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História A menina e o Mundo - Minha Dor


Escrita por: Luciuslestrange

Capítulo 2 - Minha Dor


Fanfic / Fanfiction A menina e o Mundo - Minha Dor

Se você lembrar
Leve minha dor
Se ela não quiser
Diga que eu mandei

 

Era uma aula de física, uma fatídica e insuportável aula de física. O professor de física tentava insistentemente fazer a sala se concentrar nas fórmulas, mas as panelinhas e as solidões já estavam formadas. Ela sequer prestava a atenção nele, a tempos já tinha desistido de entender uma série de coisas, e isso incluía as aulas de física. Ela olhava tudo ao redor, mas não conseguia captar nada de interessante... As pessoas comentavam de coisas ridículas, como festas e as benditas nove milhões de visualizações do clipe da Melanie Martinez. Como eram ocas aquelas criaturas... Não pensavam, amavam pouco e entregavam-se ridiculamente, como se o amor fosse o mar e e ele um banhista em dia de frio. Ahhh... Mal sabiam eles, aquelas pessoas tão chatas em sem graça, como era bom amar. Amar em sua plenitude, curtindo todos os prós e contra que todos nós sabemos que existem.
Ela, Maria Clara, era daquelas que já tinha amado de todas as maneiras, já tinha sido amada e odiada na mesma intensidade, já tinha proporcionado muito prazer e muita dor, mas assim como a música de Caetano, estava feia louca e só.  Em uma solidão gostosa até, com muita MPB e muita poesia. Clarice Lispector tinha se tornado a grande amiga em um tempo em que todos aqueles que se faziam de amigos tinham ido para o lado da outra. As coisas para ela estavam sendo duras, e o tempo tinha resolvido passar as suas horas -sempre mortas -  em câmera lenta pra ela. Era uma um troço estranho esse tal de te tempo, quando você quer ouvir uma música da qual você é apaixonado ela tem só dois minutos, mas quando você vai ver alguém por quem você é perdidamente apaixonado mas hoje nem olha na sua cara, ele demora séculos e séculos para passar.
O tempo é bem sem graça quando ele quer.

Aqui não tem mais jeito
De bem não vou ficar
Me calo pra tentar esquecer...


Fazia um dia insuportavelmente ensolarado, de modo que mesmo quando puxavam as cortinas cor de carne da sala, o sol, malandro, ainda dava seu jeitinho de atormentar Clara. Mal sabia ele que se a intensão era deixa-la em pleno estado de cólera, ele não iria conseguir, até porque Flávia fazia isso como poucos.

Era meio apagada, era muito pálida mesmo e quando pintou os cabelos de cor de rosa, não imaginou que ia ficar ainda mais apagada.  Adquiriu uma postura de ridícula de Top Model magrela na passarela, sem aparência ou traços específicos. Tinha ficado ainda mais pálida pelo cabelo e, devido as paredes da sala de aula serem brancas, as vezes brincava que se ficasse nua e encostada na parede, ninguém saberia o que era parede o que era Maria Clara. Rir é o melhor remédio, da sua desgraça então, é sensacional!
Estava lá, sentada no melhor estilo Nara Leão (que ela achava uma sonsa, mas se identificava as vezes), com as perninhas finas cruzadas enquanto mirava com uns olhos azuis (também muito azuis, muito apagados) o desconhecido.
Era difícil sair da posição ''Nara Leão.'' Os cortes ainda estavam frescos e pulsantes, como uma série de pequenos corações que pulsavam ao redor do corpo. Eles até eram úteis quando ela os fez, eles a ajudavam a se  acalmar e era até bonito ver o sangue escorrendo de toda a pele branca da menina. Mas agora, eram só dor. Ela tentou escrever poesias para passar aquela maldita aula de física, mas sabia que se mexesse os braços doeria - já que as duas juntas dos pulsos também estavam cortadas - e sairia depressão dos dedos da mesma. Era melhor ficar ali, curtindo animadamente aquela gente foda da MPB, Marcelo Jeneci, Otto, Céu... Mas ninguém a entendia  e cantava suas dores tão bem quanto Pélico. Ninguém.

 

Aqui não tem mais jeito
De bem não vou ficar
Me calo pra tentar esquecer...


Os minutos passavam cada vez mais lentos, a voz do professor cada vez mais alterada e as gargalhadas mais estridentes. Ela se perguntou por um minuto se ela tinha morrido e aquilo era o inferno. Ahh, aquilo tinha uma cara de inferno do caralho! Ver Flávia ali, a três carteiras de distância e não poder trocar uma palavra com ela era como... sei lá, era como enfiar uma faca pela garganta, uma faca de aço, polida e bem afiada, que entra macia na garganta perfura e corta o coração. Como gostava de cortes aquela menina, na encarnação passada deve ter sido açougueira ou o cutelo. Cortes na pele, corte de amizades, cortes de amor... O amor é uma faca devoradora, de dois gumes ainda! Mas ela nem tentava mais desviar, já ficava com os braços estirados como Jesus Cristo, pronta para ser atingida pelo desconhecido que ela conhecia muito bem. Aprendeu com a mãe  - uma mulher infeliz e deprimente, que deixou Clara quando ela tinha dez anos, - que as pessoas só percebem que você está ferida por dentro, quando você se fere por fora. E ela tinha aprendido como ninguém aquela lição.
Era difícil para ela acordar todo dia. O cubículo das paredes brancas que ela chamava de quarto, transpiravam a sensação de manicômio, o forro branco de Pvc, a deprimia profundamente e nos fones de ouvido só tocavam músicas que a deixavam pra baixo. Era difícil para ela fugir daquela força estranha, aquela agonia, aquela vontade  de ir cortar ''todos os pulsos do mundo'' enquanto tomava chá de maçã e canela na caneca da Frida Kahlo. No fundo, não queria mesmo , era lembrar da menina dos cabelos coloridos e tudo levava a Flávia, mas Clara tentava fugir disso, tentava viver sua vida tranquilamente. Ela fumava desajustadamente seus cigarros, regava as plantas da avó  que secavam, colocava a camiseta ao contrário, cortava todas as cebolas da casa, arrastava móveis, incensava... Tudo para esquecer de Flávia.

Sigo como der
Por ora, vou sofrer
Mas quando me deixar
Por onde andarei?


Mas existem muitos perigos nessa vida, um deles é se apaixonar por uma pessoa da qual você convive diariamente, o amor acaba mas a convivência continua, e, pelo que mostram os papos (ou a falta deles), a convivência tá uma bosta.
Flávia as vezes olhava descaradamente para Clara, mas essa por sua vez a fazia de invisível, como se a menina dos olhos castanhos não estivesse ali, como se seus olhos não mirassem os dela. As vezes, por pura birra, ela fazia uma cara feia, uma cara de Elis Regina quando canta ''Como Nossos Pais'', no Fantástico.
Era difícil fugir dela, mas ela tentava. Mostrava-se indiferente a todos os comentários sobre ela, quando a via desviava o olhar ou fechava a cara, quando as duas por ventura se cruzavam ela trocava de lado... Eram coisas desnecessárias ao ponto de vista de Flávia. Foi lindo, foi mágico, mas ok, acabou. Mas ela dizia isso pelo fato dela ter entrado com os chifres, não de ter sido a chifruda.
Mesmo com os fones no volume máximo, conseguia ouvir as gargalhadas de Flávia, como gostava de ser ''sociável'' aquela menina, minhas Bacantes! Será que ela não via aquela indignação velada e muda ? Depois de brincar com todos os outros, de vender seu corpo por vil metal, ela voltava a fixar os olhos em Maria Clara. Ela fechava a cara e Flávia virava para frente, de lábios virados para baixo.
no fundo era isso que ela queria, que ela sentisse na pele como era duro viver sozinho, que aqueles sorrisos que ela vendiam eram tão falsos quanto as lágrimas de um crocodilo, que ela sofresse tudo que Clarinha estava sofrendo, que ela sofresse como a interpretação visceral de ''Atrás da Porta.'' Queria um samba-canção, como só Chico Buarque fazia.

Se em tudo me quiser
Será como eu
Que vivo pra tentar esquecer
Flávia tinha chego a cerca de dois meses. Era bonita, tinha uns cabelos coloridos em tons de verde e azul, uns olhos castanhos e uma boca fina. Clara tinha se encantado pela magrelinha, pela "menina nova," desde o primeiro momento. Ela com aquele olhar de bicho acuado, aquela postura arcada e os calça dobrada. Era bem diferente de todas as  meninas que ela já tinha ficado, parecia ser feita de uma coosa diferente, ter saído de um daqueles desabafos do Tumblr, ou desses contos contemporâneos.
Clara foi a primeira a recebe-la, quando Flávia a viu pela primeira vez sorriu um sorriso lindo, a desgraçada tinha um sorriso que que era um caralho de bonito! Maria Clara sentou ao lado dela em todas as aulas, as duas conversavam sobre tudo, até que por descuido, Flávia ergueu a manga do casaco mostrando os cortes no braço. Estavam cicatrizando, ok, mas não pareciam tão antigos ao ponto de ficarem da cor da pele. Clara também mostrou os dela, que já tinham cicatrizado a tempos. Aquilo as ligou profundamente, naquele mesmo dia, Flávia roubou um beijo da menina. Foi violento, Flávia chegou a arrancar sangue dos lábios da menina. Deste dia em diante, começaram a se beijar e andar de mãos dadas na quadra, na hora do intervalo. Eram um casal.
Um estranho casal


Não importam os tais
Se tantas vezes desabei
Escolho continuar
Com esta dor me acostumei
É só deixar e esquecer

O problema é que a tal da Flávia era um amor, se dava bem com todo mundo e todo mundo já amava ela, e a  Clara já não estava gostando de brincar disso. Ela era das mais problemáticas, se achava um lixo de serumaninho, sempre tinha que tomar remedinhos para continuar sobrevivendo... Pra quem a vê assim, cantando nãos sabe a barra que sempre foi a vida da menina.
 Teve uma vida complicada, o pai fugiu no mundo porque não queria ter filho, viu a mãe ser estuprada, foi estuprada por um tio quando a mãe sumiu no mundo, depois viu a mãe se suicidar... As coisas so mudaram um pouco quando ela foi morar com a avó, que preencheu todas aquelas lacunas.
Problemas a parte, Clara foi achando que    Flavia fazia aquilo de propósito, que ela queria que a namorada visse que ela podia ser feliz sem ela, que ela não era nem um pouco necessária.
Foi cruel da parte de Flávia, isso era fato. Ela sabia como Clara era complicada, e ela tinha prometido ajuda-la... Mas a parte boa, é que Flavia voltava, e quando voltava, ela gratificava a namorada com os beijos mais doces e os espasmos mais prazerosos. Ela estava aprendendo a conviver com aquilo que todos chamavam de "relacionado abusivo," quando a bomba estourou.
Clara tinha uma amiga, Eduarda o nome dela. Tinha uns olhos e cílios lindos, um cabelo grosso tipo Gal Costa tropicalista, um narizinho achatado de batata repleto de sardas, alem de uma impassível cicatriz na testa.
As duas viviam em uma relação complicada, ambas tinham problemas parecidos e graças a isso sempre se exasperavam, mas voltavam as boas.
As coisas começaram a mudar quando Eduarda se aproximou subitamente de Flávia, com abraços que demoravam muito para terminar e beijos próximos da boca. Clara no começo achava normal,mas com o passar dos dias foi notando que as coisas estavam estranhas, que a sua suposta namorada estava ficando tempo demais com a amiga. Ela não sabia o que fazer, então foi ficando mais na sua, foi se distanciando de tudo e de todos. Flávia até tentava fazer como sempre fazia, com os beijos mordidas as carícias, mas Clarinha não estava mais disposta a aguentar aquilo, não com Eduarda, que mais parecia uma preguiça bêbada agarrada num bambu. E alem disso tudo, era sua amiga.

Não dá pra imaginar
Como aconteceu
Que o fim dessa história
Seja todo seu

Elas terminaram num dia de frio, Flávia estava bem calma e Clara queria ao máximo parecer conformada, mesmo tendo recebido dois dias antes uma (maldita) foto de Eduarda e Flavia trocando beijos no parque. Elas marcaram na casa de Maria Clara, a avó que não sabia como ajudar, aceitou emprestar a casa sem pestanejar.
 A principio a "brilhante ideia" foi de Flávia, ela disse que queria sentar e explicar as coisas como elas eram, e para que isso ocorresse de forma correta, não poderia ser numa sala de aula. Clara apenas concordou, como sempre.

  Maria pensou em colocar uma Elis Regina daquelas bem dramáticas, daquelas musicas tipo "Moda de Sangue," "Atrás da Porta" ou "Altos e Baixos", mas isso seria colocar sal em ferida expostas. No fim, Flavia nem apareceu, isso atiçou ainda mais o lado demoníaca de Maria Clara. Ela foi até uma mesinha e apanhou uma garrafa de uísque, sentou no sofá do lado e bebeu. Ela estava lá, mostrando pra toda aquela gente o que é sofrer.
Quando já tinha anoitecido, ela tomou coragem - ou o álcool subiu a cabeça - ela tomou coragem, pegou o celular e foi direto atrás de Flávia.

Quando me notar
Longe estarei
Livre pra tentar esquecer

" Sabe Flávia, eu tive de beber muito pra chegar aqui e chamar você. Foi até bom você não ter aparecido aqui, assim eu acabo com toda e quaisquer possibilidade de volta, acabo com as minhas esperanças. Eu cansei, cansei de ser a trouxa, de perder meu tempo tentando me convencer que o meu tempo e junto do seu. Vai ser difícil esquecer você. Os seus olhos, a sua boca e a forma sensacional em que o vento sopra encaracolando os seus cabelos.  Vai ser doloroso, eu sei, mas nenhuma dor é eterna.
Eu to ouvindo "Alma Sebosa," do Johnny Hooker, pra tentar ficar bem e odiar você, mas eu não tô conseguindo, ta difícil. Não ligue para a palhaçada que, apesar do orgulho, estava disposta a recomeçar, que queria entender o porquê de você fazer tudo isso, não ligue pra ela. Ela é uma tola que achou que você seria capaz de poupa-la dessa forma satânica de amor. Como eu disse, ela é uma tola.
Sabia que ela tinha parado de representar, ela não ia mais representar, não pra você.
Ela não via mais nada em seus olhos, então ela resolveu parar de representar, sabe ?
Mas ela vai ficar bem.

Ela não quer que você fique.



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