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História Além do que se vê - De onde vem a calma


Escrita por: Kirilov

Notas do Autor


Olá ^-^

Como as explicações ainda não estão bonitinhas nesse capítulo, e eu vi que muitos ficaram confusos, adianto que sim, a Sakura foi criada por pais adotivos. As lembranças que ela tem do passado são com os pais e o avô verdadeiro, mas quando ela fala "meus pais ligaram" ou "meus pais sei lá o que", são os pais adotivos. Essas coisas eu deixo pistas pelos capitulos, mas em breve irei escrever isso com todas as letras.

Capítulo 17 - De onde vem a calma


Depois de tantas idas e vindas, dos dias lentos e pesarosos, do sentimento intenso de não querer ser, podia finalmente acreditar que alcançara meu porto seguro. Mamãe me acolheu sem receios ou questionamentos, sem qualquer tipo de pesar. Ela me recebeu com um abraço forte, afetuoso e repleto de sentimentos; também com palavras saudosas que confortaram minha alma. Preparou-me um banho morno, serviu-me uma sopa de legumes, e arrumou a cama com zelo para minha primeira noite em sua companhia.

Eu teria preferido imortalizar aqueles primeiros minutos, nos quais acreditei conhecer a calmaria após a tempestade; mas essa crença de que no fim tudo fica bem, não passa disso: uma crença que pouco descreve a prática. Uma mentira que gostamos de acreditar.

Agora, sentada na beira da cama de solteiro, tentava absorver a primeira conversa que tivemos, na qual, por escolha própria, fui apenas ouvinte. Meu corpo, antes enfadado pelos três longos dias de viagem, estava finalmente relaxado após o banho e a comida quentinha; ainda assim, sobre minhas costas, um novo fardo ameaçava resgatar o estado de tensão.

Diante de mim um sorriso singelo amenizava as feições enfermas da mulher que me olhava com atenção, ela tentava segurar as lágrimas e esconder a tristeza que lhe feria; ao passo que eu me esforçava para aceitar o que ouvira dela instantes antes, ou pelo menos digerir cada palavra.

Agora sabia que a devastação cruel de um câncer foi o que roubou de mamãe parte da beleza e das forças. A doença parecia lhe tirar o rubor da face e a esperança dia após dia, como uma saqueadora impassível e irresoluta, uma visitante assídua que nunca falhava em sua missão, sempre com seus sussurros malignos sobre o tempo que ainda se tem: não muito. Mebuki não possuía mais que um ano de vida; sua voz mansa me confidenciou essa irrevogável previsão com calma e num evidente falso conforto. Assim como vovô, ela padeceria vítima desse mal; o câncer era nossa herança de família.

Apesar de tudo, em um único impulso de me acolher depois de tantos anos separadas, ela sorria quase como antes, da forma que eu me lembrava e resgatava da infância. O lenço colorido que lhe escondia a cabeça e a provável cicatriz de uma cirurgia malsucedida, contrastava com a pele pálida e, numa ilusão de ótica, deixava sua dor menos evidente. 

Meu olhar sobre ela era temeroso, uma mistura de dúvidas e novos pesares acerca do amanhã pairavam sobre meus pensamentos inquietos.  O medo do que agora me aguardava, a certeza de que não teria mamãe por muito tempo e a consequente solidão, fizeram-me odiar a escolha de não a ter procurado antes. 

Mas de uma forma até prazerosa e necessária, entre nós nenhuma mágoa passada ameaçava se engrandecer, nosso reencontro caminhava muito bem, tal como se apenas não nos víssemos há apenas dois ou três meses. Ficou claramente evidente, em cada troca de olhares e breves sorrisos ainda tímidos, que nenhuma de nós deseja transformar aquele momento, tão único e simbólico, numa discussão frívola sobre os erros do passado. 

Quanto tempo teríamos perdido, caso resolvêssemos remoer sobre o que não voltaria? Ou, numa tentativa equivocada, tentássemos consertar o incorrigível? Muito! A grande questão era que a dada altura de nossas vidas, em circunstâncias tão ímpares, nenhuma migalha de tempo poderia ser desperdiçada. 

Da minha parte, não a culpava por ter sido uma mãe omissa, possuía consciência de que a vida dela fora complexa demais para ser julgada pelos olhos de uma filha carente. Portanto, naquele momento, simplesmente desejava permanecer ali, olhando-a, como se somente acabasse de chegar em casa depois de um dia cansativo.

— Agora estou aqui. – Foi o que eu disse, quebrando o breve silêncio. – Não enfrentará isso sozinha.

— Sim – ela sorriu. – Teremos uma a outra, isso parece ser exatamente o que estamos precisando... Nós três. 

Com um breve silêncio ela aguardou que eu acrescentasse algo, seu olhar terno, porém ansioso, aguardava explicações. Enquanto eu, ainda sem coragem o suficiente para uma confissão, apegava-me a reconhecer seus traços e modos passivos.

Há alguns minutos havia percebido que, de soslaio, mamãe estudava minhas formas, tendo notado sem esforços a gravidez que revelava sinais em cada detalhe do meu corpo. Portanto, uma hora ou outra sabia que seria indagada sobre isso, embora não me sentisse preparada. Até então não havia falado muito sobre mim, além de coisas superficiais. Minha intenção indo para uma nova cidade era esquecer tudo e começar uma vida nova, onde ninguém precisaria tomar conhecimento da minha dor.

Contudo, a experiente Mebuki percebera que motivos negativos me motivaram a buscá-la como refúgio, as marcas arroxeados que teimam em permanecer no meu rosto, mesmo após tanto tempo, não me permitiriam segurar qualquer mentira sobre o que aconteceu. Eu tentaria esconder, é claro; porque falar sobre minhas últimas semanas, ou no mínimo pensar nelas, matava-me aos poucos.

De imediato sem saber exatamente como fugir das perguntas que me tomariam como principal foco, baixei o rosto, pensei sobre o que dizer.

Um pouco inquieta por esperar um esclarecimento que não vinha, ela prosseguiu:

— Foi ele? O pai da criança que está esperando? Foi ele quem machucou você?

Completo silêncio. 

Alguma coisa me impedia de falar e expressar meus sentimentos com clareza, como se um véu me separasse do mundo comum. As mágoas e o medo haviam tapado minha boca com uma mordaça invisível, contudo resistente, que não me possibilitava qualquer confissão. Era difícil para mim.

— Converse comigo, Sakura. Não tenha medo de me contar. Está segura aqui. Ele não pode mais lhe fazer mal...

— Não. – Rebati finalmente, balançando a cabeça no ar em negação. – Não foi ele. 

— Então onde ele está, o pai do seu filho? Por que permitiu que a machucassem?

— A culpa não foi dele. 

— Então ele virá em seguida? Ou pelo menos sabe que está aqui?

Um novo silêncio. A contragosto e ansiosa ela aguardou.

— Ele não quer o nosso bebê. Ele... Ele não nos quis. Ele... tem nojo de mim. 

— Por que, meu bem? Por que ele sentiria nojo de você?

— Porque sou suja.

— Suja? 

— Pare! – De chofre, a raiva, unida ao medo e o desespero, sem que eu pudesse controlar, fizeram-me gritar entre soluços e a plenos pulmões. Esse ódio visceral, que pouco a pouco se enraizada em minhas entranhas, era um sentimento novo em meu coração, desde os dias na estrada ele vinha se apoderando de mim, envenenando minha consciência.

Meus punhos imediatamente travaram. As perguntas me fizeram relembrar dos dias que estive sob domínio de Gaara; fizeram-me, apavorada e nauseada, lembrar de suas mãos imundas sobre mim. Ainda agitada, e revivendo parte dos meus piores pesadelos, pedi: 

– Por favor, pare... Não quero falar sobre isso. Eu não consigo.

Finalmente ela se deu conta da gravidade da minha situação, percebeu que aquelas perguntas me machucavam mais do que poderia supor. Angustiada por me levar as lágrimas, ela me abraçou e confortou com o silêncio. Com toda cautela, fez-me deitar na cama, com a cabeça sobre seu colo, e passou a mexer carinhosamente em meu cabelo. Nos braços dela eu me acalmei e adormeci, quando os olhos passaram a arder pela mistura do sono e o choro salgado.

 

*

 

Completara um mês que estava morando com mamãe. Um mês que me forçava a acreditar que os novos ares diminuiriam o que estava sentido, mas o passar dos dias continuava sem representar efeito sobre mim. O tempo não aliviava as sensações que tão ferozmente machucam minha carne e distorciam meus pensamentos.

Minha barriga havia crescido um pouco mais, e eu sabia que pelo meu bebê precisava reagir, precisava voltar a ser a antiga Sakura, e ter o mínimo de força e coragem para pelo menos enfrentar uma parcela do mundo. Mas como? Se quando me olhava no espelho via uma pessoa que não era eu, um corpo marcado por cicatrizes que nunca desapareceriam, um rosto cansado e infeliz.

Era impossível esquecer. Lutar contra a apreensão e o pavor que me dominavam estava fora do meu alcance. Sequer conseguia andar sozinha com a tranquilidade que merecia, tornou-se terrível para mim atravessar a porta de casa e encarar as ruas que me pareciam tão hostis.

E quando precisava sair, pois devido a doença durante alguns dias Mebuki não conseguia levantar da cama, então me cabia ir até o pequeno posto de saúde buscar os remédios dela ou realizar qualquer atividade externa imprescindível a manutenção da casa, eu andava com a cabeça baixa; os passos rápidos; um pequeno canivete dentro da bolsinha que carregava junto ao corpo,  numa ilusão patética de que isso me faria sentir mais segura.

Tentava, esforçava-me, repetia baixinho que nada de mal me aconteceria novamente; mas bastava ouvir passos se aproximando, ou ver um homem caminhando em minha direção, para o meu coração disparar contra o peito, e as mãos tremerem compulsivamente. A náusea vinha para esfriar e embrulhar meu estômago, minhas pernas travavam. O alívio só surgia quando o estranho passava por mim sem qualquer indícios de que possuía pretensões de me machucar. Não era fácil conviver com esse medo constante. Não era agradável. Parecia que nunca teria fim. Vivia presa, refém dos meus sentimentos, impossibilitada de levar uma vida normal.

Nesses momentos, após passado o susto, corria para o meu mais novo abrigo. A cidade estava situada no fundo de um vale, entre as montanhas, e assim, apenas para ficar sozinha, direcionava-me até o alto, até os bosques, onde poucos se aventuravam a ir. Andava por horas e horas, a fio, sem rumo, sem ideias específicas ou noção de quando voltar. As trilhas estreitas, protegidas do sol pelas sombras das árvores que se colocavam sobre elas como um teto natural, apaziguavam minha alma. Os pássaros cantavam, e vez ou outra eu ouvia o barulho entre os galhos, quando algum bichinho fugia ao sentir minha presença.

Mamãe não gostava quando eu sumia dessa forma, ficava preocupada. Na primeira vez em que resolvi buscar abrigo na tranquilidade da floresta e passei o dia inteiro caminhando, ela reuniu um grupo de pessoas para me procurar, pois acreditou que sua filha havia fugido para atentar contra a própria vida, e chorou como uma criança quando me encontrou sentada embaixo da sombra de uma árvore. Estávamos juntas tempo suficiente para ela ter certeza que minha cabeça, em suas próprias palavras, não estava no lugar; e uma profunda depressão me engolia um pouco mais a cada dia. Mas não adiantava o quanto tentava conversar comigo, eu continuava sem conseguir falar sobre o que acontecera, sobre as coisas que me perturbavam e adoeciam minha mente.

Assim como meus pais, ela também esbanjava, mesmo sem notar, um olhar de decepção, quando se dava conta que nada do que fazia me ajudava. Ninguém podia me ajudar. Ciente disso, e sem suportar mais o peso das minhas lembranças, após uma noite inteira de pesadelos e uma madrugada de insônia, quando meus pensamentos estavam ainda mais confusos, saí de casa cedo, fui até o rio que corria nas montanhas.

O sol ainda não havia surgido, o céu estava fechado devido a fina chuva que caia. O vento movimentava-se rapidamente entre a relva, balançando com violência as folhas das árvores e trazendo consigo o cheiro das flores silvestres que cresciam desenfreadas.

A terra úmida e macia massageava meus pés, trazendo-me novas conexões. Havia tirado os calçados, carregava-os nas mãos, queria sentir as raízes que um dia me cultivaram; queria sentir, de alguma forma, que ainda havia algo para mim: um passado, frio e escuro, a ser superado; e um futuro, morno e colorido, a ser vívido. Um lugar melhor. Mas no final não encontrava nada, além de um limbo inóspito. E pensava: como pode algo me machucar tanto, a ponto de a vida perder o sentido diante dos meus olhos? Como é possível que não enxergue nada a frente? 

Toquei a minha barriga sob o vestido, implorei para sentir algo que pudesse me fazer seguir adiante, tentei pensar que poderia ir além, busquei inspirações, mas no fundo estava apenas dançando no escuro. Nem mesmo a promessa da maternidade me deu esperanças. A dor machucava mais do que deveria, era mais forte do que qualquer desculpa que eu tentava usar para remedia-la, e como se não bastasse, meu espírito estava frágil o suficiente para permitir que o mal orquestrasse livremente pensamentos ruins em minha cabeça.

Perguntava-me se essa dor passaria, se algum dia o vazio que me consumia seria finalmente preenchido; e o breu, aniquilado. Temia a ausência de dias melhores no vislumbre do destino que se apresentava para mim, o sufocante “não” que era gritado pelos ecos do futuro incerto em resposta a todos os meus questionamentos ansiosos.

Então a angústia, essa ânsia inviolável e ferina, feria-me um pouco mais, sem qualquer sinal de trégua: um mal silencioso e mortal, que me mantinha constantemente sob sua lenta agressão, devorando cada pedacinho do meu ser e triturando, com seus dentes afiados, o que um dia foram os meus sonhos e recordações felizes; fazendo-me sentir na própria carne, emaranhado em minhas entranhas, o quão difícil é viver. 

Viver, simplesmente viver. Manter-se vivo! Quão estranho era que a vida me parecesse tão inconveniente, quando esta é a única premissa da existência, a priori irrefutável.

Mas se eu não tinha planos; não tinha sonhos para perseguir; nenhuma perspectiva sobre o futuro; e as alegrias de outrora, cujo resgate poderia me servir de algum escape, já não frequentavam meus pensamentos; se tudo que me vinha a cabeça quando fechava os olhos era o rosto do meu agressor, e as cenas perturbadoras que não me deixavam em paz, que inflamava minha consciência e deixava suscetível a sentimentos tão contrários; por que deveria ser forçada a viver? Ou na mais distante hipótese, acreditar que conseguiria vencer todo o mal, e assim, com essa esperança inocente, me lançar contra todas as provações?

Por que não poderia, sem ressentimentos, cortar esse pacto incompreensível com o universo, quando sequer conseguia compreender qual era o propósito da existência? Qual o intuito? Quais os motivos de estar aqui? Não encontrava respostas; por outro lado, as dúvidas e anseios brotavam em meus pensamentos, tão martirizantes e com tamanha capacidade de me deixar ansiosa e agitada, que minha cabeça doía fortemente. Tinha a impressão que estava na iminência de um colapso mental, enlouqueceria.

E esse não era um estado novo do meu espírito, tais abstrações pouco insípidas vinham ocorrendo com frequência. Acontecia que quando perdida entre esses devaneios, de súbito ficava inquieta, nervosa, irada, rangendo os dentes, movendo-me impacientemente... Falando sozinha! Ah, sim, e não que eu pudesse me dar conta de estar envolvida em algo desse tipo, quando tomava consciência das minhas ações, era que perguntava: estive falando ao vento? Será que de fato verberei tais palavras, ou elas não passaram de pensamentos? De vez em quando, notava por acaso que movia os lábios compulsoriamente, murmurando coisas aleatórias que me afligiam. 

Todo esse desconforto que vinha acompanhando minha existência, misturado ao meu próprio sofrimento, tão intenso e incurável, foi o que me ajudou a caminhar em direção ao rio. O som confortante da água ecoou em meus ouvidos, chamando-me ternamente, contribuindo para a decisão que seria fatal, eu não sabia nadar.

Meus passos foram lentos, meu corpo ainda duvidava um pouco, estava receoso, amedrontado... A água agora batia em minha cintura, se estava fria ou quente? Não lembro, não fui capaz de dar atenção a estes detalhes.

Recordo-me apenas de pensar se seria o próprio criador, capaz de me moldar e fadar a uma vida de sofrimento. E se poderia ele me renegar, jogando em minhas costas um pecado por eu não suportar o insuportável, e não compreender o incompreensível. Concluí, por fim, que o pecado do suicídio não pesaria mais sobre meus ombros do que o fardo que já estava a carregar. Em verdade, concluí que não havia pecado, nenhum preço a ser pago.

Portanto, venci esse medo: a perda da vida eterna. Deus já não existia para mim, ou no mínimo era exageradamente negligente. Temi a dor, a agonia. A morte por afogamento não soava confortável ou tranquila. A água iria me asfixiar até tudo não significar nada. Eu precisava estar certa sobre a irrelevância desse “tudo”.

Escolher entre a vida e a morte, pareceu-me como uma briga irônica entre a coragem e a covardia. Continuar significaria vencer o medo, o medo da dor, dos últimos instantes invioláveis, significava largar tudo de vez. Precipitadamente pensei que para isso se deve ter coragem, e foi apenas quando a água cobriu minha cabeça e encharcou meus pulmões, e meus pés deixaram de estar sobre algo sólido, que algumas das minhas súplicas foram atendidas e o arrependimento fez-se presente. As revelações finalmente ressurgiram do fundo das minhas lembranças para mostrar que eu ainda possuía algo, visões preencheram meus olhos com a cena feliz de um futuro; tudo isso me levou ao outro lado da mesma moeda: a covardia.

Eu fui covarde. É com pesar que admito minha desistência. É com tristeza que revelo a quais circunstâncias a minha fraqueza me levou.

Não sei exatamente como fui socorrida, ou porque sobrevivi, talvez Deus ainda estivesse lá, mesmo em minha heresia. Quem me tirou da água exatamente, eu não conhecia, tratava-se de um fazendeiro da região. Mas por alguns minutos acreditei que havia sido Sasuke, porque durante os instantes de plena agonia, ouvi a voz dele me chamando. Tenho certeza que ouvi, foi um grito aflito, ainda assim, exigente. Ele me chamou pelo nome, exigiu que eu vivesse, ordenou que eu lutasse. Em algum lugar, ele chamou por mim.

E tive certeza que o encontraria quando abrisse os olhos, aguardei ver o rosto dele, mas após a crise de tosse, que me obrigava a expelir a água engolida para fora, e o resgate da consciência, deparei-me com uma face completamente desconhecida, um rosto masculino que provocou em mim uma reação súbita.

Fiquei apavorada com o corpo que permanecia a poucos centímetros do meu, entrei numa espécie de delírio. De repente vi as feições de Gaara no semblante daquele homem, ele estava tentando me machucar novamente; ele me tirou da água, impediu-me de morrer, apenas para me causar mais sofrimento.

Do pavor minhas vísceras foram violentamente tomadas pelo ódio. Minhas mãos foram imediatamente ao pescoço dele, eu o mataria por todo o mal que me causou.

A ira me deu forças e tornou-me mais forte do que ele. O que senti resumia-se somente a raiva, uma raiva exigente, ferina, atroz... Como se naquele momento todo meu ser se igualasse ao instinto e espírito indomável de um animal selvagem e faminto. Porque um tipo de fome insaciável dominou meus atos.

Eu senti sede, gana, urgência em feri-lo, estraçalhar sua carne suja com minhas próprias unhas, até que o sangue escorresse por minhas mãos, sujando-as irrevogavelmente, trazendo à tona todo o rancor e o ódio que até então permanecera adormecido dentro de mim, o mesmo que eu vinha suportando como um cordeirinho... O lobo agora ressurgia dessa carapuça humilhante, cansado de ver tudo com seus olhos sonolentos após longos anos adormecido, sedento por qualquer tipo de vingança. O maior inimigo no avesso de minha própria face. 

Iria matá-lo, sem ressentimentos, sem culpas, com prazer.

E esse pensamento não me provocava a repugnância que deveria sentir ao imaginar tantas atrocidades, pelo contrário, ele trouxe sabores apetecíveis ao meu paladar, odores doces ao meu olfato, ele me alegrou, exaltou e trouxe paz ao meu espírito. Quão feliz eu fui enquanto tentava matar, com minhas próprias mãos, aquela pobre criatura!

A ira dominava todos os meus sentidos, um acesso violento e indomável. Um ataque inesperado que poderia controlar minhas ações para todo o sempre, porque ele me alegrou, ou pelo menos, naquele momento, meus problemas foram subitamente esquecidos através da visão de uma face que empalidecia pela consequência das minhas mãos que lhe tiravam o direito de respirar.

— Solte-o! – Ouvi gritarem ao longe, uma voz feminina. – Pelo amor de Deus, solte-o! – Cada vez mais próximo. Até que a figura esbelta, da esposa do homem que eu tentava matar, entrou no meu campo de visão.

Depois disso apenas lembro da ambulância, do frio que senti devido as roupas molhadas, do quarto com cheiro hospitalar, dos remédios para dormir, de mamãe chorando...

Fiquei dois dias internada no pequeno hospital da cidade, depois informaram que precisaria ser transferida para o hospital psiquiátrico da região, no qual receberia o tratamento adequado. Disseram-me que nesse outro hospital havia um psiquiatra renomado que realizava trabalho voluntário, o Dr. Hatake. Prometeram que ele me ajudaria. Mamãe concordou, e eu aceitei ir; aceitei porque compreendia o quanto precisava de ajuda, compreendia o risco que representava a minha própria vida e do meu bebê. Porém, quando cheguei aqui, tive certeza que sairia pior do que quando entrei. Eu vivo rodeada por loucos, por pessoas que foram abandonadas nesse lugar pela própria família, por almas atormentadas e esquecidas.


Notas Finais


Está chegando a hora de vocês conhecerem o Dr. Hatake *-*, ele irá sim ajudar Sakura.


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