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História After - Supercorp - Verdade dolorosa...


Escrita por: TommyKurkowski

Capítulo 18 - Verdade dolorosa...


Estou com calor, muito calor. Tento tirar as cobertas, mas não consigo. Quando abro os olhos, a noite anterior volta com tudo à minha mente: Lena gritando comigo no quintal, seu hálito de uísque, os cacos de vidro na cozinha, Lena me beijando, gemendo quando o toquei, sua cueca molhada. Tento me levantar, mas ela é pesada demais. Sua cabeça está apoiada no meu peito, e seu braço envolve minha cintura, mantendo seu corpo colado ao meu. Não sei como fomos parar nessa posição. Ela deve ter feito isso enquanto dormia. Sou obrigada a admitir que não quero sair da cama, não quero sair de perto de Lena, mas é preciso.

Tenho que voltar para meu quarto. Mike está lá. Mike. Mike. Empurro Lena com cuidado pelo ombro, fazendo-a se deitar de barriga para cima. Ela vira de bruços e solta um resmungo, mas não acorda.

Com gestos apressados, fico de pé e recolho minhas roupas do chão. Como a covarde que sou, quero estar longe dali quando Lena acordar. Não que isso faça diferença para ela. Na verdade, só vai poupá-la do trabalho de gastar energia me magoando de propósito para eu ir embora. Assim é melhor para nós duas. Apesar do tanto que rimos juntas ontem, tudo fica diferente à luz do dia. Lena vai se lembrar do quanto nos divertimos e vai sentir a necessidade de ser ainda mais grosseira para compensar. É isso que ela sempre faz, mas dessa vez não vou estar por perto. Por um segundo ontem à noite cheguei a pensar que talvez aquela experiência a fizesse mudar de ideia e querer passar mais tempo comigo. Mas sei que isso é impossível.

Dobro sua camiseta, guardo na gaveta da cômoda e visto minha saia. Minha camisa está toda amarrotada depois de passar a noite no chão, mas essa está longe de ser minha maior preocupação no momento. Calço os sapatos e, quando ponho a mão na maçaneta, me pego pensando:

“Uma última olhadinha não vai fazer mal.”

Olho de novo para Lena, que está dormindo. Seus cabelos negros despenteados se espalham pelo travesseiro e seu braço está caído para fora da cama. Seu rosto está lindo e pacífico, apesar dos piercings cravados na pele.

Eu me viro e abro a porta.

“Kah?”

Meu coração dispara. Viro-me com movimentos lentos, à espera de ver os olhos verdes implacáveis de Lena me encarando, mas eles estão fechados. Apesar da testa franzida, ela ainda está dormindo. Não sei se fico aliviada por isso ou abalada com o fato dela ter dito meu nome enquanto dormia.

Foi isso mesmo que ela fez ou agora também estou ouvindo coisas?

Saio do quarto e fecho a porta silenciosamente atrás de mim. Não faço ideia de como sair da casa. Vou andando pelo corredor e felizmente consigo encontrar a escada sem dificuldade. Quando começo a descer os degraus, quase dou um encontrão com a Alex. Meu coração se acelera quando tento encontrar alguma coisa para dizer. Seus olhos esquadrinham meu rosto, mas ela permanece em silêncio, à espera de uma explicação, talvez.

“Alex… Eu…” na verdade, não faço ideia do que dizer.

“Você está bem?”, ela pergunta, preocupada.

“Estou, sim. Você deve estar pensando que…”

“Não estou pensando nada. Agradeço muito por ter vindo. Sei que não gosta da Lena, mas sua presença aqui foi fundamental para mantê-la sob controle.”

Ai, ela é tão boazinha. Boazinha até demais. Quase chego a sentir vontade que ela me diga que está enojada porque passei a noite aqui, deixando meu namorado sozinho no meu quarto depois de pegar seu carro e vir socorrer Lena, só para poder me sentir tão culpada quanto deveria.

“Então você e Lena são amigas de novo?”, ela pergunta, e eu dou de ombros.

“Não faço ideia do que somos. Nem sei o que estou fazendo. É que ela… ela…” Caio no choro. Alex me envolve em seus braços e me oferece um abraço afetuoso e alentador.

“Está tudo bem. Sei que às vezes ela é terrível”, Alex diz baixinho. Espera aí… Ela deve pensar que estou chorando porque Lena me maltratou. Não deve nem imaginar que estou chorando por causa do que sinto por Lena.

Preciso ir embora antes de arruinar o bom juízo que Alex faz de mim e antes que Lena acorde. “Preciso ir. Mike está me esperando”, aviso, e Alex abre um sorriso antes de se despedir de mim.

Pego o carro e volto para o campus o mais depressa possível, chorando durante quase todo o trajeto. Como posso explicar tudo para ele? Sei que é isso que preciso fazer — não posso mentir para Mike. Não consigo nem imaginar quão magoado vai ficar.

Sou uma péssima pessoa por fazer isso com ele.

Por que não consigo ficar longe de Lena?

Tento me acalmar o máximo possível antes de entrar no estacionamento dos estudantes. Vou andando devagar, sem saber como encarar meu namorado.

Quando abro a porta do quarto, encontro Mike deitado na minha cama, olhando para o teto. Ela leva um susto quando me vê entrar.

“Pelo amor de Deus, Kara! Você ficou fora a noite toda! Liguei um monte de vezes!”, ele grita. É a primeira vez que Mike levanta a voz para mim. Já brigamos antes, mas dessa vez chego a ficar assustada.

“Desculpe, Mike. Fui até a casa da Alex porque Lena estava bêbada e quebrando as coisas, e acho que perdi a noção do tempo. Quando terminamos de arrumar tudo, já estava bem tarde, e meu celular ficou sem bateria”, minto.

Não acredito que estou mentindo para ele — uma pessoa que sempre esteve do meu lado. Sei que preciso contar tudo, mas não tenho coragem de magoá-lo.

“Por que você não usou outro telefone?”, Mike insiste, mas então fica em silêncio. “Esquece… a Lena estava quebrando as coisas? Você está bem?

“Por que continuou lá se ela estava sendo violenta?” Fico desorientada com tantas perguntas sendo despejadas sobre mim ao mesmo tempo.

“Ela não estava sendo violenta, só estava bêbada. Lena jamais ia me machucar”, digo, e imediatamente levo a mão à boca, desejando nunca ter pronunciado aquelas últimas palavras.

“Como assim, ela jamais ia machucar você? Nem conhece essa sujeita, Kara”, ele esbraveja e dá um passo na minha direção.

“Só estou dizendo que sei que ela não ia me agredir. Pelo menos disso tenho certeza. Eu estava tentando ajudar Alex, que aliás estava lá comigo”, explico.

Por outro lado, sei que, em termos emocionais, Lena seria bem capaz de me machucar — Ela inclusive já fez isso, e com certeza vai tentar de novo. Mesmo assim estou falando em sua defesa.

“Pensei que você fosse parar de andar com esse tipo de gente. Não foi isso que prometeu para mim e para sua mãe? Esse pessoal não faz bem para você, Kara. Você começou a beber e a passar a noite fora, me deixou aqui plantado… não sei nem por que me chamou para vir se era para fazer isso.” Ela se senta na cama e esconde a cabeça entre as mãos.

“Elas são legais, é que você não conhece ninguém direito ainda. E desde quando você julga as pessoas desse jeito?”, pergunto. Na verdade, eu deveria estar pedindo perdão de joelhos pela maneira como o tratei, mas é impossível não me irritar com a forma como ele fala dos meus amigos.

Principalmente de Lena, meu subconsciente me lembra, deixando-me ainda mais aborrecida.

“Não estou julgando ninguém, mas pensei que você jamais fosse querer andar com essas góticas.”

“Quê? Elas não são góticas, Mike, só estão tentando ser elas mesmos”, retruco, tão surpresa com meu tom de contrariedade quanto Mike.

“Bom, não estou gostando nada dessa história… Elas estão mudando você. Não vejo mais a Kara por quem me apaixonei.” Percebo pelo seu tom de voz que ele não está falando isso por mal. Só está triste.

“Bom, Mike…”, começo a dizer, e a porta se abre. Meus olhos desviam de Mike e se deparam com uma Lena furiosa entrando no meu quarto.

Olho para ela, para Mike, e de novo para ela.

Isso não tem como terminar bem.

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“O que você está fazendo aqui?”, pergunto a Lena, apesar de não querer ouvir a resposta, principalmente na frente de Mike.

“O que você acha? Você saiu de fininho enquanto eu dormia… O que foi aquilo?!”, ela esbraveja. Prendo a respiração ao ouvir sua voz ecoar peles paredes. O rosto de Mike se contorce de raiva, e percebo que ele está começando a montar as peças do quebra-cabeça.

Eu me sinto dividida entre a necessidade de contar a Mike o que está acontecendo e a de explicar a Lena por que fui embora.

“Responde!”, Lena berra, ficando bem na minha frente. Fico surpresa quando Mike se coloca entre nós.

“Não grita com ela!”, ele diz.

Fico paralisada quando o rosto de Lena se contorce de raiva. Por que ela está tão brava?

Ontem à noite estava tirando sarro da minha falta de experiência e teria me enxotado de lá hoje de manhã de qualquer forma. Preciso dizer algo antes que a coisa desande de vez.

“Lena… por favor, não faz isso agora”, imploro. Se ela for embora, posso tentar explicar a Mike o que está acontecendo.

“Isso o quê, Kara?”, Lena pergunta, afastando-se de Mike. Espero que Mike mantenha distância dela. Duvido que Lena pense duas vezes antes de partir para a briga. Mike está em boa forma por causa do futebol, principalmente levando em conta a magreza de Lena, mas não tenho dúvidas de que Lena se garante.

O que está acontecendo com a minha vida? Por que preciso me preocupar com uma briga entre Mike e Lena?

“Lena, vai embora, por favor, conversamos mais tarde”, peço, tentando amenizar a situação.

Mas Mike balança a cabeça em um gesto negativo. “Conversar sobre o quê? O que está acontecendo, Kara?” Ai, Deus.

“Conta para ele. Vai em frente, conta”, provoca Lena.

Não acredito que ela está fazendo isso. Sei que pode ser bem maldosa quando quer, mas isso rebaixa a coisa a um nível totalmente diferente. “Contar o quê, Kara?”, questiona Mike, e sua postura agressiva em relação a Lena se desfaz um pouco quando ela se volta para mim.

“Nada, só o que você já sabe, que passei a noite na casa da Lena e da Alex”, minto. Tento encarar Lena na esperança de que se cale, mas ela desvia imediatamente o olhar.

“Conta para ele, Kara, ou então conto eu”,

Lena diz com um grunhido.

Está tudo perdido. Sei que não adianta mais tentar esconder, e começo a chorar. Mas quero que Mike ouça tudo da minha boca, e não da cretina arrogante que puxou o assunto. Eu me sinto muito mal, mas não por minha causa, e sim por Mike. Ele não merece isso, e estou envergonhada pela maneira como o tratei e pelas confissões que vou ser forçada a fazer na frente de Lena. “Mike… Eu… Eu e Lena… A gente…”, começo.

“Ah, meu Deus”, Mike murmura, e seus olhos se enchem de lágrimas.

Como eu pude fazer isso com ela? O que estava pensando? Mike é uma pessoa boa, e Lena consegue ser cruel a ponto de me obrigar a partir seu coração e ainda ficar por perto para assistir à cena.

Mike leva as mãos à testa e balança a cabeça.

“Como pôde fazer isso, Kara? Depois de tudo por que passamos? Quando foi que isso começou?” Lágrimas escorrem de seus olhos azuis. Nunca me senti tão mal na vida — a causa das lágrimas sou eu. Olho para Lena, e meu ódio por ela me consome com tamanha força que dou um empurrão nela em vez de responder à pergunta de Mike. Pego de surpresa, Lena cambaleia para trás, mas consegue se equilibrar e evitar a queda.

“Mike, desculpa. Não sei onde estava com a cabeça.” Vou correndo até meu namorado e tento abraçá-lo, mas ele recusa meu toque. E com toda a razão. Sendo bem sincera, não tenho sido uma boa namorada faz tempo. Não sei o que estava pensando. Provavelmente alguma coisa idiota, como Lena se tornar uma pessoa decente e virar minha namorada depois que eu terminasse com Mike… Eu não podia ser mais idiota. Ou então pensei que conseguiria manter distância de Lena, e assim Mike jamais ficaria sabendo o que aconteceu. O problema é que não consigo ficar longe da Lena. Sou como uma mariposa atraída pela luz, e ela sempre faz questão de me queimar. Ambas as ideias eram cretinas e ingênuas, mas não consigo fazer uma escolha certa desde que conheci Lena.

“Também não sei onde você estava com a cabeça”, responde Mike, com um olhar de lamento e mágoa estampado nos olhos. “Acho que nem sei mais quem é você.”

Depois de dizer isso, ele sai do meu quarto. E da minha vida.

“Mike, por favor! Espera!”, grito, e saio atrás dele, mas Lena me pega pelo braço e tenta me segurar.

“Não encosta em mim! Você é inacreditável! Isso foi muito baixo, Lena, até mesmo para você”, digo aos gritos e livro meu braço de seu toque. Dou mais um empurrão nela, com força. Eu nunca tinha atacado ninguém na minha vida antes, e isso me faz odiá-la ainda mais.

“Se você for atrás dele, eu desisto”, ela diz, deixando-me boquiaberta.

“Você desiste? Desiste do quê, porra? De brincar com meus sentimentos? Odeio você!” Como ela não merece nem minha raiva, eu me acalmo e acrescento em um tom mais controlado: “Você não tem como desistir de uma coisa que nunca começou”.

Ela deixa as mãos caírem ao lado do corpo e abre a boca, mas não diz nada.

“Mike!”, grito, e saio correndo porta afora. Percorro às pressas o corredor e chego ao gramado, mas só consigo alcançá-lo já no estacionamento. Ele acelera o passo.

“Mike, por favor, me escuta. Lamento muito, muito mesmo. Eu bebi. Sei que isso não serve como desculpa, mas…” Eu me interrompo para enxugar as lágrimas, e a expressão dele se atenua.

“Não quero mais ouvir você…”, ele diz. Seus olhos estão vermelhos. Tento segurar sua mão, mas ele a afasta de mim.

“Mike, por favor, desculpa. Me perdoa. Por favor.” Não posso perdê-lo. Simplesmente não posso.

Ele abre a porta do carro, passa a mão pelos cabelos bem penteados e se vira para mim. “Preciso de um tempo, Kara. No momento nem sei mais o que pensar.”

Solto um suspiro e admito minha derrota, sem saber o que dizer. Ele só precisa de um tempo para superar tudo isso, então tudo vai voltar ao normal. Ele só precisa de um tempo, fico repetindo para mim mesma.

“Eu te amo, Kara”, Mike diz, e me pega de surpresa com um beijo na testa antes de entrar no carro e ir embora.

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Sendo a pessoa asquerosa que é, Lena ainda está no meu quarto quando volto, sentada na minha cama. Imagens minhas pegando um abajur e quebrando na cabeça dela surgem na minha mente, mas no momento não tenho energia suficiente para brigar.

“Não vou pedir desculpas”, Lena avisa quando passo por ela a caminho da cama de Sam. Recuso-me a sentar na minha cama com ela lá.

“Eu sei”, digo antes de me deitar.

Não vou me deixar levar para outra briga, nem quero que ela se desculpe. Eu a conheço bem demais para isso. Mas, pensando bem, não sei nada sobre ela. Ontem à noite Lena era só uma menina revoltada por ter sido abandonada pelo pai e usava esse ressentimento como escudo para manter as pessoas à distância. Hoje de manhã, eu a vejo como uma pessoa terrível e odiosa. Não existe nada de bom em Lena. Se em algum momento acreditei que existia, foi só porque me deixei enganar por ela.

“Ele precisava saber”, afirma Lena.

Mordo meu lábio para segurar o choro. Fico em silêncio até ouvir Lena se levantar e vir na minha direção. “Vá embora, Lena”, peço, mas quando olho a vejo de pé ao meu lado. Quando ela se senta na cama, eu me levanto em um pulo.

“Ele precisava saber”, Lena repete, e a raiva borbulha dentro de mim. Sei que só está querendo me provocar.

“Por quê, Lena? Por que ela precisava saber?

Me diz o que isso trouxe de bom além de magoar Mike. Para você não faz diferença se ele sabia ou não… você podia continuar sua vida normalmente se tivesse mantido a boca fechada. Não tinha o direito de fazer isso com ele, nem comigo.” Sinto as lágrimas brotarem outra vez e não consigo segurá-las.

“Se eu fosse ele, ia querer saber”, Lena diz com um tom de voz frio e impassível.

“Mas você não é ele e nunca vai ser. Fui burra de pensar que você poderia ser como ele. Aliás, desde quando se preocupa com o que é certo ou errado?”

“Nem tente me comparar com ele”, Lena esbraveja, deixando-me ainda mais irritada por não responder à minha pergunta e ainda distorcer o que estou dizendo. Ela se levanta e tenta se aproximar de mim, mas eu me encolho do outro lado da cama.

“Não existe comparação. Ainda não deu para entender? Você é uma babaca cruel e asquerosa que não está nem aí para ninguém além de si mesma. E ele… ele me ama. Está tentando me perdoar pelos meus erros.” Olho bem em seus olhos. “Meus erros terríveis”, acrescento.

Lena dá um passo para trás como se eu a tivesse empurrado. “Perdoar você?”

“É, ele vai me perdoar por isso. Sei que vai. Porque ele me ama, então seu plano patético de tentar fazer eu terminar na sua frente, enquanto você fica dando risada, não funcionou. Agora sai do meu quarto.”

“Não foi isso que… eu…”, ela começa, mas a interrompo. Já perdi tempo demais com Lena.

“Fora daqui! Sei que você já deve estar tramando seu próximo golpe contra mim, mas adivinha só, Lena? Não vai mais funcionar. Agora dá o fora do meu quarto, porra!” Fico surpresa com a aspereza das minhas próprias palavras, mas não me sinto mal em usá-las.

“Não é nada disso, Kah. Depois de ontem à noite, pensei que… sei lá, pensei que você e eu…”

Ela parece estar tropeçando nas próprias palavras, o que para mim é inédito. Parte de mim, uma parte nada pequena, está ansiosa para ouvir o que Lena vai dizer, mas foi assim que comecei a me envolver. Lena sabe como usar minha curiosidade contra mim, e para ela tudo não passa de um jogo. Limpo meus olhos com gestos furiosos, aliviada por não ter passado maquiagem ontem à noite.

“Você não acha que vou acreditar nessa conversa, né? Vai me dizer que sente alguma coisa por mim?”

Preciso parar de discutir, e ela precisa ir embora antes de cravar suas garras ainda mais em mim.

“Claro que sinto, Kara. Por sua causa eu…”

“Não! Eu não quero ouvir nada disso, Lena. Sei que é tudo mentira, uma forma doentia de se divertir. Só para me fazer acreditar que sente por mim o mesmo que eu sinto por você e depois puxar meu tapete. Já entendi tudo e não vou mais entrar nessa.”

“O mesmo que você sente por mim? Está me dizendo que você… você sente alguma coisa por mim?” Algo parecido com uma esperança surge em seus olhos. Ela é uma atriz muito melhor do que eu imaginava.

Lena sabe que sim, não é possível que não saiba. Por que razão eu manteria aquela relação nada saudável? Dominada por um medo que nunca havia experimentado, percebo que mal consigo admitir meus sentimentos por Lena para mim mesma, e ainda assim estou tratando do assunto abertamente, expondo-me mais do que nunca à crueldade dela.

Sinto minhas barreiras serem demolidas uma a uma pela maneira como Lena me olha, mas não posso deixar isso acontecer. “Vai embora, Lena. Não vou pedir de novo. Se não sair daqui, vou chamar o segurança.”

“Kah, por favor, responde”, ela implora.

“Não me chame de Kah. Só minha família, meus amigos e as pessoas que gostam de mim de verdade podem me chamar assim… agora sai daqui!”, grito, muito mais alto do que pretendia. Preciso que ela saia, que se afaste de mim. Detesto quando Lena me chama de Kara, mas detesto ainda mais quando me chama de Kah. Alguma coisa na maneira como seus lábios se mexem ao dizer isso a faz parecer alguém tão íntima, tão adorável… Droga, Kara. Pare com isso. “Por favor, eu preciso saber se…”

“Que fim de semana foi esse, amiguinhos? Estou acabada!”, anuncia Sam ao entrar no quarto, fingindo um cansaço exagerado. Porém, quando percebe meu rosto lavado de lágrimas, ela detém o passo e estreita os olhos na direção de Lena.

“O que está acontecendo? O que você fez?”, ela grita. “Cadê o Mike?”, Sam pergunta, olhando para mim.

“Ela foi embora, e s Lena também está de saída”, respondo.

“Kara…”, Lena insiste.

“Sam, por favor, pede pra ela ir embora”, suplico, e ela faz um aceno de cabeça. A boca de Lena se contorce de irritação quando percebe que estou usando Sam contra ela. Devia estar pensando que ia conseguir me prensar contra a parede outra vez.

“Vamos lá, garotona”, ela diz, segurando-a pelo braço e a arrastando porta afora.

Fico olhando para a parede até ver a porta se fechar e imediatamente começo a ouvir a voz dos duas no corredor.

“Qual é, Lena? Falei pra você não fazer isso. Ela é minha colega de quarto e é diferente das meninas com quem você está acostumada. Ela é meiga, inocente e, sinceramente, não é pro seu bico.”

Fico satisfeita e surpresa pela maneira como ela sai em minha defesa. Mas isso não é suficiente para aplacar o aperto que sinto no peito. Meu coração está doendo, literalmente. Pensei que sabia o que era um coração partido depois da noite com Lena no riacho, mas aquilo não foi nada em comparação com o que estou sentindo agora. Por mais que eu deteste admitir isso, passar a noite com Lena só fortaleceu meu sentimento por ela. Ouvir sua risada enquanto me fazia cócegas, a forma carinhosa como me beijou, seus braços tatuados me envolvendo, a maneira como fechou os olhos quando percorri sua pele com os dedos, tudo isso fez com que eu ficasse ainda mais caidinha por ela. Esses momentos de intimidade fizeram crescer minha estima por Lena, mas também fizeram meu sofrimento ser muito maior. Além disso, magoei Mike de tal maneira que só me resta rezar para que ele me perdoe.

“Não é nada disso.” Quando está irritado, o sotaque de Lena se torna mais evidente e suas palavras, mais incisivas.

“Não é o cacete, Lena, conheço você. Vai procurar outra pra atormentar. Tem um monte de meninas por aí. Ela não é a pessoa certa pra você. Além de ter namorado, não sabe como lidar com esse tipo de situação.”

Fico incomodada de ouvi-la sugerir que sou sensível demais, uma pessoa ágil ou coisa do tipo, mas acho que ela tem razão. Não faço outra coisa além de chorar desde que conheci Lena, e agora ela tentou arruinar meu relacionamento com Mike. Não tenho estômago para manter uma relação puramente física e sem compromisso com alguém, por melhor que isso seja. O respeito que tenho pelo meu corpo não permite isso, e sou sentimental demais.

“Tudo bem. Vou ficar longe dela. Mas nada de aparecer com ela de novo nas festas lá em casa”, ela esbraveja, e escuto seus passos se afastando, pisando duro. Já no fim do corredor, volto a ouvir sua voz, aos gritos: “Estou falando sério, não quero mais que ela apareça na minha frente. Se isso acontecer, acabo com ela”. 

------

Sam entra no quarto e me dá um abraço. É estranho constatar que bracinhos tão magros e finos podem ser tão reconfortantes.

“Obrigada por tirar Lena daqui”, digo entre soluços, e ela me abraça com mais força. As lágrimas escorrem em abundância e sem previsão de parar tão cedo.

“Lena é minha amiga, mas você também é, e não quero te ver chateada por causa dela. Desculpa, é tudo culpa minha. Sabia que era melhor dar a chave reserva para o Winn, não devia ter deixado que a Lena viesse aqui a qualquer hora. Ela é bem desagradável às vezes.”

“Não, a culpa não é sua de jeito nenhum. E sou eu que preciso pedir desculpas, por atrapalhar a amizade de vocês.”

“Até parece”, ela diz.

Afasto-me do seu abraço e contemplo a expressão de preocupação em seu rosto. Ainda bem que ela está aqui. Sam nem imagina o quanto sou grata por sua presença. Estou me sentindo absolutamente sozinha: Mike pediu um tempo para decidir se continua ou não comigo, Lena é uma imbecil, minha mãe ia surtar se conversássemos sobre isso, e Alex ficaria decepcionadíssima se descobrisse o quanto estou envolvida com a Lena. Eu literalmente não tenho ninguém além dessa menina tatuada, de cabelos de fogo, de quem jamais imaginaria ser amiga algum dia. Mas estou muito feliz por tê-la aqui comigo.

“Você quer conversar a respeito?”

Preciso tirar tudo isso do meu peito. Conto tudo para ela, desde a primeira vez que beijei Lena, passando por nosso dia no riacho, até o orgasmo que lhe proporcionei na cama. Conto também que Lena disse meu nome enquanto dormia antes de destruir toda e qualquer estima que eu poderia sentir por ela quando me obrigou a confessar tudo diante de Mike. Sua preocupação se transformou em choque e depois em tristeza. Minha camisa está encharcada de lágrimas quando termino o relato, e ela segura minha mão.

“Uau, eu nem imaginava que a coisa tinha chegado a esse ponto. Você podia ter me contado logo depois do primeiro beijo. Percebi que estava rolando alguma coisa quando Lena veio aqui naquele dia que fomos ao cinema. Ela apareceu um minuto depois de a gente se falar no telefone, então desconfiei que tinha vindo para ver você. Enfim, a Lena é uma guria legal às vezes. Quer dizer, no fundo o problema é que ela não sabe demonstrar afeto da maneira que você quer e precisa, e isso serve para a maioria das outras garotas também. Se eu fosse você, investia no Mike, porque a Lena não serve para ser namorada de ninguém”, ela diz, apertando minha mão.

Sei que ela tem razão em tudo o que disse. Mas por que precisa doer tanto assim?


Notas Finais


Espero que estejam gostando, como prometido um por semana❤️❤️


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