1. Spirit Fanfics >
  2. Amor é tudo que nós dissemos que não era >
  3. Uma aposta pra lá de errada

História Amor é tudo que nós dissemos que não era - Uma aposta pra lá de errada


Escrita por: tthesamefforyou

Capítulo 4 - Uma aposta pra lá de errada


Amor é tudo que nós dissemos que não era

Capítulo 4


"Uma aposta pra lá de errada"


Depois de uma semana indo da Universidade para casa e de casa para a Universidade, no intuito de estudar arduamente, Crowley estava, pra se dizer no mínimo, acabado. Agora entendia o que Beelzebub passava com aqueles livros. Os leu, e releu várias e várias vezes, mesmo assim não entrava na sua cabeça ruiva. Estava começando a achar que realmente era burro. Prestava atenção nas aulas, principalmente nas de Aziraphale, que por sinal ainda o olhava vez ou outra, mas não por muito tempo. Crowley não podia negar que no fundo se sentia culpado por ter sido rude daquela forma. Queria pedir desculpas, claro, mas essa parte sempre é a mais difícil. Você pode ter as melhores intenções as vezes, porém, na maioria dos casos, isso não vai ficar claro para os outros. Uma palavra. Uma ação. Um tom de voz alterado e tudo está perdido. Sua imagem está perdida. E você vai ser eternamente crucificado por isso. Independente do quão se arrependa. Não pode apagar o que fez. Crowley não podia voltar no tempo e impedir Aziraphale de ouvir seu comentário sobre as aulas de ajuda. Era certo que aquilo de alguma forma tinha deixado um clima ruim entre os dois. Talvez Aziraphale, assim como Bel, tivesse tido essas aulas. E se esse era o caso, Crowley o chamou de burro ou até pior. E se ele tivesse alguma necessidade especial e o ruivo não soubesse? Puta merda. Quem sabe ele ainda estivesse zangado. Isso era ruim. Muito ruim. Mais ruim que isso apenas sua incapacidade de aprender a matéria como todos os outros alunos. Seria um fracasso na prova e não haviam dúvidas disso. A menos que aceitasse a aposta maluca de Bel. Algo dizia a Crowley que ele já tinha visto isso em algum lugar. Mas isso pouco importava agora. Estudar sozinho não estava dando certo e precisava decidir: sua dignidade ou passar de semestre?

A resposta era óbvia.

Antes de mandar mensagem para a amiga, Crowley decidira encher a cara novamente, só para ter certeza que conseguiria fazer aquilo. Dito e feito. Bebeu metade de uma garrafa de whisky e já se sentia derrotado o bastante para topar qualquer merda que viesse de Beelzebub.

"Tá acordada?" - C

Era domingo à noite, especificamente 23 horas. Se a morena estivesse na cama não seria surpresa. E de fato, ela estava, mas com os olhos bem abertos, rolando a tela do celular para baixo, mais e mais, olhando com calma cada foto do diretor que abria, sem pressa, cada detalhe era importante. Devia ser a garota mais idiota de Londres por estar stalkeando um cara mais velho perto da meia noite. Um cara mais velho e casado. O que não faltavam eram fotos de Gabriel e Hope, aparentemente muito felizes, juntos em algum lugar, comendo alguma coisa ou se beijando. Ah, essas eram as piores. Como Bel queria que fosse ela ali. Era capaz até de chorar pensando no crush impossível se olhasse demais, por sorte a próxima foto tinha salvado sua noite. E que bela foto. Gabriel com uma camisa social branca semi aberta mostrando seu peitoral em frente ao espelho. Ah isso com certeza renderia uma boa fantasia. Estava prestes a iniciar suas idéias quando o celular vibrou. Uma mensagem. Poderia ignorar e seguir em frente. Mas era de Crowley. Uma mensagem de Crowley às 23h da noite. Isso era raro.

"Infelizmente tô" - B

Tudo bem, podia fazer aquilo outra hora. Tinha todo o tempo do mundo mesmo.

"Eu aceito" - C

Suspirou entediada, pegando o celular recém jogado na cama e visualizando a mensagem novamente. Poderia gritar de entusiasmo se Hastur e Ligur não estivessem dormindo não muito longe dali, em compensação um sorriso se formou em seu rosto.

"Me diz que não é pegadinha" - B

"Não é pegadinha" - C

"Nunca duvidei do seu potencial" - B

"Cala a boca, você me chantageou" - C

"Mas por uma boa causa" - B

"Ah sim, satisfazer suas idéias mirabolantes virou uma boa causa agora né. Tá bom" - C

"Então, quando começa o plano?" - B

"Não tem plano, Bel, só preciso pegar o velhote e tá tudo certo" - C

"E você acha que vai ser fácil assim? Vai só chegar nele e dizer: Ok, vamo ficar fodase" - B

"Não né" - C

"Que bom, porque ele é um cara mais velho, muito devoto e provavelmente falso hétero. Mas com jeito você consegue trazer ele pro vale" - B

"Porra de vale, esquece essa merda ai meo" - C

"Jeito de falar" - B

"Garota, foca nas provas e deixa o resto para o especialista aqui" - C

"Ui ui, quer um tapete vermelho também?" - B

"Sim, e um champagne também, por favor" - C

"Haahhaahhaha muito engraçado. Palmas" - B

"Beleza, vou dormir que amanhã tenho muito trabalho pela frente. Bye" - C

"E que os jogos comecem!" - B

Crowley não estava tão ferrado assim. Aziraphale era bonitinho, vai. Além do mais, havia a proposta das aulas particulares, não sabia se ainda estavam de pé, mas conhecendo o jeito bobo do loiro, era uma grande possibilidade. E uma vez perto do mais velho, nada poderia detê-lo. Já tinha uma forma de se aproximar. O resto era fácil.


[....]


Aziraphale levou sua mão às  têmporas, como estava exausto com tanto trabalho nas costas. Adorava ser professor claro, mas isso tinha seus custos. Os últimos dias haviam sido um pouco mais difíceis, e embora atolado nos preparativos das provas e tudo mais, seu pensamento continuava preenchido por uma única coisa: Crowley. Era inevitável não olhar para o ruivo durante as aulas com sua classe. Ele parecia diferente. Abria o caderno, escrevia nele, é, ele tinha um caderno, quem diria. Também lia os livros. Fazia anotações, Aziraphale sabia disso porque vez ou outra se aventurava andando pela sala, e claro, não perdia a oportunidade de passar ao lado da mesa do ruivo. Ele tinha uma letra bonita, pena não usa-la com mais frequência, também usava fones de ouvido quando a explicação cessava, mesmo sabendo que era proibido tal apetrecho em aula. Qualquer outro professor já teria dado um jeito no modo rebelde de Crowley, mas Aziraphale estava ocupado demais observando os detalhes no garoto para se importar com isso. Cego demais para seguir a conduta. Como um carro em alta velocidade numa via de mão dupla, e na contramão, sem direito a um stop para abastecer. Notara que Crowley estava sempre bem vestido, o que era ótimo, isso significava que tinha uma boa família, tinha um rumo na vida, mesmo que a Teologia não desse certo. Na verdade, o que Aziraphale mais se perguntava era porque Crowley estava ali, se claramente detestava o lugar. Não fazia sentido. E se houvesse um, o ruivo sabia esconder muito bem.

A parte mais difícil, no entanto, era quando os olhares se cruzavam. Crowley para Aziraphale. Aziraphale para Crowley. Por deus, o loiro podia sentir seu coração bater mais forte nesses momentos. Nada ao redor importava mais. Como se o tempo estivesse mais lento, quase totalmente parado e só uma coisa existisse no mundo inteiro: ele e seu querido, porém distante aluno. Odiava pensar assim, odiava lembrar daquele momento a sós com o ruivo, bem na sua mesa e quase ultrapassando os limites. Odiava o desejo de que o celular nunca tivesse alarmado aquele instante. Odiava fantasiar o que viria depois. Odiava tudo aquilo que estava acontecendo. E notoriamente, amava ao mesmo tempo toda a sensação que percorria o seu corpo quando aquele nome vinha à sua mente.

Crowley.

Anthony J. Crowley.

Aziraphale nunca se apaixonara antes, por ninguém, homem ou mulher. Nem mesmo deus ele amava tanto assim. Se amava não tinha conhecimento do fato. Era devoto, mas não era fanático. Não se ama uma divindade, não para o loiro, embora tivesse sido criado ouvindo o contrário. Deus sabia da sua fé, precisava provar mais algo além disso? Isso é loucura até para o mais insano dos homens. E por nunca ter amado ninguém antes, Aziraphale não sabia como funcionava. Não sabia os sinais. Como se comportar. Como dizer o que sentia. Ou como mostrar o que sentia. Era nada dentro de nada. Definitivamente uma criança ainda descobrindo a vida. Talvez isso tornasse mais romântico, mais clichê, mais como nos livros. Todos nós queremos um amor como dos livros ou filmes. Todos nós queremos ser amados por alguém. E todos nós merecemos isso. Realmente merecemos, e no entanto, nem sempre isso é nos dado. Alguns, por infinitos motivos, não conseguem deslumbrar desse maravilhoso sentimento. Nem sempre há reciprocidade. Nem sempre há um sentimento de fato. Na maioria das vezes é passageiro, é um acaso, uma coisa casual. E as vezes é apenas solidão e a incapacidade de sentir algo por alguém que não seja você mesmo. Como um extremo vazio manchando seu ser.

Mas Aziraphale não era uma mancha. Fora abençoado em ser tão sentimental quanto os adeptos do Romantismo no século XVIII. Tinha coração mole. Era ingênuo, e as vezes isso lhe custava caro. Sabia que estava começando a enxergar seu aluno com outros olhos. Profanos olhos. Pecaminosos olhos. Seus olhos. Olhos inundados de amor e paixão. Não queria isso, é claro. Sua religião jamais permitiria. E era aí que morava o perigo: O quão longe uma crença deve ir na vida de alguém? O quanto sua fé pode tirar de você? Não faça isso, não se apaixone por aquilo.

Não seja você.

Porque, na verdade, você não é você. Você é aquilo que suas crenças o instruem para ser. As vezes, isso é muito bom. Isso evita os desvios de personalidade. Evita a aglomeração de problemas. Só que as vezes, é isso que traz os problemas, em uma escala maior, bem maior. A fé de Aziraphale dizia que se apaixonar por alguém do mesmo sexo era definitivamente um ato horrendo. A pergunta que, dia após dia, desde então, martelava na cabeça do loiro era: Por que? Por que o seu amor era errado? O que tinha de errado em simplesmente amar alguém? Se deus amava à todos nós, incondicionalmente, qual seria o sentido de Aziraphale não poder amar incondicionalmente alguém também? Por que era um homem e ele era um homem? Qual a diferença? Quem dita as regras? Você? Eu? Deus? Deus nunca escreveu nada. Homens escreveram. Escreveram coisas que achavam ser certo ou errado em tempos onde esse "certo" ou "errado" eram adequados pela forma de pensamento da sociedade. Porém, agora, esse mesmo "certo" ou "errado" não se encaixava mais. E por incrível que pareça, a maioria das pessoas ainda não haviam percebido isso. Alguns querem viver do passado, e para estes, que bem, fiquem no passado. Os tempos mudam e as pessoas mudam. Menos os sentimentos, os sentimentos não mudam. Amar ou não alguém, independente do sexo, é uma "decisão" que só cabe a nós mesmos e mais ninguém. Por que quando alguém pode decidir isso também, então não é mais apenas nossa decisão. E as pessoas não precisam que outrem decida por elas.

Você precisa?

Crowley não precisava. Por isso confrontou sua família. O que não acabou muito bem. E agora estava prestes a fazer outra escolha estúpida. Quando os alunos foram dispensados para o almoço, o ruivo se levantou, como todos os outros, guardou suas coisas, com um pouco mais de lentidão que os demais, e os esperou sair, um por um. A cada indivíduo que atravessava aquela porta Crowley sentia suas pernas falharem. Não sabia porque estava tão nervoso. Era só uma aposta. Já tinha feito coisas piores na vida, por motivos bem menos justos.

Aziraphale estava sentado, guardando suas coisas também quando Crowley se encostou na mesa, quase sentando-se sobre ela, queria o fazer, claro, mas não tinha intimidade para tanto. O loiro podia ser um cara fácil de lidar, mas ainda era seu professor. Sua autoridade. Uma reclamação dele para com o diretor e Crowley não receberia suas regalias no fim do mês.

- Posso ajudar? - Aziraphale iniciou a conversa. Era estranho falar com o outro depois da forma como haviam se "despedido" naquele dia.

- Eu queria te pedir desculpas - Respondeu depois de alguns pequenos segundos em silêncio. Crowley podia contar nos dedos quantas vezes se desculpou com alguém. Até agora eram duas.

Os olhos de Aziraphale brilharam de uma forma tão assustadoramente adorável ao ouvir aquilo que Crowley não saberia descrever mesmo que quisesse.

- Está tudo bem - Sorriu gentilmente - Não precisa se desculpar.

- Ah preciso sim - Chegou mais para o lado, aproximando-se - Eu fui um idiota com você, professor. Não devia ter dito aquelas besteiras. Estava nervoso, e na verdade nem sei o motivo para tal.

- Eu não quis te insultar, Crowley - Largou suas coisas e colocou as mãos sobre as próprias pernas - Nunca duvidei da sua capacidade. E vejo que tem se esforçado muito ultimamente. Talvez eu tenha me precipitado. Sei que você vai se sair bem na prova sem mim, como sempre faz.

Aziraphale era tão gentil que o ruivo não sabia lidar. Nunca encontrara alguém assim antes. Era um território totalmente desconhecido. Podia lidar com pervertidos, pessoas mal educadas ou gananciosas, mas gentileza, isso era mais complicado. E era nítido que o loiro realmente acreditava que Crowley fazia suas coisas sozinho, o que causava um estranho desconforto no ruivo, como se estivesse se sentindo culpado por mentir. Culpado por fazer o mais velho de bobo.

- Não estou indo tão bem assim, sinceramente - Mas apesar da culpa, era hora de colocar o plano em ação. Estava ali por isso. E que Aziraphale algum dia fosse capaz de perdoa-lo.

- Ah - Não era bem o que esperava ouvir - Eu sinto muito.

- Eu queria saber se.. - Um momento antes da merda acontecer - Se aquela proposta de aulas particulares ainda está de pé.

E novamente Aziraphale parecia mais feliz que nunca. Era a chance de uma aproximação.

- Claro, querido - Segurou a própria mão tentando se conter. Queria segurar a mão de Crowley, é claro, mas aí seria demais, tinha medo de parecer invasivo - Tenho todo o tempo do mundo para você.

Um sorriso ladino se formou nos lábios de Crowley. Foi uma resposta totalmente inesperada, que por sinal o agradara bastante.

- Então, vai ser aqui mesmo ou....?

- Ah não, não. Eu não posso estender meu tempo aqui depois das aulas. Não pode ser em dias úteis.

- Fins de semana?

- Exato - Aziraphale não precisava pensar, já tinha a ideia na ponta da língua - Acho que vai ser muito melhor estudar em um lugar tranquilo e sem pressão.

- Tipo...? - Não estava afim de enrolação.

- Como na minha casa - Sentiu seu rosto corar - Aos sábados.

- A noite? - Tão pretensioso...

- Na parte da tarde é melhor - Deus queira que nunca ficassem sozinhos a noite. Era tentação demais para Aziraphale suportar.

- Certo. Eu gostei da ideia - Já estava na hora de sair - Estou ansioso para conhecer a sua casa, professor - Uma pequena fresta da luz do sol havia invadido o espaço entre os dois pouco tempo atrás ao passar pelas grandes janelas da sala e essa mesma fresta de luz fizera os olhos de Crowley, mesmo que escondidos pelas lentes escuras naquele momento, ficarem minimamente visíveis. E então Aziraphale fora capaz de ver aquele amarelo que o deixava tão fascinado direcionado exatamente para si, como se estivesse o sondando. Mas o que realmente havia naquela íris cor de mel era a mais pura  e genuína luxúria.

O loiro deixou mais um sorriso escapar, acompanhado de um olhar com a mesma intensidade como resposta. Mais tarde, quando pensasse melhor sobre, veria que aquela talvez não tivesse sido uma das suas melhores escolhas. Porém estava feito. E que os anjos o ajudassem com isso.


[....]


O resto da semana passou voando, pelo menos para Crowley. Para Aziraphale ela foi bastante torturante. Estava ansioso para o encontro de estudos, se é que podia chamar assim agora. Quando o dia finalmente chegou, Aziraphale acordou um pouco mais cedo que o normal, deixou a casa em ordem, não que já não estivesse antes, cuidou de suas plantas, tinha um jardim consideravelmente enorme nos fundos, repleto de rosas, orquídeas e outros tipos, tudo era feito a mão, e não odiava algo tanto quanto odiava manchas em suas preciosidades. Também tirou um tempo para limpar o seu Bentley, ah sim, ele tinha um Bentley, um Bentley 1926. Havia ganhado de seu pai, alguns anos atrás. Aziraphale o usava, apesar de não ser muito bom com ele, sentia que aquele modelo de carro era um pouco mais "agressivo" que os outros, mas como foi um presente especial nunca teve coragem de se livrar do automóvel. Sempre que olhava para ele lembrava de seu falecido pai, em uma mistura de saudade com boas lembranças. Infelizmente ainda não havia tido filhos que o pudessem herdar quando partisse, não que Aziraphale não quisesse. Adorava crianças. Em sua percepção elas eram os seres mais puros e angelicais na face da terra, ao lado dos animais. Sempre quisera ter alguém correndo e brincando pela sua casa enorme, o que faltava era a oportunidade. Mas agora, com seus 40 e poucos, acreditava que casar já não era mais possível, então se pegava frequentemente considerando a ideia da adoção. Seria um pai solteiro, sim. No entanto isso não era algo tão ruim, daria o seu melhor, compensaria os dois papéis. O importante no final era o amor e carinho que fosse capaz de dar à criança escolhida.

Mas voltando às tarefas, Aziraphale não estava se ocupando apenas para manter as boas aparências, no fundo havia uma segunda intenção, a de manter Crowley fora dos seus pensamentos. Quando o relógio na parede apontou para as 14h da tarde o loiro já estava devidamente pronto. Havia passado 1 hora inteira em sua banheira, lavara seus cachos, vestiu a calça tipicamente bege, acompanhada de sua camisa azul claro e seu colete de veludo também bege. Calçou seu par de sapatos castanhos de tartan e por último, mas não menos importante, sua gravata borboleta xadrez. Se olhou no espelho, consideravelmente satisfeito com a imagem que via. Desejava estar impecável. Geralmente não era tão vaidoso assim, porém aquela era uma ocasião especial. Muito especial.

Crowley por outro lado, só foi acordar perto das 15h, abrira os olhos, um pouco irritado com a luz forte entrando no quarto e então foi questão de segundos para uma feição de quem havia se esquecido totalmente do horário tomar conta de seu rosto. O ruivo pulou da cama, correndo em direção à outro cômodo do apartamento enquanto se despia às pressas, tentando não tropeçar mais do que já havia nos móveis restantes no caminho. Com a toalha na mão e uma dor de cabeça terrível fora capaz de chegar ao banheiro já praticamente nu. Não demorou mais que o necessário antes de voltar ao quarto e pegar as primeiras peças de roupa que encontrara pela frente, sendo elas seu colete preto, com uma camisa cinza de tecido fino por baixo e calça jeans que ficava ainda mais colada no seu corpo magro.

Normalmente Crowley tomaria algum remédio guardado em seu criado-mudo para ajudar na ressaca mas estava atrasado demais para se lembrar disso naquele momento. Tudo seria mais fácil se pra começo de conversa não tivesse bebido tanto na noite anterior, mas era sexta-feira e as pessoas sempre enchem a cara nos fins de semana, principalmente aqueles que não têm nada de especial em casa para mantê-las entretidas , o que com certeza era seu caso. Crowley apanhou suas botas pretas pelo corredor, adentrando a sala onde avistou seu casaco preto de lã jogado no encosto do sofá e logo abaixo estavam também seus óculos de sol redondos, agora sim estava pronto.

Apesar da sua cabeça ruiva estar uma bagunça, Crowley podia se lembrar da ligação totalmente aleatória que recebera na noite passada.


[....]


Voltemos algumas horas antes.

Especificamente o momento da ligação.

Aziraphale havia se empolgado tanto com a ideia das aulas que nem ao menos se lembrara de dizer onde era sua casa, não até sexta, perto da meia noite, no meio dos seus devaneios que o impediam de cair no sono. Onde era literalmente tarde demais para tentar ligar e avisar, isso se não tivesse o número de Crowley, mas adivinhe, ele tinha! Para sua sorte, destino ou um milagre de deus, o loiro havia guardado aquela cópia da ficha do seu estimado aluno, e nela haviam suas informações básicas, como um número de telefone e o endereço também, mas Aziraphale não achou que seria a melhor das idéias bater na porta do mais novo de madrugada, definitivamente não.

Poderia mandar uma mensagem e resolver tudo, porém, Azi não só vestia roupas de uma moda já esquecida, como também mantinha alguns de seus costumes igualmente deixados para trás, visto que não tinha exatamente um celular como Crowley, o que não significava que iria mandar uma carta, também não era para tanto. Possuía um telefone, sim, mas um como aqueles dos anos 50, onde você precisava girar uma espécie de "anel" para conseguir discar o número desejado. Para os outros era algo ultrapassado, para Aziraphale era algo que sobrevivera ao tempo e precisava ser mantido. E cá entre nós, ele no fundo achava o objeto uma graça.

O ruivo estava saindo do elevador, já no seu andar, quando o celular começou a tocar. Uma coisa engraçada de quando estamos bêbados é que perdemos não só o raciocínio lógico, mas a noção de profundidade das coisas também. Os bolsos de Crowley pareciam um buraco negro e foi isso que o fez demorar mais que o esperado para achar a origem do barulho na sua calça. Aziraphale estava perdendo as esperanças quando escutou alguém do outro lado da linha.

- Eae.. - A voz estava arrastada, o que podia indicar uma pessoa que havia acabado de acordar pela ligação ou um indivíduo com o corpo cheio de álcool tentando abrir a porta do apartamento com o lado errado da chave.

- Olá! - Aziraphale não podia negar que estava feliz pela chamada ter sido atendida - Eu..... acho que esqueci de te dizer onde eu moro, desculpe.

- Mas quem diabos tá falando?? - Depois da 5° tentativa Crowley finalmente conseguiu entrar em casa, era difícil dizer quando foi que as portas se tornaram uma tarefa difícil na sua vida.

- Oh... - Aquilo acabou jogando fora toda a confiança que tinha reunido para ligar. Claro que o ruivo não ia saber que seria ele ligando, já era de se esperar. Não precisava ficar tão decepcionado com isso, embora estivesse - Sou eu, Aziraphale - Pensou por um momento - Seu professor - E depois novamente - Da Universidade - Achou melhor garantir.

- Ah claro, o professor.. - Distanciou o celular do seu ouvido, deixando seus olhos semicerrados para conseguir enxergar em meio a todo aquele brilho que horas eram - Não é um pouco tarde para me ligar?

- Desculpe, eu não queria atrapalhar o seu descanso - Pobre Azi, tão inocente.

- Não atrapalhou. Eu tô indo dormir agora na verdade.

- Está tão tarde, você devia dormir mais cedo.

- Vai vir aqui e me colocar na cama no horário certo, é?

Aziraphale não pôde deixar de rir baixinho ao ouvir aquilo.

- Você sabe que não - Respondera enfim.

- Que pena - Crowley se jogou no sofá, estirando os pés sobre a mesinha no centro e deixando seus óculos em algum lugar ao lado - Pensei que ia ganhar leite na boca antes de dormir.

- Ok, vamos com calma nas piadas, querido - Aquela conversa já estava mais longa que o previsto.

- Como quiser, mademoiselle - Provavelmente Aziraphale não tinha entendido o duplo sentido da frase anterior, e na verdade era melhor assim.

A ligação só durou mais alguns minutos, o suficiente para o professor falar seu endereço e o horário adequado do encontro entre eles antes de desligar. Crowley deixou seu celular no sofá, acompanhado do seu casaco no encosto e foi, em meio aos tropeços, para o seu quarto, se jogando na cama e apagando logo em seguida.

Do outro lado da linha, Aziraphale permaneceu com o gancho do telefone na mão mesmo após o fim da chamada. Um pequeno sorriso tomava conta de seus lábios enquanto chegava à conclusão que ligar tinha sido uma boa ideia no fim das contas ou talvez ter guardado aquela folha, não, mais além, ter ido atrás daquelas informações na Universidade, espere, um pouco mais, ter esbarrado no ruivo aquele dia no corredor, como se tudo estivesse predestinado a acontecer. Aziraphale sabia que era besteira, mas acreditava tão piamente nisso que nem mesmo o mais sábio dos seres poderia tirar essa idéia da sua cabeça loira. De repente estava tão eufórico com a situação, tão feliz. Conversar com Crowley de alguma forma o fizera se sentir melhor naquela noite, mesmo que não tivesse sido o diálogo mais romântico de todos, nem de longe, mas aquilo de certo modo fez as coisas dentro de si ficarem mais calmas, como a ansiedade em vê-lo. Nem ao menos sabia o porquê da sua mente ter passado toda a semana imaginando a hora em que Crowley batesse na sua porta com aquele olhar indecifrável por trás dos óculos escuros, as roupas sempre tão modernas e impecáveis, os cabelos vermelhos rebeldes, e claro, alguma piada que Aziraphale não seria capaz de entender novamente.


[....]


Pois bem, isso foi exatamente o que aconteceu no dia seguinte.

O táxi do ruivo chegou na casa de Aziraphale basicamente 5 minutos depois que saiu, Crowley poderia ter ido andando e economizado seu dinheiro, o fato é que ele não se importava em gastar. Na verdade esse era um dos seus hobbies. Assim que pisou na calçada seus olhos percorreram todo o local, e como era grande, as grades brancas do muro percorriam uma vasta extensão em que Crowley gastaria pelo menos uns bons minutos até chegar ao fim, isso apenas na parte da frente. Passou pelo portão que possuía alguns detalhes em dourado no centro e continuou andando, haviam algumas árvores em cada lado preenchendo o gramado, mas o que realmente chamou sua atenção foi a fonte logo a frente. Não sabia que ser professor de Universidade pagava tão bem assim. E mais um pouco adiante estava a casa, que pensando bem, era praticamente uma mansão. Igualmente branca, com detalhes dourados pelas paredes e pilares, obviamente tinha dois andares, quem sabe mais.

Crowley tocou a campainha, esperando algum serviçal ou algo do tipo atender a porta, afinal um homem com tanto dinheiro teria empregados, não é mesmo? Crowley com certeza teria se aquela fosse sua casa. Porém, para sua surpresa fora o próprio Aziraphale que abriu a porta, ele usava praticamente as mesmas roupas, com excessão do casaco cor de creme que não estava presente, não que o ruivo tivesse alguma moral naquela hora para falar disso, ele também usava o mesmo look, não que fosse desprovido de outras roupas, tinha muitas, mas se sentia mais confortável com aquelas, até porque foram as primeiras que encontrou pela frente.

- Você veio! - Aziraphale parecia surpreso, e era pra se estar. Depois de 1h de atraso já estava quase se desfazendo em vinho.

- É claro que eu vim, por que não viria? - Fingiu demência, colocando as mãos nos bolsos da frente.

- Bem, você está atrasado - Se afastou, dando espaço para que o ruivo entrasse - Muito atrasado.

- Uns minutinhos não matam ninguém - Tentou amenizar a situação.

Quando Crowley adentrou o cômodo não pôde deixar de pronunciar um "uau" audível o bastante para que o mais velho ficasse um pouco envergonhado.

- Vem cá, quanto que é esse seu salário de professor? - Achava que era burguês mas Aziraphale estava de parabéns.

- O bastante para viver - Se aproximou - Você quer alguma coisa? Chá?

- Não sou muito fã de chá - Seus olhos foram de encontro à gravata borboleta de Aziraphale, ela parecia torta, e de fato, ela estava. Aziraphale havia mexido nela sem perceber logo depois de começar a ficar mais ansioso pela demora do ruivo. Então Crowley decidiu arruma-la, atitude essa um tanto quanto inesperada, que automaticamente fez o loiro inclinar a cabeça para baixo, vendo a mão alheia próxima ao seu pescoço. Engoliu em seco, tentando não ficar nervoso.

Assim que terminou, Crowley começou a descer os dedos pelo peitoral do mais velho, tocando sua pele por cima do tecido azul claro, parando próximo ao primeiro botão do colete bege. Depois de se certificar que tudo estava bem por ali, ele voltou a colocar a mão no bolso da calça e prosseguiu com sua fala - Mas eu gosto de vinho - Se afastou tendo sua atenção de volta ao cômodo.

- C-Claro - Retomou a respiração que havia parado em algum momento. Realmente não esperava por aquilo e a surpresa acabou o fazendo se esquecer de agradecer.

Enquanto o próprio Aziraphale continuava fixado na gravata, Crowley percorria a sala de estar, pensou em sentar em um dos sofás aparentemente muito confortáveis, mas achou melhor se manter explorando, ali haviam poucas coisas além dos estofados. Passando por uma porta à direita, o ruivo chegara à uma espécie de livraria misturada com escritório, e ali sim tinha um monte de coisas, além dos livros, é claro, que por sinal pareciam ser de décadas atrás, também havia um daqueles telefones antigos sobre uma mesa, uma máquina de escrever igualmente velha próxima e um livro semi aberto ao lado, junto com uma xícara de provavelmente chá, com o líquido pela metade, já frio, Crowley sabia disso porque pegou a xícara, assim como tocou em todas as outras coisas, o título na capa do livro estava apagado demais para que conseguisse dizer qual era e não estava interessado em ler as páginas, de qualquer forma. Quando Aziraphale o alcançou, Crowley estava "brincando" com seu telefone, girando o anel para lá e para cá.

- Cuidado com isso, querido - Tratou de fechar o livro que estava sobre a mesa e o colocou novamente em uma das estantes.

- Por que? Não funciona mais - Começou a discar o número de Beelzebub como quem não queria nada.

- É claro que funciona - Por incrível que parecesse.

- Sem chance - Zombou.

- Alô? - A voz da garota se fez presente do outro lado da linha.

- E não é que funciona mesmo - Crowley olhou abismado para Aziraphale e colocou o gancho no lugar, finalizando a ligação. Nem queria imaginar os xingamentos da morena por alguém ter desligado na sua cara.

Um sorriso foi compartilhado entre os dois.

- Então - Crowley se encostou na mesa - É aqui que vamos estudar?

- Sim - Tinha um visível orgulho dos seus livros e todas as outras coisas ali presentes - É aqui.

O ruivo assentiu. Só um velho mesmo para gostar de tantas coisas velhas.

- Me diz uma coisa, prof. Você me ligou disso aqui? - Apontou para o telefone antigo, ainda estava incrédulo que aquilo realmente funcionava.

- Liguei - Deu de ombros - Por que?

- Você não tem celular?

- Não gosto dessas coisas.

- Ah, não gosta? - O tom irônico na sua voz fez Aziraphale fazer um bico emburrado.

- Você tem algum problema com o meu telefone? - Cruzou os braços, evitando olhar para o outro.

Crowley sorriu com a cena, o loiro parecia uma criança zangada, uma criança fofa e zangada. Não dava para levar ele à sério daquele jeito.

- Ok, tanto faz - Voltou a serpentear pelo cômodo - Melhor a gente começar logo com isso.

- Certo - Aziraphale foi até outra mesa que havia atrás de si, pegando uma pilha de livros que tinha separado e colocado lá mais cedo. Os levou até a pequena mesinha redonda entre os sofás que haviam por ali e se sentou.

Crowley ficou observando, estava torcendo para que não tivesse que ler todos aqueles livros. Talvez devesse ter continuado reclamando do telefone.

- Precisa de tudo isso aí mesmo? - Uma sobrancelha erguida, mostrando sua preocupação.

- Você acha que eu pegaria eles à toa? - Na verdade aquilo não era nem metade do que Aziraphale realmente pretendia usar.

- Ainda da tempo de cancelar as aulas? - Não conseguia ser sério nem em momentos como aquele.

- Eu suponho que não, querido - Aziraphale colocou a mão na parte vazia ao seu lado no estofado, dando algumas batidinhas, um sinal para que Crowley se sentasse logo e parasse de reclamar.

"Maldita aposta", pensou, se dando por vencido e sentando perto de Aziraphale. Era bom Beelzebub lhe conseguir um 10 naquelas provas, porque ainda nem haviam começado mas sua alma já queria desencarnar de seu corpo.


[....]


A maioria das pessoas detesta a escola, fato, e elas não estão exatamente erradas. Não há nada mais triste do que perder horas da sua vida estudando sobre algo que você não se importa. Claro que isso faz parte do ser humano, adquirir conhecimento e todo esse blá blá blá que você ouve o tempo todo. E na escola existem três tipos de pessoas: o aluno que faz as suas obrigações, o aluno que só vai para comer o lanche e o aluno vagabundo que não faz nada mas por um milagre, ou por muita cola dos outros, consegue passar de ano. Esse era Crowley. E se manteve assim até a vida adulta. Acredite se quiser, tem gente que morre assim.

Agora imagine a cena mais triste que você já viu em algum filme ou série e eu te digo que ela não supera a cena de Crowley naquela sala, com suas costas no encosto do sofá, de pernas e braços cruzados, olhando para Aziraphale sem escutar absolutamente nada do que estava sendo dito, apenas querendo desesperadamente que um meteoro o atingisse bem ali. Por deus, era tão deprimente, não podia entender como o loiro conseguia ficar tão animado falando de um assunto tão entediante, chegava a ser um desperdício. Essa era a vida de um professor? Ler uma pilha de livros todos os dias até se aposentar? Que vida triste.

Mas não pense que Crowley ficou a tarde toda assim. Não, não, não. Ele teve que ler também, teve que fingir que estava acompanhando, até deu uma resposta ou outra certa quando Aziraphale lhe questionara, mas esse era o máximo que podia fazer. Não compreendia Teologia, não queria compreender, não tinha interesse e não queria ter. Só estava ali para cumprir com sua parte e fazer o que tinha que ser feito.

Porém, digamos que o mais velho não dava muitas brechas. Era reservado ao extremo. Evitava virar o rosto e dar de cara com o ruivo tão próximo de si, aprendera essa lição na prática. Pois aconteceu assim que começaram com a leitura. Aziraphale queria ter certeza que Crowley estava prestando atenção e sem aviso prévio se inclinou para olha-lo, nessa o ruivo estava tão perto quanto o necessário, e seus rostos quase, apenas quase, se tocaram, mais especificamente seus lábios, e só não o fizeram porque Aziraphale tinha um bom reflexo e conseguira se afastar a tempo. O silêncio se fez presente então, e Crowley continuava o olhando daquela forma que o deixava desconfortável, vulnerável, sem saber o que dizer, sem saber o que se passava na cabeça do outro, e aqueles óculos deixavam a situação ainda pior. Eles escondiam muito de Crowley. Aziraphale detestava isso. Detestava ser o único às claras. O único à mostra. Um pedido de desculpas foi feito e eles continuaram o que estavam fazendo.

Aziraphale também evitava falar de qualquer coisa que não fosse sobre o assunto das folhas de papel na mesa, mesmo quando o ruivo mudava o rumo da conversa, Aziraphale ia lá e a contornava, voltando ao ponto de partida. Crowley era um pouco invasivo, chegando a fazer perguntas pessoais, nada íntimo, apenas pessoais mesmo, e geralmente isso deixaria qualquer um irritado, mas não o professor. Ele gostava. Gostava que alguém estivesse interessado nele, ou na sua vida. Gostava de ser notado. Gostava da atenção. E ela era tão rara. Tão precária. Não precisava de muito para se agarrar à aquilo. Você provavelmente chamaria isso de carência, Aziraphale preferia chamar de solidão. Porque era sozinho, muito sozinho. Não havia ninguém com quem compartilhar sua vida. Gabriel era seu amigo, sim, mas havia um limite para o que Aziraphale podia dizer a ele ou não. Então, de repente, chega um cara do nada, se aproximando e fazendo perguntas sobre você, mesmo sabendo que não deveria fazê-las pelos motivos óbvios, já que não estavam ali para isso, mas mesmo assim Crowley era persistente. Quem não se apegaria à isso? Aziraphale nem o conhecia e mesmo assim se sentia tão bem ao seu lado.

Crowley precisava torcer muito para que aquele homem nunca descobrisse a verdade por trás da sua farsa de aluno que só tinha alguns problemas com o conteúdo e era amigável, porque isso partiria o coraçãozinho de Aziraphale de tantas formas que chegava a ser um pecado. Um pecado cruel.

Quando o relógio na parede mostrou estar perto das 18h Crowley decidiu encerrar os estudos daquele dia. Um longo dia. Muito produtivo para Aziraphale. E uma verdadeira tortura para o ruivo.

- Você tem certeza que não quer ficar mais um pouco? Tomar um chá quem sabe - Propôs enquanto acompanhava Crowley até a porta, mesmo já deixado claro que o outro não gostava de chá.

- Nah, estou cansado - O que não era de todo uma mentira.

- Ah, claro. Eu entendo - Sorriu amarelo, ainda estava relutante por já ter que se despedir.

- Nos vemos na segunda, professor - O tom confiante em sua voz era sempre uma armadilha para o mais velho.

- Eu espero que sim... - Sussurrou consigo mesmo.

Aziraphale se manteve em pé na porta depois que Crowley saiu, assistindo o ruivo passar pela fonte, andando sempre daquela forma tão solta, quase rebolando em meio aos passos sorrateiros que tinha. Não demorou para sumir do campo de visão de Aziraphale, que só então voltou para dentro, com um sorriso bobo no rosto e a mão na gravata borboleta, segurando-a com certo apreço, afinal fora o lugar onde os dedos do ruivo tinham tocado mais cedo. E não se esqueceu disso nem por um momento se quer durante aquela tarde toda.

Aziraphale não tinha certeza, mas acreditava que o cheiro de Crowley ficaria nela também, assim como seu casaco naquela noite. E de fato, ele estava certo. O cheiro do ruivo estava lá, novamente. Soube disso quando a retirou apenas para confirmar suas suspeitas. Seria um desperdício não dizer que Aziraphale passou o resto da noite em seu escritório com seus livros, sentado no mesmo sofá de antes, onde um perfume masculino que não pertencia a si exalava fortemente, e não só ele, como também o tecido da gravata borboleta ainda em sua mão, próxima às suas narinas enquanto uma taça de vinho o acompanhava no momento, sendo degustada no lugar do jantar. Por algum motivo a sua fome fora embora junto com o ruivo. E foi assim que terminou a noite, com suas costas no encosto do estofado e olhos fechados, lembrando e relembrando os momentos daquela tarde, sentindo o aroma que em breve iria embora também. Aziraphale só queria aproveita-lo antes que isso acontecesse. Só queria continuar imaginando que Crowley ainda estava ali, sentado ao seu lado.



Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...