Foi quase uma hora até que terminássemos de assinar papéis e resolver as burocracias. Vinte minutos foram apenas tentando convencer o policial de que não era necessário prestar um BO. A médica me receitou algumas coisas para os ferimentos. Achei que ficaria livre de hospital, mas acabei de descobrir que levei pontos enquanto estava desacordada. Tenho que voltar para tirá-los daqui a uma semana.
Já passava das 7h quando recebi a alta "definitiva". Com a minha bolsa no ombro e parecendo uma sobrevivente de guerra, saí pulando toda enfaixada porta à fora.
— Segura em mim, você vai terminar caindo.
— Não.
— Deixa de onda, vai logo. — Ofereceu o braço.
— NÃO.
— Qual o seu problema? — Perguntou indignado, enquanto caminhava ao meu lado no estacionamento.
— Você é burro ou só se faz?
Poucos metros depois ele me puxa em direção a um carro, que penso ser dele. Então fala abrindo a porta.
— Entra logo antes que eu tenha que te amarrar pra você não ir a pé.
— Ui, ele vai me amarrar! — Debochei com a voz carregada.
— Palhaça.
No caminho, paramos em uma farmácia. Havia uma fila abarrotada de gente para entrar. Depois de muitos empurrões de aposentadas com máscaras de proteção no queixo, conseguimos comprar curativos e medicamentos.
— Se eu tiver pegado o vírus no meio daquele povo e morrer dentro de quinze dias, juro que volto pra puxar seu pé machucado. — Afirmou ao estacionar dentro do condomínio.
Foi inevitável ser o centro das atenções quando adentramos o saguão de entrada. Todos se voltaram para nós — curiosos — até que o elevador fechasse e saíssemos de vista.
— Otários. — Sussurrou.
Chucky me olhou como se eu fosse um ET assim que eu gargalhei reparando no espelho.
— Por que você não me avisou antes de entrar na farmácia que eu tava parecendo ter sido arrastada por um caminhão na BR?
— Porque você não me avisou que eu tô igual o Chucky depois que pegou fogo dentro da fábrica.
Ao chegarmos no nosso andar, paramos um em frente ao outro — nos encarando sem saber o que dizer. Um silêncio sepulcral se instalou no corredor. A tensão era palpável.
— Obrigada?... Desculpa? — Tentei.
— Achei que você era melhor atriz. — Cruzou os braços, negando com a cabeça.
Ignorando seu comentário, fui até a porta do meu apartamento enquanto buscava as chaves na bolsa.
— Quer isso? — Ele perguntou balançando o chaveiro acima da minha linha de visão.
Quando pulei até onde estava para pegá-las, ele deu a volta em torno de mim e abriu a porta, entrando no meu recinto sagrado sem nem pedir permissão. Respirei fundo para não quebrar os restos do porta-retratos que estavam no chão na cabeça dele. Não lembro de ter dado essa liberdade a ninguém.
Antes mesmo que eu entrasse, ouvi um grito ruidoso vindo de dentro da cozinha.
— SAAAI DEMÔNIO!
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.