, fazendo uma menção muito sutil ao que tinha dito. - Quem sabe…

  Senti Namoo me olhar como se estivesse num misto de confusão e receio. 

  —Ham, okay… - Lentamente retirou suas mãos dos nossos ombros e deu um passo para trás. - Acho que vou voltar a ajudar a Sunhi. 

  O assisti retornar até a mesa de rabo de olho, e logo voltei a encarar Alex, que parecia estar se divertindo muito com a minha suposta ameaça. 

  —O que acha de ir ver o que o Luca está aprontando no quarto? - Fez menção de tirar o copo da minha mão. 

 —Estou ótima aqui, obrigada.  - Não a deixei que fizesse isso, e depois de adotar um semblante arrogante, voltei a secar as outras coisas. Ela prosseguiu me olhando por alguns segundos, mas se rendeu ao soltar mais uma de suas risadinhas sem graça. Como ela tinha a pachorra de zombar do meu descontentamento?! - E você ainda ri… - Revirei os olhos por pura inconformidade. 

  —Quais eram as minhas opções além dessa?

  —Eu tenho uma opção bem legal para você, Alexia, você ia adorar… - Resmunguei e respirei o mais fundo que pude, escutando Namoo e Sunhi discutirem sobre algo ao fundo. Bati com a ponta do pé seguidas vezes no chão para controlar minha ansiedade e tentei ao máximo ignorar a voz daqueles dois, mas era muito difícil quando a voz de Sunhi se mostrava demasiadamente estridente e irritante. - Sério, eles ainda vão demorar para ir embora? - Me virei para ela com um contrariamente mais apreensivo e impaciente. 

 

  —O que vocês acham da gente jogar algo?! - Namoo se pronunciou com seu costumeiro  tom alto e excitado. 

 

  Alex desligou a água e me encarou com um sorrisinho de canto.

 

  —Isso responde a sua pergunta?



 

[…]



 

  Uma hora e doze minutos...

 

  Namoo e Alex estavam jogando Just Dance por UMA HORA E DOZE MINUTOS! 

 

  Exatamente, eu contei as horas e também cada minuto daquela tortura. 

  Tudo bem, talvez esse não seja o melhor termo para usar, mas tudo estava caminhando para se tornar sim, uma tortura.

  Eu não fazia ideia de como os dois malucos estavam conseguindo dançar com toda aquela disposição sem se sentirem fadigados. Alex não tinha comido tanto, mas Namoo agiu como quem não se alimenta há anos, e ele estava pulando de um lado para outro como se as leis da biologia não funcionassem em seu caso, e isso me surpreendeu muito.

  De qualquer forma, eles formavam uma bela dupla, e Alex parecia se divertir muito ao lado dele, o que me agradou o bastante e me ajudou no processo de apenas assistir, já que eu não quis jogar.

  Namoo não era um completo chato, sabe… ele só era um pouco sem noção, e isso eu conseguia perdoar. 

  E, bom, eu me diverti com a situação, pois como eles eram ótimos dançarinos, conseguiam entregar um bom show. Sunhi também estava jogando, mas eu me recusava a dizer que seus movimentos desengonçados poderiam ser considerados dança, porque isso seria uma verdadeira ofensa aos dançarinos em geral. Então preferi apenas fingir que ela não estava ali e concentrei todas as minhas energias em Alex, que, como sempre, me proporcionava uma bela visão de costas... 

  Foi bem interessante no começo, confesso, mas os minutos começaram a parecer horas depois que passei a desejar aquele corpo mais do que deveria, e não poder fazer algo a respeito me deixou milhões de vezes mais frustrada. 

  Afinal, aqueles outros dois não tinham nada melhor para fazer?! Eram namorados, deveriam estar aproveitando o tempo que tinham para fazer filhos ou coisa do tipo, e não sendo inconvenientes desse jeito! Entendo o lado do Namoo, porque deve ser um saco ficar a sós com Sunhi sem ter um tipo de escapismo, mas simplesmente não era problema meu! Eu tinha uma companhia mais do que perfeita, e eles não tinham o direito de a roubar de mim logo na noite em que voltei de viagem!

  Cada segundo perdido era uma lamentação para mim, e ver que a noite parecia estar só no começo para eles estava me dando nos nervos. E obviamente isso foi transparecido em minha feição, que nesse caso eu nem ao menos fiz questão de tentar esconder.

 

  E então ali estava eu, praticamente jogada no sofá com grande desleixo e um notável ar de desânimo. Luca novamente procurou aconchego em meu colo, já que sua dona estava mais ocupada com as visitas, e graças a ele consegui ter ao menos um pouco de alegria. 


 

  —Okay, desisto. - Sunhi ergueu as mãos no ar em rendição. 

  Até que enfim percebeu o próprio fiasco… 

  —Ótimo, vou poder jogar sério agora! - Namoo puxou para cima o moletom que estava usando, o jogando de qualquer modo acima da mesa de centro para ficar apenas com sua camiseta. 

  Sorri. 

  Passei a adorar a forma Namoo fazia pouco de Sunhi sem nem ao menos se dar conta… 

  —Você sempre perde, não sei porque ainda tenta. - Alex o provocou com um sorrisinho. 

  —Você joga sujo, é diferente… 

  Abri mais o sorriso quando Alex me olhou com cumplicidade, implicitamente zombando da justificativa barata dele. 

  —E tem como trapacear no Just Dance…? - Voltou a se virar para a TV. 

 

  Agora que estavam só os dois ali, a tarefa de os assistir se tornava milhões de vezes mais fácil, mas a atenção que eu estava dando para a conversa deles foi roubada num piscar de olhos. 

  Sunhi, que até então ainda estava de pé, passou a andar na minha direção em passos preguiçosos e sua característica feição antipática no rosto. 

  Meu sorriso aos poucos foi se desfazendo, e eu me perguntei por que diabos ela estava vindo até mim. 

 

  Quando ela se sentou ao meu lado, não consegui não a olhar na maior cara de pau. 

  A encarei como se estivesse terrivelmente ofendida, e de certo modo eu estava mesmo. 

  Aquele não era o único sofá, tinha outro vazio bem ao lado. Que droga ela estava fazendo ao se sentar tão perto de mim?! E não o bastante, ela também não se sentou no outro canto como de esperado, e sim, literalmente colada a mim. 

  Qual era o problema dela?! 

 

  De imediato esbocei uma leve careta e me remexi desconfortável, não esperando nada para me arrastar pelo estofado e me espremer no canto para que não nos tocássemos mais. Odiei a sensação física de ter contato forçado com seu corpo.

 

  Jurei estar ficando louca quando pensei ter visto Sunhi sorrir brevemente como se meu incômodo a agradasse, e por isso tive que ter muito autocontrole para não ficar mais ofendida do que já estava. 

  Voltei a passear com meus dedos nos pêlos de Luca na esperança de me distrair, mas com cinco segundos tendo se passado, concluí que isso seria impossível enquanto tivesse uma pessoa tão desagradável ao meu lado. 

  Veja bem, eu não era tão infantil quanto aparentava; poderia tranquilamente ficar ao lado de Sunhi e suportar a antipatia que eu sentia por ela, contanto que isso fosse me trazer algum benefício depois. Mas eu simplesmente não estava contando com um detalhe: a ousadia ímpar dela. 

  Sunhi, com toda a sua aparente falta de educação e civilidade, decidiu que ocuparia seu tempo ao meu lado para me examinar diretamente, sem nem um pingo de sutileza. 

  Ela, literalmente, estava com o rosto todo virado em minha direção, me encarando como se estivesse hipnotizada. 

 

  Que droga era aquela…? 

 

  Admito que passei a sentir até mesmo um pouco de medo, pois ela nem ao menos estava piscando. 

  Que coisa mais esquisita a se fazer… 

  Quer dizer, se pensando bem, vindo de alguém como ela era até que justificável. Mas isso nem de longe significava que podia fazer isso comigo.

 

  Sendo assim, já me sentindo muito impaciente por tudo o que tinha acontecido até então, não me deixei me intimidar mais com aquela indesejada atenção, e sem mais delongas retribui seu olhar. 

 

  A olhei de cima abaixo com grande soberba e arqueei as sobrancelhas. 

 

  —Perdeu alguma coisa? - Perguntei num tom baixo e desdenhoso. 

  —Muitas. - Cruzou as pernas e os braços, copiando o modo como eu estava a olhando. 

  —Dentre elas a noção, pelo jeito. 

  —Não, isso não. - Voltou a sorrir, porém com um grande aumento em seu deboche. 

  —Se isso fosse mesmo verdade, você não estaria aqui me atrapalhando. 

  —Oh, mesmo? 

  Revirei os olhos pela sua dissimulação e voltei a assistir os dois dançando. 

  —Não banque a idiota. Você sabia que eu estava indo ver a Alex quando nos encontramos, e decidiu vir aqui de propósito para nos importunar. 

  —A única que parece estar incomodada aqui, é você. 

  —A Alex também está, pode ter certeza disso. 

  —Ela parece longe de estar, se quer saber. - Também a olhou, e assim ambas a assistimos sorrir de orelha à orelha enquanto assistia Namoo se atrapalhar com o jogo. 

  Ambas estávamos falando baixo, e com a ajuda do som alto da TV, Alex não conseguiria nos ouvir. Acredito que tanto Sunhi quanto eu tínhamos em comum o desejo de a manter fora dessa intriga secreta. 

  —Humpf… - Passei a minha mão livre pelo cabelo e formei um bico mimado nos lábios. 

  Ela soltou uma risadinha nasal e respirou fundo como se estivesse satisfeita. 

  —Ninguém mandou você ser intrometida e tentar resolver um problema que não é seu. 

  —Concordo. Se tivesse deixado isso de lado, ela teria te esquecido em alguns dias e poderia encontrar uma amizade melhor que essa sua. 

  —Felizmente você perdeu a oportunidade. - Deu de ombros com um fingido bom humor. - E eu tenho que te agradecer, pois agora que você me alertou, vou fazer questão de a manter muito ocupada com a minha amizade. Mas acho que isso não vai te beneficiar muito, pois não vai sobrar muito tempo para ela dedicar a você. 

  —Para o seu saber, Sunhi, ela estando feliz já é o bastante para mim, não importa com quem esteja. - A olhei de esguia. - Mas tenho quase certeza que a minha companhia é bem mais interessante que a sua. 

  Gostou da minha frase moralista? Eu também gostei…

  Pena que era mentira. 

  Se o impossível de fato acontecesse e Alex escolhesse Sunhi à mim, a última coisa que eu poderia sentir seria satisfação. Na realidade, acho que eu me afogaria em ódio por a ver feliz com uma companhia daquelas. 

 —Acha mesmo que ela escolheria você? - Perguntou com um ácido sarcasmo. 

  —Tendo você como melhor amiga? Acho sim. 

  —Eu não contaria com isso. - Deu uma breve pausa quando o som da TV parou conforme eles esperavam o resultado da partida. - A Alex valoriza muito a nossa amizade…  

  —É, e você tem um jeito bem peculiar de retribuir, não é? - Deixei de acariciar o gato para cruzar meus braços. Pelo modo como minha raiva apenas estava crescendo, seria melhor não ter meus dedos ocupados ali, já que estava sujeita a descontar nele sem querer. - Ao invés de fazer tudo isso por ela, que é quem de fato importa aqui, você preferiu tornar isso sobre mim, já que sua única intenção é me atingir apenas porque ficou ofendida por ouvir a verdade. Bela amizade a sua… 


 

  Sunhi instantaneamente mostrou ter a resposta na ponta da língua, mas felizmente foi interrompida por Namoo e, graças aos céus, eu não precisei sofrer para ouvir suas ladainhas.


 

  —CEM PONTOS A MAIS QUE EU?! - Gritou numa grande onda de indignação ao ver que Alex tinha ganhado novamente. 

 

  Luca, que até aquele segundo estava dormindo tranquilamente em meus braços, se assustou ao ponto de ter chegado a quase pular em meu colo, tamanho foi o seu espasmo. Em seguida passou a olhar ao redor como se estivesse procurando o que tinha causado aquilo. 

  Por mais que eu tivesse tentado o acalmar, ele já não se sentiu mais seguro comigo, e assim desceu até o chão com pressa e se aproximou da dona. 

  Eu tive vontade de socar a cara do Namoo pelo escândalo que fez? Sim. Mas tudo isso sumiu da minha mente quando vi Luca tocar a perna de Alex com a pata, pedindo pela sua atenção através de um miado e um olhar digno de piedade. 

  —O que foi, Luca…? - Alex o olhou, e quase que de imediato adotou a mesma expressão penosa que ele. - O idiota do Namoo te assustou? - Se abaixou e o pegou no colo, fazendo com Namoo o que antes eu tive vontade. - Olha o que você fez! - Bateu no braço dele quando voltou a se levantar e o olhou feio. 

  Ergui um sorrisinho sincero ao assisti-la aconchegar o filhote em seu colo como se fosse um verdadeiro bebê. 

  Inferno… por que ela tinha que ser tão fofa? 

  —Hmmm, me desculpa! - Namoo se aproximou de Alex para tentar agradar Luca, que inicialmente pareceu muito arisco. - Sim, meow, meow… 

  Fiz uma leve careta quando escutei seu tom agudo numa falha tentativa de parecer menos perigoso. 

  Foi bem constrangedor, admito. Mas até aí estaria tudo bem, caso ele não resolvesse me tirar um pouco da minha zona de conforto emocional. Senti uma grande estranheza quando o vi pousar aquela mão quilométrica nas costas delicadas da Alex, de certo modo a abraçando durante seu processo de reconciliação com o gato. 

 

  —Ei…? - Me pronunciei em alto e bom tom, tentando não aparentar estar sentindo tanto ciúmes. 

  —Oh. - Namoo virou o pescoço para me olhar. - Desculpa. - Sorriu feito uma criança atrevida e se separou dela. 

  Alex então também me olhou, e logo sorriu com todos aqueles dentes perfeitos à mostra apenas para acabar com o meu juízo. 

  —Que ciúmes possessivo… - Sunhi comentou como quem não queria nada. - Isso tudo é insegurança? 

  —Cuide da sua vida. - A cortei com rispidez e, numa rápida transição de humor, ergui o canto dos lábios num sorrisinho ao ver que Alex deixou o jogo de lado para andar até nós. 

  —Estou morta… - Suspirou com preguiça e sentou entre eu e Sunhi com Luca ainda nos braços. 

  —Com dor? - Perguntei depois de ela ter feito uma careta quando acariciei seu ombro com a mão esquerda.  

  —Muita. 

  —Você está tensa… - Passei a massagear aquela região para tentar a ajudar. 

  —Sim… - Fechou os olhos e inclinou a cabeça para trás. 

  —Precisa relaxar… - Deslizei minha mão lentamente até sua nuca e continuei com meus olhos extremamente atentos às suas feições. 

  Alex estava quente; a maciez de sua pele contra a palma da mão me transmitia um tipo diferente de calor, e tive a impressão de que não era algo recente o bastante para se justificar pelo jogo. 

  —Alguma sugestão…? - Continuou de olhos fechados e usou de seu tom naturalmente tranquilo. 

  Demorei para responder. 

  Com essa pergunta, Alex me entregou um vasto espaço para explorar diferentes interpretações, e, nas condições de meu corpo, a maioria delas eram bem… excitantes. 

  Guiada por esse pensamento e pelo meu mais primitivo instinto, desci meus olhos lentamente por seu pescoço agora mais à mostra, seguindo por sua clavícula, seios e pernas. 

  Minhas íris se tornaram brilhantes e minha garganta se secou como nunca tinha feito. 

  Céus, ela era sexy… 

  Ter que lidar com seus pólos de personalidade era como viver numa relação abusiva de amor e ódio.  

  Molhei os lábios e em seguida prendi o inferior entre os dentes, tentando reprimir o perigoso retorno daquela sensação consumidora que senti no pé da minha barriga. Mas, na realidade, o esforço que me dispus a aplicar foi bem limitado pela falta de comprometimento, e por isso de nada adiantou a minha tentativa. 

  —Tenho uma… - Subi um pouco mais a minha mão e a perdi em meio ao seu cabelo.

  Num súbito e inconsciente momento de desejo interno, fechei os dedos entre suas mechas e as puxei o bastante para indicar o meu tom insinuante como complemento ao que tinha dito.

  Alex, após se mostrar surpreendida e até um pouco rendida, endireitou lentamente sua postura e me fitou com a intensidade de mil pares de olhos.  

  E, ali, eu me vi extremamente exposta. 

  Com seus olhos nos meus, senti como se meus próprios pensamentos estivessem sendo lidos por ela, e no momento em que passou a também descer por meu corpo, vi em suas íris uma pretensão quase que caprichosa, como se pudesse ver por debaixo das minhas roupas. Mas apesar de ter me sentido ligeiramente envergonhada, não me deixei intimidar por sua forma implícita de tentar me dominar, pois não era esse o papel que eu pretendia desempenhar naquela noite. 

  E uma vez isso estando claro, aproximei o meu corpo um pouco mais do dela e insisti no carinho em seu cabelo. 

  Brevemente olhando ao redor para conferir, notei que Namoo estava completamente absorto e entretido com o nosso pequeno jogo de persuasão, assim como Sunhi, que diferente dele parecia mais desconfortável do que qualquer outra coisa somente pelo toque da minha mão na nuca de Alex. 

  E por isso, sua nauseante feição enfim me serviu de algo. Absorvendo seu incômodo fora de proporções por um carinho tão simples, uma ideia tentadora e vingativa me surgiu em mente. 

  Culturalmente falando, o modo com Sunhi enxergava demonstrações de afeto me era muito conveniente ali, e eu pedi internamente para que ela tenha sido verdadeira quando soltou aquela frase na mesa. 

 

  Então, com um plano parcialmente idealizado na cabeça, voltei a fitar Alex e molhei os lábios com um único e exclusivo objetivo, e depois de ter me colocado de joelhos e de frente para ela, aproveitei da minha mão na sua nuca para chegar aonde queria.

  Sem pedir permissão, a puxei contra mim e colei nossos lábios num ato influenciado pelo mais puro egoísmo e desejo.

  Instantaneamente senti o ar se fazer necessário em meus pulmões graças ao mais agradável dos nervosismos, e por isso arfei de modo involuntário sem precisar nos separar. 

  Ela ficou surpresa. Senti isso pela tensão que exalou através de sua boca inicialmente imóvel e seu murmúrio arrastado. E por mais incrível que pareça, foi essa a exata reação que esperei dela. 

  Alex gostava de brincar com meus sentimentos; parecia ter um singular interesse em testar os meus limites, sejam eles físicos ou emocionais. E, felizmente, dessa vez eu consegui a pegar desprevenida em seu próprio jogo, pois certamente não imaginou que eu seria capaz de ultrapassar a linha abstrata que se entendia como "apenas flertar".

  Desse modo, senti uma sedutora confiança crescer dentro de mim, ao ponto que passei a ficar extremamente confortável quanto à minha exposição. E, como o poder subiu rapidamente à minha cabeça, me permiti aproveitar aquilo do modo como me desse na telha. Quando ela inclinou seu rosto para trás numa clara reação de seu inconsciente, usei minha mão livre para segurar seu pulso com toda a autoridade do mundo, a trazendo mais para perto e a impedindo de se afastar. 

  Sem a dar uma folga, deixei sua mão comodamente estacionada no meu quadril e parti para meu movimento seguinte, que se resumia ao saciar de um desejo consequente ao que tinha feito. Entreabri meus lábios e usei a palma da minha outra mão para subir lentamente pelo seu braço, causando uma série de arrepios na pele dela por onde passei. 

  E uma vez completamente dependente de sua permissão para prosseguir, sorri fraco ao perceber que minha presença era mais do que bem vinda.  

  Quando ela me deu espaço, minha língua expressamente se entrelaçou à dela, deixando claro a urgência de um acentuado apetite sexual que dificilmente seria contido por menos, e felizmente fui retribuída com a mesma, se não mais, intensidade. 

  Dividimos ali um beijo molhado, insinuante e esperadamente quente. 

  Mas antes de me permitir desfrutar integralmente de seus encantos, optei por dar continuidade ao meu plano, pois afinal de contas, não estávamos só eu e ela ali.

  Então, com um evidente tom de menosprezo, abri meu olhos ainda em meio ao beijo e prendi minha total atenção em Sunhi, que já estava me olhando com sua recém adquirida feição de assombro. 

  Fiz questão de mostrar o quão prazeroso isso era para mim, tanto beijar Alex quanto esfregar isso na cara dela, e o demonstrei da melhor forma possível por meio da minha expressão dividida entre implicância e excitação. 

  Descrever em palavras a satisfação que senti seria uma tarefa um tanto quanto complicada, mas posso dizer que consegui minha aguardada vingança pelas inúmeras frustrações que Sunhi me causou naquela noite. 

  Cheguei a me perguntar se ela já tinha visto em sua vida duas garotas se beijando, pois a forma intranquila como estava me olhando era bem exagerada, mesmo que eu estivesse a afrontando com meus olhos. E foi exatamente por essa razão que estimulei ainda mais o beijo; queria a ver chegar no ápice de seu incômodo, para que então fizesse a minha vontade sem eu precisar fazer mais esforço.

  Só faltava uma única coisa para que meu deleite se tornasse contínuo, e isso já estava mais do que encaminhado também, tendo em vista todo o contexto à nossa volta.

  —Nossa… - Ouvi Namoo comentar num fio de voz mais ao lado, porém não precisei o olhar para saber que sua expressão era excessivamente abobalhada. 

  E na mais favorável perspectiva, a simples reação dele se mostrou ser o perfeito gatilho para que Sunhi finalmente se desse conta do que estava acontecendo ali. 

  Intercalando seu olhar entre mim e o namorado, ela se levantou num impulso e demonstrou grande aborrecimento com todos nós. 

  —Vamos embora, Namoo. - Se pronunciou com pouca emoção na voz, pegando seus pertences que tinha deixado acima do outro sofá. 

  Alex, que até ali estava seguindo o ritmo que eu impus, fez menção de nos separar assim que ouviu a amiga anunciar sua ida; mas eu não deixei. Com a mão que usei para acariciar seu braço, pousei os dedos na região de seu maxilar e delicadamente a mantive com o rosto virado exclusivamente para mim. E para tornar as coisas um pouco mais tentadoras para ela, afastei nossos lábios milimetricamente apenas para que pudéssemos nos olhar, e quando nossas íris se conectaram novamente, soltei o ar calmamente pela boca.

  Com meus olhos intencionalmente significativos e transbordados em anseio, revelei qual era a minha pretensão sem precisar traduzir em palavras, roçando meus lábios nos dela novamente conforme escutava Sunhi apressar Namoo em segundo plano. 

  —Não, vamos ficar… - Ele rebateu ainda em sua entonação insegura e alienada. 

  —Nós vamos embora, Namoo… agora! - O chamou entre dentes e num tom a mais de ameaça, se aproximando da porta. 

  —Que saco… - Resmungou como uma criança mimada quando não ganha o que quer.

  Ainda olhando Alex, arqueei uma sobrancelha em divertimento ao sentir os passos pesados dos dois pela sala, e à medida que escutei o som da porta se abrindo, passeei sutilmente com minha língua por seus lábios, molhando sua boca num íntimo ato de carinho que antecipava o principal.    

  —Nos falamos depois, Alex. - Foi tudo o que Sunhi disse antes que ouvíssemos novamente o barulho da porta, dessa vez para a fechar. 

  Com dois ou três segundos em completo silêncio, deixei crescer um sorrisinho em meu rosto num pleno sentimento de agrado. 

  —Você é impossível, Ryujin… - Passeou com sua mão pelo meu quadril depois de adotar o mesmo sorrisinho que eu.

  Luca, que pareceu ter ganhado resguardo com a saída de Namoo, pulou do colo dela numa bela conveniência e andou em direção ao quarto. 

  —Não me venha com essa, sei que está mais do que feliz por ver eles irem embora… 

  —Você acha…? 

  Com um ar saudável de provocação, ela usou ambas as mãos para me puxar de encontro ao seu corpo, e de imediato entendi o que ela quis de mim. 

  Invertendo as posições de quando nos beijamos pela primeira vez, passei com minhas pernas por cima do colo dela e as coloquei de cada lado do seu corpo, me sentando ali numa posição propositalmente impura. 

  —Tenho certeza… - Encostei a ponta do meu nariz no dela no único ato verdadeiramente fofo naquela circunstância. - E agora posso matar o que estava me matando. 

  Ela pareceu ter gostado, tanto que apertou seus braços ao meu redor e me trouxe perigosamente mais para perto, de modo que todas as regiões mais erógenas de meu corpo tocassem as suas.

  —Saudades, você diz? - Mordiscou meu lábio inferior e soltou uma risadinha fraca ao me ver revirar os olhos. 

  —Lá vem você com esse papo… 

  —Vamos, Ryujin… - Mordeu o próprio lábio dessa vez, descendo suas mãos devagar pelas minhas costas. 

 

  Engoli em seco os estímulos de meu corpo em relação ao toque e à minha visão. 

  As mãos de Alex só pararam quando seus dedos desceram a linha do meu quadril, mas não chegou a tocar devidamente naquela região. E eu tive uma breve crise de descontentamento, pois aquele meio termo acabou me deixando extremamente aflita. Não sabia como me sentir; deveria permitir me sentir excitada ou apenas considerar como um toque sem segundas intenções? 

  Se fosse mesmo somente um ato trivial, desejei que parasse com aquilo imediatamente para não me fazer sentir algo inapropriado. Mas, se não fosse, implorei internamente para que ela descesse os dedos de uma vez e fizesse o que bem entendesse comigo, para que assim aquele suspense acabasse logo. Pois afinal, num contexto tão caloroso quanto aquele, seus movimentos mornos me serviam apenas como ofensa.

 

  E, claro, se junto ao seu toque ela teve a intenção de me chantagear para admitir que tinha sentido saudade, tenho que dizer que funcionou muito mais do que bem. 

  Estive prestes a dar o braço a torcer quando, sem mais nem menos, Namoo abriu a porta e adentrou a sala como se estivesse apressado. 

 

  —Meninas, eu… - Parou de andar, de falar, e também de agir como um ser humano ao nos ver naquela posição. 

  —Precisando de algo, Namoo? - Alex perguntou num tom divertido, não deixando de manter a intimidade entre nós apenas porque ele apareceu. 

  —Eu… - Pigarreou e coçou a nunca num evidente estado de nervosismo. - Eu esqueci o meu moletom. - Voltou a andar e se aproximou da mesa de centro. - Aqui… - Nos mostrou a roupa com ênfase como se quisesse justificar o seu retorno, e em seguida soltou uma risadinha sem graça. 

  Assim como Alex, esbocei um sorrisinho de canto nos lábios, achando certa graça no modo como ele estava apertando o moletom nos dedos para reprimir o desejo e a inveja (que eu sabia) que estava sentindo de nós. 

  Meu eu revolucionário certamente me faria ficar irritada pela sua falta de senso ao pensar que podia nos invadir com seus olhos cheios de uma luxúria barata, mas apenas não fiquei, porque, bom… era o Namoo. Seu modo de agir por si só já mostrava o quão patético era, e inclusive ele próprio parecia também muito conformado com a ideia de que não passaria de apenas olhares. Sendo assim, eu não dei a mínima. 

 

  Continuei sorrindo e o olhei mais diretamente, ao mesmo tempo explorando o corpo de Alex com as minhas mãos ao massagear seus ombros e descer até a região de sua clavícula.

  —E precisa de mais alguma coisa? - Perguntei num fingido tom convidativo. 

 

  Namoo abriu e fechou a boca várias vezes, e em nenhuma delas conseguiu nos entregar uma resposta. 

  Logo outra pessoa fez isso por ele. 

  Para a total quebra de clima, escutamos um estridente e ecoado grito de Sunhi, que provavelmente já estava longe do apartamento. Ela o chamou apenas pelo nome, e foi o suficiente para que ele fizesse uma ligeira careta. 

 

  Alex e eu nos entreolhamos brevemente com um notável sentimento de cumplicidade. 

 

  —Ai… - Namoo suspirou como se algo lastimável tivesse acontecido. Abraçou o próprio moletom e arqueou as sobrancelhas num olhar pidão. - Por que vocês não são mente aberta, hein?

  Sua pergunta foi retórica e reclamona, e depois de tê-la soltado, se virou contragosto e pisou forte no seu caminho de volta para a porta. 

 

  Prossegui olhando para aquela direção mesmo que não já tivesse mais nada para se ver, e também deixei que meu sorrisinho continuasse em minha boca enquanto eu ainda sentisse vontade de o fazer. 

  Entendi muito bem o que Namoo quis dizer com aquela pergunta, e eu gostei de ele ter tirado essa conclusão sozinho apenas por nos observar. 

  Eu era, sim, uma pessoa com a mente aberta. Costumava nunca ter certeza sobre minhas opiniões e crenças em geral, pois sabia que poderia mudar a qualquer momento. Entretanto, existia um único conceito em que eu não deixava margens para contestações, e fazia questão de reafirmar minha certeza no mais tradicional dos costumes.

  Eu não dividiria a Alex; de jeito nenhum.

  Fosse com Namoo ou qualquer outra pessoa que ousasse nos fazer uma proposta daquelas. Eu não aceitaria em nenhuma ocasião, em nenhum contexto e em nenhuma chantagem. 

  E definitivamente também não estava aberta ao diálogo. 

  

  Felizmente, ela parecia pensar da mesma forma que eu. 

 

  —Ei… 

  Competindo consigo mesma pela minha atenção, Alex apertou seus dedos contra minha pele para que eu voltasse a olhá-la. 

  —Hm…?

 

  Ela sorriu injustamente e demorou alguns momentos para voltar a falar. 


 

  —Você precisa dizer o que sente por mim… 


 

  

 

[...] 




 

  Três dias depois: 



 

  Eu estava brava com a Alex, para variar.

 


 

  Na noite em que estive em seu apartamento, nada de tão especial aconteceu. Obviamente que, com esse "nada de tão especial", me refiro à… sexo. 

  Não foi nada que ela fez, muito menos o que eu fiz. Apenas não aconteceu. E isso estava longe de parecer algo negativo para mim, claro. 

  Ficamos juntas um bom tempo. Yeji me ligou por volta das duas da manhã para dizer que Minji me queria no apartamento para que todas pudéssemos descansar, e eu obedeci sem questionar. 

  Nesse meio tempo que pude ficar a sós com ela, posso dizer que consegui acabar com uma boa parcela da minha saudade. Foram inúmeros beijos trocados, desde os mais inocentes até os mais aflorados; tantos que os lábios de Alex chegaram a ficar levemente inchados, e para o azar dela, isso só me fez querer a beijar ainda mais. Entre carícias estimulantes e mãos bobas, também posso dizer que nossa noite não deixou nada a desejar… ou melhor, deixou muito a desejar, se levando em conta o banho gelado que fui obrigada a tomar assim que cheguei em casa. 

  E isso me fez dormir de um modo que não consegui nos vinte dias anteriores: extremamente bem. 

  O fenômeno que todos descrevem em livros e filmes; eu senti. A tal sensação de dormir apaixonada... 

  Aquela em que seu ventre treme gelidamente somente por você ter lembrado do nome da pessoa ou de alguma cena; que te faz querer sorrir até que seus músculos faciais passem a doer e, que mesmo assim, você não para porque é simplesmente impossível lutar contra. A que te induz a querer gritar com todas as forças para tentar extravasar essa quente euforia que consome seu coração, e que no fundo você sabe que de nada vai adiantar porque não é assim que se resolve. E tudo isso sendo finalizado com sonhos ilusórios, que preenchem sua consciência assim que fecha os olhos para tentar dormir. 

 

  Em suma, algo perturbadoramente prazeroso. 


 

  Foi assim que meu corpo optou por me mostrar fisicamente quais eram os reflexos de Alex no meu sistema.

  E naquela noite em específico, dormi como se estivesse flutuando nas nuvens. 

 

  Obs: não, eu não estava apaixonada, como deve ter pensado mais uma vez. "Dormir apaixonada" é apenas a expressão usada para descrever aqueles sentimentos, e por mais que eu tenha sentido todos eles, não quer dizer que eu esteja doente ao ponto de realmente cair de paixão pela Alex…

  Não mesmo…  


 

  Prosseguindo: no dia seguinte, acordei de tão bom humor que as garotas mal me reconheceram, mas logo ligaram os pontos e passaram a manhã toda implicando comigo e insistindo em pedir detalhes da minha noite. Como eu realmente estava contente, dei o braço a torcer e as contei alguns breves acontecimentos para que elas julgassem minhas atitudes. 

  Obviamente eu as contextualizei sobre Sunhi e sua inconveniência fora de série, e obviamente elas me deram total razão em cada escolha que fiz.

  Enquanto falava sobre esses assuntos menos "íntimos", me senti confortável e até que bem empolgada para compartilhar ainda mais coisas com elas. Contudo, logo que Chaeryeong me questionou sobre o que aconteceu entre mim e Alex depois que Sunhi e Namoo foram embora, a narrativa mudou por completo. 

  Me lembro de ter corado violentamente ao tentar descrever o momento em que Alex sugeriu que fôssemos para o quarto para ficarmos mais confortáveis, e então parei por ali sem nem ao menos terminar de contar. Disse para elas que já estava de bom tamanho e, ignorando suas implicâncias e insistências, decidi não falar mais daquilo para evitar uma maior humilhação. 

  Para minha sorte elas se conformaram com facilidade e seguiram o dia como se fosse qualquer outro, até porque o mundo delas não girava em torno do meu "lance" com a Alex, e certamente não fazia tanta diferença na vida delas se não se tratasse de uma boa fofoca. 

  E então, assim como elas, também segui meu dia como se fosse qualquer outro. Passei boa parte do meu tempo mimando Dallie e Byullie com abraços e beijos o suficiente para recuperar o tempo que perdemos, e nas ocasiões que eles fugiam de mim pelo afeto excessivo, me preocupei em apenas descansar da viagem. 

  Alex estava no trabalho, e por isso não conversamos o tanto quanto meu interior desejava, mas me contentei com a atenção que ela se esforçou para me dar sempre que arranjava um tempinho entre os intervalos.

  Modéstia parte, ela realmente gostava muito de mim.   

  

  Quando fui dormir, o mesmo aconteceu e minha noite de sono acabou sendo ainda melhor que a anterior, já que Alex e eu conversamos por horas pelo telefone até que a bateria dela acabasse. 

  Inclusive, mesmo sendo obrigada a acordar cedo na manhã seguinte, não ousei reclamar. Fui a primeira a levantar (coisa que não era lá tão comum assim), a primeira a comer e a primeira a ficar pronta. Vesti uma roupa legal, passei uma leve maquiagem, me enchi de perfume… E claro, para finalizar, assumi o papel de Yeji para apressar as garotas para não ocorrerem atrasos. 

  Por que eu estava agindo assim? 

  Porque naquele dia iríamos passar o dia todo na empresa, integralmente confinadas na sala de ensaios para praticar as coreografias do showcase. Por consequência, Alex passaria cada minuto dessas horas ali, comigo. 

 

  Minha ansiedade estava bem acentuada naquela manhã, e me perseguiu por todo lugar até que finalmente estivéssemos em frente à empresa. 

  E uma vez que adentrei a sala de ensaios e encontrei os olhos doces de Alex, minha ansiedade teve seu espaço roubado por aquela maravilhosa emoção que tomava conta de todo o meu corpo. 

 

  Mas eu preciso fazer uma correção bem importante antes de mais nada: Sim, Alex realmente gostava muito de mim… mas parecia ter um equivalente e sádico prazer em acabar com o meu bom humor. 

 

  Durante o período da manhã, ambas agimos feito supostas profissionais e não deixamos à mostra a tensão que alimentávamos a cada vez que nos olhávamos. Porém não foi tão fácil quanto pensei que seria, e por ver que estava sujeita a acabar fazendo besteira, preferi por manter o máximo de distância possível dela, já que apenas seu perfume era o bastante para me fazer entrar num estado de loucura em que meus atos não seriam mais responsabilidade minha. 

  Foi uma situação delicada? Sim. Mas as horas se passaram com grande rapidez por estarmos todas nos divertindo, e num piscar de olhos meio período já havia se passado. 

  

  No intervalo para o almoço, aproveitei a distração de alguns e a ausência de outros para arrastar Alex até a sala anexa, a trancando ali comigo para que pudéssemos ter um pouco de privacidade. 

  Até então, tudo estaria correndo bem, claro, se não fosse pelas decisões que ela resolveu tomar. 

  Ao tentar a beijar, Alex permitiu que trocássemos somente um breve selinho, não me dando a possibilidade de aprofundar o beijo do modo como deveria ser.

  Estranhei; e quando a questionei sobre, fui surpreendida por sua audácia, onde disse que não iríamos nos "beijar de verdade" até que eu assumisse meus sentimentos por ela, fossem eles o de saudade ou o que eu carregava em meu peito. 

  Minha primeira reação foi pensar que ela estava brincando, pois afinal, além de estar fazendo quase a mesma chantagem de antes, agora continha requintes de crueldade que por definitivo eu não merecia. 

  Mas ela estava mesmo falando sério. 

  Depois de muito ouvir minhas reclamações e meus xingos disfarçados de análise sobre seu caráter duvidoso, Alex fez questão de esclarecer sua condição mais uma vez e, com um ar de satisfação, teve a pachorra de me abandonar naquele cubículo com a justificativa de que "queria evitar a tentação de me beijar". 

   Esperadamente sua atitude me deixou furiosa, e quando voltei para a sala principal, me apeguei a esse sentimento para a fuzilar com meus olhares durante todo o resto do dia, propositalmente a encarando com tons de acusação e irritabilidade sempre que podia. 

  Tenho plena certeza que isso a incomodou, mas como ela tinha um irritante dom para a atuação, conseguiu esconder isso muito bem de todos. Diferente de mim, que fui abordada muitas vezes com perguntas como "Você está bem? Parece brava…" 

  Sinceramente falando, meu arrependimento por ter me esforçado para parecer mais bonita para ela não poderia ser maior. 

  Aquela ingrata… Quem a deu a liberdade para pensar que estava no comando de tudo na nossa relação?! 

  Já estava passando a me enfurecer de verdade. 

  Comecei a pensar que toda essa problemática dizia muito mais sobre ela do que sobre mim. Por que precisava insistir tanto nisso, no final das contas? Tinha algum tipo de necessidade por elogios ou algo do gênero? 

  Simplesmente não entrava na minha cabeça qual era a da sua fixação por esse tipo de coisa… 

 

  À noite, quando já estava em casa, me dispus a mandá-la algumas mensagens e tentei a questionar sobre essas minhas dúvidas, mas ela usou a mesma desculpa de sempre, dizendo que queria me fazer vencer o orgulho e toda esse papo furado que ela costumava jogar para cima de mim. 

  Por já ter perdido a paciência, comecei uma discussão fervorosa que fizemos durar por longos minutos em torno de um único assunto, e para o aumento da minha raiva, esse diálogo acabou não fazendo diferença nenhuma em nossas vidas. Na realidade, pode-se considerar que isso foi culpa dela, pois eu praticamente discuti sozinha enquanto ela usava daquela ridícula tranquilidade emocional para ser o mais passiva possível. 

  E ao perceber que estava apenas fazendo papel de idiota, me despedi dela com mais alguns xingamentos e a ignorei pelo resto da noite. 

 

  Ao deitar minha cabeça no travesseiro para finalmente dormir, me prendi num misto de sensações ambíguas. 

  No dia seguinte iríamos gravar uma apresentação para o Inkigayo logo pela manhã, e em seguida seguiríamos direto para o local em que aconteceria o showcase, pois passaríamos a ensaiar lá para nos acostumarmos. E, a pedidos de Dongsun e Minji, Alex também passaria esse tempo conosco. 

  Por mais que sua presença me fizesse sofrer antecipadamente, decidi que ao menos tentaria não me tornar refém das provocações dela. 


 

  Se ela iria agir com toda aquela teimosia, eu também iria. 

  

  


 

[...] 





 

                 •Narrador ON:



 

  10:30 


 

  Ryujin passou pela porta do camarim e procurou ao redor com seus olhos estreitos. 

  Assim que chegou no local do showcase depois de já ter cumprido com o primeiro compromisso do dia, logo de cara encontrou Suk, que parecia extremamente perdido em meio aos staffs apressados. Ele a deu a valiosa informação de que Alex tinha acabado de chegar e que estava no camarim para as esperar, e sendo assim ela não demorou muito para se despedir do garoto e sair conferindo cada porta daquele grande lugar. 

  Quando enfim achou a porta certa, também encontrou a razão pela qual tinha dormido mal na noite passada. 

  Alex estava um pouco mais ao canto daquela grande sala, sentada sobre um dos sofás conforme digitava algo distraída em seu celular. 

  Ryujin sentiu uma pequena parcela de seu interior se afetar pela sua incomum beleza, mas optou por fingir que não aconteceu porque parecia ser o ideal a se fazer. Então olhou ao redor mais uma vez e notou que não haviam muitas pessoas ali; apenas duas das maquiadoras, que estavam entretidas em sua própria bolha no outro extremo da sala. 

  Viu naquela situação uma bem vinda oportunidade para fazer o que tinha planejado há algumas horas, e desse modo se ocupou em fazer acontecer. 

  Depois de fechar a porta atrás de si, comprimiu os lábios e traçou seu caminho até ela com passos pretensiosamente demorados e silenciosos. Chegando em seu destino, que era a mesa um pouco mais à frente do sofá, encostou o quadril na beirada e se permitiu a olhar de rabo de olho por pura inconsciência. 

  Nisso, conseguiu acompanhar o movimento dos olhos de Alex, que com grande interesse deixou de mirar a tela de seu celular para a analisar da cabeça aos pés. E inclusive, demorou ao menos cinco segundos no mesmo ato de subir e descer suas íris, como se de alguma forma estivesse presa ao que via. 

  Ryujin se agradou com isso, claro. Seu ego foi delicadamente amaciado pelo interesse explícito da mulher em seu corpo, e assim passou a se sentir ligeiramente mais confiante. 

 

  —Está bonita hoje. - Alex comentou num forte tom de admiração e firmeza. 

  —Sim, estou.  - Assentiu e passou a encarar o chão. - Uma pena para você, que não vai poder tirar muito proveito disso… 

  —Realmente, uma pena… - Adotou um ar de sugestividade. Ryujin respirou fundo em insatisfação; se Alex iria mesmo fazer aquela greve, preferia que ela fosse totalmente desagradável e não concordasse com tudo o que fosse dizer, principalmente se fosse para usar de um tom de flerte. Só assim iria conseguir sentir raiva e apenas raiva. - Como foi a gravação?

  —Ótima. - Respondeu sem emoção alguma.

  —Só isso?

  —Só isso.

  Alex sorriu de canto e prosseguiu analisando o perfil de Ryujin por mais alguns silenciosos momentos. Por mais que gostasse de a ver irritada assim, escolheu voltar a mirar seu celular na esperança de dobrar o incômodo dela. 

  E deu certo. 

  Em meio minuto, Ryujin se viu agudamente desconfortável com o suposto desinteresse dela quanto a sua presença, e por isso se viu obrigada a ter que fazer algo a respeito. 

  Com um bico contrariado nos lábios, pigarreou e formou um roteiro em sua mente para que pudesse usar os acontecimentos daquela manhã a seu favor.

  —Sabia que os idols costumam trocar números pelos lanches nos bastidores desses programas? - A olhou de canto mais uma vez e comentou como quem queria nada. 

  Era verdade. No intervalo da gravação, acabou ganhando de brinde alguns números junto ao seu sanduíche. 

  —É? - Alex respondeu preguiçosamente, ainda muito mais preocupada com as mensagens em seu celular do que com o assunto. 

  —É. - Esboçou uma crescente arrogância a cada segundo que se passava.

  —Que legal… - Ironizou com desânimo, deslizando o polegar pela tela do aparelho. 

  —Não quer saber como eles fazem isso? - Cruzou os braços e continuou a assistindo de canto. 

  —Hum… - Franziu o cenho e balançou a cabeça em negativo. - Não. 

  Ryujin revirou os olhos por puro descontentamento e a encarou num intenso desejo de poder quebrar aquele celular em pedacinhos, tamanha a sua indignação. Nesse ritmo, nada daria certo se ela não seguisse o roteiro que planejou.

  Mas não desistiria tão fácil daquela abordagem. 

  Não mesmo. 

  —Eu tomaria cuidado, se fosse você. - Comentou em tom de aviso e arqueou as sobrancelhas, apertando ainda mais seus braços. 

  Alex sorriu fraco ao notar o tom dela, e por isso acabou com toda a atenção que estava dando ao seu celular.

  —Mesmo? - Com muita calma e demora subiu seu rosto para a encarar, desfrutando de um velado bom humor na voz. - Por que? 

  Ryujin, logo que percebeu o olhar dela sobre si, tratou de encarar a parede com todo o seu empenho para não a dar o gostinho de ser retribuída, e em seguida adotou uma expressão ainda mais soberba, se é que era possível. 

  —Oras, como assim por que? Não consegue juntar os pontos numa interpretação? 

  Alex prosseguiu sorrindo e balançou a cabeça em positivo, deixando seu celular acima do braço do sofá para que pudesse brincar com seus fios de cabelo. 

  —Eu consigo. - Cruzou as pernas numa pose tão esnobe quanto a dela, porém preferiu não parecer tão infantil e mimada. - Mas quero saber o que você está insinuando com isso. 

  Ryujin deu de ombros e encarou as próprias unhas como se não se importasse com o assunto. 

  —Não estou insinuando, só estou dizendo que você deveria ficar mais atenta. - Levou uma mão até o bolso de seu moletom e tirou dali alguns pequenos papéis, os analisando como se fosse a coisa mais interessante do mundo. - Porque, sabe… você pode acabar tendo uma surpresa bem desagradável caso continue com essa sua greve de afeto… 

  Alex fechou um pouco sua expressão e desceu os olhos até as mãos dela, a assitindo brincar com aqueles papéis que tinham números escritos. 

  —A surpresa desagradável seria você conhecer outra pessoa? - Perguntou com uma sobrancelha arqueada. 

 —Sim. - Suspirou e sorriu provocativamente, voltando a guardar os papéis quando notou que eles tinham causado o efeito que esperava.  

  Alex se recostou melhor e apoiou o cotovelo no braço do sofá, analisando todo o perfil da garota enquanto pensava a respeito. 

  —Então você realmente não gosta de mim o tanto quanto eu imagino, se poucos dias sem carinho são o suficiente para que você já pense em ficar com outro alguém. 

  Ryujin balançou a cabeça em positivo muito devagar. Internamente, todo o seu interior discordava com todas as forças daquela frase, pois afinal, a verdade era bem diferente daquilo, mas optou por ignorar todo aquele motim que seu coração havia organizado. 

  —É, talvez eu não goste tanto mesmo. - Voltou a cruzar os braços e abusou de sua entonação mais desdenhosa. 

  —Bom, se é assim, eu deveria fazer o mesmo que você… - Continuou a olhando, e assim pôde perceber com clareza a forma como ela não conseguiu esconder a mudança em sua expressão ao ouvir aquilo. 

  —O que? - A olhou por um momento, mas em questões de frações de segundos se forçou a retornar suas íris para a parede, já que não queria a assistir brincar com o próprio cabelo daquela maneira tão… perigosa. 

  —Conhecer outra pessoa. - Respirou fundo, pesado e sonoramente. 

  —E quem disse que eu estou fazendo isso, Alexia?! - Esqueça a última decisão de Ryujin. Logo que ouviu aquilo (que em sua concepção era classificado como absurdo), não hesitou em virar seu rosto e olhar para ela com grande inconformidade. 

  —Não está? - Voltou a fitar o bolso dela, não se deixando intimidar pelo olhar que estava a queimando. 

  —É óbvio que não! - A mirou da cabeça aos pés. 

  Alex deu de ombros e segurou com todas as suas forças um sorrisinho que queria vir à tona graças às caras e bocas da garota à sua frente. 

  —Então por que está sugerindo que eu deveria tomar cuidado? - Também a olhou de cima abaixo numa retribuição nada amigável. Ryujin se sentiu provocada não apenas por isso, mas também pelo baixo e simplista tom de voz que ela costumava usar, o que a dava um ar pacífico demais para seu gosto. Tinha como a tirar do sério, afinal? - Quer me fazer sentir ciúmes? 

  —Pff, claro que não… - Negou com pouco caso e se remexeu desconfortável na mesa, olhando ao redor num ato planejado para justificar sua pausa, para que assim pudesse pensar no que falaria a seguir. Sua intenção era sim fazer ciúmes, mas, apesar de Alex ter tocado no assunto, não soube dizer se tinha dado certo, já que a expressão dela continuava irritantemente neutra. E essa dúvida definitivamente não era bem vinda dentro de si. - Mas… - Voltou a estacionar seu olhar mimado sobre ela e levantou o queixo na sua característica maneira de tentar demonstrar superioridade. - Você está com ciúmes, por acaso? 

  Alex continuou a encarando com a mesma expressão e em completo silêncio por pelo menos cinco segundos, porém não conseguiu mascarar seu leve divertimento quanto à situação, e graças a isso deixou um pequeno sorriso crescer gradativamente em seus lábios. Piscou lentamente e passou a mão por seu cabelo uma última vez, a pousando acima de sua coxa logo em seguida. Estaria mentindo se dissesse que não teve a intenção de insinuar sensualidade naquele ato, porque ela o fez de modo muito explícito, o bastante para que Ryujin perdesse um pouco o fio da meada. 

  Respirou com tranquilidade e a respondeu num tom calmo, ao mesmo tempo que também franco e sincero. 

  —Eu estou com muito ciúmes de você, Ryujin… - Desceu o olhar para seu próprio joelho, onde agora sua mão subia e descia num singelo e estimulante carinho. - Queria poder jogar todos esses papéis no lixo, se quer saber. - Voltou a olhá-la apenas para conferir se algo havia mudado em sua face.

  Num primeiro momento, Ryujin se viu dividida num misto de surpresa e conformidade; afinal, ela sabia que Alex sempre era muito honesta e não escondia seus sentimentos, mas isso não queria dizer que ela tinha a mínima noção de como lidar com toda essa transparência. Não conseguia compreender o que a levava a ser tão aberta. Mas isso de nada importava, porque, de qualquer forma, aquela confissão a atingiu positivamente no meio do seu coração, amaciando seu ego de modo que a fez sentir leves arrepios na espinha. 

  Contudo, em contradição ao seu modo de se expressar verbalmente, Alex não esboçava muita coisa em suas feições. Não mostrava grande descontentamento ou raiva em sua forma de agir (coisa que era mais a praia de Ryujin), e com isso fazia a garota se sentir até mesmo um pouco confusa. 

  Por favor, não a entenda mal; tudo o que menos queria era ter que enfrentar uma pessoa descontroladamente ciumenta, mas veja bem, naquela situação em específico Alex parecia neutra até demais, mesmo que tenha dito que estava com ciúmes. Ryujin queria a ver ao menos fazer uma cara feia ou algo do tipo, mas não obteve nada disso; ganhou apenas um olhar intenso que transmitia um pouco, mas só um pouco mesmo, de insatisfação. 

  Teve de admitir para si mesma que se sentiu muito curiosa para ver como Alex agiria quando estivesse verdadeiramente brava. Tinha desfrutado um pouco dessa experiência quando a viu discutir com um dos trainees, mas além de mal conseguir se lembrar do ocorrido por ter sido muitas semanas atrás, ainda sentia que ela não estava realmente irritada naquela ocasião, pois na realidade pareceu ter sido mais dura e séria, e somente isso. Então, a assistir perder o controle emocional parecia muito tentador para que ficasse apenas em sua imaginação. 

  Por isso, controlou ao máximo seus músculos faciais para que não sorrisse, mesmo que quisesse muito, e também insistiu em se manter na persona arrogante e fria de anteriormente. 

  —Que pena que você não pode, não é mesmo? - Ironizou. - Saiba que você vai sofrer muito mais se continuar com essa sua gracinha, porque eu vou fazer questão de esfregar sua cara que eu estou com outra pessoa. 

  Alex continuou a acariciar seu joelho, porém estendeu um pouco mais sua rota para também passear com sua mão por sua coxa, agora tornando seu sorriso ligeiramente mais intuitivo e provocador. 

  —Ousado da sua parte pensar que vai mesmo conseguir fazer isso. 

  Ryujin segurou a própria cintura e a olhou de cima abaixo pela milésima vez desde o dia anterior. 

  —E por que não conseguiria?

  Alex prendeu o lábio inferior entre os dentes e sorriu um pouco mais conforme esperava alguns segundos se passarem para a deixar ainda mais frustrada pela demora. Parecia um pouco tolo pensar dessa forma, mas nada conseguia tirar de sua cabeça a ideia de que Ryujin ficava extremamente atraente quando brava ou irritada. Adorava a ver assim, por mais que não fosse exatamente bom para nenhum dos lados. 

  —Porque você é uma idol… E pelo que parece, você pretende se relacionar com outro idol. Como iria conseguir me deixar com ciúmes se, provavelmente, eu nunca chegaria a ver vocês no mesmo espaço juntos? Com todas as proibições e cuidados que teriam que ter para se esconder… - Questionou retoricamente num tom ácido de quem tem um bom argumento. - Isso, claro, se vocês próprios conseguissem se ver em meio aos compromissos de agenda que teriam. Isso deve esfriar os sentimentos de qualquer um… - Olhou ao redor enquanto fingia refletir a respeito. - Então seria um relacionamento fadado ao fracasso antes mesmo de começar, você não acha? - Ryujin teve de se segurar para não jogar na cabeça de Alex qualquer coisa que estivesse ao seu alcance, tamanha a sua infelicidade com a coerência daqueles fatos. Sendo assim optou pela escolha mais segura para a saúde física das duas: simplesmente não respondeu. - E, sabe… - Mas, para Alex, isso não era o bastante. - É diferente do meu caso, por exemplo...  - Deu de ombros humildemente. 

  Ryujin travou o maxilar e engoliu em seco, se perguntando sobre o que diabos aquela maluca estava falando. Desse modo, se viu obrigada a ter que dizer algo, graças à sua ingrata curiosidade. 

  —Diferente como, eu posso saber? 

  —Bom, vamos começar pelo fato de que eu não sou uma idol, e isso já me dá uma imensa liberdade para não ter que me preocupar em esconder um relacionamento de todos. - Molhou os lábios com a língua e usou propositalmente de seu tom mais tranquilo e despreocupado. - E, claro, eu poderia me relacionar com quem eu bem entendesse, na hora que eu quisesse. - Na mais brilhante de todas as coincidências, a porta do camarim foi aberta quase que de imediato, e por ela se passaram algumas staffs, incluindo Areum. Tanto Alex quanto Ryujin pararam para as olhar, rendendo satisfação para uma e desgosto para a outra. - Com qualquer pessoa… - Colocou mais significância na frase logo que ambas voltaram a se encarar. 

  Ryujin experimentou ali um grande e quase que desconhecido pico de raiva. Ficou muito claro para si o que Alex quis dizer, e ela não poderia ter encontrado uma maneira pior para a deixar brava. 

  Quem ela pensava que era para insinuar coisas assim, afinal de contas?!

  Sabia que sentia ciúmes de Areum, por que teve de a dirigir aquela estúpida e mascarada provocação?!

  Agora ela estava mais do que irada, e em suas veias o ciúmes corria fervorosamente somente por ter voltado a imaginar a ridícula cena de Alex e Areum juntas à sua frente na pior das distopias. 

  Qual era o problema dela, hein? 

  Se pudesse voltar no tempo, Ryujin nunca teria tocado naquele assunto. Tudo bem que também a quis causar ciúmes, mas era completamente diferente! Ela não tinha o direito de pagar com a mesma moeda, não mesmo! 

  Além disso, também se questionou sobre como ela conseguia ser tão boa com discussões. Ela nem era tão fluente em coreano assim, de onde tirava todas aquelas frases? 

  “Como eu queria poder acabar com esse seu sorrisinho…” resmungou internamente. 

  Mas sua maior perturbação acabou vindo logo em seguida, quando Alex, ao terminar de falar, piscou galantemente num explícito tom de convencimento. 

  Ryujin perdeu toda a sua paciência com aquilo, se é que tinha lhe restado alguma. Então se desencostou da mesa sem nenhuma delicadeza e fechou os punhos, balançando a cabeça em negativo.

  —Você é uma idiota, Alexia. 

  Revirou os olhos e não pensou duas vezes antes de virar seu corpo e seguir para fora daquela sala, usando de passos pesados e determinados para chamar a atenção de todos ali, mostrando que estava extremamente desgostosa. 

  Quanto à Alex, ela continuou imóvel no sofá e apenas acompanhou o caminho dela até a porta. Quando ela saiu de seu campo de visão, tudo o que fez foi retornar o olhar para suas pernas, se permitindo sorrir livremente dessa vez. 

  Ela não estava feliz, porém isso não significava que não tinha achado graça em tudo o que aconteceu, porque achou. E por isso estava sorrindo feito uma boba. 

  Moveu seu outro braço e juntou suas duas mãos acima das pernas, brincando com seus dedos conforme se perdia em pensamentos que rodeavam Ryujin. 

  Por mais que não tenha demonstrado tanto, ela tinha mesmo sentido grande ciúmes, e isso começou a corroer por dentro. Imaginar Ryujin com outro alguém era terrivelmente frustrante, e, se levando em conta o tanto de papéis que ela tinha recebido, a fila de admiradores secretos era bem extensa e variada, o que a deixava ainda mais inquieta. 

  Por terem passado tanto tempo fechadas numa bolha, tinha se esquecido um pouco do fato de que ela era realmente uma idol e, consequentemente, muito conhecida e popular devido à sua beleza. Com isso passou a se dar conta de quantas pessoas a desejavam, e era quase que inevitável não se sentir extremamente insegura com toda essa narrativa. 

  Soube desde o primeiro momento que Ryujin só tinha feito aquilo para a provocar, pois era uma péssima atriz e não conseguiu entregar um bom fingimento, mas isso não queria dizer que estava imune a realmente sentir ciúmes. Afinal, aquela atuação barata poderia até ser de mentira, mas os diversos números que ela recebeu definitivamente não eram. 

  Saber que outras pessoas tão atraentes e interessantes quanto Ryujin demonstravam querer a conhecer melhor era o pior dos fatos, e estava começando a tirá-la do sério. 

 

  Talvez, quem sabe, o "aviso" de Ryujin não tenha sido tão engraçado assim, no final daquela brincadeira. 

 

  Talvez devesse mesmo tomar cuidado…  



 

[...] 



 

  16:00



 

  —Como está? - Ryujin olhou para Chaeryeong da forma que pôde enquanto a ajudava com os fios do fone de retorno. 

  —Um pouco apertado ainda… - Inclinou sua cabeça mais para o lado para facilitar o trabalho da amiga. 

  —E agora? - Soltou um pouco mais o fio. 

  —Perfeito. 

  Chaeryeong sorriu em agradecimento e se dirigiu até o meio do palco, deixando Ryujin sozinha enquanto ajustava os próprios fones. 

  Ela não encontrou dificuldades para o fazer, e uma vez que eles já estavam arrumados, se viu pronta para se juntar às outras no meio do palco para o ensaio. Numa última checagem passeou com as mãos por suas roupas para garantir que não tinha algo em seus bolsos que pudesse a atrapalhar, e acabou parando acima dos bolsos de seu moletom. 

  Respirou fundo por pura insatisfação e os esvaziou, encontrando novamente aqueles mesmos papéis com diferentes números. Os olhou com grande preguiça e desânimo; o único propósito pelo qual os guardou era fazer ciúmes em Alex, e por mais que tenha dado relativamente certo, acabaram por causar mais dano do que agrado à sua saúde mental. Então, de nada mais valia todos aqueles números, porque ela definitivamente não tinha a intenção de os adicionar na sua lista de contatos. 

  Olhou para os lados para se certificar de que ninguém estava olhando, para em seguida poder amassar os papéis com força e se aproximar do lixo no canto do corredor. Depois de ter jogado os papéis fora sem nenhum tipo de hesitação ou apego, respirou fundo mais uma vez e começou a andar em direção ao palco. 

  Nas últimas horas, Ryujin tentou conter toda aquela bomba relógio que costumava chamar de sentimentos, e, apesar de ter conseguido se acalmar, não sabia se poderia confiar totalmente em si mesma, já que não tinha visto Alex desde o acontecimento de mais cedo. Tinha uma leve impressão de que voltaria a enlouquecer caso a visse em sua frente, e por isso continuou a trabalhar seu emocional para que se tornasse um pouco menos suscetível. 

  Ela ainda estava irritada, tinha plena noção disso e nem ao menos fazia questão de esconder de si mesma e dos outros. Sua expressão não era a das melhores e seu humor muito menos, mas procurou fazer o possível para não deixar que isso interferisse no trabalho ou nas relações que tinha com todos os staffs. 

  O que ela realmente estava querendo conter era aquele ciúmes todo que estava sentindo. Estava conformada de que seu irritamento não passaria, pois ele não era novo e muito menos possível de se controlar, já que ela acumulava inúmeros sentimentos de raiva e frustração pela Alex desde o dia em que se conheceram, então tentar se livrar disso era como chover no molhado. Mas ela não conseguia se contentar quanto ao ciúmes, porque era mais do que insatisfatório para seu orgulho ter que lidar com esse fardo. 

  Ryujin não era boba. Sabia que Alex não estava mesmo falando sério, pois era quase que inexistente a possibilidade de ser trocada por Areum. Nem no mais ilusório dos sonhos conseguia ver isso se aplicando na realidade, e sendo assim estava fora de cogitação se sentir insegura quanto à sua exclusividade no coração de Alex. 

  Mas… então por que diabos ela ainda estava se sentindo enciumada?!

  Simplesmente não conseguia encontrar uma justificativa para que continuasse reproduzindo diferentes tipos de cenas e ocasiões que inflavam ainda mais o seu ciúmes, e ao mesmo tempo também não conseguia privar sua mente masoquista de prosseguir torturando a si própria com toda aquela maluquice. 

  O que deveria fazer numa situação como essa, afinal? Já não tinha mais ideia de como moderar sua própria imaginação, e estava ficando cada vez mais perturbada. 

  Ryujin esperou do fundo do coração que Alex, ao menos, estivesse sentindo o dobro de ciúmes que ela estava sentindo. Seria uma bela forma de fazer valer a pena todo aquele sofrimento. 

  Era errado, sim, ela também já sabia disso. 

  Contudo, ainda sim, gostou da ideia de imaginar Alex infeliz. 

  Pediu aos céus para que o ciúmes dela fosse tão fervoroso internamente quanto o seu, pois apenas se sentiria agradada caso soubesse que não estava passando por isso sozinha. 

  Era pedir demais?

  —Estão todas no palco? Ótimo! - Um dos staffs de som sorriu amigavelmente para todas elas assim que Ryujin se aproximou para completar o grupo. - Vamos começar de acordo com a programação que vocês já ensaiaram na empresa, certo? Só para se adaptarem ao palco e ao espaço que vão ter. 

  —Certo! - Yeji, como de costume, foi a primeira a concordar com grande empolgação para inserir as garotas de modo mais animado no que tinham de fazer. 

  —Dêem o sinal quando já estiverem em posição para eu poder iniciar a música, okay? - Ele acenou fraco para elas com um sorrisinho e logo se dirigiu ao caminho para trás do palco. - Onde está a coreógrafa? Ela precisa estar aqui para ver se está tudo nos conformes… 

  Ryujin revirou os olhos ao ouvir o homem dizer aquilo, pois tinha esquecido que Alex era necessária ali. Também sentiu um leve e contragosto frio na barriga pelo mesmo motivo. 

  —Ryujin, vem! - Yeji a puxou pela mão ao ver que tinha se distraído. 

  —Ah, sim… desculpa. - Balançou a cabeça e sorriu fraco, se posicionando e tentando se concentrar ao máximo no trabalho. 

  —Que bela sensação de poder… 

  Todas perderam um pouco o rumo quando ouviram uma voz feminina e bem humorada ecoar em alto e bom tom por todo o lugar. Olhando adiante, avistaram Alex andando em frente à primeira fileira de assentos com um sorrisinho infantil, trazendo consigo alguns papéis e um microfone. 

  —Fala sério, não acredito que deram um microfone para ela… - Ryujin reclamou num tom moderado, mas acabou sendo o suficiente para Alex ouvir. 

  —Gostou, Ryujin? - Sorriu provocativamente e se sentou em uma das cadeiras, cruzando as pernas em pose de superioridade e fazendo questão de continuar usando o microfone. - Agora vou poder chamar sua atenção mais alto e te fazer passar vergonha na frente de todos. 

  Ryujin preferiu por não responder; somente voltou a se posicionar enquanto tentava ignorar as risadinhas das garotas. 

  —Okay, meninas, vamos lá. - Yeji bateu alguma palminhas ainda sorrindo, então mandou o sinal para o staff assim que também voltou a se situar. 

 

  Ryujin tomou fôlego e fez o possível e o impossível para manter o foco no que estava fazendo, para que assim Alex não tivesse a satisfação de chamar sua atenção na frente dos outros. Faria o seu melhor naquilo, estava mais do que determinada. Então, quando a música começou, tratou de impor mais energia do que costumava durante os ensaios, olhando diretamente para as últimas fileiras para que também não se distraísse com aquele par de olhos que de certo estavam a julgando. 

  Foram quase quatro minutos de completa e pura tensão durante a primeira música, mas assim que acabou, se sentiu mais do que realizada com seu desempenho, pois não conseguiu listar um único momento em que fez algo de errado. Desse modo, depois de ter informado para o staff que seu retorno estava um pouco atrasado, começou a andar calmamente pelo palco enquanto ajustava o fio de sua lapela. 

  Fitando Alex de canto numa despretensiosa intromissão, notou que ela tinha um leve sorrisinho nos lábios, mas seus olhos estavam concentrados nos papéis em seu colo. Se questionou se ela tinha gostado do que viu, se é que tinha acompanhado a apresentação. Esperou muito que sim, mesmo que não dependesse da aprovação dela. 

  —Está perfeito, meninas… - Alex se pronunciou sem o microfone e ainda com o olhar abaixado, mas não demorou muito para subir o rosto para as fitar. - Só preciso que se posicionem meio metro à direita, porque não ficaram totalmente centralizadas durante o refrão.

  —Certo! - Todas as quatro, com exceção de Ryujin, concordaram fielmente ao pedido e se moveram mais para o lado. 

  —Ah, e… Ryujin. - Levantou um dedo no ar e esperou que seu olhar fosse retribuído para continuar. - Você parece muito empenhada, parabéns. - Assentiu positivamente num falso contentamento. - Vou fingir que não fez de propósito. - Sorriu mais abertamente. - Mas você ainda vai errar, guarde minhas palavras. - Balançou o dedo indicador na direção dela. - Eu vou te pegar ainda… 

  Ryujin deu de ombros com se não se importasse e teve de ignorar mais uma vez as risadinhas das garotas. 

  —Vai morrer tentando… 

  Murmurou de mau grado e ocupou sua atenção mais uma vez com o fios, agindo como se eles ainda precisassem ser regulados enquanto esperava a próxima música. 

  Cerca de meio minuto depois o staff deu permissão para que iniciassem a apresentação seguinte, e o comprometimento de Ryujin consigo mesma acabou ficando um pouco mais rígido. Fez a mesma coisa que da vez anterior, do começo ao fim se manteve centrada e teve a garantia que não tinha cometido nenhum erro. Quando a música enfim havia se encerrado, fez questão de encarar a mulher com toda a convicção do mundo, esperando pelo feedback com grande empenho. 

  Alex, com a única e exclusiva intenção de a levar aos nervos, não disse coisa alguma. Simplesmente retribuiu o olhar dela com um divertido curvar de lábios, atuando como se estivesse entretida, porém não o suficiente para gastar palavras com isso. 

  “Ai, essa… cretina!” Ryujin xingou mentalmente e fechou os punhos em raiva, pisando forte por todo o palco conforme procurava sua posição na próxima faixa.

  Na terceira vez em que dançaram, duplicou sua entrega à coreografia e levou tão a sério quanto nos shows de verdade, causando uma discrepância notável de energia entre ela e as outras garotas. Tudo isso porque queria ver Alex ser obrigada a elogiar sua performance. 

  Mas, bem… não foi exatamente assim que aconteceu. 

  Pós apresentação, com um pouco de suor na testa e o fôlego quase que escapando de seus pulmões, Ryujin mais uma vez assombrou a mulher com seu olhar cheio de expectativas. E, bom, seria cômico se não fosse trágico; Alex nem ao menos a olhou de volta desta vez, muito menos tinha um sorrisinho nos lábios. Tudo o que estava deixando demonstrar era uma feição desinteressada em relação às frases que lia em seus papéis. 

  Ryujin chegou a se perguntar se ela tinha chegado a assistir a apresentação, pois nem ao menos parecia que tinha movido seus olhos nos últimos cinco minutos. 

  —Ei… - Se aproximou despretensiosamente de Yuna encarou os próprios pés numa orgulhosa timidez. - Ela assistiu a coreografia?

  —Sim, você não viu? - Soltou uma risadinha fraca, amarrando seu cabelo de qualquer forma num rabo. 

  —Não, eu não queria olhar para ela… - Juntou as sobrancelhas e formou um bico mimado nos lábios. 

  —Até quando vocês vão ficar fazendo esse joguinho, hein? - Perguntou de modo retórico e soltou mais uma risadinha, a acompanhando de volta ao meio do palco para se preparar. 

  Ryujin deu de ombros e continuou olhando para baixo, se calando para que assim voltasse a dialogar com a sua mente. 

  “Por que diabos ela não disse nada, então?!” questionou com grande insatisfação. “É a coreógrafa, faz parte do trabalho comentar sobre as apresentações! Quanta falta de profissionalismo, Alexia…”

  —Estamos prontas para a próxima. - Yeji fez sinal positivo para o staff atrás do palco. 

  Ryujin bufou e olhou discretamente para Alex. Ela ainda tinha os olhos caídos, e parecia não ter a intenção de os subir para acompanhar os próximos movimentos. 

  Imaginou que, talvez, Alex estivesse fazendo isso de propósito por ser mais uma de suas implicâncias, e por essa razão acabou mudando um pouco o rumo de suas intenções. Agora estava empenhada em descobrir se sua dedução era mesmo certa. E se fosse, a pegaria em flagrante. 

  Assim, quando a nova canção começou a rodear todo o local, não desviou seu olhar para as últimas fileiras como havia feito das últimas vezes; persistiu em manter suas íris mais do que centradas em Alex. 

 

  Tolice de sua parte. 

 

  Como de praxe, as coisas não saíram conforme o planejado em sua mente. 

  Pode se dizer que houve ao menos um acerto de Ryujin: ela estava sim certa. 

  Ainda no início, viu Alex levantar suas íris para acompanhar a prática como se nada tivesse acontecido, tendo naquilo a confirmação do que já estava suspeitando. Mas não esperava que o preço a se pagar por uma dedução correta fosse tão alto. Seu tempo de deleite interno por tê-la pego no ato fora curto demais para que pudesse dizer que tinha valido mesmo a pena. Num primeiro momento, Alex observou somente as outras garotas, e desse modo Ryujin se manteve tranquila no quesito de equilibrar seu foco entre os passos da coreografia e a atenção que estava a dando, mas obviamente não durou mais que dois ou três segundos. 

  Quando Alex fixou os olhos intensamente sobre si, todo o seu corpo escolheu por livre e espontânea vontade entrar em estado de uma inexplicável insanidade, causando inúmeras panes em seus sentidos. Num passe de mágica sua consciência a lembrou de que estava sendo analisada, e por isso não poderia errar de jeito nenhum. E foi aí que também se lembrou do porquê de não ter retribuído o olhar dela nas músicas anteriores: porque Alex a deixava tensa de um modo que uma multidão de mil pessoas não conseguia. E, uma vez revivendo isso na mente, a inquietação voltou a bater em sua porta. De uma hora para outra, todo o seu senso de ritmo e movimento foram resumidos a pó, incluindo também a sua memória, fazendo com que esquecesse de todos os passos de uma coreografia que tinha repetido por incansáveis vezes nos últimos dias. 

  Se esforçando para fingir para os outros e si mesma de que tinha tudo sobre controle, tentou improvisar alguns passos depois de ter cortado conexões com o olhar de Alex, porém já estava tarde demais para recuperar o que já tinha perdido de vez. Numa busca sem sucesso para conseguir chegar à posição que pensava ser a sua, acabou batendo de frente com Yeji, consequentemente confundindo todas as outras três, que pararam de dançar para as observar. 

  —Ei, está tudo bem? - Yeji segurou Ryujin nos braços logo que a música foi interrompida, estranhando o olhar perdido que ela tinha. 

  —Está. - Assentiu fervorosamente e sacudiu a cabeça. - Eu só… esqueci qual era a minha posição. 

  —Você deveria ir para a quatro. - Chaeryeong respondeu enquanto balançava a mão em frente ao rosto, buscando por um alívio para o calor que estava sentindo devido ao exercício. 

  —Ah, é… - Soltou uma risadinha sem graça e passou a mão nervosamente pelo cabelo. - Me desculpem pelo erro, não vai acontecer de novo. 

  —Não se preocupe. - Lia sorriu amigavelmente e a deu algumas batidinhas nas costas como incentivo. 

  Ryujin assentiu mais uma vez e suspirou pesado, massageando sua têmpora com a mão direita conforme procurava relembrar de toda a coreografia de ponta a ponta. Contudo essa não era a tarefa mais fácil do mundo quando ela sentia que aqueles olhos ainda estavam a queimando. 

  Numa covarde dificuldade para resistir à tentação, tornou a observar Alex discretamente, e acabou sentindo incômodos tremores da cabeça aos pés ao ver que ela tinha voltado a sorrir como se estivesse mais do que agradada com o que tinha acontecido. Por isso, passou a deixar de lado a intenção de disfarçar seu olhar e passou a encará-la como quem a desafia para uma briga. Pois afinal, que tipo de coreógrafa ficava feliz com um erro daqueles? Tudo bem que parecia ser mais uma questão pessoal do que profissional, mas ainda parecia extremamente errado em sua concepção. 

  —O que foi?! - Perguntou num tom insolente e alto. 

  Teve de confessar que acabou passando ligeiramente do ponto, pois todos os outros staffs pareceram assustados com a forma informal e até um pouco grosseira como tinha dirigido a pergunta para uma pessoa mais velha, ainda mais sendo sua coreógrafa. Mas se consolou com o fato de que eles nunca saberiam qual era a real relação delas, então acabou por não dar tanta importância para os julgamentos. Caso fosse questionada sobre, diria que tinha ganhado a liberdade para falar e agir despojadamente com ela, e assim o assunto estaria resolvido sem grande alarde. 

  Na espera pela resposta, acompanhou os movimentos de Alex, que com muita modéstia olhou para os staffs com um ar ameno, sinalizando que esse não era um comportamento novo. Tendo isso feito, voltou a mirar Ryujin com a mesma petulância, porém com traços mais maduros por serem característicos de sua personalidade. Seguindo essa mesma linha, demorou ao menos três ou quatro segundos para fazer menção de que iria responder algo. 

  —Acho que eu não vou poder assistir o show se você agir assim toda vez que nos olharmos...  - Abusou de um tom categoricamente franco e ácido, usando a ponta dos dedos para brincar com as folhas dos papéis após dar uma breve pausa para só então continuar a falar. - Eu te deixo nervosa, Ryujin? - Deixou crescer em seus lábios um sorrisinho sugestivo. 

  Ryujin se sentiu mais ofendida do que deveria nessa circunstância, pois a única resposta para aquela pergunta era que, sim, Alex a deixava muito nervosa. Mas saber que ela tinha certa noção disso era terrivelmente vergonhoso. 

  —Pff, vai sonhando. - Replicou com grandes doses de deboche e rispidez. 

  Alex soltou algumas risadinhas fracas e largou seus papéis acima do assento ao lado. 

  —Bom, de qualquer forma você cometeu vários erros. - Levantou o queixo e formou um pequeno bico nos lábios numa implícita e caricata imitação, fazendo Ryujin revirar os olhos fervorosamente, mesmo que por dentro (muito lá dentro mesmo) tenha achado isso fofo. - Você está muito afastada das garotas, não se posicionou mais para a direita como eu pedi. E, além desse seu… - Gesticulou com a mão como se estivesse à procura de algum termo. - "atrapalhamento", você sempre está um movimento à frente, então precisa desacelerar. - Cruzou os braços e persistiu em manter aquela mesma expressão. 

  Ryujin entreabriu os lábios e estreitou os olhos, completamente inconformada com o que tinha escutado. 

  —Eu não fiz nada disso! - Protestou com firmeza. 

  —Sim, você fez. - Afirmou numa pose de autoridade, olhando para suas próprias unhas em mais uma imitação. - Provavelmente não percebeu porque estava ocupada querendo me impressionar. 

  —Oras, você… - Cerrou os dentes e balançou a cabeça negativamente. Na esperança de se defender, olhou para as meninas para que elas confirmassem que seu trabalho tinha sido perfeito, mas sua fé se foi assim que viu as expressões contrariadas e divertidas em seus rostos. Passou a se questionar se estava começando a ficar louca, pois até então tinha plena certeza de que estava perfeitamente alinhada ao ritmo. É… Talvez estivesse mesmo ficando louca… Mas não ao ponto de concordar com Alex. Não faria isso nem em um milhão de anos. - Quer saber, deixa pra lá. - Pousou as mãos na cintura e voltou a andar pelo palco, olhando ao redor como se o diálogo de nada valesse para dar continuidade. - Vamos acabar logo com isso. 

  —Vamos! - Yeji concordou com animação junto à Yuna. 

 

  Quando todas as cinco se situaram, a mesma música de antes começou a tocar, para que assim pudessem a completar sem erros dessa vez. 

  Dentro dos conformes, foi uma tentativa razoavelmente satisfatória. Ryujin sabia que estava sendo observada, e mesmo que tenha se lembrado de todos os passos, encontrou certa dificuldade para se entregar totalmente, já que sua mente não a deixava esquecer de sua ilustre espectadora. 

  E isso se intensificou ainda mais durante as três músicas seguintes. 

  Parecia loucura ter que se conformar com o fato de que não estava conseguindo fazer algo certo naquela tarde, principalmente porque, durante os ensaios na empresa, Alex também a analisava muito, mas não chegava a se sentir tão inquieta assim. Qual era a diferença, afinal de contas? Não fazia sentido… 

  Mas, de qualquer forma, era isso o que estava tendo que enfrentar, e nada parecia mais irritante do que as correções de Alex no final de todas as músicas. Não é como se ela fosse inocente, porque não era; Ryujin sabia que tinha errado, pois ela mesma acabou percebendo que deixou passar alguns detalhes como pequenos movimentos de mão e passos imprecisos (tudo isso graças à sua ansiedade causada pela presença dela). Porém não era como se fossem grandes desacertos, pois na realidade eram detalhes mínimos que qualquer leigo deixaria passar. Mas é claro que Alex percebeu muito bem, e para o seu desânimo, ela não deixou de dialogar sobre. 

  Em meio à comentários e sugestões fortemente inclinados para a ironia, Alex usou e abusou do poder de seu cargo para implicar com ela, e não se intimidou quando, na segunda música, Minji se sentou ao seu lado para também assistir. 

  Ryujin não gostou nada disso, tanto que acabou por retrucar todas as falas dela com grosserias tão debochadas quanto, arrancando diversos risos das pessoas ao redor mesmo que não tivesse essa intenção. 

  Apenas estava irritada com a Alex pelos mais diversos motivos.  

  Talvez irritada até demais.


 

  —"Você não se lembrou de esticar os braços no pre chorus" nhenhenhe. - Imitou a voz dela num tom agudo e um exagerado sotaque, fazendo caras e bocas conforme o sentimento de raiva crescia dentro de si. - Juro que ainda acabo com ela… - Resmungou baixo e encarou o chão, esperando pela próxima e última música para que pudesse sair dali o mais rápido possível. 

  Para sua alegria, não teria que ensaiar Nobody like you; a canção não tinha coreografia, então só seria praticada no dia do show para a passagem final de som. Não teria ficado feliz em a apresentar para Alex numa situação como aquela, então agradeceu internamente por ser uma música não dançável.

  —E não se esqueça de manter a cabeça erguida no começo! - Alex finalizou sua sessão de críticas com um dedo levantado no ar e uma dissimulada pose fechada. 

  Ryujin travou o maxilar com grande força e contou internamente até dez, tendo que repetir esse ato ao menos mais três vezes para que se sentisse um pouquinho menos irritada. Odiava quando as implicâncias de Alex funcionavam, e odiava ainda mais o fato de não conseguir ficar verdadeiramente brava, já que gostava demais dela para isso.

  Tinha como existir castigo pior que esse? Acreditava fielmente que não. 

  Fechou os olhos e lentamente inspirou e expirou o ar para fora de seus pulmões, buscando se auto subornar a aguentar aquela situação com a recompensa de que estaria longe dali em cinco minutos. Não obteve o sucesso que esperava, mas já parecia o suficiente para suportar, contanto que Alex ficasse de boca fechada. 

  Mas, claro, isso não iria acontecer. 

  Como se tivesse lido seus pensamentos, Alex voltou a fazer menção de falar, chamando a atenção não apenas dela, mas também de todas as garotas quando pegou o microfone que tinha deixado de escanteio desde que havia chegado. 

  "Qual é, você quer mesmo chamar toda essa atenção?" Revirou os olhos e cruzou os braços, a olhando diretamente enquanto esperava pela próxima condenação com um sentimento antecipado de desaprovo. 

  Alex molhou os lábios antes de falar e esboçou sua característica feição doce pela primeira vez naquele dia, mirando única e exclusivamente para ela conforme aproximava o microfone do rosto.  

 

  —Alguém já te disse que você está linda hoje, Ryujin? - Perguntou num tom meigo e rouco ao mesmo tempo. - Porque você está. 

  

  Ryujin se manteve da mesma forma. Por um momento nem ao menos chegou a piscar os olhos, tamanha fora o seu estranhamento quanto à fala de Alex. 

  Aquilo era mesmo sério? 

  Ela tinha ouvido direito ou era apenas mais uma de suas loucuras internas causando alucinações? Porque era bem provável de ser naquela altura do campeonato. 

  Mas não, não era. 

  Quando olhou ao redor, notou os sorrisos divertidos e sugestivos estampados nos rostos das garotas, até mesmo no de Minji e de alguns staffs. 

  —Ela está linda, vocês não acham? - Alex insistiu, dessa vez olhando para a equipe atrás do palco. Todos eles concordaram de imediato e abriram sorrisos ainda maiores quando ela pareceu agradecida pela ajuda. - Sim, com certeza está. - Foi a sua vez de sorrir. 

  Ryujin até então não tinha sentido mudanças em seu comportamento físico ou emocional, mas assim que viu Alex sorrir daquela forma, seu coração chegou a querer sair pela boca e seu estômago quase saiu voando junto às borboletas que ganharam vida após muito tempo adormecidas ali. 

  Que tipo de brincadeira ela estava fazendo com seus sentimentos, afinal de contas? 

  Na última meia hora, tudo o que Alex tinha feito foi a provocar com as mais infantis e desnecessárias críticas, e de repente a soltava um elogio daqueles?

  Como teve a pachorra de a fazer construir um imenso senso de raiva dentro de si, para depois simplesmente desmoronar tudo com aquelas poucas palavras? 

  "Só pode ser uma piada…" pensou com seus botões conforme o sorriso permanente de Alex continuava a causar grandes estragos em todo o seu corpo. 

  Em mais um de seus momentâneos devaneios de psicopatia, se imaginou usando aquele mesmo microfone que ela tinha em mãos para a agredir, dada o tamanho de sua fúria. Mas não se preocupe, isso passou após alguns momentos, pois passou a ocupar sua mente com outra coisa: essa tal "fúria" que passou a sentir. 

  Se engana quem pensa que aquela era uma frustração que seguia o padrão tradicional de seu significado. Diferente de segundos atrás, o seu descontentamento se dava unicamente pelo fato de que Alex conseguiu transformar em fumaça toda a raiva que tinha guardado em seu coração, deixando dentro de si apenas um crescente sentimento de euforia e pura paixão. E era exatamente isso que a tirava totalmente do sério, porque não conseguia pensar em uma realidade em que esse tipo de comportamento fosse coerente quanto à sua personalidade. Perguntou para si mesma quando é que tudo isso tinha acontecido; essa "coisa" de ter se transformado em uma completa banana ao ponto de deixar Alex ter tanto controle sobre seus sentimentos. 

  Até mesmo esse próprio sentimento de indignação passou a ser diluído numa onda de conformidade de sua consciência, que aos poucos passou a "aceitar" o inevitável. Tudo isso era demais para sua cabeça, onde seu orgulho protestava contrariamente à toda essa narrativa. 

  E esse nem era o pior, na verdade. 

  O pior, querendo ou não, era que ela se sentiu extremamente rendida ao trivial elogio que recebeu. Não soube dizer ao certo se era por Alex ter tido a brilhante ideia de dizer isso propositalmente no microfone para todos ouvirem, se era pelo tom doce e sincero que ela tinha usado junto à aquele sorriso que abalava suas estruturas, ou se era pela da junção de todas essas coisas. 

  Mas seja lá o que for, foi o bastante para que seu coração batesse mais forte contra seu peito e seus músculos faciais se movessem por conta própria como reação à tudo aquilo. 

  Ryujin não queria sorrir, não mesmo.

  Sorrir parecia ser a pior das ideias quando tudo o que menos pretendia era que Alex se sentisse parabenizada pelo seu ato. Mas foi quase que inútil tentar controlar seu corpo quando já havia perdido o controle sobre ele. 

  Com os staffs soltando algumas risadinhas à sua esquerda e as meninas sorrindo de maneira cúmplice à sua direita, Ryujin murchou os ombros e sorriu mesmo que contragosto. Mas não foi aquele sorriso. Numa última tentativa de resistência, conseguiu conter a vontade de sorrir de orelha à orelha, entrando numa espécie de meio termo, onde seu ato transmitiu tanto rendição quanto inconformidade. 

  Desse modo, subiu seus olhos para o teto e balançou a cabeça em completo estado de negação, pousando as mãos na cintura enquanto se deixava levar pela lamentável sensação de agrado e afeto. 

  Ela queria muito, mais do que tudo, poder estar a sós com Alex naquele momento. Para que pudesse a xingar de todos os nomes possíveis e, logo em seguida, a beijar sem parar até que enjoassem (se é que estavam sujeitas a enjoar). 

 

  Por que precisava ser tão radical quando se tratava de suas emoções?




 

[...]



 

  Meia hora depois:


 

  

  Ryujin olhou para seu reflexo no espelho num misto de bem estar e incomodidade.

  Massageou seus dedos uns contra os outros conforme a água escorria por suas mãos. 

 

  Depois do que Alex a disse, o clima no palco ficou bem mais descontraído para todos, e por isso a finalização do ensaio acabou sendo bem mais tranquila do que imaginou. Mas ela ainda estava brava; o bastante para querer distância. 

  Depois de uma certa enrolação por partes dos staffs para corrigirem os erros no retorno, enfim foi liberada da prática e assim decidiu que se afastaria de todos para esfriar a cabeça. 

  Não conseguia ignorar o elogio que Alex a tinha feito, tampouco a satisfação que sentiu, mas não se deixou entregar totalmente. Odiava como ela fazia parecer que era a pessoa mais doce do mundo, quando na verdade existia a possibilidade de só ter feito aquilo para a chantagear ainda mais. Essa dúvida a perseguiu por todo o caminho até o banheiro, e certamente não conseguiria ter uma conclusão tão cedo. 

  Ao menos já estava próxima de ir embora para casa, e ali poderia arranjar outros meios para escapar de sua realidade. 

  Então terminou de lavar suas mãos após bufar pesadamente e passou a conferir melhor a sua aparência no espelho. 

  Até aquele momento estava completamente sozinha no banheiro; ninguém tinha entrado ou saído. 

  Mas como sua sorte parecia ter o efeito contrário, o universo decidiu a presentear com a companhia mais (in)desejada de todas.

 

  À medida que penteava seu cabelo com os dedos, ouviu o barulho da porta à sua esquerda e por mero costume virou o rosto para saber quem era. 

  “Que ótimo…” ironizou internamente revirou os olhos assim que viu Alex adentrar o espaço, se obrigando a voltar a mirar seu reflexo num ato verdadeiramente arrogante. E sabendo que estava sendo observada, fez questão de exaltar todos os seus movimentos, desde suas expressões variando entre a soberba e a irritação, até o toque impaciente de seus dedos no cabelo.

 

  Então, para transmitir melhor o que sentia por dentro, se permitiu respirar fundo e pesado, lentamente inspirando e expirando o ar para fora de seus pulmões como se fosse de extrema necessidade.

 

  —Ai, você… - Alex lamentou num tom de voz inseguro e afobado. 

  Ryujin não teve muito tempo para tentar descobrir o que aquilo queria dizer, porque num piscar de olhos seu pulso fora segurado pela mão de Alex, que a puxou em direção à uma das cabines daquele banheiro vazio. 

  —Ei! - Reclamou quase que de imediato, mas não fez nada mais para a impedir de a arrastar porque estava ligeiramente curiosa para saber quais eram as suas intenções com isso. 

  Sua resposta não veio em formato verbal, mas acabou sendo um ato tão expositivo que não sentiu falta de uma explicação por meio de palavras. 

  Alex a guiou para dentro da cabine, fechou e trancou a porta para que ficassem "a sós", e desse modo a pressionou contra a parede para, sem nenhum suspense, colar seus lábios com fervor e até mesmo certa pressa.  

  Ryujin, por mais que estivesse ainda um pouco relutante, instintivamente pousou suas mãos acima dos braços que rodeavam seu corpo e fechou os olhos para uma melhor experiência. Mesmo sendo um singelo selar de lábios, foi o bastante para que seu corpo mais uma vez reagisse de várias formas, entre elas um forte e sonoro suspiro que soltou pelas narinas contra o rosto dela. 

  Pressionou seus dedos no toque para transferir um pouco de sua euforia, arranhando a pele dela mesmo que por cima do pano da blusa por pura necessidade de descontar em algo, e inclusive inclinou seu rosto para frente, intensificando o contato de seus lábios por estar ansiando por mais ao estar tendo tão pouco.

  Teve também de confessar para si mesma que estava começando a adorar e se apegar ao modo como Alex sempre a apertava em seus braços, pois isso a passava uma enorme sensação de aconchego e afeto que implicavam diretamente no meio de seu peito, gerando uma sensação que queimava da maneira mais deliciosa possível. 

    Mas não entendeu o porquê de ela ter tomado essa atitude tão de repente, se horas atrás parecia mais do que disposta a prosseguir com a greve.

 

  —Hum… - Alex murmurou em baixo tom, a presenteando com mais alguns demorados e carinhosos selinhos. - Ryujin… - Usou novamente de sua entonação de lamento. - Por que você não diz logo que sente por mim para eu poder te beijar de verdade? - A beijou mais uma última vez e afastou o rosto para que se olhassem devidamente. - Hm? - Sorriu fraco e colou ainda mais seus corpos. 

  Entre um segundo e outro, Ryujin tornou a esboçar descaso em sua face e rolou os olhos até o canto da parede, cruzando os braços para não mais retribuir o carinho. 

  —Por que você não para com essa sua chantagenzinha para poder me beijar de verdade? - Reformulou a pergunta numa entonação notavelmente ácida. 

  —Porque eu quero te ouvir falar.

  —Olha, eu não sou uma especialista em relacionamentos, ma…

  —Nós temos um relacionamento? - A interrompeu com sorrisinho nos lábios. 

  Ryujin a olhou de rabo de olho com desdém e preferiu ignorar o questionamento. 

  —Enfim… - Exaltou sua fala para comunicar que não queria ser interrompida de novo. - Eu não sou uma especialista, mas tenho certeza que esse tipo de coisa precisa ser dito espontaneamente, e não sobre pressão e chantagem, como você está fazendo. 

  —Concordo, mas existem exceções à regra, que são as pessoas como você.  

  —Como eu? - A olhou diretamente, esboçando ofendimento antes mesmo de ouvir a classificação que ganharia. 

  —Sim, pessoas vaidosas e orgulhosas. 

  —Oras, vaidosa é você! - A acusou com as sobrancelhas arqueadas. - Que precisa se reafirmar sempre, exigindo que as pessoas digam o quão importante você é para inflar esse seu ego. 

  —Eu posso até ser, Ryujin… - A apertou ainda mais entre seus braços para a provocar com a proximidade. - Mas a minha vaidade nem ao menos chega a se comparar à sua. 

  —Por acaso eu saio por aí jogando meu charme para cima de todos para conseguir uma auto aprovação? 

  Alex sorriu fraco e baixou o olhar por alguns momentos, como se estivesse imaginando se era assim que Ryujin a enxergava. 

  —Não, você não faz isso. - Continuou com aquele mesmo sorrisinho. - Na verdade, é exatamente o contrário. Seu tipo de vaidade é o zelo em excesso… você protege todos os seus sentimentos e guarda eles para si mesma, porque se acha boa demais para dizer que está apaixonada, mesmo que te sufoque. 

  —Apaixonada?! - Quase gritou numa divisão entre escárnio e descrença.

  —Sim. 

  —Meu Deus, você… - Soltou uma risada cética. - Definitivamente não está bem.

  —Pois eu discordo. Sei muito bem do que falo… 

  Ryujin revirou os olhos e negou como se tivesse ouvido algo fantasioso e incoerente. 

  —Por que você não consegue aceitar a verdade, hein? - Encostou a cabeça na parede e a olhou com um fingido desinteresse. - Eu não estou apaixonada por você, acredite.

  Alex deixou seu sorrisinho crescer um pouco mais ao ouvir isso, e então explorou cada canto do rosto dela com seus olhos antes de pensar em responder. 

  Prendeu o lábio inferior entre os dentes e gastou grande parte de seu tempo olhando para a boca à sua frente, e assim Ryujin também desceu seus olhos para a boca dela numa quase que hipnotizante atração. 

  —Apenas pessoas apaixonadas sentem ciúmes, Ryujin.  

  —E de onde você tirou essa loucura de achar que eu sinto ciúmes de você? 

  Alex a mirou com um ar de tédio. 

  —Sério mesmo que vai continuar batendo nessa tecla depois do teatro que fez hoje pela manhã? - Sua entonação deixou de ser bem humorada para se tornar franca e honesta. 

  —Não estou lembrada disso… - Franziu o queixo e deu de ombros. - Só me lembro que foi você quem se mordeu de ciúmes. 

  —Hm… - Assentiu e soltou algumas risadinhas num misto de divertimento e incredulidade, parecendo já um pouco conformada. - Por falar nisso, onde estão aqueles números? - Moveu sua mão direita até o bolso do moletom dela, tentando encontrar os tais papéis. - Vou jogá-los fora agora mesmo. 

  —Tarde demais, Alexia. - Exalou superioridade. - Eu já adicionei todos os números, e inclusive já até mandei mensagem para alguns. 

  Alex murchou os ombros e desistiu de procurar pelos papéis ao ouvir isso, voltando a posicionar sua mão nas costas dela. 

  —Mesmo…? 

  —Mesmo! - Formou um bico mimado nos lábios e parabenizou a si mesma por ter contado uma mentira crível dessa vez. 

  —Oh… 

  Ryujin se sentiu um pouquinho culpada quando viu a expressão parcialmente decepcionada dela… mas só um pouquinho mesmo. 

  Não o bastante para confessar que era apenas mais uma de suas mentiras. 

  —E, aliás… - Usou de um mais atrevido para dar continuidade ao assunto. -  Esse seu ciúmes todo diz muito sobre o que você sente, certo? Se seguirmos essa sua linha maluca de raciocínio.

  Alex remexeu os ombros por ainda parecer um pouco desconfortável quanto à resposta anterior, mas após alguns segundos acabou por voltar ao normal ao recuperar sua postura. 

  —Está sugerindo que eu estou apaixonada por você? 

  —Sim… 

  Alex balançou a cabeça muito lentamente em positivo conectou seus olhos aos dela com sua costumeira intensidade, se calando por alguns segundos como se estivesse pensando a respeito. 

  Ryujin não quis admitir para si mesma que tinha ficado apreensiva de repente devido ao suspense da pergunta. Digamos que ela não esperou que fosse mesmo ser levada a sério, e para disfarçar sua tensão preferiu justificar o embrulhar em seu estômago como uma má digestão do almoço de mais cedo. Ela não sabia quem diabos queria enganar com aquele pensamento, pois era somente ela e sua consciência ali dentro, mas se manteve nessa mesma ideia até que o silêncio fosse preenchido novamente. 

  —Ham… acho que eu concordo. - Adotou seriedade tanto no olhar quanto na voz. 

  —C… - Quase engasgou. - Concorda? - Perguntou num fio de voz extremamente oscilante. 

  Por mais que soubesse da possibilidade de essa ser a resposta, de qualquer forma acabou sendo pega desprevenida, e assim seu estômago acabou por se revirar ainda mais por puro nervosismo, assim como seu coração fez menção de estar preparado para surtar a qualquer momento. 

  Olhando diretamente naqueles olhos quase negros pelo demonstrar genuíno de afeto, se sentiu perdida e sem saber o que fazer, tendo como único norte a opção de esperar por uma resposta. A abafada voz em sua mente que cantava a probabilidade de receber uma confirmação era torturante, e quando Alex tomou ar para falar, cada pequena célula de seu corpo se tensionou num pico de expectativa. 

  —Sim… - Transformou toda a sua forma de a mirar, usando de um tom doce de admiração tanto na voz quanto em sua expressão, transbordando em ternura somente com suas íris. Isso por si só já era uma senhora resposta, mas optou por validar com palavras para que não restassem dúvidas. - Acho que estou mesmo apaixonada por você, Ryujin. 

  



 

  Você. 

  Isso, você mesmo que está lendo.

  Me diga uma coisa.   

  Já chegou a experimentar da sensação de desastre emocional?

  Aquela que se assemelha à uma descarga elétrica que percorre todo o seu corpo, paralisando todos os seus órgãos por uma fração de segundo, para que só então você volte à realidade e se sinta completamente desnorteado e alheio às coisas ao redor…? 

  Aquela eletricidade que nada tem a ver com a física, e sim com a paixão e todos os seus misteriosos meios de ação em nosso corpo e mente. 

  Que nos atinge como um soco no meio da cara, e que ao invés de te fazer sentir dor, te faz sentir um imenso prazer. 

  E que também te faz pensar que existem centenas de cubos de gelo amontoados em sua barriga, tamanho os tremores gélidos que você sente ao ouvir meras palavras. 

  Claro, isso sem contar o seu estado mental, que nesse ponto chega a ser resumido à mentalidade de uma criança de dois anos, que mal consegue formular uma frase sem se atrapalhar com as sílabas e as noções de coerência. 

  Já chegou a sentir algo parecido com isso?

  Espero muito que sim. Pois só dessa forma você vai conseguir entender o que se passou dentro de Ryujin naquele momento. 

  Seu processo de assimilação daquela declaração fora quase que fielmente traçado pela mesma linha que foi citada anteriormente. De maneira episódica, seu corpo reagiu de diferentes formas a cada segundo. 

  No primeiro momento, depois de repetir a frase em sua mente para a converter, Ryujin sentiu como se uma onda de choque tivesse a atingido em cheio, atordoado cada terminação nervosa de seu sistema e a deixando em completo estado de alerta somente por ter se dado conta do que se tratava. Depois, seus pulmões, coração e cabeça se juntaram no protesto mais rápido do mundo, deixando de cumprir com suas funções por um único segundo, causando estrago o suficiente para a enlouquecer ainda mais. E por isso ela foi levada ao terceiro e último estágio, onde suas faculdades mentais foram abaladas ao ponto de não ter conseguido pensar em nada diferente de "A Alex está apaixonada por mim". 

  Talvez fosse esse um tipo diferente de ascensão psicológica. 

  Mas, por favor, não entenda errado! Descrevendo dessa forma, pode até parecer que não tenha sido uma sensação prazerosa e muito o menos desejável, porém é aí que você se engana. 

  Com tudo isso tendo acontecido num intervalo de três míseros segundos, Ryujin sentiu como se tivesse sido bom demais para ter durado tão pouco, e mesmo ainda sentindo a pulsante sensação de euforia correndo por suas veias, desejou ter aproveitado aquilo um pouco mais, de tão prazerosa que fora a sua reação. 

  Mas aquilo já não voltaria mais, e o contraste entre o frio e o calor que agora assolava seu ventre servia como um ótimo e permanente substituto. 

  Assim, ela pôde voltar a se concentrar no que realmente importava: Alex. 

  A assistindo sorrir tão docemente, sentiu uma imensa vontade de a agarrar e a sufocar com todos os beijos e carícias do mundo. 

  Mas não conseguiu realizar o próprio desejo, porque ficou assustada. 

  Assustada com o que aconteceria em seguida… ou melhor, com o que deveria acontecer em seguida. 

  Alex parecia extremamente confortável com toda a situação, e para a surpresa de Ryujin seu olhar não demonstrava nenhum tipo de pressão ou expectativa para que dissesse o mesmo. Ela estava apenas… satisfeita. 

  Mas não se tratava sobre a pressão de Alex, e sim sobre a sua própria pressão. Por uma concepção de que deveria ser recíproca, sua mente começou a martelar a ideia de que deveria dizer que sentia o mesmo, e isso confundiu toda a sua sanidade restante, já que seu orgulho se posicionou duramente contra esse conceito, causando uma enorme briga interna apesar de já desconfiar que sim, sentia o mesmo.   

  E enquanto isso acontecia, ela ainda tinha que lidar com a realidade à sua frente, onde, se não dissesse algo nos próximos cinco segundos, estaria sujeita a se equiparar a uma psicopata, já que estava fitando Alex em completo silêncio sem nem ao menos piscar os olhos. 

  E foi no desespero por botar algo para fora, que Ryujin acabou soltando isso:

  —Err… eu… eu s… - Fechou os olhos e sacudiu a cabeça. - Fi… não, eu não… - Juntou as sobrancelhas preocupadamente quando Alex abriu um maior sorriso e soltou mais algumas de suas risadinhas. 

  —Está tudo bem? - Arqueou uma sobrancelha num tom leve de descontração. 

  Ryujin se colocou a pensar sobre como a injustiça trabalhava em sua vida, pois parecia a coisa mais absurda do mundo ver Alex nem ao menos tremer ou esboçar algum nervosismo enquanto ela própria se encontrava daquela forma. Chegava a beirar o desrespeito. 

  Como conseguia ser tão equilibrada? 

  Era simplesmente loucura. 

  —Ham… uhum. - Concordou por murmúrios. 

  —Ótimo. - Sorriu abertamente. - Então, agora que já deixei isso claro, quero que você ao menos me dê um agrado. 

  —Hm… - Voltou a murmurar e quase que inconscientemente concentrou a maior parte de seu foco em seus pensamentos, não conseguindo desapegar de seus intermináveis diálogos sobre o assunto. 

  —Quero que admita que sente ciúmes de mim. - Adotou uma expressão mais galante. 

  Ryujin não chegou a vê‐la e nem sequer a escutou; suas íris estavam estacionadas nos ombros dela conforme vagueava pelos mais diversos devaneios distraídos de sua mente, pesando os prós e contras de cada lado. A única coisa que ainda a prendia à realidade era uma terceira e bem mais baixa voz, que a informava que deveria responder o que lhe havia sido dito mesmo que não tivesse entendido bulhufas.

  —Não… - Soltou sem nem ao menos pensar ou se importar em descobrir o que diabos tinha respondido. 

  —Ah, qual é, Ryujin… não vem com essa. - Reclamou sem nem ao menos notar que ela estava absorta. 

  —Hm… - Coçou o maxilar ainda fitando a costura da blusa dela. 

  

  Alex remexeu os ombros e franziu as sobrancelhas, questionando internamente o porquê de não estar mais sendo olhada nos olhos. Dessa vez acabou usando de um tom mais provocativo e sério para chamar a atenção dela, procurando arrancar a verdade dela a todo custo. 

  —Se não sente ciúmes, o que acha de eu convidar Areum para jantar essa noite? Hm?! - Sorriu confiante numa quase absoluta certeza de que isso a irritaria. 

  Mas, não. 

  Essa foi a vez de Alex experimentar da esquisita sensação de quebra de expectativas. 

  —Uhum… 

  Entenda, naquela circunstância em específico Ryujin não tinha nenhuma intenção de fazer pouco caso do que Alex tinha a dizer, mas simplesmente não conseguiu trabalhar sua mente para superar a declaração de momentos atrás, e isso a tirou por completo de qualquer senso palpável da vida real. Desse jeito permitiu que seu retorno agisse no modo automático até que conseguisse controlar a pane em sua cabeça. 

  Se ela estivesse prestando ao menos um por cento de atenção no que lhe estava sendo dito, provavelmente já estaria aos berros por puro ciúmes, porém como seus ouvidos se vedaram totalmente para o exterior, acabou concordando por ser a resposta mais provável de não render contestações. 

  Mas aquela não era uma boa hora para operar mecanicamente. Porque, diferente dela, Alex estava muito bem centrada no presente momento, e por falta de poderes sobrenaturais não conseguiu ver o que se passava na sua cabeça para compreender o que estava acontecendo de verdade. 

  E assim, nesse inconveniente momento de desconexão que nenhuma delas percebeu, Alex se sentiu um pouco decepcionada com a resposta curta que ganhou. 

  Pois afinal, por que Ryujin tinha um tom tão desanimado na voz e um olhar alheio que nunca tinha mostrado antes? 

  —"Uhum"? - Aos poucos foi desfazendo seu sorriso. - Quer dizer que… eu posso chamar a Areum para sair? - Juntou as sobrancelhas e passeou com suas íris por todo o perfil dela, não se sentindo mais tão satisfeita por ter revelado seus sentimentos. Tinha dito algo fora de hora ou indesejado…? Quem sabe… Não sabia dizer ao certo. Mas acabou tendo a ligeira suspeita de que, talvez, ela não tenha gostado tanto, já que nem ao menos respondeu sua pergunta; continuou em silêncio, encarando seu ombro esquerdo com pupilas desfocadas. - Ryujin…? - Aliviou o aperto de suas mãos ao redor dela num processo de afastamento, segurando sua cintura num toque quase que inexistente. 

  E foi assim Ryujin “acordou”; quando o seu corpo já não estava mais sendo acarinhado.

  —Hm…? - Levantou seu olhar num ar de confusão. 

  —Está dizendo que eu posso fazer isso? 

  Ryujin entrou em um grande dilema. 

  Iria confessar que não tinha escutado coisa alguma nos últimos dois minutos ou apenas seguiria o fluxo natural das coisas? 

  Querendo ou não, ela se sentiu um pouco curiosa para saber o que tinha dito para que Alex tivesse uma feição tão negativamente neutra na face, mas ao mesmo tempo julgou que seria ainda pior revelar que as palavras dela até ali tinham sido em vão. 

  Num surto de suposta empatia, sua curiosidade acabou pesando bem menos em sua decisão, o que a levou a escolher continuar fingindo que estava tudo certo e passaria a dá-la a devida atenção dali em diante. 

  Então assentiu numa pose franca e a olhou firme nos olhos para tornar sua atuação mais crível. 

  —Sim, pode… - Tentou disfarçar com um sorrisinho. - Inclusive, acho que você deve fazer isso. - Seu tom foi firme e encorajador.

   Em sua inocente concepção, imaginou que Alex merecia toda a sua aprovação seja lá para qual finalidade, pois ela parecia linda demais para recusar. Isso sem contar as batidas de seu coração que naquela altura já estavam vergonhosamente dolorosas em seu peito.  

 

  Alex piscou seguidas vezes e engoliu o ar conforme a sensação de desconforto crescia aos poucos em seu peito. 

  Se questionou sobre o por que diabos Ryujin parecia tão tranquila com toda aquela história, se até algumas horas atrás tinha ficado furiosa com a implícita possibilidade de sair com Areum. E a única justificativa plausível em sua consciência se dava pelo fato de tê-la dito que estava apaixonada. 

 Talvez não tenha sido uma boa ideia dizer isso. E talvez também tenha revelado cedo demais, ou se equivocado ao pensar que Ryujin veria isso como algo bom, porque claramente não viu, já que estava aprovando sua falsa intenção de querer sair com outra pessoa.  

  E isso definitivamente não era um bom sinal. 

 

  —Agora você feriu um pouco meus sentimentos, admito... - Soltou fracas e descrentes risadinhas na intenção de mascarar seu visível desencanto, mas seu tom, por mais que esforçado para parecer bem humorado, acabou demonstrando uma incomum insegurança. 

  Desviou o olhar para a parede para depois retirar por completo suas mãos do corpo dela, se afastando em um passo. 

  Ryujin arqueou uma sobrancelha para transmitir sua incompreensão, estranhando muito o que estava vendo: Alex a dando as costas para abrir a porta e se retirar daquele pequeno espaço com um ar de descontentamento. 

  —Eu feri seus sentimentos? - A seguiu para fora dali e parou de andar quando ela também parou, esperando ser encarada de volta para prosseguir. - Tá maluca? - Perguntou ainda com seu sorrisinho, imaginando que aquilo era algum tipo de brincadeira ou charme. 

  Alex franziu o cenho e a mirou nos olhos com a mesma esperança de ser algum tipo de gozação, mas ao ver que ela não foi nem um pouco sarcástica, começou a se arrepender por tê-la seguido até ali há alguns minutos. 

  —Eu digo que estou apaixonada por você, e logo depois você diz que eu deveria sair com a Areum... - Molhou os lábios e olhou ao redor, procurando pela coerência da coisa. - E eu sou a maluca da história? - Começou também a se sentir levemente ofendida pela feição da garota, que ainda não parecia estar a levando a sério. 

  Ryujin soltou uma alta e irônica risada, estendendo uma mão no ar por estar se sentindo ainda mais confusa. 

  —Sim, você é a maluca da história. - Afirmou com grande ênfase. - Porque eu não me lembro de… - Parou de falar numa forçada interrupção de Alex, que não a esperou terminar de falar para a dar as costas de novo e seguir até a outra porta. Num ímpeto de querer ser ouvida, a alcançou em passos apressados e segurou em seu antebraço. - Ei… - Virou o corpo dela em sua direção e a encarou da cabeça aos pés, agora tornando sua expressão mais séria ao ver que ela não parecia mesmo estar atuando. 

  Alex se manteve em silêncio por uma fração de momento, mas não teve o tato suficiente para continuar lidando com as feições infantis que estava recebendo. 

  Com muita calma e delicadeza se soltou do toque dela em seu braço, usando sua outra mão para abrir a porta. 

  —A gente se fala depois, Ryujin. 

  Foi tudo o que disse antes de sair dali, deixando claro que não queria ser acompanhada quando fechou a porta logo em seguida. 

 

  Ryujin abriu e fechou a boca várias vezes, encarando a superfície clara à sua frente enquanto tentava raciocinar o que estava se passando. 

  Cogitou ir atrás de Alex e tentar entender a situação no caminho, mas acabou ficando tão pensativa que não conseguiu colocar sua ideia em prática. Então o que lhe restou foi tentar procurar em sua memória de curto prazo alguma evidência que a ajudasse a resolver aquele quebra cabeças. Teve a impressão de realmente ter ouvido o nome de Areum nas falas de Alex, mas a imersão em sua bolha fora tão intensa que, mesmo colocando todas as suas energias nisso, não conseguia se recordar de nada que lhe havia sido dito. 

  Consequentemente, as únicas peças disponíveis foram as que a própria Alex havia repetido momento atrás. Mas… acreditar naquilo foi um processo um tanto quanto complicado. Sabia que ela não era mentirosa ou coisa do tipo, porém era quase que impossível não entrar em estado de negação, porque nem na pior das possibilidades conseguia se ver concordando com um absurdo daqueles. 

  Vamos colocar da forma mais literal e abreviada possível: Alex e Areum, propositalmente sozinhas e dividindo o mesmo metro quadrado num clima de flerte. Essa era a exata descrição de um dos piores pesadelos de Ryujin; ponto. Agora, como ela conseguiria aceitar em sua cabeça que tinha concordado com isso? Por mais alienada que tenha ficado, se imaginou incapaz de fazer algo assim. 

  Mas, numa completa discordância, foi o que Alex a disse que tinha feito. E isso bagunçou tudo o que acreditava ser verdade. 



 

  Era possível mesmo que tenha ficado tão absorta que acabou contrariando todo o seu modo natural de agir? 



 

… 


 

  Quinze minutos depois: 



 

  —Unnie… - Ryujin se aproximou de Yeji discretamente enquanto todas andavam pelo estacionamento. - Você viu a Alex? 

  —Não, não vi. - A olhou numa feição curiosa. - Por que? 

  —Preciso falar com ela… - Olhou ao redor com grande atenção, tentando achar um certo carro preto em meio à tantos outros iguais. Alisou a alça de sua mochila com certa preocupação e mordeu o lábio inferior por puro nervosismo. Precisava encontrar Alex o mais rápido possível.  

  

  Nesse quarto de hora que havia se passado, acabou tirando algumas importantes conclusões que influenciavam diretamente na frustração que estava sentindo. 

  A primeira e mais óbvia delas era que, gostando ou não, tinha concordado cegamente com a desvairada ideia de Alex e Areum saírem juntas. Ela ainda não tinha se recordado desse momento, muito menos conseguiu entender como diabos Alex acabou chegando nesse tópico, mas decidiu por aceitar de uma vez sem questionar, porque lembrar ou não lembrar tinha um impacto quase que nulo no que realmente importava. 

  A segunda, digamos que um tanto quanto controvérsia, era que passou a considerar Alex como parcialmente culpada pelo que tinha ocorrido, se levando em conta que soltou sua confissão de paixão sem nem ao menos preparar o terreno antes, por consequência a fazendo entrar em estado de choque e total renúncia da realidade. 

  (Boatos dizem que Ryujin se forçou a acreditar nessa dedução para que não se sentisse tão singularmente responsável…) 

  A terceira e última conclusão, sendo essa a mais problemática de todas, era totalmente baseada na anterior: Alex estava apaixonada por sua pessoa.

  Passou tanto tempo tentando encontrar motivos para dividir a culpa, que acabou se esquecendo da única coisa que realmente importava. E quando se deu conta disso, já estava caminhando ao lado das garotas pelos corredores, iniciando a jornada de volta para casa e temendo que talvez fosse um pouco tarde para tentar resolver. 

  A questão era a seguinte: Alex, em seu transcendente e costumeiro estado de sinceridade e doçura, confessou seus sentimentos com todas as palavras sem nenhum tipo de hesitação. E, numa ingrata resposta (mesmo que não intencional), Ryujin acabou focando em si mesma num momento delicado demais para que cometesse esse pecado. E, não contente com isso, vomitou as mais aleatórias respostas que levaram à circunstância atual, quando, na verdade, deveria ter dito para Alex como se sentia também. 

  Ela, por mais que fosse orgulhosa, era muito franca consigo mesma, e sabia muito bem que estava sentindo todos os sintomas de uma doença chamada paixão. Uma vez tendo encontrado esse vergonhoso rótulo para suas emoções, decidiu que guardaria para si por achar ser o certo a se fazer ao menos por enquanto. 

  Mas, vendo Alex assumir aquilo com tanta satisfação e liberdade, sentiu um louco desejo de jogar tudo para o alto e também declarar sua reciprocidade. 

  Mas nada saiu. 

  Nada fez além de entrar em estado vegetativo, assim perdendo a chance de a proporcionar o mesmo turbilhão de sensações. 

 

  E agora, que estava a dez metros de distância do carro que a levaria de volta para casa, se sentiu quase que sem saída. 

  Não era o fim do mundo, óbvio que não. 

  Ninguém morria de amor, muito menos por um desentendimento que uma simples conversa solucionaria. 

  Mas ela não queria ter que discutir isso através de mensagens, ao mesmo tempo que também não queria ter que deixar Alex dormir com aquele peso desnecessário até que o dia de amanhã chegasse e pudessem conversar pessoalmente. 

  Até porque… estava sujeita a perder a coragem que estava alimentando para declarar seus sentimentos. 

 

  Então ela precisava urgentemente a encontrar naquele estacionamento. 

  


 

  —Aconteceu algo? - Yeji copiou o ato de Ryujin e também passou a olhar ao redor para a ajudar a procurar. 

  —É, mais ou menos… 

  —Você não vai agarrar ela no meio do estacionamento, certo? - Perguntou num tom preocupado. - Por mais que seja romântico, já vi pelo menos dois fotógrafos aqui… 

  —Não, não vou… 

  "Mas acho que teria feito caso você não tivesse me lembrado..." completou internamente. 

  —Okay. - Soltou uma risadinha e insistiu em auxiliar na procura mesmo que já estivessem em frente ao carro que as levariam. - Oh! - Estreitou os olhos e focou numa região à direita, apontando discretamente. - Não é ela ali? 

  Ryujin seguiu a direção indicada e encurtou seu foco alguns metros à direita, e na mesma rapidez que sentiu um pico de ansiedade, também ganhou grandes doses de desencanto. 

  Ver Alex ali foi como uma ilusória sensação de contentamento, porque ela não estava sozinha. Estava parada ao lado de seu carro, conversando justamente com Areum e numa distância pouco formal. 

  —É, é ela… - Respondeu com certo desânimo, não conseguindo desviar seus olhos daquela visão nem mesmo para olhar Yeji. 

  Alex ainda não tinha notado que estava sendo assistida, e por isso seus olhos estavam exclusivamente dedicados à Areum, que mais uma vez estava falando enquanto ela se mantinha calada, somente ouvindo. 

  Ryujin sentiu todo o seu estômago embrulhar ao assistir os dedos de Areum invadirem o espaço pessoal dela para brincar com o pano de sua blusa como se tivesse liberdade para tal. Tudo piorou quando viu Alex não a impedir de continuar, onde tudo o que fez foi descer seu olhar para a assistir fazer aquilo. Ela não tinha aquela característica e encantadora feição na face; estava esboçando o mesmo descontentamento de quando havia deixado o banheiro quinze minutos atrás. 

  Mas isso ainda incomodou Ryujin. 

  Pois, se Alex realmente não gostava de Areum, por que estava permitindo aquela aproximação tão íntima? 

  Era ridiculamente contraditório, ainda mais se levando em conta que elas nem ao menos eram amigas para que isso fosse justificado de alguma forma. 

  Não poderia nem ao menos teorizar sobre ser uma implicância planejada para a fazer ciúmes, porque Alex não fazia ideia de que tinha espectadores para o seu show. 

  Então sim, infelizmente estava acontecendo. 


 

  Ryujin cravou suas unhas com força na alça da mochila, sentindo que estava mais enciumada do que qualquer outra vez anterior. 

  Prendeu o ar dentro dos pulmões e continuou a digerir contragosto aquela cena. 

  Agora era Alex quem tinha o momento de fala, e até a forma como ela olhava Areum diretamente nos olhos conseguiu a deixar inquieta. 

  Sua vontade era de ir até lá e se colocar no meio delas para mostrar com todo o seu egoísmo que a vaga no coração de Alex já estava preenchida, mas, como a própria Yeji havia ressaltado, existiam câmeras curiosas ao redor, e não poderia colocar a imagem do grupo em jogo por causa de ciúmes, por mais que fosse um senhor ciúmes. 

  Entretanto, ela poderia as amaldiçoar a vontade em sua mente, e acabou fazendo isso com grande empenho, se quer saber. Além de que também pediu para qualquer um que estivesse no céu que aquela interação chegasse ao fim, prometendo agradecer caso acontecesse. 

  Nesse meio tempo, como se suas preces tivessem sido ouvidas pelas forças do inferno, Areum não apenas se aproximou mais, como teve seu braço acariciado pela mão de Alex. 

  "Você não está fazendo isso, Alexia…" negou com firmeza, mesmo que estivesse vendo aquilo quase que de camarote. 

  —Ei… - Sentiu a mão de Yeji se pousar em seu ombro. - Está tudo bem? 

  Ryujin continuou presa àquela cena, propositalmente não respondendo à pergunta até que tivesse certeza. 

  Estava quase pronta para entrar de uma vez naquele carro para que se poupasse de um maior sofrimento, mas as coisas acabaram tomando um rumo diferente dessa vez. 

  Para o agrado de uma das facetas de Ryujin, depois de já ter soltado o braço de Areum e dado um passo atrás para se afastar, Alex comprimiu os lábios e começou a olhar ao redor por puro costume. Nesse intervalo, seus olhos acabaram se encontrando aos dela quase que como dois ímãs em processo de atração. 

  Tanto Ryujin quanto Alex transmitiram desagrado no olhar, igualmente intensos e motivados por diferentes causas. E claro, como era de costume, nenhuma delas sentiu a necessidade de quebrar a conexão de suas íris. 

  Areum, notando a atenção fixa de Alex em outro lugar, virou ligeiramente seu corpo para conferir o que era, assim também a encontrando. Ryujin não conseguiu evitar a olhar de volta, pois seu corpo a obrigou a demonstrar ao menos um pouco de sua raiva, e desse modo usou de seu tom mais arrogante e desdenhoso para a fitar. 

  Areum pareceu ter ficado um pouco confusa com aqueles olhos a queimando com tanto empenho, mas aos poucos começou a entender melhor a situação, passando a demonstrar certo ofendimento na face. 

  Ryujin não deu a mínima para isso, pois pouco acrescentaria na sua vida. Mas olhar para alguém que aprendeu a não gostar acabou a dando certa ojeriza, e por essa razão escolheu voltar seu foco para algo bonito, por mais que aquela beleza estivesse a dando nos nervos no momento.  

  Mais uma vez sendo exposta aos olhos de Alex, sentiu que grande parte de sua coragem já tinha sido substituída pela fúria causada pelo ciúmes, e assim já não se sentiu mais interessada em continuar naquele jogo bobo de olhares que apenas mostrava o quão infantis elas eram. 

 

  Como se não bastasse o sentimento de culpa, agora ela teria de lidar também com o crescente desapontamento em seu peito. 

 

  —Mais do que bem. 


 

  Enfim respondeu à pergunta de Yeji, dando as costas para Alex sem pensar duas vezes antes de entrar no carro, desejando que ao menos pudesse ir embora dali o mais rápido possível. 

  

  


 

[...] 



 

  03:30 



 

  Ryujin fechou os olhos com calma, largando seu celular de qualquer forma ao lado de sua cabeça no colchão. Respirou fundo ao menos três vezes, tomando cuidado para não acordar Yeji, que já havia pegado no sono há algumas horas.

  Não estava conseguindo dormir. 

  Mesmo com os olhos pesados pelo cansaço, não pôde nem ao menos cogitar ser enfeitiçada pelos encantos de uma noite de sono.

  Em sua mente os pensamentos chegavam a transbordar; todos eles tão carregados de negatividade que fizeram sua cabeça doer de modo literal, a impedindo de conseguir ter sucesso em algumas de suas frustradas tentativas de dormir. 

  Desde que havia deitado na cama em mais uma de suas reflexões com o teto, Alex se sobressaiu em meio à todas as outras preocupações. O pesar agudo e ciumento em seu peito a cada segundo aumentava, e a cada segundo a fazia questionar de que lado seu corpo e mente de fato estavam. 

  Não sabia o que Alex e Areum tinham dito uma para a outra, e também não sabia o que elas fizeram depois que foi embora, mas tinha um certo pressentimento ruim dentro de si que a fazia ponderar entre as piores possibilidades para aquela narrativa. E isso apenas piorava ainda mais o seu estado. 

  Não tinha noção de como lidar com o fato de que, talvez, a sua reação no banheiro (ou a falta dela) quanto aos sentimentos de Alex tenha influenciado diretamente no que viu no estacionamento. E, se fosse mesmo, se julgou a mais idiota de todos os idiotas por ter causado esse desentendimento todo. 

  Mas, por outro lado, Ryujin também não conseguia encarar uma realidade onde tivesse que tratar com um ato tão infantil vindo de Alex.

  Isso a enchia de um sentimento torturante de indignação e raiva. Quanto mais pensava sobre o que tinha visto, mais pequeno ficava o espaço que seu coração tinha para bater em seu peito, e por mera consequência, mais irracionais e pessimistas se tornavam seus pensamentos e emoções, a dando uma mínima margem para tentar encarar as coisas com a lente da maturidade. 

  Desse modo, tentar convencer a si mesma de que deveria esperar o dia seguinte chegar para que assim pudesse esclarecer as coisas, era quase como tapar o sol com uma peneira; inútil. Mesmo que inconscientemente, já havia sentenciado as mais precipitadas das conclusões, antecipando a chegada dos sentimentos que o ciúme trazia como brinde. 

  E isso era deveras auto explicativo para o estado que se encontrava ali, em sua cama. 

  Pois afinal, era impossível dormir quando sua mente martelava sem parar das mais inocentes até as mais perturbadoras questões em seu subconsciente.

  Se perguntou se ela tinha colocado John Mayer para tocar enquanto dirigia tediosamente de volta para casa após o trabalho. Quis saber se ela tinha comido, se tinha tomado banho, se tinha dado atenção para Luca em seu tempo livre… 

  Se tinha pensado nela… 

  Queria saber tudo, pois passou a se interessar pelos mais simples e cotidianos atos de Alex conforme sua paixão evoluía, e a imaginar realizando tarefas triviais era uma boa forma de se respirar em meio ao mar de indagações que só fazia a afogar. Mas, lá no fundo, sabia que também estava tendo esses questionamentos porque desejou do fundo de seu coração ter a certeza de que ela estava totalmente sozinha naquele apartamento… se é que estava nele.  

  Por último, e definitivamente mais importante, quis saber acima de todas as coisas se ela também estava tendo seu sono roubado. Queria muito imaginar que sim, que ela estivesse compartilhando da mesma aturdida sensação de insônia forçada. E queria também ser a razão de cada segundo perdido dela; não queria dividir seu mérito com uma vizinha tarada ou qualquer outra preocupação que servisse como justificativa. 

  Queria ser o único e exclusivo motivo pelo qual Alex estivesse acordada naquele horário. 

  E por isso, acabou usando seu celular para desvendar esse mistério. Com meia dúzia de toques na tela, se viu analisando o perfil dela no aplicativo de mensagens. Teve uma grata surpresa ao ver que ela estava online naquele momento, assim apreciando mais uma de suas sensações de desafogamento. 

  Por costume, se permitiu encarar a foto dela em seu contato, e com um suspiro apaixonado entalado na garganta, demorou longos e masoquistas segundos admirando-a. 

  A amaldiçoou por ser tão bonita. 

  Aqueles traços beiravam a perfeição, e na circunstância que seu coração vivenciava ali, eram características dignas de condenação. Principalmente porque, horas atrás, a dona daquela beleza tinha confessado ser sua amante. 

  Os arrepios que teve ao se lembrar disso pela centésima vez não foram, nem de longe, justos ou piedosos. Mas serviram para a acordar de seu transe, e assim percebeu que de nada adiantaria continuar olhando para aquela imagem se não fosse fazer nada a respeito. Encarar o contato dela na tela de seu celular era nada mais do que uma opção tentadora que só lhe faria mal com o passar do tempo. Mais uma vez, inútil. 

  Não queria alimentar ainda mais o fogo ciumento da paixão dentro de si, e se deixar seduzir pela beleza da razão de tudo aquilo, indiscutivelmente não era a melhor maneira de se fazer isso.

  Então tentou se ocupar com as outras questões que também a deixavam nervosa, como o showcase que estava por vir ou a recepção do público para com o programa que iria ao ar no dia seguinte. No começo foi um pouco difícil, já que quase sempre acabava voltando para Alex sem nem ao menos se dar conta, mas não estava disposta a dar a braço a torcer tão facilmente. E, para a sua surpresa, a insistência de continuar batendo na mesma tecla acabou funcionando muito mais do que bem, mesmo que tenha demorado dezenas de minutos para tal. 

  A satisfação pelo trabalho mais uma vez conseguiu a tirar um pouco da realidade, tanto que passou a sentir até uma estimulante ansiedade no pé de sua barriga. Assim, mesmo não conseguindo dormir, se sentiu um pouco melhor pela distração que teve.

  Impulsionada por essa euforia, mais uma vez usou seu telefone para entrar nas redes sociais e bisbilhotar o que os fãs e pessoas em geral tinham a dizer sobre as promoções do comeback e coisas do gênero. 

  E, infelizmente, foi aí que um antigo fantasma voltou a assombrá-la. 

  Na questão de redes sociais, é quase que de senso comum que nunca se sabe o que esperar vindo das pessoas, principalmente quando elas expressam suas opiniões sobre algo ou alguém. Também é praticamente impossível evitar ler ou se deparar com algo desagradável, e não foi diferente com Ryujin. 

  Ela não estava esperando encontrar uma foto sua na timeline logo que abriu o aplicativo, e isso acabou tentando um pouco a sua curiosidade, já que era uma imagem que havia sido capturada algumas horas atrás no estacionamento, e, se estava em alta, era porque algo ali havia chamado a atenção das pessoas.

  Seu impulso fora tão inocente e empolgado que, logo que leu o primeiro comentário, acabou levando uma grande queda que destruiu a pouca alegria que tinha construído minutos atrás. 

  O primeiro comentário estava falando sobre sua aparência. O segundo também. Assim como terceiro, assim como o quarto e assim como os quinhentos seguintes. Por mais que uma boa parcela estivesse elogiando sua beleza, algumas falas em específico a atingiram em cheio como um tapa na cara. 

  Muitos dialogavam pejorativamente sobre seu corpo, mais uma vez criticando o seu ganho de peso e como isso "mudou" o seu corpo de modo geral. 

  Por mais que soubesse que isso só a faria mal, não conseguiu parar de ler os comentários. Logo que acabava de ler um, descia para o próximo e assim repetia o mesmo ato seguidas vezes. Não sabia explicar se queria encontrar alguém que a defendesse com unhas e dentes ou se queria apenas explorar um pouco mais o seu lado masoquista, mas isso acabou ainda mais com seu eu interior. 

  Os comentários eram verdadeiramente maldosos e não construtivos, e por mais que soubesse que eram "ossos do ofício" de ser uma pessoa pública, não evitou a chegada de ainda mais negatividade em sua mente. 

  Ver as pessoas falando tão abertamente sobre suas coxas ou seu rosto mais cheio passaram a desapontá-la da mesma forma como tinha sido da última vez, aquela em que ousou ler opiniões e acabou sendo ofendida ao ponto de optar por não comer por pura pressão externa. 

  Não foi de sua intenção abrir as portas para a assombração da insegurança a perseguir novamente, mas acabou sendo um processo muito menos demorado graças aos outros sentimentos que já estavam dentro de si, que serviram como o catalisador ideal. 

  E por isso, o que antes parecia ser uma simples distração, acabou se tornando mais um bicho de sete cabeças que ainda não fazia ideia de como combater. 

  Na primeira vez que viu a foto, pensou que estava até mesmo bem apresentável, mas após se dar conta dos detalhes que as pessoas apontavam, passou a achá-la ridiculamente desagradável, desejando poder apagar aquilo da memória das pessoas e da sua própria também. 

  Como não podia, tudo o que estava ao seu alcance era deixar seu celular de lado e tentar fingir que aquilo não tinha acontecido. 

  Mas tudo estava fora de seu controle no momento, e naquela condição seu coração passou a doer um pouco mais pelo aperto. 

  Imaginou que, pelo retrospecto, tentar reverter o irreversível somente a faria se desgastar ainda mais, e como não lhe restava muito para alimentar seu ego e orgulho, decidiu que nem ao menos ousaria se animar de novo.

  Pelo jeito sua noite estava destinada a ser um fiasco, e não se esforçaria mais para continuar a remar contra a maré. 

  Optou pelo caminho mais simples e se conformou com o diagnóstico que tinha recebido. 

  Desse modo, com o telefone já perdido em meio às dobras de seu lençol, encarou o nada e desfrutou de sua catástrofe emocional. Não tentaria mais se distrair para que as horas passassem rápido, porque o preço a se pagar era alto demais. 

  Se o universo estava disposto a fazê-la se martirizar, aceitaria de (não) bom grado. 

  Porque, na teoria e na prática, fora ela própria quem se colocou nessa situação. 


 

  Talvez merecesse, quem sabe… 



 

[...]


 

  

  Na tarde seguinte:



 

  17:45



 

  —Okay, Yeji, pode descer agora. 

  —Certo… 

 

  Ryujin se remexeu na cadeira e as observou de canto com um misto sentimento de apreensão e desdém. 

  Mais uma vez ela e as garotas estavam no local que iria ser o showcase; esse era o último dia de ensaios e finalização dos preparativos antes do show. 

  Para o agradecer de seu sono, não precisaram acordar cedo pela manhã, já que o ensaio se passaria durante a tarde. Assim, não precisou levantar da cama quase no mesmo horário em que havia conseguido dormir. 

  Mas isso não fazia muita diferença no contexto geral, pois de nada adiantava estar com o físico descansado se mentalmente continuava tão exausta quanto antes. E isso estava impactando rigorosamente no modo como estava se comportando. Quieta, alheia, indiferente e um pouco abatida; foi assim que se mostrou durante as últimas horas em convívio social. 

  Quando acordou, mal conversou com as meninas, tampouco com Dallie e Byullie, que costumavam alegrar suas manhãs para que começasse o dia bem. Tudo o que fez foi vestir roupas um pouco mais folgadas que pudessem cobrir seu corpo e tentou mascarar suas olheiras com um pouco de maquiagem, tudo isso evitando olhar para seu reflexo no espelho para que não ficasse ainda pior. Depois, se obrigou a comer ao menos uma maçã para que não se sentisse tão fraca nas horas que seguissem o dia.

  No caminho até ali, se manteve absorta na realidade de seus fones de ouvido, que a permitiam se fechar para o mundo exterior por uma fração de hora. Mas quando chegaram, foram intimadas por Minji a logo iniciar a prática das outras músicas, e as horas que passou ali foram extremamente desconfortáveis. 

  Quando se colocou acima do palco, seus olhos imediatamente encontraram aquele corpo feminino na plateia de uma pessoa só. Dessa vez, entretanto, era bem diferente do que tinha visto no dia anterior. Alex estava sentada mais ao fundo, longe da primeira fileira e assim muito pouco exposta aos olhares de terceiros; ela não tinha um microfone para compor seu status de autoridade, muito menos um sorriso divertido que aliviasse a tensão daquele lugar. 

  Por mais que sua feição continuasse habitualmente simpática e leve, Ryujin sabia que não era genuíno. Resultante do pouco tempo desde que tinham se conhecido, seria no mínimo fútil imaginar que a conhecia tão profundamente para conseguir distinguir seus reais sentimentos através dos atos, mas, nesse caso em específico, a compreendia o bastante para ter certeza que ela não estava tão bem assim. E, sem nenhuma surpresa, isso foi transparecido no trabalho. 

  Ryujin costumava odiar o modo como Alex usava de poucas palavras e também do silêncio para se comunicar, já que não era tão boa observadora. Mas esse artifício acabou lhe servindo como uma luva. O (não) feedback que ela e as garotas receberam, que basicamente foram meros sinais de positivo com a mão e sorrisinhos doces, foi mais do que conveniente para seu bem estar. 

  Ela adorava a voz de Alex e tudo o que compunha aquele timbre tão agradável para seus ouvidos, porém pediu aos céus para que não precisasse ter que ouvi-lo naquela tarde. A escutar falar em seu tom doce e carinhoso, com aquele toque de rouquidão e seu fofo sotaque parecia a pior das ideias, pois sabia que isso faria seu coração pular pela garganta, e não queria ter que sofrer ainda mais por paixão. 

  Então, a ausência de comunicação verbal em nada atrapalhou. Apenas serviu para que fizesse logo o seu trabalho e, dessa vez, nem ao menos chegou a se importar se estava passando uma boa impressão com a presença de palco ou não.

  Apenas fez o que tinha que fazer, nada mais e nada menos.  

  Vez ou outra seus olhares se encontravam conforme performava, e além de seus costumeiros estímulos físicos, teve a leve impressão de que, sempre que isso acontecia, os olhos dela brilhavam como reação natural. Tinha plena certeza que os seus também brilharam na mais sincera e inconsciente reciprocidade, entretanto nada mais que isso. 

  Quando o ensaio acabou, se dirigiu diretamente para o camarim ao lado das garotas sem nem ao menos pestanejar. 

  Areum foi a primeira pessoa que viu assim que adentrou aquela sala, mas para evitar ao máximo o cansaço, preferiu ignorar sua existência da forma que pôde até que não tivesse mais opções. O camarim era grande, e usou disso como uma vantagem para ficar o mais afastada possível. 

  Contudo, passou a achar que Areum tinha um propósito contrário ao seu, já que parecia sempre atenta aos seus atos, vez ou outra fazendo parecer que queria ouvir sobre o que conversava com as garotas. Inclusive, jurou tê-la visto esticar o olhar quando comentou com Yuna sobre estar triste pelos comentários sobre sua aparência. E isso a fez se calar por completo nas horas seguintes, pois não queria ser alvo de fofoca. 

  Mas, em questões de se focar no próprio objetivo, concluiu que se saiu satisfatoriamente bem nos primeiros momentos, mesmo que soubesse que seu deleite tinha um curto prazo de validade. Areum estava ali para conferir se os figurinos estavam ideais para cada uma delas, e inevitavelmente teriam que interagir entre si por fins profissionais, e por mais que estivesse adiando essa situação ao máximo (deixando que as garotas fossem primeiro), sabia que sua hora estava por vir.

  Pouco tempo após ter concluído isso, teve sua atenção roubada sem avisos prévios quando Alex adentrou o camarim ao lado de Minji. Ambas pareciam dispostas e anunciaram que iriam até o restaurante mais próximo para buscar comida, e por isso precisavam saber o que cada um ali queria comer para que chegassem num consenso do que pedir. 

  Nesse processo, Ryujin poupou seus esforços para tentar ser discreta em seu modo de olhar para Alex, porque sabia que era sem sentido. A assistiu conversar educadamente com os outros staffs com a maior cara de pau do mundo, e teve de confessar para si mesma que a ver um pouco mais de perto mexeu muito com seu interior, ao ponto de que se deparou com uma insuportável vontade de a puxar ali mesmo e a abraçar na frente de todos. A abraçar o mais forte possível na procura de algum conforto para o incômodo doloroso em seu peito. Mas ela não podia fazer isso, tampouco deveria. 

  Pensou que seria um pouco difícil se conformar e manter seu corpo sobre controle para que não fizesse alguma bobagem, mas sua mente acabou esquecendo desse desejo como num passe de mágica. Tudo o que precisou foi de uma leve distração… 

  Ignorar Areum fora deveras prazeroso enquanto durou, mas teve de quebrar com seu próprio compromisso por não conseguir relevar o senhor olhar que ela lançou a Alex alguns segundos depois. 

  Não conseguiu ter maturidade. De fato, ela nem chegou a tentar. 

  Ryujin não estava em seu estado natural de ser, portanto não obteve sucesso ao tentar lançar para Areum uma cara fechada ou um olhar feio para que a "intimidasse". O máximo que conseguiu foi um olhar indiferente e neutro do pior significado da palavra. Porém, para seu agradecer, foi o bastante para não passar em branco, e como no estacionamento no dia anterior, ela deixou de fitar Alex para retribuir seu olhar.

  Ambas se conectaram numa invisível intriga mal estabelecida, e assim persistiram por alguns segundos. Ryujin a dirigiu os mais imaturos xingamentos por mente, e desejou que seus olhos transmitissem o que tinha pensado para que pudesse se sentir um pouco melhor. Mas não teve a oportunidade de saber se tinha funcionado ou não, pois Minji quebrou quase toda aquela tensão ao se colocar à sua frente para perguntar o que queria comer. 

  Disse que não queria nada por não estar sentindo fome, reaproveitando a justificativa que antes já tinha usado. Minji questionou, claro, e por isso teve de arranjar uma desculpa qualquer, onde disse que tinha comprado um chocolate nas máquinas no corredor. Aquela foi a primeira vez que Alex a olhou desde que tinha chegado no camarim, e ela não parecia contente. 

  Ryujin preferiu não retribuir, manteve seus olhos fixados no chão assim que Minji se afastou com um ar de desconfiança. 

  Depois que elas saíram novamente pela porta, olhou discretamente para Areum apenas por garantia, e ficou um pouco menos incomodada ao ver que ela já tinha voltado ao trabalho, dessa vez com a ajuda da assistente para tirar as medidas de Chaeryeong. 

 

  Os quinze minutos seguintes foram recheados de tédio puro; Yeji, Lia e Yuna tinham saído para comprar alguns doces, mas não pôde as acompanhar por justamente estar esperando sua vez de ser medida por Areum, Chaeryeong obviamente também estava inacessível, então não havia nenhuma presença ali que pudesse a distrair. Quanto às distrações não humanas, também não teve muita sorte; estava longe de pensar em entrar nas redes sociais novamente, portanto tudo o que ela se dispôs a fazer foi tentar matar o tempo com algum dos jogos em seu celular. 

  Em sua cabeça, aquilo nunca poderia ser considerado um verdadeiro sucesso, mas concluiu que ao menos serviu para manter suas mãos ocupadas, assim aliviando um pouco sua ansiedade. 

 

  —Unnie… - Chaeryeong se aproximou dela com seu característico sorrisinho tímido. - É a sua vez. 

  —Oh… - Desligou a tela do celular, tentando sorrir de volta apenas porque achava um crime não a retribuir. - Okay.  

  —Eu vou ir atrás das garotas… - A assistiu se levantar. - Você vem depois que terminar? 

  —Uhum… - Assentiu no seu melhor tom. - Eu encontro vocês. 

  —Okay… até mais então. - Acenou fraco e logo a deu as costas para seguir até a porta. 

  Quando ela saiu de seu campo de visão, Ryujin olhou ao redor e notou que não existia mais nenhum rosto agradável naquela sala, e assim se sentiu extremamente desconfortável no meio de meros conhecidos. 

  Então tratou de se dirigir até Areum para acabar logo com aquilo, pois assim poderia finalmente encontrar as garotas e amenizar a tensão dentro de si. 

 

  —Aí está você… - Areum a olhou discretamente de cima abaixo quando se aproximou o suficiente. Ryujin se manteve calada, somente cumprimentou a tal assistente com as sobrancelhas e parou ao lado delas. - Tire seu moletom. 

  —Ham… - Olhou para sua roupa e comprimiu os lábios. - Por que? 

  —Para eu tirar suas medidas…? - Estendeu uma mão no ar para exaltar sua fala. 

  —Não consegue fazer isso com o moletom…? - Usou do mesmo tom que ela.

  —Não, ele fica muito folgado no seu corpo, pode atrapalhar tudo. 

  Ryujin suspirou devagar e mordeu o lábio inferior, demorando para aceitar a ordem que recebeu. Não queria ter que tirar o moletom, pois ele estava a ajudando a lidar com sua insegurança ao esconder melhor o seu corpo, e não sentiu que se manteria assim caso o tirasse. Mas infelizmente isso não estava sob seu controle; teria que o fazer, querendo ou não. 

  Então levou a ponta dos dedos até a barra da blusa e a puxou para cima com grande relutância, sentindo sobre sua pele uma sensação de frio que nada tinha a ver com o clima. 

  —Pronto… - Se pronunciou em baixo tom assim que deixou a peça acima da cadeira ao lado, junto ao seu celular. 

  —Ótimo. Então suba ali. - Indicou uma espécie de degrau que a faria ficar mais alta para facilitar seu trabalho. 

  —Certo. 

  Ryujin teve a leve impressão de que Areum estava usando de um tom não tão agradável assim, mas não teve força o bastante para a retrucar com o olhar ou algo mais implícito. 

  Fez o que ela pediu e tentou antecipar suas tentativas de ficar calma, pois sabia que estaria sujeita a se irritar apenas por ter seu corpo tocado pelas mãos dela. 

  —Estenda os braços. - Se aproximou com a fita métrica. 

 

  Ao obedecer de contragosto novamente, procurou fixar seu olhar no teto para evitar ainda mais desencanto e deixou que ela fizesse seu trabalho. 

  Após dois minutos em meio a toques desnecessários e várias medidas tiradas de seus braços e costas, Ryujin se sentiu extremamente apreensiva quando Areum sussurrou algo inaudível para a assistente e ambas soltaram risadinhas abafadas. 

  Seu eu paranóico a fez pensar que estavam rindo sobre sua pessoa ou algo relacionado ao seu corpo, e isso aplicou um aumento considerável no dano causado em seu ego. Já o seu lado pensante e racional tentou estabelecer um julgamento justo em sua mente, dizendo que talvez não tivesse nada a ver consigo. Porém esse argumento acabou caindo por terra quando isso se repetiu ao ter sua cintura medida pela estilista. Areum e Cho (a assistente) soltaram mais risadinhas cúmplices não apenas mais uma vez, mas duas. 

  Ryujin sentiu algo horrível com isso. 

  Uma sensação de insuficiência enorme apenas por cogitar a possibilidade de elas estarem zombando de seu corpo. 

  E não poderia existir ocasião pior para que isso acontecesse.

  —Okay, terminamos a parte superior. - Areum se espreguiçou ainda com um sorrisinho estampado na face. - Vamos ver o estrago nas suas pernas. 

  —Estrago? - Perguntou sem nem ao menos ter comandado essa ação.  

  —Modo de falar… não se preocupe. - Negou como se não fosse nada e deu de ombros. - Agora afaste um pouco as pernas, por favor. - Ryujin demorou longos segundos parada, sem mover nenhum músculo. Somente deu o braço a torcer quando teve a certeza de que Areum percebeu que não tinha gostado de sua fala. - Hm… acho que vamos ter que refazer suas roupas. - Balançou a cabeça em negativo e levantou uma sobrancelha de modo irônico, olhando para ela da cabeça aos pés antes de continuar. 

  —Por que? - Questionou no mesmo tom. 

  —Porque o shorts não vai te servir. - Apontou para seu quadril e coxas como se fosse óbvio. - Tenho plena certeza disso. 

  Ryujin a analisou por demorados segundos, desde os dedos apontados para si até o cabelo extremamente liso que caía sobre os ombros da mulher. Tudo em Areum estava a dando repulsa naquele momento. 

  —Vou pegar papel e caneta para anotarmos as novas medidas. - Cho anunciou com um sorrisinho provocativo e as deu as costas em direção às mesas. 

   —Okay… - Areum pousou as mãos na cintura e, muito descaradamente, tornou a olhá-la da cabeça aos pés como se não fosse de seu agrado. Olhou para suas coxas, seu quadril, sua cintura… tudo. Ryujin se sentiu tão invadida que preferiu desviar seu olhar e tentar pensar em outra coisa para que não ficasse ainda pior consigo mesma. - Você ganhou peso, hein… 

  O tom passivo agressivo que usou na última frase atingiu Ryujin em cheio, diretamente em seu peito. Mas, novamente, ela optou por não responder; olhou para o manequim ao seu lado e o copiou, se mantendo estática conforme sua consciência tentava mais do que tudo silenciar aqueles comentários.

  Estava se sentindo pequena.  

  —Aqui. - Cho voltou a se aproximar, agora com as mãos ocupadas e o mesmo sorrisinho nos lábios. 

  Areum aceitou o que lhe foi oferecido e olhou de canto para Ryujin antes de voltar ao seu trabalho.

  —Por que você está usando roupas tão largas hoje, se sabia que eu tiraria as medidas? - Reclamou retoricamente, sentindo com a ponta dos dedos a textura do tecido da calça moletom dela. - Hmm. - Arqueou as sobrancelhas e respirou pesadamente. - Ao menos o tecido é fino… para a nossa sorte você não vai precisar tirar a calça… 

  Depois de ter rodeado a coxa dela com a faixa, propositalmente demorou muito mais do que o necessário para tirar as medidas, a cada segundo esboçando diferentes caras e bocas como se estivesse chocada com o que estava vendo. 

  Ryujin a viu fazer isso. Contra sua vontade, seus olhos curiosos e masoquistas fitaram a mulher por uma fração de segundo, e a assistir entortar a boca enquanto olhava os números foi um tanto quanto desagradável. 

  Afinal, era mesmo tão impressionante o seu ganho de peso? E, se fosse, qual era o problema em engordar?  Aquela reação toda era necessária? Sério? 

  Começou a contar os segundos para que aquilo acabasse logo. Estar exposta ao julgamento de duas que pessoas que não simpatizava era mais do que desconfortável, e ela já estava vulnerável demais para ter que suportar mais alguns minutos ali. 

  —Nossa… - Areum, que não parecia contente com o silêncio, voltou a falar. Se afastou e largou a fita ao redor de seu pescoço, voltando a segurar a própria cintura numa pose arrogante para depois estalar a língua várias vezes para transmitir seu suposto descontentamento. - Vamos precisar de mais tecido, Cho. - Subiu seu olhar para ela e esperou até que fosse retribuída, mostrando sua velada aversão. - Muito mais tecido. - Completou com mais significância. 

  Ryujin de imediato baixou o olhar para o chão.

  Junto aos seus olhos, sua autoestima também caiu de vez aos seus pés.

  Passou a ter certeza que Areum não estava mais seguindo um protocolo de trabalho, e sim apenas usando isso como pretexto para ser má, e isso machucou muito seu orgulho. Em outra ocasião certamente teria a respondido com uma tirada ainda mais ácida e cortante, mas era diferente dessa vez. Seu emocional já não estava tão protegido como costumava ser, e aquelas falas conseguiram a atingir num ponto muito delicado, que a afetava diretamente tanto física quanto mentalmente. 

  —Vamos ter que correr com isso, então. Não temos tanto tempo. - Cho balançou a cabeça em positivo e comprimiu os lábios, olhando também para o corpo à sua frente, porém um pouco menos explicitamente. 

  —É, ninguém estava contando com esse imprevisto… - Areum suspirou e sinalizou que já tinha acabado seu trabalho. Quando Ryujin se colocou de pé em sua frente, sorriu de lado com superioridade e levantou as sobrancelhas. - Precisa parar de comer ramyeon, ou vai parecer ainda mais como uma porca e eu vou ter que refazer todas as suas roupas. 

 

  Ryujin engoliu com dificuldade aquela última grosseria. 

  Conectando suas íris na dela, notou o quão tranquila ela parecia estar mesmo após ter soltado palavras tão duras e cuéis. 

  Se sentiu terrivelmente inferior e intimidada, e por consequência também não conseguiu encontrar dentro de si amor próprio o suficiente para devolver a amargura. 

  Tudo o que fez foi pegar seus pertences acima da cadeira e andar diretamente para fora dali numa covarde tentativa de escapar. No percurso, ainda teve que lidar com mais risadinhas provocativas que elas soltaram sem nem poder dizer algo. 

  Mas não fazia mal; ao menos não tanto. Sabia que não conseguiria manter a postura caso estivesse dividindo o mesmo espaço que Areum, então colocou em pauta o objetivo de encontrar um lugar vazio para que pudesse se situar melhor.  

  Com isso em mente, logo que se colocou para fora dali, olhou para os dois lados do corredor e tentou se lembrar da geografia daquele lugar, para que assim não se perdesse e conseguisse se isolar em paz. 

  Sua primeira escolha foi ir para a direita, já que sabia que existiam salas vazias por ali, mas acabou mudando de ideia logo que deu o primeiro passo. No fundo do corredor, avistou duas silhuetas femininas andando em sua direção: Alex e Minji. Ambas tinham sorrisos simpáticos no rosto e traziam algumas sacolas em mãos conforme conversavam distraidamente. 

  Por mais que fosse aliviador ver duas pessoas que a agradava, não teve vontade alguma de cruzar o caminho com elas; sabia que seria questionada quanto à sua explícita feição de abalo, e tudo o que menos queria era ter que dar explicações que a faria se sentir ainda mais humilhada. Sendo assim, não deu mais nenhum passo naquele sentido. Tudo o que fez foi, por puro instinto, trocar um breve olhar com Alex, que inclusive piorou um pouco mais as coisas. 

  Em mais uma vitória da paranoica insegurança que julgava seu próprio físico, de modo inconsciente se questionou se Alex realmente quis dizer que ela estava bonita no dia anterior ou se tinha dito apenas para ganhar mais a simpatia das pessoas ao redor, como já tinha pensado no banheiro antes. E, por causa do sentimento instável dentro de si, considerou que a possibilidade de não ter sido genuíno era a mais justificável. 

  Pois afinal, "quem iria me achar bonita nesse estado?", pensou conforme analisava a feição inicialmente alegre no rosto dela. Aquele começo de sorriso causou um impacto unicamente negativo em seu corpo, e por isso sentiu seus olhos ficarem parcialmente molhados pela sensação de rejeição. 

  E isso enfim a trouxe de volta para o mundo real, ao ponto que se deu conta de que ainda estava ali, parada feito uma idiota. 

  E então, num ímpeto intencionado mais uma vez pela vontade de escapar, deu as costas para as duas e não pensou antes de seguir seu caminho para o lado contrário com pressa.  

  Depois de ter virado o corredor e se certificado de que estava realmente sozinha, deixou seu corpo relaxar um pouco e voltou a andar mais lentamente, olhando ao redor à procura de alguma sala desocupada.

  Olhando para dentro de cada porta e sentindo seu coração se apertar mais e mais pela impaciência, acabou encontrando o que mais precisava: as escadas de emergência. 

  Como a maioria das pessoas eram grandes preguiçosas e preferiam a praticidade dos elevadores, as escadas estavam completamente vazias e silenciosas, sendo esse o local perfeito para ficar, já que muito dificilmente alguém passaria por ali e a veria naquele estado. 

  Então, depois de passar, fechou a porta atrás de si e olhou ao redor por alguns momentos. À sua direita, a opção de descer para onde deveria ser o estacionamento, e à esquerda a opção de subir para o próximo andar. Ela não tinha a intenção de ir para nenhum desses lugares, mas ficar de costas para a porta parecia um ótimo obstáculo para curiosos, e assim acabou escolhendo a direita. 

  Em passos tímidos e desanimados se aproximou da escada, e da mesma forma se sentou acima do primeiro degrau. 

  Sem saber como se portar ou agir naquela situação, vestiu seu moletom novamente e perdeu algumas dezenas de segundos encarando a branquitude das paredes ao seu redor, aos poucos se sentindo sufocada pela falta de personalidade daquele espaço. E assim, passou também a se sentir desconfortável consigo mesma (nesse caso, mais do que já estava). Suas pernas, que antes esticadas e separadas, foram rapidamente encolhidas de modo que pudesse colocar seus braços em volta delas, abraçando a si própria num fechamento que pouco proporcionava algum tipo de aconchego ou consolo. 

  Deixou de encarar o nada para deitar sua cabeça acima de seu joelho, posteriormente tendo uma limitada visão somente do piso dos degraus e do pé da parede. 

  Desse modo, enfim conseguiu ter a oportunidade de respirar fundo, e, uma vez que seus pulmões se encheram de ar, seu interior também se encheu de uma terrível angústia que tinha como único propósito a levar à insanidade. 

  Soltou o ar com força e fechou os olhos. 

 

  Respirou fundo mais uma, duas, três... dez… vinte vezes.

  

  Nada parecia estar funcionando.


 

--



 

  Longe da escadarias, ali estava Alex, passando pela porta do camarim com um grande ponto de exclamação acima de sua cabeça. 

  —...você viu a cara dela? - Internamente falando, todos os seus sentidos entraram em estado de alerta pelo que tinha visto. 

  —Sim, mas ela já estava um pouco estranha hoje. - Minji estava quase que da mesma forma, tão confusa quanto. 

  —Foi diferente… - Negou e a ajudou a colocar todas as sacolas acima da mesa mais próxima. Depois travou o maxilar e pousou uma das mãos na cintura, passeando com seus olhos pelos quatro cantos da sala à procura de pistas. - Não viu nos olhos dela? 

  Minji parou de tatear as sacolas por uma fração de segundo, encarando o perfil de Alex com seriedade. 

  —Não, não vi… 

 —Alguma coisa aconteceu aqui. - Concluiu com quase absoluta certeza. 

  —Você acha mesmo…? 

 

  Alex não a respondeu de imediato. 

  Alguns metros mais à frente, isolou o seu foco em Areum e a outra garota que não sabia o nome, pois chamaram muito a sua atenção pelas feições divertidas e risadas ligeiramente fora do ponto. 

  Pelo modo como as assistiu recolher seus utensílios de trabalho, imaginou que já tivessem cumprido com suas obrigações, e talvez essa fosse uma das razões de toda aquela descontração. 

  Mas não conseguiu tirar seus olhos delas nos segundos posteriores, pois as risadinhas simplesmente não pararam. E, uma vez dando mais importância para o sentido de sua audição, conseguiu ver e ouvir Areum soltar algo como "você viu a cara dela?" num tom mais do que áspero. 

  Não soube explicar, mas seu sexto sentido se pronunciou em imediata reação ao que acompanhou, e a avisou que, realmente, algo tinha acontecido ali. 

  Portanto, Ryujin voltou a ser protagonista em seu consciente. 

 

 

  —Acho. 

  Foi tudo o que disse para Minji, e sem a dar mais nenhum tipo de informação, largou o que estava fazendo para reconstruir seu caminho de volta para os corredores. 

  Ela não fazia ideia de onde Ryujin poderia estar, mas sabia qual era a direção que ela tinha seguido, o que facilitava muito mais a sua procura. 

  Com o coração batendo no mesmo ritmo de seus pés e um pressentimento esquisito subindo pela garganta, se concentrou em descobrir o que diabos havia acontecido enquanto estava fora. 

  Virando a esquina do mesmo corredor que Ryujin antes havia passado, atentou seus olhos com grande empenho para todas as portas dali. 

  Conferiu a primeira da direita. A segunda da esquerda. A terceira, e também a quarta porta. Nenhum sinal dela. 

  Cogitou a possibilidade de ela ter seguido por outro caminho sem que tenha visto, e isso a fez pegar o celular no bolso de seu jeans para agilizar os processos. Prosseguiu andando enquanto deslizava o dedo pela tela do aparelho à procura do número, e continuou olhando para dentro das salas por garantia. 

  Uma vez com o número já exposto em seu telefone, não hesitou em apertar a tecla verde e levar o aparelho até o ouvido. 

  Chamou uma, duas, três vezes… 

  Teria ficado mais preocupada caso continuasse assim, mas notou que o som das suas chamadas não era o único a preencher o corredor, e por isso sua esperança tomou conta de seu corpo quando ouviu os barulhos virem de uma porta alguns metros à esquerda. 

  Em meio a movimentos apressados de perna, conseguiu alcançar o seu destino em poucos segundos, e com seus olhos atentos enxergou para dentro do lugar pela pequena janela transparente. 

  Assim que viu aquela silhueta feminina nos primeiros lances da escada, desligou sua chamada e levou seus dedos nervosos até a maçaneta, segurando firme mesmo que não tivesse tomado a decisão de a abrir ainda. Seu interior afobado queria que logo entrasse ali e acabasse de uma vez com a recém aflição, mas não se permitiu deixar ser controlada pelos impulsos. Pela forma como Ryujin estava se portando ali, a abordar com tanta agitação era a pior ideia existente. 

  Então engoliu o ar e o manteve dentro de seus pulmões por longos momentos, acalmando seus batimentos cardíacos para que não fizesse bobagens conforme seu olhar continuava presto exclusivamente nela. E, somente quando teve a certeza de que estava realmente calma, concedeu passagem para si mesma num ato paciente e silencioso.  Ao fechar a porta atrás de si com o mesmo (se não mais) cuidado, guardou o celular de volta em seu bolso e sentiu seu peito se manifestar dolorosamente com o cenário que se deparou. 

  Ryujin estava abraçada às próprias pernas, com o rosto parcialmente escondido no meio dos joelhos e numa pose injustamente solitária e encolhida, onde nem ao menos virou o rosto para saber quem havia entrado ali. 

  Seu anseio para saber o que tinha a feito ficar assim triplicou de tamanho, e por essa razão não se permitiu perder mais nenhum segundo naquela circunstância. 

  Ainda sem tirar os olhos dela, se aproximou através de passos apreensivos e também se sentou no primeiro degrau, mas inicialmente manteve uma certa distância entre seus corpos para não invadir o seu espaço. 

  Não estava conseguindo ver o rosto dela tão bem, mas notou que os seus olhos estavam no meio termo entre aberto e fechado, caídos no chão sem nenhum tipo de emoção; ao menos não uma emoção positiva. Seus dedos sem movimento seguravam firme no pano de sua calça moletom como se estivessem dispostos a mantê-la naquela posição; fechada e inacessível. Suas sobrancelhas minimamente arqueadas indicavam estar sofrendo internamente, e seu queixo franzido revelava que estava próxima de chorar.

  Alex se sentiu extremamente magoada com a feição dela. 

  Nada tinha a ver com o mesmo rosto que viu nas horas passadas. 

  Antes ela exalava diferentes camadas de irritamento e desencanto, mas naquele momento estava transbordando em um pesado e tenso abatimento, ao ponto que conseguiria pegar esse sentimento na mão caso tentasse.

  Nada mais; apenas isso. 

  E mais uma vez, sua intuição relacionou aquela imagem à um certo alguém que tinha visto no camarim. 

  Alguém que sabia que, por tabela, era a principal suspeita. 

  Seu estômago revirou dentro de si; se contorceu em desconforto e a fez alimentar uma fúria antecipada ao que estava por vir. 

 

  Dividida entre receio e determinação, arrastou o seu corpo um pouco mais para o lado e pousou suas mãos acima dos próprios joelhos, fitando Ryujin no desejo de ser retribuída. 

   

 

  —Quem te fez isso? 

   

 

  

 … 


 

  Exatos cinco minutos depois:   





 

  Alex empurrou a porta do camarim com a mão esquerda e não se importou com o estrondoso barulho que causou. Com alguns pares de olhos atentos a assistindo, adentrou a sala com a pior das expressões no rosto. 

  Na mão direita, seus dedos estavam carinhosamente entrelaçados com os de Ryujin num aperto delicado e afetuoso, a trazendo junto consigo e guiando seu caminho até um dos cantos onde todos deixavam seus pertences. 


 

  Segundos atrás, enquanto ainda estavam as duas na escada, nada mais do que dez ou vinte palavras foram trocadas. 

  Ryujin, em seu mais justificável direito, não disse coisa alguma. Não contou quem foi que tinha a magoado, muito menos concordou ou negou quando Alex perguntou se tinha sido Areum. 

  Mas seu comportamento acabou dizendo muito mais do que palavras. 

  Alex viu. Assim que tocou no nome de Areum, os olhos de Ryujin se tornaram um pouco mais emotivos e afetados. 

  Viu a forma como ela pareceu ter se incomodado, e essa era a prova que precisava para completar o quebra cabeça em mente. 

  Tendo essa confirmação, nada mais a impediu de deixar um ódio agressivo consumir suas veias e roubar o protagonismo em seu coração. E persuadida por essa sensação, não pensou duas vezes antes de fazer o que lhe tinha surgido em mente. 

  Com determinação, intimou Ryujin para a seguir de volta para o camarim, e esperadamente sua primeira resposta foi um movimento negativo de cabeça. Mas não se deu por satisfeita, e assim pediu de novo. Daquela vez com um pouco mais de calma e amor, acariciando suas costas enquanto estendia a outra mão para que ela segurasse. E uma vez a olhando nos olhos e tentando passar uma sensação de segurança, enfim seu convite foi aceito. 

  Dividida entre compaixão e fúria equivalentes, usou de toda a sua doçura para trazer Ryujin de volta para aquela sala, e mesmo sem saber o que tinha acontecido, notou que ela pareceu um pouco relutante quando se aproximaram da porta. 

  Isso a deixou ainda mais inconformada, e por isso entrou naquele espaço com tanta raiva; queria deixar expostos os seus sentimentos. 

 

  E agora, depois de ter soltado a mão de Ryujin para pegar a mochila dela, percebeu que suas mãos estavam até mesmo um pouco trêmulas por estar enxergando pela lente do irracionalismo. 

  Mas não importava. 

  Apenas ignorou suas reações corporais e se virou para a garota. 

 

  —Aqui. - A estendeu a mochila e esperou até que tivesse a colocado sobre seu ombro. - Me espera na porta…? - Se aproximou um pouco dela e encarou suas íris num tom sensível e terno. Usou a ponta dos dedos para tocar sua mão novamente num breve carinho. - Só preciso fazer uma coisa.  

  Alex olhou por cima do ombro dela e avistou Minji, que mais ao fundo se portava de modo preocupado e atento. E assim que Ryujin positivou brevemente com a cabeça e se virou para voltar à porta, andou diretamente na direção da mulher. 

  Seus passos eram pesados e propositalmente impacientes. 

  —O que aconteceu com ela? - Minji perguntou logo que estavam próximas o suficiente. 

  —Acha que a Ryujin vai ter problemas caso passe a noite na minha casa? - Ignorou a primeira pergunta e foi direto ao assunto. 

  —Ham… - Esboçou confusão. - Eu não… eu não sei. 

  Alex molhou os lábios e engoliu o ar na tentativa de não descontar em Minji, já que gostava bastante de sua pessoa. 

  —Você confia em mim? - Colocou uma mecha do próprio cabelo atrás da orelha. 

  —Sim, Alex, mas… - Coçou o maxilar num ato de dúvida. - O que aconteceu com ela, hein? 

  —Eu ainda não… - Num ato simples de olhar ao redor, mais uma vez encontrou Areum adiante, fazendo o mesmo de quando a viu minutos atrás: rindo. Rindo como se estivesse verdadeiramente agradada, ao lado da assistente que parecia menos animada. - Ainda não sei. - Completou ainda com os olhos presos nas duas. Doses de represália pura foram injetadas em suas veias já muito quentes pelo calor do momento. - Mas vou descobrir. 

  Foi tudo o que disse antes de desviar de Minji e seguir até Areum, que estava de costas conforme fechava algumas maletas. 

  Dos pés à cabeça, seu corpo estava ardendo numa chama que dificilmente a deixaria em paz se não fizesse algo a respeito. 

  Então, ela o faria sem nenhum problema ou hesitação. Porque precisava, e também porque queria. 


 

  —Ei. - Se pronunciou logo que se colocou atrás dela, esperando que se virasse para prosseguir.  

  Areum virou minimamente a cabeça para olhar, como se, dependendo de quem fosse, não se daria ao trabalho de dar total atenção à pessoa. Mas ao notar que era Alex ali, tratou de virar seu corpo em direção à ela com um sorriso estampado na face. 

  —Alex, oi! - Passou a mão pelo cabelo como se quisesse parecer mais bonita. 

  —Qual é a porra do seu problema?

  Perguntou sem nenhum desvio e sustentou a expressão séria, e embora suas palavras não fossem educadas, usou de um tom calmo e frio. 

  Areum se calou por alguns segundos, aos poucos diminuindo o sorrisinho que tinha no rosto. 

  —O que disse...? - Juntou as sobrancelhas num ar de incompreensão. 

  —Você é surda? - Deu uma breve pausa e continuou com seu tom baixo, pois percebeu que outros staffs começaram a prestar atenção na conversa. - Perguntei qual é a porra do seu problema. - Repetiu pausadamente. 

  Areum molhou os lábios demoradamente e com certa calma segurou na borda da mesa ao se encostar ali. 

  —Você pode me explicar o que está acontecendo, ou eu vou ter que adivinhar o porquê de estar falando assim comigo?

  Alex soltou o ar pesadamente pela boca e virou o rosto para observar Ryujin, que estava parada em frente à porta com uma feição penosa e parcialmente desentendida. Seu interior ardeu ainda mais em raiva por ver o pesar dos olhos dela, e por essa razão voltou a encarar a outra com mais furor.

  —O que foi que você fez pra ela?

  Não precisou dizer o nome de Ryujin para indicar sobre quem estava falando, pois Areum também tinha tirado alguns segundos para a encarar e certamente conseguiu relacionar. 

  —Não sei do que está falando.  

  —Anda, desembucha. - Insistiu com impaciência. 

  —Não tenho o que desembuchar, Alex. - Piscou lentamente e negou com a cabeça, também mantendo uma tonalidade civilizada.

  —Sim, você tem. 

  Areum mais uma vez olhou para Ryujin, agora com traços mais acentuados de antipatia. 

  —O que foi que ela te disse, hein? 

  —Nada. - Chamou a atenção dela de volta para si. - Mas eu sei que você tem algo a ver com o estado dela. 

  Areum soltou algumas risadinhas descrentes que fizeram Alex se imaginar encerrando aquilo de várias maneiras. 

  —A única coisa que fiz foi comentar sobre o ganho de peso dela. - Continuou a rir como se estivesse se lembrando de algo. - Nada demais. 

  —Nada demais?! - Franziu o cenho e deu um passo em sua direção. 

  —Sim, oras… - Cruzou os braços numa pose confiante. - Disse que as roupas não serviriam mais e que deveria parar de comer Ramyeon para não causar mais problemas!

  Alex ficou sem saber o que dizer num primeiro momento. 

  Simplesmente não tinha ideia do que fazer. Analisando a feição provocante e estúpida de Areum, sentiu uma enorme vontade de pular para cima dela e começar uma briga ali mesmo, mas não conseguiria o fazer por ainda ter um pingo de moralidade restante em seu interior. 

  Contudo, também não conseguiu encontrar outras alternativas cabíveis para a fazer pagar pelo que tinha dito para Ryujin. 

  Essa dúvida tomou conta de seu corpo por três lentos e torturantes segundos. 

  —Você gosta disso? - A olhou de cima abaixo. - De fazer as pessoas se sentirem mal? - Questionou entre dentes. 

  —É óbvio que não. - Rolou os olhos como se estivesse no meio de uma discussão divertida. 

  —Então por que continua dando risada? 

  —Porque é engraçado. 

  —Não estou vendo nada engraçado aqui. 

  Areum bateu com a ponta do pé algumas vezes no chão e novamente seu sorriso foi murchando até que ela retornasse a atuar com seriedade. 

  —A graça é você pensar que as minhas palavras realmente machucaram ela. - Explicou numa total transformação em seu tom também. - Isso faz parte do meu trabalho, se ela se incomodou, não é problema meu.

  Alex entreabriu os lábios num misto de incompreensão e descrença. 

  —Desde quando ser desagradável faz parte do seu trabalho?! - Não conseguiu controlar seu volume, e assim acabou atraindo bem mais atenção para o diálogo. 

  —Dizer a verdade não é sinônimo de ser desagradável! 

  Alex deixou seus ombros murcharem e esboçou desalento conforme assimilava o que ela tinha dito. 

  Aquilo era realmente sério? 

  —O seu trabalho, Areum, é vestir as garotas, e nada mais que isso, independente da mudança de corpo delas. - Deu mais um passo em sua direção e fechou os punhos para reprimir sua raiva. - Qualquer coisa que envolva você abrir essa sua boca grande para dizer falsas verdades, é totalmente dispensável! 

  —E o que faz você pensar que tem o direito de me dizer o que devo ou não fazer?! Tomar as dores dela também não faz parte do seu trabalho! 

  —Diferente de você, eu tenho a capacidade de admitir que não é uma questão profissional. - Voltou a diminuir seu tom para expressar sua convicção. - É inteiramente pessoal!

  —Alex, acho que já está na hora de parar. - Minji se aproximou num tom apaziguador. 

  —Parar?! - A olhou com ainda mais incredulidade. 

  —Não, não podemos parar tão cedo! - Areum protestou. - Vamos, Alex, você ainda precisa esclarecer para todos o quão pessoal é a sua relação com a Ryujin! 

  Alex, ao olhar para os staffs ao redor, compreendeu de imediato o que estava se passando. 

  Areum tentou a persuadir pela emoção para que cometesse um deslize, e soube que isso aconteceria caso Minji não tivesse segurado em seu braço para a fazer voltar a ter os pés no chão. 

  Cogitar a possibilidade de piorar ainda mais as coisas para Ryujin foi o estopim para que o monstruoso sentimento de raiva enfim crescesse de vez no meio do seu peito, se estendendo por todas as suas terminações nervosas para a assolar ainda mais. 

  E essa tal fúria precisava muito ser extravasada, não importava quais fossem os meios. 

  —Você, sua… - Ensaiou, literalmente, partir para cima dela. Estava a um passo de colocar suas mãos nela quando Minji interrompeu tanto seu ato quanto sua fala, que com muita força de vontade segurou seu braço forte o bastante para a manter no mesmo lugar. - Idiota! - Tentou se soltar ao balançar o braço, e isso até mesmo fez Areum recuar, mas de nada adiantou. Minji, por mais que não parecesse, tinha uma surpreendente força e estabilidade no corpo para a segurar por tempo indeterminado. - Me solta! - Sua voz estava extremamente exaltada. 

  —Alex! - Minji a chamou mais uma vez num tom de extrema repreensão.  

  —O que?! - A olhou ainda muito disposta a iniciar uma briga física. 

  —Preciso que você vá embora. Agora. - Diminuiu sem tom de voz. 

  —Não, nem pensar! - Negou com veemência. - Eu vou soc…

  —Eu assumo por aqui, Alexia. - A interrompeu novamente, a mirando com os olhos extremamente significativos e insinuantes. Alex se calou por alguns momentos, sentindo o ar começar a faltar nos pulmões. - Ryujin está te esperando, esqueceu? - Levantou uma sobrancelha e exaltou o nome da garota para a chantagear. 

  Alex prosseguiu alguns momentos olhando para os olhos escuros de Minji, mas calmamente tornou a virar seu rosto e encontrou Ryujin na mesma posição e com uma feição difícil de se identificar. 

  Pensando e repensando seus atos por seguidas vezes, conseguiu compreender melhor a situação e recuperou a sanidade.

  Em um outro lugar, com outro público e outra circunstância, quem sabe, ela não teria tomado a mesma decisão. 

  Mas não se permitiria fazer aquilo com Ryujin, ali. Sabia muito bem que tudo o que falasse ou fizesse poderia implicar diretamente na segurança dela e também das outras garotas, e não se perdoaria caso acabasse cometendo um erro puramente influenciado pelo calor do momento. 

  Não tinha o direito de colocar seus desejos acima de tudo, porque, além de imoral, estaria também tirando todo o significado da sua real intenção, que era justamente proteger Ryujin. 

  Queria muito, mais do que tudo, poder fazer com que Areum tivesse algum tipo de consequência, seja ela física ou não. Porém teria que deixar essa tarefa nas mãos experientes e flexíveis de Minji, que parecia ter entendido a situação e tinha mais tato do que qualquer um ali para resolver. 

  Confiava nela, e caso acontecesse de suas expectativas não serem alcançadas, pensaria em algo futuramente para ao menos ficarem quites. 

  Teria todo o tempo do mundo para isso, tinha plena certeza. 


 

  —Sim… - Respirou fundo e sentiu ela soltar seu braço com delicadeza. 

  —Posso confiar Ryujin a você? - Perguntou na esperança de a amaciar um pouco mais. 

  —Pode. - Assentiu e endireitou a postura. 

  —Pff… - Areum murmurou sarcasticamente. 

 

  Alex a olhou de cima abaixo com grande desprezo. Parte de si sentiu vontade de voltar atrás em sua decisão. 

  "Como eu queria poder ser um pouco mais inconsequente…" pensou internamente. 

  Mas Ryujin estava mesmo a esperando, e nada no mundo a faria trocá-la por uma briga necessariamente desnecessária. 

  Desse modo, enquanto fazia pouco caso dela, se afastou em passos pequenos. 

  Mas não fazia mal; poderia encontrar outras formas para a causar ao menos um pouco de impacto. 

  Portanto, logo que deu as costas para ela, andou diretamente na direção de Ryujin com firmeza e seriedade. Contudo, antes de realmente sair dali, optou por fazer uma última coisa. 

  A raiva ainda estava dentro dela; não seriam as palavras de Minji ou sua empatia pela reputação de Ryujin que a livraria desse sentimento… ao menos não tão cedo. 

  E uma vez estando de acordo com isso, aceitou de bom grado a influência negativa da fúria em seu corpo e se deixou ser comandada por ela. Olhando diretamente para Ryujin conforme caminhava, aproveitou do manequim próximo de sua passagem para, sem mais nem menos, usar da sua mão para o empurrar com força, fazendo-o cair num barulho estrondoso no chão que, certamente, assustou novamente todos que estavam ali. Não o suficiente, também empurrou todas as quatro ou cinco caixas de utensílios que Areum tinha arrumado mais cedo, tendo plena certeza de que muitas coisas se quebraram somente ao ouvir o barulho quando se chocaram com o solo.  

 

  Alex tinha certeza absoluta que, em outro caso, teria achado muita graça em seu próprio ato, mas não daquela vez. Sua expressão era terrivelmente séria, dada a sua indignação, e não poderia estar se importando menos com isso; queria somente descontar em algo que pudesse expressar parte de seus sentimentos. 

  E quando enfim o fez, o peso em suas costas diminuiu e então se permitiu preocupar única e exclusivamente com Ryujin. Com mais meia dúzia de passos conseguiu a alcançar, e assim pôde voltar a segurar a mão dela, mesmo que discretamente. 


 

  —Vamos. 

  

 

  

 

  [...] 



 

  20:00




 

  O caminho até o apartamento de Alex foi cruelmente quieto, tenso e desconfortável para ambos os lados. 

  Uma vez que ficaram sozinhas naquele veículo, seus sentimentos foram condensados numa bolha densa de afastamento. 

  Com o silêncio tomando conta de todo o percurso, ambas se lembraram do que havia acontecido entre elas no dia anterior, e toda essa narrativa as afetou de diferentes formas, mas todas em completa equivalência. 

  Porém em contrapartida, Alex, muito influenciada por sua empatia e desejo de ajudar, deixou de lado todos os seus poréns e desapontamentos para se focar singularmente no presente momento, tentando não piorar ainda mais as coisas. 

  Vez ou outra, quando paravam pelo trânsito, a direcionava olhares discretos à procura de algum indício que aprovasse o que estava fazendo. Mas Ryujin nem ao menos chegou a retribuí-la; continuava quieta, fitando as próprias pernas como se estivesse em outro universo. Então se viu obrigada a ter que usar do modo convencional de comunicação, e logo que parou o carro no sinal vermelho, a olhou com grande insegurança e soltou algo como "vou te levar para a minha casa". Sua resposta foi um repetido e desanimado sacudir de cabeça que confirmava sua fala.

  Mas não estava totalmente convencida; não queria a forçar a fazer algo que não queria, mesmo que achasse ser o melhor para as condições da problemática. 

  Depois de ansiosos segundos de pausa, voltou a se virar para ela e perguntou um mero "Você quer?", com uma entonação perdida entre incerteza e distanciamento emocional. Seu coração, já um pouco desgastado, sofreu com esse sentimento durante o quase meio minuto que passou na expectativa de obter um retorno. Ryujin soltou apenas um baixo e oscilante "sim", voltando a se retrair quase que instantaneamente e deixando implícito que falar não era exatamente sua intenção ali. 

  Alex ainda sim não se contentou; não encontrou um pingo de emoção na voz dela, e com isso não conseguiu saber se estava mesmo falando a verdade. Mas tinha entendido o recado de que não deveria estender a conversa, e, para reprimir o gosto amargo da dúvida em sua garganta, apertou o volante nas mãos e manteve a boca fechada pelo resto do caminho. 

  O único momento em que voltou a falar, sendo esse um caso de necessária exceção, foi ao questionar se ela queria passar no dormitório para pegar roupas ou algo do tipo. Ryujin novamente usou de poucas palavras, dizendo que sempre carregava roupas extras em sua mochila. Sendo assim, nada mais foi discutido no ambiente do automóvel. 

  Depois de minutos terem se assemelhado a horas no percurso, elas finalmente chegaram no prédio onde Alex morava, e logo no estacionamento a distância entre elas se mostrou ainda pior; tanto física quanto emocionalmente. 

  Diferente de antes, seus dedos não se entrelaçaram num aperto, muito menos chegaram a ficar com os corpos próximos um do outro. Alex sentiu um imenso bloqueio entre elas, e não cogitou tomar a atitude de iniciar uma aproximação afetuosa, pois não queria a desagradar com um carinho que parecia não querer, e assim, pareceram duas estranhas que a única semelhança entre si era estar seguindo na mesma direção.

  Desse modo, quando ambas passaram a dividir o mesmo espaço no elevador, ela se manteve em um canto e Ryujin se colocou no extremo oposto, conservando a máxima distância que dizia por si só o que estavam sentindo em relação à outra. 

  Mas apesar dos pesares, Alex percebeu seu coração ser apertado por uma força invisível quando assistiu Ryujin passar o caminho todo olhando para o chão, explicitamente evitando encarar o seu reflexo nos espelhos que cobriam as quatro paredes daquela caixa de metal. Foi uma experiência desagradável a ver agir desse jeito, e era ainda pior não saber o que fazer para ajeitar tudo. Por consequência, não fez nada além de observar, desejando que o décimo andar chegasse logo para que Ryujin se sentisse menos oprimida. 

  E, enfim estando sozinhas em seu apartamento, foram recebidas por um gato extremamente contente por as ver ali. Alex foi a primeira que Luca cumprimentou, mas ela logo o deixou a implícita tarefa de fazer com Ryujin o que não estava conseguindo. Então, conforme eles se entendiam em saudações baseadas em carinho, andou diretamente até seu quarto e pensou no que diabos faria dali em diante. 

  Sua primeira opção era tomar um longo banho para esfriar a mente, e decidiu seguir por essa linha de raciocínio por parecer o ideal a se fazer. Portanto, ao ter deixado uma trilha de roupas jogadas pelo chão conforme retirava o casaco, meias e os sapatos, retornou à sala para dar continuidade à saga de poucas palavras com Ryujin. 

  Avisou que iria tomar um breve banho, e que se quisesse fazer o mesmo teria tudo o que precisava na suíte do quarto. Dessa vez não esperou por uma resposta, somente seguiu seu caminho para o banheiro de visitas e ali se trancou por tempo indeterminado. 

  Com a água quente se chocando contra seu rosto, estabeleceu uma linha ilogica de pensamento, onde a princípio tudo parecia confuso e difícil de se encontrar uma resolução à altura. 

  Seu maior martírio, tirando a mágoa de Ryujin, se baseou exclusivamente no arrependimento por não ter confrontado Areum de modo que não ficasse com o peso de tarefa inacabada nas costas. Obviamente era um dilema e tanto, já que também tinha de pensar nas garotas e no que isso implicaria nelas, mas querendo ou não, nada mudaria o que sentia dentro do peito. 

  Mesmo que soubesse que foi, em teoria, o certo a se fazer, não conseguiu desapegar da possibilidade de ter conseguido a dar o troco de alguma forma. E isso tinha o poder para acabar com sua noite, caso não revesse suas prioridades. 

  Mas, felizmente, ela se deu conta ainda em meio ao banho. 

  Tentando o seu melhor para tirar Areum da cabeça, se concentrou em Ryujin e em quais eram as soluções para o caso dela. Mas o retrospecto a deixou ainda mais para baixo; simplesmente não existiam soluções. Normalmente, quando se trata de mágoas causadas pela insegurança que as pessoas impõem, apenas o tempo e um ombro amigo serviam como remédio. 

  Tempo não a ajudaria ali, pois tinha um desejo imediatista de sanar a dor dela, e uma solução a longo prazo de nada adiantaria. 

  Quanto ao ombro amigo… 

  Alex estava ciente do bloqueio entre elas. No entanto, quanto mais dialogava com a voz da razão, passou a se questionar se essa tal restrição era mesmo tão inconsciente. Por mais que fosse uma pessoa teoricamente madura e equilibrada, sabia que quando se tratava de amor sua personalidade estava sujeita a mudar pelos mais simples e variados motivos. E considerou que, talvez, esse era o seu caso. 

  Pela reciprocidade que não ganhou de Ryujin no dia anterior, seu interior mergulhou numa onda de amargura que tinha a feito perder o sono durante a noite, e como isso se estendeu durante todas as horas do dia, imaginou que estava sujeita a ainda estar contaminada por esse sentimento. Esse tal sentimento era o seu orgulho.

  Alex sabia que seu orgulho não era tóxico como no caso de Ryujin, e ele fora até mesmo válido em certos pontos, pois mostrava que sua intenção era apenas a proteger de mais desapontamentos. Mas ele estava a impedindo de se aproximar mais profundamente de Ryujin pelo medo de ganhar mais uma rejeição, e isso sim não era válido, muito menos justo. 

  Oferecer apoio para Ryujin ultrapassava as linhas pré ditas do que deveria ser uma relação de duas pessoas que se gostam, e ela não deixaria que um amor não correspondido à altura a impedisse de a consolar.

  Em resumo, a intenção de ajudar se dava exclusivamente pela paixão que sentia, mas esse sentimento não tinha ligação nenhuma com seus atos empáticos. 

  Com essa conclusão em mãos, Alex procurou arranjar uma coragem que pouco lhe restava do dia anterior, e depois de adiar sua responsabilidade por quase meia hora, se obrigou a terminar o banho de uma vez. 

  Assim, ao se colocar para fora do banheiro já vestida, fez seu caminho diretamente para o quarto, pois viu que Ryujin já não estava mais na sala. 

  Engolindo em seco sua ansiedade, Alex se colocou ao lado da porta, fechou seus dedos ao redor da maçaneta e olhou para dentro do quarto parcialmente escuro, já que as luzes estavam apagadas.  

  Seu coração errou a batida ao ver Ryujin deitada sobre sua cama, provavelmente já de banho tomado por estar usando roupas diferentes. Inclusive, seu coração errou mais uma batida quando notou que o moletom que ela estava usando era seu. 

  Mas deixou esse breve surto de lado, pois tinha coisas muito mais importantes para dar atenção.

  

  Ryujin estava deitada de lado, encolhida na cama em completo silêncio enquanto abraçava um dos travesseiros. Mesmo a vendo de costas, sabia que ela não tinha uma boa expressão, e também sabia que ela não estava dormindo, apesar de não estar se movendo. 

  Por um momento, pensou em a deixar sozinha ali um pouco mais para que pudesse ter seu próprio espaço, mas descartou essa ideia quase que no minuto seguinte. A olhando assim, julgou que seria quase um crime a deixar a só, dada a circunstância. 

  Então se desencostou do batente e começou a andar em direção à cama em passos lentos e silenciosos. Não tirou os olhos dela durante o percurso, e por essa razão passou a se sentir muito mal ao notar o quão triste era a sua expressão. Tinha os olhos caídos na cama; encarava o lençol com uma feição vaga e abatida. Seus únicos movimentos eram o de seu peito ao respirar e o dos dedos que brincavam com o tecido do travesseiro que rodeava. 

  A ver dessa forma quebrava seu coração em pedacinhos, e saber que não tinha tanto poder para a livrar desse sofrimento era ainda pior. 

  Quando se colocou ao lado da cama, respirou fundo, coçou os olhos, estalou a língua, olhou ao redor… era difícil saber como deveria se inserir naquele espaço sem a incomodar. Tinha a impressão de que poderia comprometer tudo caso cometesse algum erro, então se esforçou para ensaiar algo em sua cabeça antes. 

  Portanto, molhou os lábios demoradamente e passou a mão pelos cabelos por puro nervosismo. 

  Desde quando tentar consolar alguém tinha se tornado uma tarefa tão difícil assim?  

  Ryujin não a olhou nesse meio tempo, continuou com os olhos estagnados no mesmo ponto como se estivesse presa e não fizesse mais questão de querer relutar. Alex não soube dizer se era um sinal de que deveria se afastar ou se poderia continuar, mas, após mais longos momentos a encarando e sentindo sua angústia aumentar, decidiu que faria de uma vez o que tinha em mente. 

  Então, com toda a calma do mundo, inclinou seu corpo para a frente e apoiou as mãos no colchão, tendo habilidade e cautela para enfim deitar ao seu lado. 

  Inicialmente, a distância entre si ainda era considerável; o vão entre seus corpos permitia que mais uma pessoa se deitasse ali com grande facilidade, mas, para ela, não fazia mal. Preferiu uma abordagem mais paciente, e felizmente Ryujin não pareceu ter odiado a ideia, se levando em conta que não moveu um músculo ou se mostrou incomodada. E sentindo a tensão interior diminuir, se permitiu aproximar mais o seu corpo lentamente, de modo que apenas um palmo separasse seus rostos. 

  A olhando um pouco mais de perto e vendo o quão magoados seus olhos mostravam estar, sentiu uma grande sensação de insuficiência, tanto por não ter conseguido evitar que isso acontecesse e quanto por não conseguir fazer algo além de oferecer consolo. 

 

  Ela só queria que parasse, nada mais. 

 

  Suspirou em rendição e se aconchegou um pouco melhor no colchão. Com olhos apreensivos e afeiçoados, muito delicadamente subiu a mão até o rosto dela; usou a ponta dos dedos para colocar uma mecha de cabelo atrás de sua orelha para a enxergar melhor, e quando terminou, as costas desses mesmos dedos foram usados para acariciar sua bochecha de modo merecidamente brando. De cima para baixo, lenta e amorosamente, naquele carinho estendeu uma linha tênue entre um ato de amor egoísta e um ato de amor altruísta. Deixar de a tocar parecia injusto tanto consigo mesma quanto com ela, e por isso decidiu que não pararia tão cedo. 

  Para Alex, parecia certa loucura deduzir que Ryujin tinha se sentido um pouco melhor com seu toque, mas pôde dizer que, pelo menos, conseguiu a tirar de sua bolha com isso. 

  Depois de quase um minuto demonstrando parte de seu amor, a assistiu subir com demora aqueles olhos negros em direção aos seus. E uma vez conectadas, sentiu um imediato e reacionário arrepio que se espalhou por todo o seu corpo, a dando uma sensação incômoda de ambiguidade. 

  A não intensidade das íris de Ryujin a inquietou de maneira que não imaginou ser possível. De certo modo, ficou feliz de ter recebido um pouco de atenção, mas encarar aquela tristeza, de longe, não foi uma boa experiência, porque machucava ainda mais o que tinha restado de seu coração. 

  Mas isso nada a tinha a ver consigo, e sim com ela. E apenas ela.  

  Então, depois de ter engolido em seco aquela melancólica feição, suspirou profundamente e desceu um pouco mais sua mão pelo rosto dela, a pousando na região de seu maxilar e interrompendo temporariamente o seu carinho. 

  —Como você está? - Perguntou num tom íntimo e doce. 

  Alex tinha noção de que essa era uma pergunta da qual já sabia a resposta, mas não conseguiu encontrar outra alternativa que a possibilitasse iniciar uma conversa. Infelizmente se viu obrigada a questionar o óbvio. 

  Ryujin permaneceu em silêncio nos primeiros momentos. Seus dedos pararam de brincar com o tecido do travesseiro e tudo o que fez foi persistir em manter suas íris conectadas, por meio delas conversando sobre tudo e transmitindo o nada ao mesmo tempo. 

  –Eu… - Deu uma breve pausa e tornou a brincar com o travesseiro, não deixando que seu olhar desviasse nem por um segundo. Seu tom era baixo, rouco, lento e terrivelmente magoado. - Eu não sei… - Ergueu minimamente o canto dos lábios no que parecia ser um sorrisinho e piscou lentamente como se estivesse com sono. 

 

  Ryujin estava um pouco menos mal agora. 

  Assim como Alex, também tinha refletido muito durante o banho. 

 

  Alex assentiu fraco e passeou com seus olhos mais uma vez pelo rosto dela, se enxergando num misto entre admiração e indignação.  

 

  —Sinto muito… - Deslizou sua mão pelo pescoço dela e parou somente quando seus dedos se perderam em meios às mechas de cabelo, iniciando mais um intimista e suave carinho. - Eu não queria que você estivesse passando por isso… me desculpa.  

 

  Ryujin arqueou suas sobrancelhas aos poucos, de modo que esboçou uma feição penosa e até mesmo um pouco carente. Sentindo aquele toque em seu cabelo, demorou cinco longos segundos num hipnotizante silêncio até conseguir raciocinar a frase. 

 

  —Por que está pedindo desculpas?  


 

  Alex comprimiu os lábios e soltou uma risadinha nasal que se aproximava mais de um tom de descrença. 

 

  —Eu não sei, eu… - Rolou os olhos pelo quarto por estar se sentindo um pouco desconfortável. - Eu acho que… indiretamente tenho uma parcela de culpa no que aconteceu. 

  Ryujin se viu ainda mais confusa. 

  —Como? 

  Alex continuou explorando os cantos do quarto por causa de sua inquietação. 

  —Ontem, Ryujin… - Levou os dedos da outra mão para travesseiro que ela estava abraçando, também brincando com o tecido para se manter totalmente ocupada. - No estacionamento… - Ignorou o olhar mais intenso que recebeu. - A Areum me convidou para um encontro. 

  —Hm… - Foi tudo o que conseguiu dizer. 

  —E eu disse que não, claro. Mas… ela continuou a insistir por um tempo. Queria que eu a desse um bom motivo para negar, pois não aceitaria um não sem uma justificativa. Eu tentei contornar a situação, mas ela não estava disposta a desistir. E eu meio que… deixei escapar a informação de que estou apaixonada. - Deu uma breve pausa. 

  —Você disse que estava apaixonada por mim? - Esboçou um ceticismo neutro e tímido.

  —Não, eu não disse. - Negou com veemência, pensando que ela estaria vendo aquilo como algo negativo. - Mas foi nesse momento que eu te vi, lá, nos assistindo. Eu não consegui tirar os olhos de você, e ela percebeu… - Com um pouco mais de coragem, voltou a olhá-la nos olhos. - Depois que foi embora, ela me perguntou se era por você que eu estava apaixonada. Disse que se lembrava muito bem de quando você estragou os planos dela no dia em que nos beijamos… - Sorriu em auto depreciação por se considerar uma grande idiota. - Eu não disse que estava, mas também não consegui negar… - Tornou a desviar o olhar por estar se sentindo exposta demais. - E ela ficou furiosa quando ligou os pontos… 

 

  —Acha que ela fez o que fez por isso…? 

 

  Alex assentiu fraco. 

 

  —Acho… 

 

  Ryujin continuou assistindo Alex, que tinha uma feição de extrema culpa ao olhar para a parede atrás de si. 

 

  –Não foi sua culpa, Alex… - Negou com um tom passivo. 

 

  Alex se calou.

  Fez moradia para seus olhos no teto do quarto e dali não sentiu a necessidade de sair. 

 

  

  Quanto à Ryujin aconteceu o mesmo, também se calou, mas por outros motivos. 

  Dando continuidade para seus devaneios e sentindo a angústia a inferiorizar cada vez mais, chegou numa única conclusão sobre si mesma: odiava se sentir vulnerável. 

  A ideia de ficar exposta assombrava seu ser desde que se entendia por gente, e sabia que isso se dava pela personalidade que tinha. Durante sua infância, muitas vezes tentou se abrir para estabelecer relações, e em muitas delas acabou se magoando. Por consequência, o orgulho lhe serviu como ajuda para se manter mais fechada e inacessível, desse modo a livrando de muitas mágoas que estava sujeita a sentir. 

  Assim, acabou aceitando de bom grado esse traço de personalidade, e conforme os anos se passavam, aprendeu a se adaptar e moldar o orgulho para melhor se encaixar. E por mais que muitas vezes também gerasse conflitos e a fizesse tomar atitudes questionáveis, não tinha como negar sua eficácia. 

  Porém, a questão era que, infelizmente, seu orgulho não conseguia a proteger de coisas que estavam fora de seu controle. 

  Com sua aparência, por exemplo, por mais confiante que fosse, um simples comentário ou ofensa era o suficiente para que a porta de seu coração ficasse exposta para as pessoas fazerem o que lhes desse na telha. E por fruto disso, mais rancor passava a estocar em seu peito, assim como também a vontade de se fechar ainda mais. 

  E ela estava bem com isso, porque em sua maioria, funcionava. Mas passou a questionar todos os seus princípios quando conheceu Alex alguns meses atrás. 

  Não soube como, quando e nem porquê; mas apenas estar ao seu lado era um gatilho forte o bastante para a deixar vulnerável. 

  Alex abriu todas as suas portas como se não existissem obstáculos assim que se conheceram, e para piorar, não precisou fazer coisa alguma para conseguir essa proeza; quase que literalmente falando. 

  Ryujin se sentiu fortemente atacada com isso, e talvez esse tenha sido um dos maiores motivos pelo qual preferia distância dela nas primeiras semanas. (Você não pensou que aquela intolerância toda se deu apenas porque foi taxada de mal educada, não é...?) 

  Como em todas as outras vezes, ficou esperando pelo momento em que Alex fosse tomar alguma atitude que a magoaria, e seguiu essa mesma linha de raciocínio conforme a via sempre implicar com seu jeito e coisas gênero. Pensou que isso iria se evoluir para algo mais grave, e posteriormente teria seu coração machucado por tabela. 

  Mas não, não foi isso o que aconteceu. 

  Conforme as semanas iam se passando e Alex se mostrava unicamente doce e gentil, seu interior recuou num grande estranhamento. A cada dia estando lado a lado, mais passava a gostar de seu jeito e o que trazia junto com ele; o senso de humor, o modo como tentava agradar a todos, o jeito fofo e engraçado de confundir pronúncias em coreano… tudo. E, acima de tudo, o quase inexistente orgulho dentro de si. 

  Ryujin nunca tinha conhecido alguém assim, que contrastasse tanto sua personalidade nesse quesito. 

  Ver Alex levar tudo "numa boa" foi um dos primeiros indícios que tinha algo muito errado com ela, ou então muito certo. Por mais que se esforçasse para a afastar com grosserias, ela simplesmente relevava e, com um saudável senso esportivo, retribuía as implicâncias com sua leveza, de modo que Ryujin nunca conseguiu ficar verdadeiramente brava, por mais que quisesse muito.  

Mas, ainda sim, mesmo já se questionando sobre quais eram os seus sentimentos por ela, prosseguiu com um pé atrás por mera garantia. Afinal, Alex poderia cometer um deslize a qualquer momento. 

  E, se enfurecendo em antecipação pelo que supostamente aconteceria no futuro, criou uma barreira baseada em mais grosserias para poder se defender. 

Na realidade, quem acabou cometendo o deslize foi ela própria. 

  Ao recusar admitir que Alex fazia gentilezas por ser verdadeiramente gentil, usou de seu pior lado para a afastar quando demonstrou preocupação. E então foi a sua vez de magoar alguém erroneamente, sem nem ao menos ter um motivo plausível. Sendo assim, Alex justamente se fechou. 

  Ryujin pensou que, ali, a relação de amizade ou de qualquer outra coisa entre elas tinha se acabado por motivos óbvios. Mas não tentaria se redimir, porque bom, não valia tanto a pena assim. Imaginou que Alex logo superaria tudo aquilo e ambas fossem seguir seus caminhos. No entanto, mais uma vez acabou se enganando. 

  Saber que Alex, mesmo magoada, colocou o emprego em risco para a defender de um superior, foi um choque e tanto para seu interior lidar. 

  No melhor dos significados, nunca imaginou encontrar na vida alguém com tão pouco amor próprio. Parecia loucura ver alguém se doar dessa forma por uma pessoa com atitudes tão ingratas como a sua, mas foi o que aconteceu. E assim até mesmo seu orgulho se mostrou curioso para saber "qual era a dela". 

  Muito receosa e também radicalmente preparada para o pior, decidiu experimentar deixar Alex se infiltrar em seu coração para fazer o que quisesse. E ela o tratou tão… bem. 

  Ryujin viu tudo o que acreditava ser verdade cair por terra quando, enfim, percebeu que Alex não tinha nenhuma intenção de a fazer mal. Porque, sim, ela apenas fazia gentilezas por ser gentil; e também a tratava bem por ser genuinamente boa; a fazia se apaixonar por ser verdadeiramente apaixonante… nada mais que isso. 

  E, por mais que não tivesse desistido de seu receio, se deixou levar pela intuição que a incentivava a descobrir o que os encantos dela poderiam proporcionar. Em meio às conversas, implicâncias e toques significativos, se viu totalmente entregue à Alex, totalmente disposta a ver suas crenças serem refutadas. 

  E, realmente, elas foram, uma por uma. A partir do momento em que se beijaram, aceitou de muito bom grado o sentimento que seu orgulho ainda desconfiava muito. 

  Demonstrar através de beijos e carícias o que sentia era extremamente benéfico para seu coração, e parecia que aos poucos ele se tornava mais livre para se expressar e tomar partido em seus atos depois de muito tempo sendo regulado pelo ego. E esse, fortalecido por anos, não estava totalmente de acordo com essa nova realidade. 

  Quando se viu ser colocada na parede por Alex, que parecia precisar de provas verbais de amor, sentiu recuar algumas casas no jogo. Algo estava segurando seu braço e a arrastando de volta para dentro; a insegurança. Dizer claramente como se sentia era um dos últimos passos para a rendição, e uma vez tendo declarado isso, não teria mais volta. E, se não tinha mais volta, também não tinha um limitante para a manter na zona de conforto; estaria a mercê e completamente dependente de Alex, e como seu ciúmes a fazia questionar muito seu real valor, teve medo de que suas palavras acabassem sendo em vão quando ela se cansasse de sua pessoa e a trocasse por outra.

  Contudo, mais uma vez o destino a provou que estava completamente errada. 

  Alex, mesmo magoada por não ter seus sentimentos retribuídos, nem ao menos hesitou em a defender de Areum. 

  Ryujin mais uma vez não soube como reagir; enquanto assistia Alex ensaiar agredir Areum e em seguida destruir as coisas dela para se vingar, se sentiu no pináculo de sua surpresa. Com o coração dolorido pela rejeição ao seu corpo, acompanhar os movimentos de alguém que estava a protegendo era como… se sentir a pessoa mais amada de todo o universo. 

  Alex, mesmo em decepção, não deixou que ela fosse atingida pelas palavras infelizes de terceiros. 


 

  Protegeu o coração que lhe tinha sido entregue. 





 

  Ryujin sentiu o ar lhe faltar os pulmões numa breve volta à realidade. 

  Estava olhando para Alex, traçando seus pensamentos enquanto perdida num meio termo entre uma imersiva distração e uma absorta concentração. Por um momento, esqueceu do que tinha a feito ficar mal; a opressão causada pelos comentários infelizes já nem mais lhe incomodava. 

  Tudo o que passou a demonstrar em sua face foi uma sincera admiração e fascínio, que a cada segundo se tornava mais evidente conforme continuava a olhar para o rosto à sua frente. 

  Os olhos inconfundivelmente intensos estavam a enfeitiçando pouco a pouco sem nem ao menos estarem a olhando de volta, e acabou percebendo tarde demais que já estava completamente entregue por causa castanho esverdeado daquelas íris. Os traços artísticos que beiravam a perfeição naquele rosto, a atraindo sedutoramente como o melhor dos pecados. E aqueles lábios… 


 

  Ryujin tirou a mão do travesseiro. 

  Num movimento meramente inconsciente e delicado, levou a ponta de seus dedos até o rosto dela e segurou seu queixo. Com o polegar, acariciou o lábio inferior dela na expectativa de sentir a maciez e o calor daquela textura. 

  Da esquerda para a direita, do movimento mais intenso ao mais sutil, continuou tateando o lábio dela numa espécie de hipnose. 


 

  Alex abaixou o olhar com a mesma calma. 


 

  Ryujin, ao ver que olhos dela transmitiam grandes doses de doçura e apreensão, voltou a se questionar sobre a tal conclusão que tinha tirado sobre si mesma minutos atrás. 



 

  Olhando diretamente para aqueles olhos e sentindo seu coração bater na porta da sua garanta, percebeu que… 


 

  —Ei… o que foi? 



 

  …talvez, quem sabe, ficar vulnerável não fosse tão ruim quanto pensou. 



 

  —Talvez eu esteja um pouco apaixonada por você. 

 

  

  






 


Notas Finais


oLhA gEnTe Eu CoLoQuEi O nOmE dA fIc Na FaLa dA rYuJiN hAhA MuItO sAgAz

Alex nesse capítulo tava como >>>>>>> https://www.youtube.com/watch?v=_mamyfkb3Wk&ab_channel=HenriqueSilva


Galerinha, mil desculpas mesmo pela demora. Das três semanas sem postar eu realmente fiquei ocupada na primeira e não consegui encontrar tempo e disposição pra escrever, e nas duas últimas eu sofri demais com o bloqueio. O capítulo ficou enorme e eu acabei colocando muita informação condensada numa coisa só, mas espero do fundo do coração que ele pareça coerente e que siga uma linha boa de raciocínio para não parecer confuso.
Inclusive, também peço desculpas pelos comentários que eu demorei a responder, prometo que não vai se repetir <3

Ah, e pra quem teve paciência de ler as notas finais, tenho um recado:
Se quiserem, me sigam no twitter porque quero amigar com vocês. Aliás, eu até já vi algumas pessoas falando da fic por lá, então se vocês não me seguirem eu vou seguir vocês garaio
ahuhushauhu o user é @im_fucking_sad eh isto

Até o próximo capítulo <3


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