Luan.
Consegui sair da empresa só de noite, já era tarde e mesmo assim cruzei com Ana quando cheguei em casa. Estava tudo silencioso demais, Claudia já tinha ido embora e por que ela continuava ali?
- Ana? – chamei, fazendo com que ela me olhasse. – Te assustei? Por que cê ainda tá aqui?
- Oi Luan. – ela sorriu delicadamente. – Ainda tô trabalhando. – ela deu de ombros.
- Mas você não é a responsável pelo serviço pesado, é a Claudia, você só deve ajudá-la a arrumar algo ou cozinhar. – fiquei confuso.
- Só fiz o que sua mulher mandou. – Ana respondeu reprimindo uma careta e eu me segurei para não rir. Tudo então tinha feito sentido, só podia ter sido a Jade. Ela passou o dia quieta demais, não ligou, não procurou briga. Devia estar descontando na coitada da Ana.
- Ah, entendi. Você não precisa fazer nada que a Jade mandar. – respondi.
- Mas... – ela tentou argumentar.
- Sem “mas”, quem te chamou para trabalhar aqui fui eu, o que me torna seu patrão, a Jade é sem noção.
Ela apenas assentiu com a cabeça e mudou de assunto.
- Tá com fome? Posso fazer alguma coisa pra você comer, juro que minha comida não é tão ruim assim...
- Aposto que é melhor que a minha. – comentei. – Não, comi na empresa. – disse e me dirigi até a geladeira, pegando um pote de sorvete e duas colheres.
- Bem, então acho que já vou indo... – ela pegou a mochila e jogou sobre os ombros.
- Que? Cê vai pra casa uma hora dessas? Nem pensar, eu não vou deixar, sua casa é longe e você demoraria horas para chegar lá, além de ser perigoso. Você vai dormir aqui.
- Aqui? – ela perguntou hesitante.
- Não exatamente aqui, mas tem um quartinho nos fundos, você pode dormir aqui na semana e ir pra casa no sábado. – propus.
- Tem razão, eu demoraria horas pra chegar em casa... Vou aceitar então.
- Já que você vai ficar, senta aqui e me faz companhia. – puxei o banco do balcão para que ela sentasse ao meu lado e lhe entreguei a colher para dividirmos o sorvete.
Ana.
Eu jamais pensaria que o filho da tia Mari pudesse ser tão bom, gentil, educado. Ele sempre me surpreendia com alguma coisa e eu estava começando a adorar isso. Da mulher dele, não posso falar o mesmo. Ela é literalmente uma cobra, e a pergunta de Cláudia mais cedo se repete na minha cabeça: como ele pôde ter se casado com alguém assim? Jade passou o dia me explorando e eu me sentia exausta. Mas estar aqui, dividindo um pote de sorvete de napolitano com o Luan me deixava melhor.
- É bom ter alguém para conversar que não seja sobre contas, reuniões, problemas. – ele disse e sorriu. – Então, qual faculdade você cursava?
- Eu cursava moda, é algo pelo qual sou apaixonada. – respondi sorrindo ao me lembrar.
- Combina com você, sabia? – ele puxou assunto.
- Obrigada. É o que mais me identifico.
Houve um silêncio de repente, os olhos de Luan exploravam meu rosto, mas eu podia sentir que aqueles olhos eram capazes de enxergar até minha alma. Sem me dar conta, fiz o mesmo que ele. O analisava, ele era bonito, bonito era pouco, na verdade. Ele era lindo, com uma beleza diferente, o cabelo bem cortado.
- Tá sujo aqui. – a voz macia interrompeu o momento e ele levou um dedo até o canto da minha boca, esfregando suavemente. Senti o mesmo choque que senti de manhã, quando esbarramos nossas mãos no carro. Foi impossível conter um arrepio e espero que ele não tenha percebido.
- Sou tipo criança pra comer sorvete. – foi o que consegui dizer e me remexi desconfortável na cadeira.
- Você já pensou em ser modelo? Você levaria jeito, eu conheço alguns amigos que trabalham no ramo, poderia te indicar.
- Seria um sonho, mas não sei se minha timidez iria me ajudar. – confessei.
- Vou conversar com meus amigos, você seria uma ótima profissional. Agora vou te deixar dormir, tenho certeza que seu dia foi tão puxado quanto o meu. Obrigada pela companhia. – ele se pôs de pé e fiz o mesmo.
- Obrigada pelo sorvete e pelo quartinho. Boa noite, Luan.
- Boa noite, Ana.
{...}
O quartinho ao lado da casa não era um quartinho, era um belo quarto, amplo e aconchegante. Arrumei minhas coisas num guarda roupa e decidi tomar um banho para aliviar meu corpo tenso. Minha mente estava a mil, eu relembrava os momentos no carro, o toque dele contra minha pele, a ignorância daquela mulher. Luan faria de mim uma modelo? Que besteira, Ana, você parece uma adolescente se iludindo. Era o que minha consciência gritava e ela estava certa. Desliguei o chuveiro e me sequei, bufando de raiva comigo mesma por acreditar nisso. Vesti apenas uma calcinha e uma blusa e me joguei na cama. Meu celular tinha umas dez mensagens da Bruna, e umas da tia Mari.
Respondi tia Mari primeiro, dizendo que tinha gostado do meu primeiro dia de trabalho e que estava tudo bem comigo, o filho dela estava cuidando bem de mim. Cliquei na janela com o nome da Bruna e li:
“Como está sendo a manhã?” 11:47
“A Jade cobra tá por ai?” 13:12
“Aninha! Cadê você?” 13:39
“Ok, desisto. Sei que tenho que te deixar trabalhar, mas minha curiosidade não deixa.” 15:00
“Me conta como foi seu dia, eu quero saber de tudo, já rolou algo entre você e meu irmão? Pode me responder a qualquer hora, eu só durmo hoje quando ver essa resposta!” 20:53
“Meu dia foi... diferente, a sua cunhada é bem esquentadinha, hein? Digamos que ela abusou demais de mim hoje e estou exausta, estava trabalhando muito, por isso não respondi suas loucas mensagens. O que rolou entre eu e seu irmão? Dividimos um sorvete, isso significa algo? Com certeza não” digitei rápido e enviei.
Bruna leu e respondeu em menos de dois minutos.
- “Começaram dividindo um sorvete, vão terminar dividindo a mesma cama, a vida... ai ai, mal posso esperar”
“Continua sonhando acordada, agora é sério, vou dormir mesmo! Amo você, apesar das suas loucuras.” Enviei.
“Também amo você, cunhadinha.”
Luan.
Subi as escadas devagar e abri a porta do quarto sem fazer barulho. Jade estava vendo tv, e eu pensando que ela já tinha dormido.
- Amor! Demorou pra chegar hoje. – ela reclamou e veio até mim, começando a desabotoar minha camisa e alisando minhas costas.
- Você não ligou. – comentei sério.
- Sentiu falta das minhas ligações? – ela deu uma risadinha.
- Não Jade, posso imaginar que você estivesse infernizando a vida da Ana.
- Ana? – ela se fez de desentendida. – Ah, a empregadinha. Ela leva jeito pro emprego, conclui hoje.
- Não quero você a explorando, entendeu? Ana é só uma ajudante da Claúdia, não é obrigação dela limpar o chão, coisas assim. – eu estava bravo de verdade.
- Luan, o que está fazendo? – ela se fez de ofendida. – Praticamente não discutimos hoje, ai você vem querer falar da empregada! Tem noção disso? Está brigando comigo por causa da empregada! – Jade parecia ter nojo ao dizer essas palavras.
- Ela não é só a empregada, Jade. Ela é mais que isso, você não conhece a história dela, minha mãe a ajudou e...
- Claro, sua mãe! A sogrinha heroína, né? – ironizou. – Agora entendi porque tanta defesa com a loirinha, ela é protegida da sua mãe.
- Estou cansado, Jade, cansado disso tudo. Nosso casamento está indo pro buraco e você nem se esforça pra tentar salvá-lo. Não vale a pena discutir com você, me deixe descansar.
- Quem deveria salvar nosso casamento era você, Luan. – ela gritou. – Eu também estou cansada de você!
A deixei falando sozinha e tirei a roupa, entrando rapidamente no chuveiro e a água abafou os gritos histéricos da Jade lá fora. Meus pais estavam certos, todos estavam, por que me casei com ela? Eu não aguentava mais essa situação se repetindo todos os dias, estava fugindo do controle, fazendo minha vida virar um inferno.
Por outro lado, mais uma vez tive a pele de Ana sobre a minha, o que me causou uma estranha sensação de novo. O jeito como ela reagiu quando a toquei chamou minha atenção. Aliás, tudo nela estava me atraindo.
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