36.000fts é o equivalente a 11.000 metros na altitude de cruzeiro. O Boeing 777-200ER da Indie Airways(1) sobrevoava o Atlântico norte com destino à Chicago. A aeronave teria partido de Londres e realizava o voo 307.
Era uma noite calma, sem nuvens densas, portanto, sem turbulências. O voo estava tranquilo, a maioria dos passageiros dormiam enquanto outros insones ouviam música em seus celulares e/ou apenas observavam o céu pouco iluminado pela luz solar refletida na lua através das janelas ao seu lado.
Na cabine de pilotagem, o primeiro oficial Patrick Stump — um homem ruivo baixinho de 30 anos — observava atentamente o horizonte degradê da troposfera, seus olhos verdes cintilantes devido à luz lunar, enquanto o comandante Pete Wentz — um homem artificialmente loiro e também baixinho de 35 anos — lia A Chama que Aquece Meu Coração(2) pela quadragésima vez.
Patrick tinha 9.507 horas — ele teria começado a escola de aviação um pouco tarde — de voo, enquanto Pete era mais experiente, com 14.748.
Os dois homens se conheceram no primeiro voo de Patrick numa aeronave comercial, sendo Pete seu instrutor. Eles se tornaram amigos desde então. Patrick e Pete voavam juntos há quase três anos.
— Caramba, você é muito bebê chorão. — Stump riu levemente ao olhar por um breve momento para seu colega e perceber uma lágrima escorrendo sobre seu rosto. Pete bufou, fechando o livro ao terminar de ler e secando a lágrima, um pequeno sorriso no rosto.
— Se você ler isso, vai entender porque sou “bebê chorão”. — Fez aspas com os dedos após colocar o livro sobre o pequeno compartimento detrás do encosto da poltrona. Patrick balançou a cabeça negativamente, um pequeno sorriso nos lábios.
— Já li. — O ruivo admitiu e Pete o olhou com um enorme sorriso no rosto, os olhos brilhando.
— E? — Perguntou o comandante, curiosidade em saber o que o outro homem teria achado da história. Patrick suspirou levemente antes de responder.
— A autora errou em usar um Boeing 737-200. Na verdade, errou feio em usar um Boeing. Os Boeings não se envolvem em acidentes. — Patrick comentou, estalando a língua uma vez sobre o palato e movendo a cabeça em sinal de negação. O comandante riu levemente.
— Mas foi colisão em solo, Patrick. E ela usou duas aeronaves. — Pete corrigiu Patrick, o ruivo revirando os olhos, ainda observando o horizonte.
— Dois Boeings. O que essa pessoa tem contra os Boeings? — Pete riu alto, fechando os olhos e pendendo a cabeça para trás.
— Não estou entendendo qual é a graça. — O ruivo olhou para o loiro que ainda ria. Patrick continuou encarando o outro homem rindo, esperando que ele parasse para explicar o motivo de estar gargalhando em sua cara. Patrick revirou os olhos quando percebeu que Pete não parou de caçoar de si e voltou a encarar o anil à sua frente. Pete finalmente cessou sua sessão de risadas, secando uma lágrima no canto dos olhos.
— Sério, Patrick? Você não gostou por causa desse detalhe besta? — Pete perguntou retoricamente, sorrindo, e Patrick deu de ombros.
— Eu não disse que não gostei. — Patrick olhou brevemente para Pete e logo voltou a olhar para o céu à sua frente.
— Tudo bem, mas você sabe que qualquer aeronave pode colidir com outra em solo. Só o piloto, o piloto coadjuvante e o cara da sinalização que precisam ser menos Tribbiani(3) e mais Hawking(4) quando estiverem no processo de taxiamento da aeronave. — Pete fez graça e Patrick riu sarcasticamente para o modo como seu colega falou sobre a posição de copiloto, mas Pete não questionou seu sarcasmo.
— Ai, ai, Stump. É apenas ficção. Não leve muito a sério. — Patrick, mais uma vez, riu sarcasticamente.
— “É apenas ficção. Não leve muito a sério.” — Repetiu o que o piloto disse, tentando ridiculamente fazer uma versão mais fina do som da sua voz, e riu novamente, mas uma risada verdadeira.
— Falou o bebê chorão. — Patrick disse ao parar de rir. Foi a vez de Pete revirar os olhos ao entender que ele mesmo levou a ficção da história a sério.
— Tudo bem, tudo bem. Sou suspeito pra falar. Mas a história em si é ótima. Bem romântica e fofa. Eu gostaria muito que alguém fizesse comigo o que Lewis fez com Martin. — Pete recostou a cabeça no encosto, olhando para as luzes dos vários instrumentos de voo no teto do cockpit(5) com um leve sorriso, sonhando acordado. Patrick riu.
— Ser fodido lentamente após várias brigas horríveis e perceber que ainda está perdidamente apaixonado? — Pete olhou para Patrick, atônito, enquanto Patrick olhava para frente, segurando um sorriso, suas mãos segurando levemente o manche(6).
— Não! — Pete riu nervosamente.
— Eu quis dizer quando ele vai atrás de Martin no aeroporto para tentar se reconciliar com ele, mesmo o idiota não ter aceitado. — Pete fez biquinho ao relembrar a cena e Patrick o olhou, um sorriso brincando em seus lábios. O ruivo mordeu o lábio antes de comentar:
— Pois eu sim. — Pete, que olhava para o horizonte artificial(7) dos comandos de controle para certificar se a aeronave estava bem calibrada — e estava — e para o altímetro — que marcava exatos 36.000fts —, perguntou distraidamente:
— Você o quê? — Patrick olhou para o manche, passando a ponta da unha do polegar direito sobre a superfície do controle, e respondeu:
— Eu gostaria que alguém me fodesse como Lewis fodeu Martin. Mas sabe, não tão lenta nem delicadamente. Eu prefiro com força e violentamente. — Pete quase engasgou com a própria saliva ao ouvir as palavras de Patrick. O comandante olhou para o homem ao seu lado, os olhos largos em espanto. Patrick apenas olhava para o horizonte segurando um sorriso, se divertindo com a cara do amigo.
— Espero que isso seja uma brincadeira, Stump, senão... — Pete foi diminuindo o volume da voz em cada palavra pronunciada enquanto observava o semblante de Patrick, esperando que ele dissesse que aquilo era uma brincadeira.
De repente, a imagem mental de si mesmo fodendo o ruivo invadiu sua mente. Pete ficou levemente assustado com o pensamento. Ele nunca teve pensamentos inapropriados sobre o amigo. Bem, ele já imaginou beijando seus lábios convidativos algumas vezes, mas nunca fazendo sexo. Muito menos violento.
— Senão...? — Patrick chamou a atenção de Pete, o olhando atentamente com um sorriso divertido nos lábios. Pete focou seu olhar no olhar de Patrick, a boca entreaberta com a expressão de espanto. Pete nada disse, ainda encarando Patrick.
— Nada, Patrick. Nada. — Pete finalmente se recompôs, tentando remover aqueles pensamentos, e voltou à sua posição no assento.
— Tudo bem. — Patrick riu internamente e olhou para o céu estrelado à sua frente.
[...]
O olhar de Pete estava perdido no horizonte artificial, seus pensamentos longe daquela aeronave. Fazia 40 minutos desde a conversa nada ousada que teve com o primeiro oficial cujo tirava um cochilo em seu assento. Pete não conseguiu tirar aqueles pensamentos sobre seu amigo, mesmo tendo tentado de várias formas até desistir. Ele dava breves olhares para o rosto do ruivo de vez em quando e suspirava levemente em frustração. O piloto não sabia como aquela conversa chegou a tal rumo, à ponto de fazê-lo imaginar fazendo coisas inescrupulosas com o homem ao seu lado. Já estava quase difícil manter o foco no voo, fora daquele ser pálido e fodidamente bonito que era o copiloto. Pete ponderou mais — contra sua vontade — sobre foder o amigo até pegar no sono.
Pete abriu os olhos e percebeu que estava sozinho na cabine ao olhar ao redor e não avistar Patrick. O homem sentiu uma grande vontade de ir ao banheiro e decidiu chamar Patrick pelo interfone.
— Primeiro oficial Stump, preciso de você e do comissário Trohman na cabine de comando. Obrigado. — E assim desligou.
Pete esperou durante 3 minutos pela chegada de Patrick e do comissário, mas os dois homens nunca atenderam ao pedido do comandante — o que era bastante estranho, pois qualquer tripulante o antende em menos de 5 segundos.
Pete percebeu que algo estava errado e decidiu quebrar uma das regras da aviação, saindo da cabine, a deixando sem ninguém para supervisioná-la.
Ao abrir a porta, Pete notou que a fuselagem estava um breu, sem nem uma única luminária acima dos assentos acesa — a não ser a iluminação lunar pelas poucas janelas que estavam com as portinhas levantadas. Ele também notou que não havia nenhum passageiro e franziu a testa. Pete desviou o caminho do banheiro e caminhou lentamente por um dos corredores da fuselagem, olhando para cada poltrona à procura de algum passageiro. Sem sucesso. O comandante já estava quase entrando em desespero interno quando ele avistou uma figura familiar sentado no chão da galley(8) — a cortina era inexistente — parecendo desacordado. Pete correu até ele, desespero começando a preencher seu corpo.
— Patrick! Patrick, você está bem? Ei!
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