Passada a euforia de final de ano, Regina esperava por seu diploma. Arthur e Júlio viajaram pouco depois da defesa de fim de curso dela e só retornaram em janeiro.
Tão logo Arthur chegou,deixei que se acomodasse em sua sala e fui abordá-lo.
- Bom dia Arthur. Poderíamos conversar agora? – parei na porta.
- Claro, claro. Entre. – apontou a cadeira.
Sentei-me, perguntei sobre a viagem de trabalho e seu final de ano e daí fui direto ao assunto.
- No dia da defesa do fim de curso da Regina,você disse que queria conversar comigo. Falou até que ela estava nos planos. Sobre o que seria?
Ele riu e comentou:
- Ai, ai, as mulheres são tão curiosas... Mas está certo. Bem! – pigarreou – Júlio e eu conversamos muito sobre isso e decidimos que pode valer a pena sim.
- O que...? – estava muito curiosa.
- Você teria alguma restrição em trabalhar com sua... companheira?
- Nenhuma! – respondi francamente.
- E quanto a passar tempos fora do Rio? Longe do mar... – olhou-me tentativamente.
- Ah! – cocei a cabeça – Acho que tudo tem um preço, não é?
Ele balançou a cabeça e levantou-se. Começou a circular pela sala.
- Sabe Emma, eu na minha vida, e já são aí uns 15 anos de estrada, conheci muitos profissionais. – pôs as mãos nos bolsos – Um deles me ensinou muito. Seu nome era Baltazar. Um homem de meia idade, cheio de sonhos e muitas idéias. Ele é um nome desconhecido, mas eu vou te dizer: muito nesta cidade se deve a ele. Foi um empreendedor! E ele me ensinou que na vida vale a pena correr riscos! - pegou uma xícara para se servir de café e olhou para mim – Aceita?
- Não obrigado. – respondi cordialmente
- Depois dele, vieram muitos outros. Uns mais competentes, outros menos, mas todos medíocres, e medíocre querendo dizer, dentro da média. – sorveu um gole – Mas você, - sorriu e apontou para mim. – você de longe não é nada medíocre. Quando professor Ramirez me falou de você eu achei que era apenas um professor lambendo a cria. Mas quando eu te conheci cheguei aqui e disse pra Júlio: "Meu caro, ali temos um potencial." – bebeu mais um gole – Você tem base, tem cultura, é muito versátil. Engraçado que sabe ser desde aquela engenheira elegante das reuniões formais e finos coquetéis até aquela que desce do salto,vai pro campo e reclama que a peãozada não vibrou o concreto direito.E ainda pega no fio de prumo pra ver se uma parede tá no nível ou não. – riu – Quando Júlio te conheceu, no dia da tua entrevista ele disse pra mim: "Cara, uma mulher dessa não tinha que tá em canteiro de obra. Não vai dar certo!" E eu disse: "Vamos ver!" E eu acertei. – apontou para si – Eu sempre acerto.
Deu mais umas rodopiadas pela sala e aquilo já estava me dando nos nervos. Mudei de posição na cadeira para disfarçar.
- E aí eu pensei – cruzou os braços – Emma é a pessoa pro que eu tô querendo. Ela tem o que eu quero: ousadia! Mas falta uma pessoa com ela. Acácio? Seria perfeito, mas ele não tem ambição. Além do mais ele não arreda o pé daqui por causa da mulher e dos filhos. Mas aí – abriu os braços e sorriu – eu vejo o trabalho da Regina e vi que ela tem o que eu precisava. – bateu palma - Não é arquiteta, mas entende bem. É jovem, não tem filhos e tá com todo o gás. – riu.
- Mas e daí...? – perguntei mexendo com a mão – Agradeço as palavras, mas ainda não captei.
- E daí – caminhou para trás da mesa e apoiou-se nela olhando pra mim – que o Rio tá um mercado cada vez mais agressivo e saturado. Você já viu quanta empresa tem por aí? E quantas com material barato, mão-de-obra porca e jogando os preços lá embaixo nas concorrências? Obras de fachada, bela viola e pão bolorento! A gente tem que cavucar aí fora. Porra, o Brasil não é só o Rio. – socou a mesa – A gente podia coordenar serviços em outras cidades, em outros estados!
Pegando projeto pronto pra fazer, oferecendo projeto, seja lá como for! Pensei no sudeste primeiro e depois! Quem sabe? – socou a mesa – Garota a gente pode pegar os projetos e subcontratar! Todo mundo faz isso aqui, por que a gente não pode fazer isso fora daqui?
- A idéia é boa,mas efetivamente,como seria isso? – olhei bem para ele - Que você espera de nós? Lembre-se que Regina tá como eu tava naquela época: esperando documentação.
- Bom – sentou-se – Eu esperei por você, eu espero por ela! Além do mais você ainda não acabou lá na Barra. – ajeitou a gravata - Leon agora foi escalado pra ser nosso hunter. Ele vai caçar as oportunidades fora daqui. E daí vocês entram tocando o trabalho e "morando" – fez aspas com os dedos – no local da obra enquanto for preciso. O escritório bancaria hotel, deslocamento, diárias e seguro. Você já tem seu celular de trabalho, - pausou – Regina teria o dela e vocês poderão alugar um carro sempre que necessário.
- É muito interessante, um desafio e tanto, mas você sabe que vai sacrificar a gente. – apoiei as mãos na mesa e olhei bem para ele – Quanto vai me dar de aumento por isso? E ela, quanto vai ganhar?
Arthur riu e apoiou-se no encosto da cadeira cruzando os braços e balançando a cabeça.
- Ai,Swan, eu esqueci de acrescentar. Você fala mesmo o que tem de ser dito. – riu de novo – Quer aumento? Então me diz. Quanto? – cruzou os braços e esperou.
"Ai meu Deus, por essa pergunta eu não esperava!"
Pensei um pouco, respirei fundo e respondi:
- O dobro do que eu ganho! – o encarei.
- O dobro? – riu – Você não acha que está muito ousada não,menina? – sorriu.
- E não foi exatamente por isso que você me escolheu? Por que eu sou ousada? – revidei.
Ele riu de novo e balançou a cabeça.
- Tá certo! Nessa você me derrubou. – olhou pra mim – Eu aceito!
Nesse momento meu coração bateu nos dentes e voltou. Se eu estivesse de boca aberta veríamos um coração batendo no chão. Engoli em seco e disfarcei.
- E Regina? Pra dizer a verdade ela deveria estar aqui, não acha?
- Acho! E você tem que reconhecer que ela é uma profissional recém formada e sem experiência de campo. Você trabalha desde estudante, ela não. É bem mais acadêmica, até porque teve uma formação mais multidisciplinar. Você teve um foco bem direcionado. – balançou a cabeça – Mas eu não vou mendigar com ela. Vou oferecer uma boa proposta.
- E quando ela deve vir conversar com vocês?
- Amanhã é um bom dia.
- Eu digo a ela.
- Bem, era isso o que eu tinha de falar.
- Ótimo. – levantei-me – Vou indo então.
Saí da sala e fui para o banheiro. Quando entrei pulei e comemorei de forma como não poderia fazer na frente do chefe.
Regina ficou muito ansiosa pela entrevista e no dia seguinte foi no escritório conversar com Arthur e Júlio. Quando ela entrou simplesmente paralisou a firma. Era incrível como ela tinha esse poder. Onde quer que fosse sempre conquistava uma legião de fãs que babavam a cada passo e gesto seu. Eu tinha ciúmes, mas nada doentio. Sabia, sentia, que ela era minha de corpo e alma.
- Mona, tua garota hein? – Leon me disse baixinho – Ui!- revirou os olhos – Se eu gostasse de mulher...- olhou-me de cima a baixo – Aliás, vocês duas numa cama devem pegar fogo!
- Nem te conto! – sorri.
- Sua diabinha! – deu-me um tapa no braço – Ah, olha só! Tem um seriado que passa na TV, pensei nisso agora, é a cara de vocês! Xena, a Princesa Guerreira. Uma guerreira morena alta de olhos azuis que vive com uma poetisa lourinha dos olhos verdes. São como vocês! Assiste só! E é legal a beça!
- E onde passa isso? – perguntei rindo.
- No SBT! Todo domingo. Assiste só! É por volta das dez e meia da manhã.
Na conversa entre Regina e os chefes eles explicaram para ela o que Arthur já havia me dito e fizeram uma boa proposta. Ela saiu da sala deles animada e com a promessa de um contato ainda antes do final da semana.
Conforme prometido eles a chamaram lá de novo e marcaram uma reunião conosco. Os quatro juntos. Quando estávamos na sala de Arthur, Leon foi chamado e apresentou um plano de trabalho. Era uma prestação de serviço para siderúrgicas que estavam promovendo obras de ampliação: uma no Rio, três em Minas Gerais e uma no Espírito Santo. A previsão era de que nosso trabalho durasse até setembro. Nossa participação seria em parceria com outras empreiteiras, mas era um bom começo. Eles decidiram que Regina viajaria antes para os locais da obras, para que conversasse com os clientes e conhecesse as localidades. Isso tudo na semana seguinte. Apenas Ricardo, o mestre de obras, iria com ela.
Em casa, conversamos sobre o assunto e eu estava morrendo de medo de deixá-la ir.
- Emmy, eu viajei para Europa sem você e agora você tem medo de que eu viaje para tão perto? – perguntou sorrindo.
- Mas você ia com seus pais e não sozinha!
- Mas eu não vou sozinha! Ricardo vai junto,lembra?
- É! – pus as mãos na cintura.
Regina arrumava a mala. Era domingo e no dia seguinte ela iria. E como sempre, a mala grande demais.
- Cuidado com tudo! Não dá trela pra estranhos, presta atenção, não deixa a bolsa dando mole pra ninguém roubar ou colocar droga dentro dela.
- E por que alguém faria isso? – perguntou rindo.
- Tem gente muito má por aí!
- Não tenha medo. Vai dar tudo certo. – beijou-me os lábios e foi fechar a mala.
Olhei o relógio e me lembrei do tal seriado que Leon falou. Peguei o controle e liguei a TV.
- Amor,Leon disse que tem um seriado aí no canal 11 que tem umas mulheres que parecem com a gente. O nome dele é Xena.
- Ah é? É a segunda pessoa que diz isso! Paulinha assiste também e me disse a mesma coisa um dia desses. Disse que Ruth concorda. Acha que Xena com uma mulher lá de Araras.
- Ah! – balancei a cabeça e ri – Ruth e suas estórias! Na cidade de Araras, segundo ela, tem de tudo! Não sei como não disse que Xena morava lá.
Sintonizei no canal e o seriado estava começando. A primeira coisa que ouvi foi a música e o texto de abertura:
"Na época dos deuses antigos, opressores, e reis, uma terra sem lei clamava por uma heroína, Xena
Uma poderosa princesa, Forjada no calor da batalha..."
- É essa aí??? Que mulherão! – sentei e ri – Quisera eu! Como dizem vocês ingleses: I wish!
- Deixa eu ver. – Regina veio correndo – Ai, eu perdi!
- Agora é anúncio. Espera um pouco.
O capítulo começou e era uma estória onde Gabrielle e Xena estavam na Bretanha.
- Bem, já vi uma semelhança. Elas andam pela Inglaterra. – ri.
Regina estava sentada do meu colo.
Olhei para as pernas da personagem fixamente olhando para a TV e disse provocativa:
– E ela também tem umas pernas...
Levei um tapa no ombro.
- Ai! – olhei surpresa
- Gostou das pernas dela? – fez um bico.
Ri e cheguei mais perto.
- Ah, meu amor,eu não acredito que você tá com ciúmes de uma atriz que eu nem conheço, nunca vou conhecer e não sei nem o nome. E se conhecesse ela nem me olharia duas vezes, com toda certeza.– abracei-a pela cintura e ela se levantou.
- Mas você olharia várias vezes, com toda certeza. Eu sei e me lembro muito bem do seu fraco por atrizes... – caminhou até a cozinha.
Levantei-me e fui até lá.Estava de costas e eu a abracei.
- Prefiro a minha mulher – cheirei seu pescoço – ao vivo, em carne e osso e só minha! – mordi sua orelha – Aliás, - virei-a de frente para mim – a senhora vai viajar amanhã e a gente aqui perdendo tempo com peiticas...
Ela riu e mordeu o lábio inferior.
- E que palavra maluca é essa? Peitica?
- Coisa que vovó dizia. Quer dizer, bobagem, perda de tempo, boa merda. Algo como bulshit.
- Bulshit? E quem te ensinou essa palavra feia? – envolveu meu pescoço com os braços.
- Aquela que me ensinou a falar um monte de sacanagens em inglês: vovó Granny! – beijei seu pescoço.
Ela fechou os olhos e riu gostosamente.
- Minha avó ensinou sacanagem para você, é?
- Sacanagem falada. – beijei seus lábios – Mas não sacanagem executada. Até porque é minha avó também e uma velhinha de respeito. – puxei-a para cima e ela envolveu minha cintura com as pernas.
- E quem te ensinou a sacanagem executada? O arsenal de amantes que você teve? – mordeu meu queixo e me deu um tapa no ombro.
- Sabe como é,meu bem, certas coisas a gente tem que praticar, praticar, praticar... – coloquei as mãos em sua bunda e comecei a morder e beijar seu pescoço caminhando para o quarto.
- Really? (É mesmo?) – respirou fundo .
Deitei-a na cama e respondi:
- Oh, really.
Fizemos amor ao som de Xena e suas aventuras, bem como, do restante da programação seguinte, até sermos vencidas pelo cansaço.
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