Mesmo não conseguindo vê-lo de onde eu estava, tinha certeza que ele estava lá fora, esperando meu turno terminar, exatamente como disse que faria.
***
— Lucy… Isso… Por… Como assim? Eu vou… – andou até a saída e voltou. — Por que você não… – parou quando o sininho da porta soou.
Nashi já havia parado de choramingar e mexeu as pernas querendo chão. A coloquei no lugar dela e ela voltou a brincar, mas eu sabia que a menina prestava atenção em tudo.
Natsu passou a mão pelos cabelos e eu quase podia ver as engrenagens funcionando.
— Eu 'tô trabalhando agora e não posso fazer isso. – consegui falar.
Eu ainda estava em choque.
— É… Certo... 'Tá bom… – respirava rápido. — Vamos conversar depois. Que horas você sai? Pode ser hoje? — parecia perdido.
Ele deu espaço para alguém chegar ao caixa. A pessoa me entregou o que escolheu, pagou e saiu.
— Eu saio às 18 horas.
— Bom… Isso é… bom… Eu vou... esperar lá fora… e... É isso. – virou-se e saiu.
***
Ainda eram 17h55. Realmente, quando estamos ansiosos o tempo não passa.
Com certeza aparentava ser a calma em pessoa, mas isso era só por fora. Por dentro me sentia enjoada, queria fugir, me esconder debaixo das cobertas e esquecer que o resto do mundo existia, mas não podia, tinha minhas responsabilidades. Além disso, nós precisávamos conversar. Eu precisava saber o que houve e o porquê dele ter desaparecido esses anos, apesar de desconfiar do motivo.
— Finalmente. – suspirei. — Hora de ir.
— 'Xim, 'finamente. – tentou imitar meu suspiro, mas saiu um sopro e eu ri.
— Só você mesmo 'pra me fazer rir agora.
Peguei uma das bonecas e guardei na mochila. Ela abraçou a outra e nós nos aprontamos para sair.
— Nashi, você quer fazer xixi antes de ir?
— Não.
— Tem certeza?
— 'Xim.
— Então vamos.
Quando nos aproximamos da porta, ela parou.
— 'Queio 'faze xixi.
Revirei os olhos e a levei no banheiro.
— 'Tá pronta? – perguntei saindo do banheiro.
— 'Xim.
Nos aproximamos novamente da porta e ela parou, de novo.
— Mamãe…
— Hum? – ela parecia tímida e nervosa. Me aproximei. — O que foi?
— Eu 'tô bonita? – perguntou mexendo na barra do vestido. — Meu 'cabeio 'tá bonito? – ela olhou para frente e depois para o chão.
Olhei para trás e vi que Natsu estava parado na calçada, então aquele era o motivo das perguntas. Me aproximei e agachei na frente da pequena.
— Você 'tá linda, minha princesa. A menina mais linda desse mundo todo. – falei colocando uma mecha de cabelo atrás de sua orelha.
Ela sorriu ainda olhando para o chão.
— Eu 'aquedito na mamãe.
— Vamos agora ou você quer esperar um pouco? – falei segurando sua mãozinha.
— 'Vamo.
Ela abraçou a boneca e nós saímos da loja. Tranquei a porta, fechei as grades e quando virei, me assustei, pois Natsu estava bem próximo.
O alvo da sua atenção era Nashi e quando ela percebeu isso, corou mais ainda e abaixou a cabeça, abraçando a boneca e se escondendo atrás da minha perna. Ele riu diante dessa ação.
— Podemos conversar agora?
— Lá em casa é melhor.
Enquanto andávamos em direção ao ponto de ônibus, Natsu segurou meu pulso. Senti um friozinho na barriga diante desse simples toque.
— Entra. – disse olhando para um carro.
— É seu? – assentiu. — Bom, o que você acha, filha? Prefere ir de ônibus ou carro?
— 'Caio.
Quem disse que criança é boba?
— Eu só não tenho cadeirinha.
— Tudo bem, eu vou atrás e ela vai no colo.
Me acomodei no banco e a peguei. Nashi olhava tudo, sempre foi muito curiosa.
— Você quer que eu aumente o ar ou 'tá bom? – perguntou assim que entrou e bateu a porta com força, fazendo a menina pular com o susto.
— 'Tá bom assim, né? – perguntei e ela assentiu. — Olha, Natsu, se acalma. Você vai dirigir e não dá 'pra fazer isso nervoso assim, ok?
— Sim, sim, você 'tá certa. – respirou fundo algumas vezes. — Ok, vamos.
Saiu com o carro e eu conseguia notar que ele agarrava o volante com força, como se o mesmo fosse sair.
— Natsu?
— Hum? – perguntou sem tirar os olhos da estrada.
— Meu endereço… – ele encostou o carro e olhou para mim. — Meu endereço, você não pegou.
Ele estava completamente perdido e eu não consiguia achar graça na situação. O choque dele foi mil vezes maior que o meu.
— Verdade, né? – riu sem graça. — Pode falar.
— O papai vai com a gente 'pa casa? – perguntou "baixinho" para mim, mas ele ouviu.
—…
— Vai.
Falei o endereço, ele disse que lembrava onde ficava e saímos.
Nashi dormiu assim que o carro voltou a se mover. Queria saber o que passava na cabeça dela. Sempre que ela me perguntava sobre o pai, eu falei muito bem dele, não tinha do que falar mal. Expliquei como ele estava estudando em outro país, que no caso foi a última coisa que soube dele e mostrei as várias fotos da época em que namorávamos e éramos felizes juntos.
O trajeto que demorava 45 minutos de ônibus, levou 35 minutos de carro e eu tenho certeza que seria mais rápido se ele não estivesse dirigindo tão devagar. Eu agradecia mentalmente por isso, pois, nervoso daquele jeito, poderia causar um acidente.
Ele desceu do carro e na hora que eu me preparava para sair, a porta do meu lado abriu.
— Você quer que eu segure a... mochila?
— Você quer segurá-la? – falei sobre a menina.
— Eu posso? – perguntou e eu assenti.
Colocou as mãos nas axilas e a pegou do meu colo. Deixou o antebraço debaixo do bumbum dela e a outra mão nas costas. Dava para ver que ele estava bem nervoso.
— Ela não é um bebê, Natsu, não precisa ficar assim.
Peguei minhas coisas, desci do carro e ele o trancou. Subimos para o apartamento e paramos na porta.
— Você tem certeza que quer conversar hoje?
— Sim, por favor.
Suspirei e destranquei a porta.
— Entra.
Ele entrou e deu espaço para eu passar, depois de trancá-la. Me seguiu até a sala e parou no meio dela. Na hora que ia pegá-la, lembrei da cama desarrumada.
— Espera só um pouquinho, porque eu preciso ajeitar lá dentro.
Não esperei resposta e fui ao quarto. O colchão já estava seco. Desliguei o ventilador, o colocando no canto, forrei a cama, fechei a janela e a cortina, deixando o ambiente mais escuro. Depois voltei e peguei a menina. A deitei mais no meio, tirei seus sapatos e garanti que ela ainda dormia. Deixei um beijo na sua testa, respirei fundo e saí, deixando a porta aberta, hábito que criei.
Fui direto à cozinha e preparei um sanduíche para nós, nem sei se ele queria, mas não me custava fazer. Servi dois copos de suco e coloquei tudo numa bandeja.
Andei até a sala e coloquei a bandeja na mesa de centro. Eu estava tão nervosa.
— Fiz um 'pra você também.
Mordi o sanduíche, tentando me distrair da situação. Eu estava ciente de que ele me olhava e eu sabia exatamente quais seriam suas primeiras palavras.
Terminei de comer e ele nem tocou em seu lanche. Levei a bandeja de volta para a cozinha, guardei o dele na geladeira e me apoiei na pia. Precisava de um tempo e depois de respirar fundo não sei quantas vezes, voltei à sala.
Sentei novamente ao seu lado. Sabia que ele me encarava e mesmo não querendo admitir, senti sua falta. Meus sentimentos estavam vindo à tona naquele momento. Dobrei as pernas e apoiei o queixo nos joelhos. A visão embaçou e eu não consegui segurar as lágrimas. Abaixei a cabeça e agora minha testa estava apoiada.
— P-Por que você não veio antes? – eu perguntei.
Natsu passava carinhosamente a mão pelas minhas costas.
— Por que você não me contou? – ele perguntou.
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