História A Mentira - Atrás de um perdão e não de um término

Estávamos na estrada há apenas trinta minutos e minha atenção estava voltada totalmente para a paisagem no lado de fora. Jeongguk mexia no seu celular distraído e em um dado momento ele tirou o fone de ouvido da sua mochila e conectou no aparelho, colocou o mesmo e pegou o livro que lhe emprestei, abriu em uma página específica e começou a ler. 

Fiquei o observando de lado e reparei nos seus olhos concentrados; a expressão contraída porque pareceu ler algo que não esperava, seus dedos da mão direita batucando no apoio para os braços do banco.

Respirei fundo e tentei organizar meus sentimentos. Jeongguk, o garoto popular, que tem uma agenda cheia demais para ir em um acampamento de astronomia está nesse momento sentado ao meu lado lendo um livro que eu indiquei. 

É universo, parece que o mundo dá voltas mesmo.

— Quer ouvir também? — tive um pequeno sobressalto quando ouvi a voz de Jeongguk.

— Hã?

— Música Tinker Bell, quer ouvir música comigo? — perguntou novamente.

— Ah, tudo bem — ele estendeu um dos fones para mim e me surpreendi pela música que estava tocando. — Justin Bieber, sério?

— Claro, ele é o melhor — disse me encarando.

— Ata — resmunguei. — Ele nunca chegará aos pés de Ed. Sheeran — o garoto ao meu lado me encarou e fiz o mesmo.

— Você é sempre do contra, não é?

— Só com você — sorri com escárnio.

Inesperadamente ele pegou delicadamente na lateral da minha cabeça e a empurrou na sua direção, encostou-a no seu ombro e eu olhei para cima o encarando.

— É para você ficar mais confortável enquanto lê comigo — explicou como se fosse telepata.

Não questionei porque já me dei por vencida e aceitei que Jungkook é esquisito e eu não posso mudar isso nele, infelizmente. Não li, pelo contrário, me senti inebriada pelo cheiro do garoto e fechei meus olhos, mal percebi quando peguei no sono.

[ …. ]

— Como assim você não trouxe uma barraca? — perguntei colocando minhas mãos na cintura.

— Eu saí com muita pressa Tinker Bell, não tive tempo de pensar nisso.

— Não teve tempo de pensar em trazer uma barraca? Para um acampamento? — estava incoformada.

— Tudo bem _______, daremos um jeito nisso. Não se preocupe — Namjoon, o pacificador, falou.

— Bom, também você é minha namorada não veria problema nenhum em dividirmos a barraca — Jeon falou de modo descarado claramente colocando subentendido intenções infundadas, deixando tanto a Namjoon, quanto a mim sem graça.

— Os gêneros não podem se misturar nas barracas Jeongguk — o coreano ao meu lado explicou. — O diretor pediu para que isso não acontecesse.

— Mas você é meu parça…

— Sinto muito — deu de ombros e saiu andando para a área aberta aonde os outros já montavam suas barracas.

— Aish...

Peguei minha mochila e também comecei a caminhar para onde iria montar a minha barraca, o sol já estava se pondo e deixava um crepúsculo maravilhoso desenhado no céu. Me abaixei tirando as coisas da minha mochila e reparei em Jungkook ao meu lado.

— Quer ajuda? — perguntou.

— Você sabe montar uma barraca? — ergui minha sobrancelha duvidando muito disso.

— Vai por mim, não me chamam de garoto de ouro apenas por minhas habilidades entre quatro paredes — piscou, revirei os olhos e me afastei da minha mochila enquanto Jungkook já se abaixava e soltava a barraca.

Juro, ele não demorou nem cinco minutos para erguer a barraca. Fiquei surpresa? Obviamente. Admitirei isso? Não.

— É, até que ficou boazinha — fiz pouco caso.

— Caralho, olha o tamanho disso; dá pelo menos cinco pessoas aí dentro e não me deixam dormir com você.

— Primeiro, exagerado. Segundo, mesmo que fosse permitido você dormir comigo eu não iria querer. Obrigada. De nada — peguei minha mochila do chão.

— Você me trata tão mal e eu sou um namorado tão bonzinho — fez uma cara triste que se eu não conhecesse a peça até diria que é verdadeira.

— Porque lhe convém, né?

Ele sorriu mostrando aquele sorriso estranhamente semelhante a de um coelho.

Odeio Jeon Jeongguk, principalmente por ele ser bonito.

— Vou entrar para descansar um pouco.

— Descansar? Acabamos de chegar.

— Vou ficar acordada a noite inteira, então preciso tirar uma soneca agora e se você não me incomodar durante esse tempo eu agradeceria muito — dei um sorriso irônico para o coreano.

— Imaginei que seria chato, mas não tanto. Tudo bem Tinker Bell vai lá tirar sua soneca de fadinha, eu vou ver com o Einstein ali aonde irei dormir e depois vou dar uma corrida para não perder a rotina — disse e já saiu andando em direção ao Namjoon.

Entrei na minha barraca e esperei pela noite que logo chegaria.

[ …. ]

Abri meus olhos aos poucos e percebi que tinha dormido de boca aberta, limpei a baba que tinha no canto da minha boca e olhei as horas no meu celular, passava das nove da noite. Me surpreendi por ter dormido tanto então tratei de sair, a primeira coisa em que reparei foi nos meus colegas sentados ao redor de uma fogueira prestando atenção em algo que Jungkook contava animado. Abracei meu corpo por conta da brisa gélida que se chocou contra mim e olhei ao redor; Namjoon estava em um canto mais afastado arrumando as coisas para a observação, fui até ele e parei ao seu lado. Ele me olhou e sorriu.

— Finalmente acordou — disse voltando a se concentrar no seu equipamento.

— Precisa de ajuda com alguma coisa? — perguntei.

— Não, está tudo bem aqui — nesse momento ele deixou algumas coisas cair no chão e eu ri por conta do seu constragimento. Me abaixei para pegá-las. — É, talvez um pouquinho de ajuda não faça mal.

— Por que os outros não estão aqui te ajudando? — Namjoon pegou uma peça da minha mão e encaixou em algo que ele segurava.

— Jeongguk está contando algumas histórias interessantes e eles parecem bem compenetrados, decidi não atrapalhá-los — explicou.

— Ah, sim.

— Posso te fazer uma pergunta _______? — assenti então ele continuou. — O Jeongguk não está aqui para observar nada com a gente, né? Ele está aqui porque está com ciúmes de você comigo.

Arregalei meus olhos e gaguejei um pouco antes de responder.

— Jeongguk não sente ciúmes de mim Joonie — dei um sorriso, o menino me encarou.

— Qualquer cara sente ciúmes da namorada, ainda mais se ela for igual a você — voltou para o que estava fazendo. Agradeci por está de noite porque se não daria para o coreano ver minhas bochechas rosadas. — Acho que ele pensa que eu sou uma ameaça ou algo do tipo — deu de ombros.

Olhei para a fogueira aonde Jeongguk ainda conversava com os outros e ele pareceu sentir que eu o observava pois também me encarou. Ele sorriu e piscou um dos olhos para mim, desviei meu olhar e ouvi sua risada.

— Está pronto — Namjoon endireitou a postura.

— Irei chamar os outros — falei, o vi aquiescer então caminhei para perto da fogueira e avisei a todos que estava tudo pronto.

Apenas Jungkook ficou sentado no seu lugar e eu ergui o supercílio.

— Você não vem?

— Não Tinker Bell, irei ficar vendo vocês daqui. Sei que será uma experiência incrível, mas eu passo — soltou sarcástico, revirei os olhos voltando para aonde meus colegas estavam.

Ficamos ali por horas, é incrível observar o céu daqui de onde não existem postes ou poluição suficiente para encobrir o brilho das estrelas.

Aos poucos cada pessoa ia se dispersando, o último que resolveu ir descansar foi Namjoon, ele se despediu de mim e seguiu para a sua barraca. Como dormir mais cedo pretendo ficar aqui para ver o sol nascer no horizonte. 

Me sentei na grama e apenas ouvia o som dos grilos. Acho que já passava das três da manhã e o frio tinha aumentado significativamente, mas eu não queria sair dali foi então que eu ouvi passos atrás de mim, pensei se tratar de Namjoon voltando para me fazer companhia, mas me surpreendi quando uma manta foi posta delicadamente sobre meus ombros olhei para trás e vi Jeongguk vestido em um moletom preto enquanto usava uma touca da mesma cor.

— O quê está fazendo aqui fora a essa hora, nesse frio? — perguntou ainda de pé.

— Vou esperar o sol nascer — falei.

— Mas ainda falta horas para isso acontecer.

— É, eu sei.

— E pretendia morrer de hipotermia até lá? — ergueu o supercílio.

— Não, então obrigada pela manta — sorri e o vi amenizar um pouco sua expressão.

— Por nada — ele se sentou ao meu lado e eu o fiquei encarando com o cenho franzido. — Estou sem sono, vou te fazer companhia — explicou.

Voltei a olhar para o céu e fiquei em silêncio, pela minha visão periférica vi Jungkook fazer o mesmo.

— Tem como ver alguma daquelas constelações de que você tanto fala sem usar um telescópio? — me surpreendi com a sua pergunta, mas logo tratei de apontar para o conjunto de três estrelas que estava a nossa frente. — As Três Marias?

— É como são comumente conhecidas, mas seus nomes verdadeiros são Alnitak, Alnilam e Minatka — olhei para Jungkook e o vi fazer uma careta, sorri e voltei apontar para o céu. — A partir dessas estrelas você encontra a constelação de Órion, a mais popular. Observe bem, se ligarmos todos os pontos conseguimos desenhar um homem segurando um arco-flecha.

— Puta que pariu… verdade — disse depois de um tempo observando.

— Tem uma teoria que diz que as pirâmides de Gizé, aquelas que ficam no Egito, imitam o cinturão de Órion, porque assim como ele as pirâmides não possuem uma simetria perfeita e estão voltadas para o Rio Nilo como as estrelas estão para a Via Láctea — Jungkook ainda continuava a encarar o céu.

— Então isso quer dizer que foram os E.T's que construíram mesmo as pirâmides? — questionou, dei uma risada e o garoto me encarou risonho. — Estou falando sério.

— Bom, toda possibilidade é uma possibilidade — dei de ombros.

— Você é inteligente para caralho Tinker Bell — comentou deitando na grama com a cabeça apoiada nas palmas de suas mãos. O imitei arrumando a manta para que ela ainda me esquentasse. — Bela namorada de mentira que eu arrumei, hein?

— Você é mesmo um homem de sorte — soltei e ele riu.

— Ah, antes que eu me esqueça — colocou a mão dentro do bolso do seu moletom. — Chocolate para a princesa — estendeu para mim. Aceitei de bom grado porque comida não rejeitamos de jeito nenhum.

Comi a barra de chocolate devagar, enquanto isso Jungkook cantarolava uma música qualquer, terminei de comer e fechei meus olhos. 

Estava cansada, mas não iria dormir. 

O tempo foi se passando até que uma dúvida do nada surgiu na minha cabeça.

— Jeongguk? Tá acordado? — olhei para o lado.

— Uhum — resmungou de olhos fechados. Me deitei de lado e fiquei o encarando mesmo que ele não fizesse isso de volta.

— Supostamente a escola inteira acredita que eu sou sua namorada, certo? — O vi aquiescer. — E isso incluí a Yeri também.

— Essa é a ideia.

— Sim, mas seu plano não é conquistá-la e tudo mais? Como você espera que Yeri fique com você se supostamente estamos juntos? — Jungkook franziu o cenho e finalmente abriu os olhos me olhando.

— Como assim?

— Para você ficar com a Yeri terá que terminar comigo. Podemos encenar alguma coisa, não na frente da escola inteira, obviamente, porque seria muito humilhante, mas tipo, espalhamos a notícia que terminamos e depois eu apareço um pouco “abalada” na escola para sustentar um pouco mais a mentira. Então você poderá enfim partir para a Yeri — expliquei calmamente e o vi me analisar. O coreano apoiou seu corpo no seu braço esquerdo e virou-se de frente para mim.

— Quer terminar comigo?

— Sim, quer dizer não. Sim, mas apenas para não ficarmos mais nesse impasse.

— Eu não acho que deveríamos terminar agora — disse sério.

— Por quê? — fiquei confusa diante da sua recusa, Jungkook se sentou, endireitou a postura e pigarreou.

— Ainda não estou no nível que quero com a Yeri.

— Mas não acha que para chegar nesse nível é mais fácil que terminemos?

— Não.

— Não?

— Não Baker, não viemos aqui para terminar e sim para você me perdoar. Não invente isso agora — não estava entendendo a reação de Jungkook a minha proposta. Me sentei também para olhá-lo melhor.

Fiquei o encarando e Jungkook fazia o mesmo, e então ficamos nesse impasse por um bom tempo até que por fim suspirei e voltei a olhar para frente.

— Às vezes eu não te entendo — externei meu pensamento.

— É o meu jeitinho de ser — debochou.

— Mas então, quando você chegar nesse tal “nível” com a Yeri, como pretende se declarar para ela? — perguntei me sentindo realmente curiosa.

— Hum… vou chamar ela para ir naquela sorveteria da frente da escola e dizer que gosto dela.

— Só isso? — fiz careta.

— É muito ruim?

— Péssimo — fui sincera. Jungkook se sentou de frente para mim.

— Caso fosse com você como gostaria que um cara se declarasse? — imitei sua posição e o encarei.

Quem olhasse de longe parecia que eram os amigos compartilhando de algo muito pessoal. Percebia-se isso apenas pelas nossas expressões corporais. 

— Bom, eu iria querer que me levasse para um lugar especial que seria o “nosso lugar”, ele não poderia deixar muito evidente que se declararia, surpresas são mais emocionantes, então ele se declararia para mim. Na minha opinião já que você tem uma boa voz para cantar deveria escolher uma música que conte a história de vocês e cantá-la, seria perfeito — terminei meu raciocínio.

— Como sabe que eu canto?

— Na noite que estava na sua casa talvez eu tenha ouvido um pouco você cantando para o seu pai. Acidentalmente é claro — reforcei.

— Hum… — tinha um garoto concentrado na minha frente. — Você até que é bem romântica Tinker Bell. Mas como nós ficaríamos depois de tudo isso? — me encarou de novo.

— Bom, eu saio do grupo das líderes de torcida e volto a ser invisível como sempre fui antes de você aparecer — dei de ombros, Jungkook parecia incomodado com algo porém parecia ter receio de falar.

— Mas e nós?

Dei um sorriso sem graça e desviei meu olhar.

— Depois de tudo não existirá um “nós”, apenas você e Yeri. Jeon Jeongguk o popular, amigo de todos, bom na matéria de artes e péssimo em exatas. Yeri líder de torcida, simpática, perfeita, inteligente e ótima em música. _______ Baker e… quem é essa mesmo? — ri com minha própria piada idiota. — Os eixos serão alinhados novamente. Os astros entrarão na rota e sairei dessa realidade paralela que é uma nerd de astronomia namorando o capitão do time de basquete, me sinto muito em um clichê americano. Agora só falta algum de nós se apaixonar pelo outro para a história sim ser um verídico filme adolescente estadunidense — gargalhei. 

Jungkook ficou quieto de repente o que não é comum para ele, então para tentar mudar o clima voltei a falar.

— Bom, esse é o último ano mesmo, então provavelmente nem vamos mais nos ver ano que vem — sorri.

— Podemos pelo menos ser amigos — sugeriu.

— Vai por mim meu querido Gguk, quando você começa a namorar, ainda mais se for a sua crush de anos, você deixará um pouco os seus amigos de lado. Além do mais, seria estranho se nós “ex namorados” do ensino médio sendo amigos.

— É, talvez você tenha razão — por fim ele voltou a amenizar sua expressão.

Foi então que um primeiro de luz atingiu meu olho e tive fechá-lo, olhei para o lado e percebi que já estava amanhecendo e com isso o sol vindo junto. Arrumei minha posição para olhar para o nascer do sol e presenciei uma das cenas mais lindas que existem, porém minha mente não estava ali. 

Estou triste pela conversa que acabei de ter. Não é como se eu não pudesse mais viver sem Jungkook, mas… não sei se tudo vai voltar a ser tão bom quanto era antes sem esse coreano intrometido e egocêntrico.