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História Amostra Humana. - Reunidas- Em frente.


Escrita por: Korrah

Notas do Autor


BOA LEITURA!


No capítulo anterior:

"- Ah não, - Tights constrangeu-se. - vocês não sabem...
- Não sei o que?! - e a voz de Kakaroto logo se entonou de maneira impaciente, irritada com o suspense.

Era inusitado como um ambiente podia mudar da água para o vinho em questão de segundos.
A loira respirou fundo e juntou as palmas da mão á frente do rosto, entrelaçando os dedos pouco à pouco enquanto pensava profundamente em como deveria dar aquela notícia.
Bulma ficou atenta, sentindo o estômago revirando. Principalmente porque lembrou-se de que Kakaroto não queria envolver entes queridos em seus problemas. Instintivamente ela repetiu o gesto da irmã, mas mais discretamente esperando o veredito.
Enfim Tights abriu os olhos e observou o homem alienígena pesarosa, enquanto um nó parecia sufocá-lo na garganta.

- Kakaroto. - o chamou tremula, gesticulando as mãos de um jeito afobado. - ...seu irmão faleceu naquele ataque. Eu sinto muito.

A resposta fez o rapaz perder o ar por um segundo, como se uma fenda profunda tivesse se aberto no chão e o feito cair milhares de metros num abismo sem fundo."

Capítulo 36 - Reunidas- Em frente.




As luzes do painel de controle da nave foram se acendendo aos poucos, fazendo o breu do loft desaparecer parcialmente. Automaticamente a temperatura do ambiente aumentou, para se acentuar entre as diferenças climáticas do mundo exterior. Kakaroto enfim se inclinou até a poltrona de piloto, praticamente despencando sobre ela quando esteve perto de se sentar. O assento sacudiu com o abalo, como se seu corpo estivesse pesado demais para que tivesse forças de se manter de pé.
A decisão do rapaz de sair da caverna e voltar para nave foi quase necessária; Desorientado e apático disse aos outros que precisava de espaço.

Devaneou um pouco.
Na nave havia um único acordo de convivência entre o trio: cada um tinha de cumprir com suas obrigações rotineiras. Estar a par da organização do ambiente em que viviam era crucial para a sobrevivência da tripulação e ao menos naquele ponto todos estavam de acordo veemente. Por isso, a primeira coisa que Kakaroto idealizou ao ir até o aeromodelo foi adiantar suas tarefas enquanto Bulma e Vegeta estivessem no acampamento. Afinal, trabalho distrai a mente.

Mas então por que fitar a camada grossa de neve cobrindo o visor lhe pareceu muito mais favorável? Suspirou angustiado.


Longos quinze anos haviam se passado desde que tivera aquele tipo de sensação fúnebre
O peito comprimido o dava a impressão de que seu coração poderia ser esmagado. O estômago tenso, irritável, chegava a dá-lo náuseas enquanto suas vísceras pareciam se embolar continuamente, prendendo-se em nós. O cérebro simplesmente não conseguia processar nenhuma outra informação além da notícia da morte de Raditz, num ciclo repetitivo.

Indiferença. Negação. Raiva.
Parecia coberto por essas emoções negativas, especialmente por esta última.

Por que seu irmão idiota precisou voltar para Vegeta-sei?

Kakaroto odiava profundamente todos os estágios do luto, em sua maioria longos e ás vezes até irrecuperáveis. Converter um sentimento ruim à apenas uma lembrança triste era forrado de processos que só o tempo era capaz de prover.
Mas nessas ocasiões, o tempo nunca parecia passar.



" Onde acha que vão colocar sua urna de cinzas, quando morrer?"


A voz infantil e imatura de Raditz assombrou seus pensamentos de repente, entre sua concepção distorcida de ideias. Que momento terrível para remoer memórias repletas de nostalgia.
O dia em que ouviu aquela pergunta Bardock fazia aniversário de um ano de morte e eles haviam ido até o mausoléu de soldados no palácio, visitá-lo. A mãe os arrastou até aquele lugar sombrio contra suas vontades. O pedestal em que a urna do pai ficava sempre pareceu exagerado.
Diziam que apenas os melhores soldados do reino tinham o privilégio de ocupar uma vaga naquele sepulcro. Com a benção do rei, era um dos maiores símbolos de honra que um homem poderia receber, para serem admirados até depois da morte.

" Minha o quê?", franziu o cenho.
"Sua urna, porra.", e repetiu, enfim fazendo o pequeno Kakaroto compreender o que queria dizer.

O caçula pareceu se comprimir com a ideia.
O primeiro ano foi o mais difícil para eles. Fosse na rotina, quando a mãe servia uma refeição à mais na mesa por hábito ou nas datas comemorativas, onde a ausência do pai era apenas recordada como uma figura dolorosa. Kakaroto não achou que iria conseguir se adaptar a aquelas novas mudanças. Chegou a ficar uma semana sem falar quando encontrou o corpo em estado deplorável do genitor. A imagem do crânio estourado surgia em sua mente mais vezes do que gostaria em seus sonhos.

"Mamãe disse que essa é uma ala sacra", fugiu do assunto, lembrando do que a mãe havia dito antes de saírem de casa para evitar conflitos. "Devemos manter a reverência e evitar palavras de baixo calão aqui."

A morte ainda parecia tão pavorosa.
No entanto, uma risada curta e insultuosa escapou da garganta do primogênito.

"Se não o que?", não conseguiu se conter, mal criado. "Essas pilhas de cinzas vão nos punir?"

Riu sozinho.
Kakaroto engoliu em seco e apenas continuou a fitar o conjunto fino e caro de urnas à frente. Sem força física o suficiente para impor respeito aos outros saiyajins ter um porte sério e elegante era o mínimo que podia fazer para tentar recompensar alguma coisa, mas Raditz jamais entenderia.
Um silêncio costumeiro pairou entre os dois garotos.

Enfim Raditz se apoiou sobre a divisória que separava os vivos dos mortos, perto das criptas.

"Seria legal se a minha ficasse no centro igual a do papai.", sua voz soava estranhamente séria. "Ele se orgulharia de mim do outro lado."

Orgulho. Ali estava um sentimento que ele provavelmente nunca proporcionou ao pai.

"Tento não pensar sobre isso.", Kakaroto respondeu finalmente, num suspiro sincero.

E Raditz sorriu de lado, daquele jeito provocativo que o irritava profundamente.

"Tss... devia pensar.", soltou o ar debochado antes de diminuir o irmão, "Mas talvez o questionamento sensível seja erro meu. Por um momento esqueci que estou falando com um fracassado."
"Como é?!", e qualquer afronta era capaz de deixar o menor irado, se esquecendo completamente de manter sua postura. "Você é o mais velho Raditz, vai morrer primeiro. Vou me certificar de jogar suas cinzas numa vala!", retrucou chamando a atenção de algumas viúvas que passavam perto da sepultura de Bardock, olhando-os cheias de censura pela falta de controle na voz.
"Se poupe, fui eu quem nasceu com mais de quatro dígitos na minha contagem de energia. Sabe que não sou eu que devo me preocupar em morrer antes. Porém... ", o maior decidiu continuar. " se te deixar feliz podemos usar sua urna como peso de porta, para dar algum significado a sua vida."

Na hora a frase dita em forma de afronta soou cruel.
Não era como se Kakaroto ainda se importasse, as circunstâncias à sua volta mudaram sua forma de pensar. Aprendeu a substituir as lágrimas pelo "foda-se" quando foi se tornando adulto. Até era engraçado agora…
E não é que no fim das contas Raditz morreu primeiro? Quem diria, nem ele próprio conseguia acreditar.

"Retire o que disse!", ralhou, ganhando tons de vermelho com a fúria.
"Me obrigue.", o garoto mais velho colocou as mãos atrás das costas, provocativo, antes de dar ás costas ao irmão.

O que o pequeno Kakaroto poderia lhe fazer afinal?
O garoto era fraco, quebrável e assustado; não era à toa que sempre era surrado pelos outros garotos. Contudo, aquele dia o erro de Raditz foi se apoiar apenas naquele argumento, sem expandir seus horizontes para se perguntar o por quê dos garotos surrarem ele.

Em um segundo sentiu uma pancada forte nas costas, o fazendo ir para frente com o impacto. E antes que conseguisse formular o que estava acontecendo, um Kakaroto possesso pulava sobre ele, os fazendo rolar aos socos pelo chão sagrado do mausoléu de soldados. A maneira que a briga começou foi tão repentina... e a meia hora de aula de etiqueta que a mãe havia os dado aquela manhã havia ido por terra. Quase literalmente.

Kakaroto podia apanhar, mas não apanhava sem revidar.
O gosto de sangue saindo do corte próximo ao lábio só fez Raditz constatar isso. Deu uma gargalhada gostosa, deixando o jovem Kakaroto atônito.

Então tinha um irmão mais corajoso do que havia imaginado.

Não demorou até que a mãe aparecesse para os punir.




A neve continuava grossa sobre o visor da nave. A lembrança fez um sorriso bobo se formar na face de Kakaroto. Não imaginava que na perda do irmão seu cérebro o traria aquele dia em que haviam brigado feio à tona. Gostou de ser surpreendido.

Aquela hora a urna de Raditz devia estar na casa da família e não no mausoléu de soldados no reino como bem queria, mas talvez ele fosse gostar.

"Ele se orgulharia de mim do outro lado.", a frase do irmão se repetiu.

O homem esperando por uma aprovação que Raditz foi parecia completamente diferente do que havia morrido por uma causa. Então... se houvesse vida após a morte do outro lado, Kakaroto sabia que Raditz não perguntaria a seu pai se havia o orgulhado. Parece que havia aprendido muita coisa desde que haviam seguido caminhos separados...
Aliás, pensando mais à respeito, era mais a cara dele socar o pai no - improvável - outro mundo pelo abandono precoce.

Isso fez o rapaz dar risada em negação, e logo, substituir a graça por um soluço forrado de tristeza; do tipo que preenchia sua garganta, te fazendo sucumbir á dor como um imbecil nostálgico. Pela primeira e última vez, Kakaroto se permitiu chorar por seu irmão.






E não muito longe, o grupo dentro da caverna estava à volta de uma fogueira.
Era estranho como diante da dor de um terceiro, todos ficavam impotentes.
A conversa antes tão animada desapareceu em questão de minutos e logo o clima agradável variou de claro à fúnebre.

A morte era mesmo dilacerante. Traumática.

- Eu não conhecia Raditz muito bem, só sabia que ele me exterminaria à troco de moedas. Desde o início sempre deixou claro que me detestava. - Bulma recordava sua jornada, mas especificamente, do momento em que Raditz havia surgido nela. - Mas... ainda assim, ele me deixou fugir aquele dia, mesmo que fosse contra tudo o que acreditava.

Se Raditz tivesse a impedido de escapar da nave no dia da fuga ela jamais estaria tendo aquela conversa agora. O grupo ouvia o discurso atentamente.
É verdade que Tights ainda estava desconfortável com a situação que havia trazido à tona, mas sabia que também não poderia mentir e agir como se aquela fatalidade não tivesse acontecido. A cabeça de Kakaroto devia estar uma bagunça aquela hora - ela mal conseguia se imaginar na mesma situação; porém, esconder seria pior.

- Talvez ele não fosse má pessoa no fim. - Chirai comentou, participativa.
- Talvez. - a Briefs caçula deu de ombros. - Ele pode ter cometido inúmeros erros mas definitivamente não era um covarde. Precisa-se ter muita coragem para expôr a verdade e deixar sua vida em segundo plano por isso. - finalizou, reflexiva. - Respeito e admiro essa atitude.

A garota verde acenou em compreensão, a vista dos outros dois companheiros.

A outra terráquea esfregou a nuca, sentindo as energias se esgotando à cada hora... até que seus olhos se perderam no outro saiyajin que estava acompanhado de Bulma.

Por que diabos ele sempre estava calado?

- E você... o conheceu? - Tights indagou prontamente a Vegeta segundos depois da observação.

Este a olhou de rabo de olho.

O que Vegeta deveria dizer sobre Raditz afinal?
O homem era tão insignificante que mal se lembrava de seu rosto!

Teve vontade de se isolar junto de Kakaroto na nave para evitar sociabilização... mas por fim, relaxou os músculos.

- Não o conheci, mas quase o matei certa vez. - foi tudo o que conseguiu lembrar à respeito.

A loira franziu o cenho. Bulma tinha parceiros potencialmente perigosos...
Havia certa negatividade à respeito da fama do príncipe dos saiyajins; ao menos foi que constatou na capital. Imaginá-lo perto da irmã por tanto tempo a deixou transtornada. Foi mesmo uma surpresa perceber que os dois se davam estranhamente bem.

- Essa não é a coisa mais apropriada a se dizer quando alguém está de luto. - e Bulma falou em seriedade, dando força a impressão da loira por acaso.

Apesar de parecer, a censura não veio de forma repreensiva. Era mais como se Vegeta estivesse aprendendo todos os dias coisas novas sobre o manual de convivência social.
Saiyajins e humanos tinham costumes diferentes, era evidente.
Em geral, o príncipe deserdado apenas sabia que seria julgado como insensível para alguns terráqueos se demonstrasse explicitamente que não dava tanta importância à atmosfera enlutada.

- Hmn, tanto faz. - mas respondeu seco do mesmo jeito. - O que realmente me irrita é a situação em que ele foi morto. Emboscado covardemente, como um animal na porra de um abatedouro... - havia um tom nítido de ódio em sua voz. - É como se estivessem nos subestimando. Espero que os desgraçados responsáveis por isso sejam mortos friamente.

O modo rústico do saiyajin demonstrar suas indignações era intimidante constatou Bulma, principalmente ao notar os amigos de sua irmã se encolhendo. Evitava pensar sobre morte, mas ser pega da mesma maneira traiçoeira de Raditz a assustava muito. Visto como tinha certo valor para o império imaginava que a possibilidade se tornaria possível em algum momento. A azulada cruzou os braços, paranoica.

Vegeta por outro lado, aproveitou o momento de silêncio.
Flexionou as costas lentamente, usando as coxas de apoio para os cotovelos enquanto assistia as chamas da fogueira queimarem matéria. Esperava que o período de desacorçoamento de Kakaroto não durasse tanto, afinal, nunca podiam se alocar tempo demais em um planeta. E por coincidência, aquele mesmo instante Tights imaginava que seria melhor se focassem em outros pontos importantes além da morte do irmão de Kakaroto. Ela lamentava, mas não sabia se o tempo que tinham em grupo era escasso. Não poderia desperdiçar um minuto sequer privando seus objetivos.

- ...aonde planejam ir depois daqui? - mudou de assunto repentina, quase rude. - Infelizmente não posso deixar os poréns do ambiente adiarem a delineação de nossas metas e intenções, então não me levem à mal.
 

Ao menos ela e Vegeta eram bem parecidos naquele aspecto.

- Tem razão. - e Bulma acenou compreensiva, se afastando de seu estado mental inquieto após um suspiro.

Daquela vez não podia esperar por Kakaroto...

- Estamos indo para Ludo. - foi direta, evitando delongas.

E para seu espanto, a expressão de Tights e de seus companheiros pareceram se contrair como se ela tivesse acabado de dizer algo absurdo. Enrugou a testa perante as reações.

- Estão loucos?! - Jaco foi o primeiro a indagar, descrente.
- Ir para Ludo é como procurar o buraco da própria cova! - e Chirai acompanhou.

Por um curto período Bulma suspirou angustiada.
Tanto Vegeta quanto Kakaroto haviam a avisado que ir para lá era suicídio então não era como se estivesse diante de uma novidade.

Por que sempre haviam barreiras em seu caminho?

- É, eu sei. - tirou a franja do rosto. - Mas já estamos na rota do destino e estou decidida em seguir em frente.

Em meio aos reflexos de absurdo dos seres à frente, a terráquea de cabelos azuis nem notou a expressão de descontentamento de Tights. Não houve nenhuma premissa misteriosa antes da loira descobrir a motivação por trás do desejo da irmã de ir para aquele lugar.

- Nem pensar. - fez uma negação. - Você não vai ir atrás do papai sozinha, é insano.

Dessa vez estava tão perto…

- Eu não estou indo sozinha, se é o que a preocupa. - Bulma ainda tentou se justificar.
- Teria problemas naquele inferno mesmo se tivesse um exército à seu favor!- a Briefs mais velha rolou os olhos. - Eu a proíbo.

Bulma cerrou as sobrancelhas, sentindo aquela velha sensação de subestimação que a perseguia. Só o fato de estar viva e presente ali eram milagres! As pessoas que conviviam com ela já deveriam estar cientes de que não era fraca e muito menos despreparada. As escolhas de ambiente ainda não a desclassificavam como sobrevivente.
Por isso sentiu a necessidade de dizer:

- Não preciso da sua aprovação. - a voz saiu áspera. - Não sou mais a garota da Terra da qual se lembra Tights, então não tente me controlar.

Sua irmã podia ter bons pontos e motivos para se sentir preocupada, mas pela primeira vez Bulma conseguia dizer com convicção que as coisas não eram como antes.
Foi como quebrar um espelho ilusório.
Havia percorrido um grande trajeto para chegar ali e não estava disposta a desistir agora.

- Eu também mudei. - porém, Tights respondeu á altura rápido. - E é justamente por isso que a proíbo.

Oito horas. Foi o tempo que as duas demoraram para entrar em uma discussão após um ano sem terem notícias uma da outra. Elas se encararam cheias de severidade, como se uma não intimidasse a outra.
Briefs tinham gênio forte, diga-se de passagem.

-Você tem noção da quantidade de absurdos que precisei ouvir sobre este maldito lugar? - prosseguiu irada. - A quantidade de coisas que precisei assistir?!

A loira esfregou o rosto, tendo uma série de péssimas recordações preenchendo sua cabeça.
Bufou irada antes de prosseguir:

- Todos os dias os escravos que tinham sorte conseguiam ser transferidos de Ludo para à capital. Porque eram vendidos em remessa ou porque tinham habilidades especiais demais para serem desperdiçadas com trabalho braçal...- passou a narrar, resumidamente. - Lembro que sempre chegavam raquíticos e sujos, quase cadavéricos. Poucos resistiam ao processo de adaptação no novo planeta.

O relato denso doeu em Bulma, por mais incessante que estivesse em mudar de ideia.
Tights segurou um dos pulsos, olhando-o fixamente. A pior parte ainda estava para vir. Bulma havia descoberto recentemente que os métodos de contenção aplicados nos escravos eram cruéis...

- As marcas das pulseiras eletrônicas recém tiradas nunca se cicatrizavam por completo, deixando marcas permanentes e dolorosas demais para serem vistas. Isso quando deixavam! - tensionou o maxilar, em negação. - Acostumados a serem controlados pelo medo, tinham horror ao mundo novo e desconhecido à sua volta. Nas primeiras semanas agiam como animais irracionais, hostis e assustados. Alguns não conseguiam nem voltar a falar... - fechou o punho, rancorosa. - Não demorou até que eu me desse conta de que seria impossível para mim ver papai outra vez.
- Como pode ter tanta certeza se nem tentou? - e Bulma desviou o olhar, firme em prosseguir.
- Puff... - a loira bufou, fazendo uma negação. - Acredite, ouvi o suficiente á respeito de Ludo.

E quando a loira apontou para Lemo, seu companheiro laranja e calado, ele apenas ergueu a barra da calça de seu macacão para lhes revelar a prótese mecânica no lugar de sua perna esquerda. O fato prontamente calou Bulma, que sempre estava acostumada a lidar com situações que fugiam de seu controle.

- É isso o que acontece quando sai da linha. - Tights rosnou, irritadiça.

A azulada realmente não tinha nada a argumentar que a favorecesse.
Era difícil arrumar argumentos diante de fatos. Abaixou a cabeça e cerrou as sobrancelhas, enquanto Lemo ajeitava a peça de roupa. Vegeta fitou a companheira de longe, vendo-a numa rara situação onde não podia dizer nada para se defender.
Aonde estava toda a sua determinação? A primeira prova sólida de que era uma maluca suicida eram suficientes para desanimá-la?

Tights respirou profundamente, finalmente acabando com o silencio momentâneo.

- Estamos indo para a Terra. - revelou, ciente de que a irmã estava ouvindo cada palavra mesmo não a fitando. - Agora é apenas uma colônia em terraformação para o império então não existem aliados próximos cobrindo as redondezas, o que torna o acesso à atmosfera fácil.
 

O que a Briefs mais velha queria dizer já estava nítido para Bulma, mas ela completou mesmo assim:

- Descobrir o que aconteceu com a nossa mãe e nossos amigos é mais viável e é nisso que vou me apoiar. Eu amo o papai e faria qualquer coisa para tê-lo ao meu lado, mas não existem chances otimistas de que consiga entrar e sair de Ludo viva. Quero que venha comigo. - foi direta.

Ludo ainda era uma prioridade... mas quando a oportunidade de voltar para casa caiu sobre seu colo Bulma se sentiu desestabilizada. Em algum momento ela tinha esperanças de que voltaria para a Terra, porém, definitivamente não esperava que a chance viria de forma tão rápida.

Seria aquela a brecha única que estava esperando para ter sua vida de volta?
Ao mesmo tempo em que sabotava seus ideais, doía pensar que tomar aquela decisão significava dizer adeus para seu pai.

Engoliu em seco um instante. E também para Vegeta e Kakaroto.

E este primeiro citado pareceu interessado em descobrir o que ela diria. Talvez simplesmente para reafirmar mais uma vez que ela era uma cadela individualista.
No entanto:

-... preciso construir minha câmara primeiro. - foi tudo o que a azulada conseguiu dizer, fugindo de uma resposta clara, de um Vegeta provocativo e da pressão de várias expectativas. Isso desagradou Tights.

Ao menos ela conseguiu ser convincente na fala.

- Como assim? O que te faz pensar que construir uma câmara seja necessário agora?! - a loira insistiu.
- Negócios. - Bulma concluiu de maneira pouco explicativa a irmã e aos seus amigos, engolindo em seco.

Desleal de sua parte ou não, ela e Vegeta tinham um trato. Ela o deixava forte e ele ia para Ludo sem pestanejar. Ele estava fazendo sua parte bem, então era hora dela mostrar que estava mesmo retribuindo o que havia combinado. Não imaginou que se sentiria tão dividida com seus objetivos de um segundo para o outro, mas independente de como ou com quem rumaria uma jornada, a construção da câmara era crucial para valorizar sua palavra.
Também tinha honra, e queria deixar isso claro.

- É importante para mim reservar um tempo para terminar isso antes de... - segurou as próprias mãos, de olho na irmã. - estar pronta para discutir sobre um destino com clareza.

"Só assim terei uma resposta sólida para dá-la sobre ir ou ficar sem magoá-la.", e pensou camufladamente abaixo de todas as ideias, persistente.
A resposta não agradou a loira, mas esta apenas suspirou longamente e esticou as pernas em descontentamento.

- Odeio quando pensamos por direções opostas.- foi sincera. - Mas... sé é o que acha que deve fazer agora não vou impedi-la. O que podemos fazer para ajudar?

Prestatividade. Aí estava uma qualidade que havia de sobra na irmã de Bulma, mesmo na adversidade. Um certo alívio preencheu o coração da azulada, a deixando menos pressionada.

- Precisamos fundir o metal que coletamos e soldar as peças da câmara na nave o mais rápido possível. - comentou, racional - Pensando nisso, imagino que nossa estadia pode ser mais breve do que o esperado.

A construção da máquina gravitacional lhe custaria parte do tempo precioso que teria com a irmã; mas aquele devia ser o preço a ser pago por cumprir sua palavra.
Mas ao contrário do que esperava, a solução surgiu imediatamente:

- Lemo e Chirai trabalham bem com metal. A fundição pode ser iniciada aqui quando quiser. - Tights disse.

A informação ateu a atenção de Bulma, que prontamente passou a olhar ao redor da caverna.

- Mas... eu não estou vendo nenhum equipamento.
- Temos o que precisamos guardado em cápsulas, me certifiquei de roubar muitos modelos originais trazidos da Terra enquanto vivi na capital. - a loira explicou. - No mais, Lemo dá conta de derreter o aço e cuidar da parte difícil. Ele não é um makyan à toa.

Kakaroto havia falado sobre os Makyan certa vez.
A Briefs caçula se impressionou com a temperatura do planeta deles. Nascidos para serem compatíveis ao calor, eram uma espécie do tipo intrigante.
Fitou Lemo um instante, surpresa. Um rio de lava devia ser tranquilo como um lago raso para ele.

- Sei que Chirai dará conta de cuidar dos últimos detalhes da fundição.
- Não espere por erros. - Jaco deu profundidade a própria frase, se fazendo presente.
-Acredite, antes de conhecê-la eu achava que a a única pessoa tão obstinada a atingir a perfeição de suas criações fosse o papai! - Tights confirmou.

"Vocês agem como se nunca tivessem visto alguém perfeccionista antes.", Bulma teve a impressão de ouvir a moça esverdeada dizendo algo assim, trazendo leveza outra vez ao ambiente.
E diga-se de passagem, o rumo de acontecimentos pareceu agradar muito a Vegeta.

- O trabalho começa assim que pedir. - para finalizar, sua irmã ressaltou.

Bulma respirou profundamente, admirada com a fácil e rara resolução de suas questões. Nem parecia ser verdade.

- Não seria um incomodo para vocês trabalharem nisso? - mas antes se preocupou mais com a opinião dos companheiros de Tights.

De maneira nenhuma Bulma queria fazê-los pensar que por ser irmã de Tights eles deviam assumir obrigações por ela. Felizmente, não pareceu um problema.

- Nunca tem nada para fazer nesse lugar entediante, estou mais feliz em ajudar do que imagina. - Chirai deu ênfase, fazendo a azulada sorrir.

Ninguém pareceu contrariado.

- Ótimo, então podemos começar as preparações amanhã.
- Assim que trazer as plantas, posso ser útil ao ajudar na revisão final. - Tights se ofereceu.
- Ah, eu ia sugerir isso agora mesmo. - e Bulma se animou, enfim sincronizando seus pensamentos com os da irmã.

Eram mulheres com personalidades muito diferentes, mas ás vezes a maneira como pareciam se entender era quase assustadora.

- Bem... - Lemo se ergueu, afim de dispensar os minutos entediantes de preparativos para o dia seguinte. - Se é assim é melhor começar a desencapsular o equipamento.
- Vou ajudá-lo. - e Chirai se prontificou.

As coisas pareciam certas.
Ao menos uma parte de seu planejamento estava em andamento, pensou Bulma orgulhosa. Gostou da dinâmica do grupo de Tights, a maioria deles eram solícitos e afáveis. Invejou-a um segundo, ciente de que o sistema do trio a qual pertencia funcionava mas quase como se não tivesse pé ou cabeça. É verdade que saiyajins não eram a espécie mais adaptável do universo.
Isso ficou nítido quando Vegeta também os deu as costas, como se já tivesse ouvido o que queria.

- Obrigada. - olhou para a irmã, como se a mesma tivesse tirado um peso de suas costas. - Não faz ideia de como a sua ajuda facilita o caminho.
- Estou aqui para isso. - a loira assentiu. - Mas…

Até então as coisas pareciam parcialmente resolvidas.

- Não pense que isso deixa nossa conversa sobre Ludo em segundo plano.

A firmeza na voz de Tights arrepiou Bulma.

- ... está certo. - e esta concordou sem objeções.

Porque apesar de tudo, a terráquea de cabelos azuis também não queria fingir por poucos dias que Ludo era um assunto distante de sua realidade.
A noite pareceu longa.



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O universo era como uma grande fazenda equipada com tudo o que se podia imaginar. Elementos dos mais simples aos mais raros, recursos naturais de todos os tipos e inúmeras formas de vida. No fim das contas, os planetas espalhados pelo cosmos eram como celeiros espaçosos que guardavam esses mantimentos valiosos. O regime e cronograma dessas coisas apenas badalava de forma natural, em seu ritmo, fazendo a existência parecer um privilégio simples e gratuito.
Mas não era.
Existir era como um maldito tiro no escuro.
Você podia nascer em um planeta civilizado com tecnologia avançada ou em uma tribo primitiva aonde haviam acabado de descobrir o fogo. Ou então nascia banhado à ouro sendo parte da linha de sucessão da realeza ou em extrema pobreza sendo o filho rejeitado que sobreviveu a um aborto. Ás vezes simplesmente nascia sem nada de especial, só para ter uma posição secundária e medíocre no mundo.

Freeza era o desgraçado que havia nascido com todas as glórias e Coola era o fodido que apenas observava aquelas glórias de longe. Por isso, se um dia o universo pudesse escolher alguém para administrar suas terras, essa pessoa seria Freeza.
Ele teve sorte de ser alguém iluminado, para seu ódio.


Coola respirou profundamente, fixando os olhos no irmão de longe enquanto sentado nos assentos da sala de reunião. Não havia nenhum motivo para estar ali, apenas preso em uma atividade camuflada da qual podia chamar de luxo ao fingir ter interesses políticos sobre a capital.
Zarbon ampliou o holograma sobre a mesa, focando no ponto que os interessava:

- O quadrante L ao leste da capital tem potencial para se tornar um dos grandes pontos do império. Atualmente nossos olheiros dizem que o lugar vem servindo de passagem para rebeldes e desordeiros, mas a maioria dos planetas está em um estado de evolução e existe uma infinidade de recursos a serem explorados pelos domínios. - explicou.- Não parecem áreas desperdiçáveis.
- Por que devo me interessar em colonizar planetas sem vida inteligente e repleto de rebeldes? - Freeza desdenhou, com uma das mãos apoiadas no queixo.
- Permita-me apresentá-lo a situação de uma maneira ampla, meu lorde. - e o belo ser insistiu, como havia ensaiado com Coola semanas antes.

O acordo que havia feito com o irmão do imperador estava indo melhor do que Zarbon esperava. O changelin certamente não possuía os mesmos dotes energéticos de Freeza, mas possuía uma mente tão brilhante e ambiciosa quanto. Se não mais...

- Ao redor do quadrante L existe uma série de planetas que sobrevivem da escravidão. Se fizéssemos colônias do império entre eles, o mercado escravo aumentaria gradativamente e atrairia outros magnatas interestelares, aumentando ainda mais a riqueza dos cofres imperiais. - sorriu.

Freeza suspirou longamente, mas Zarbon se sentiu aliviado quando ele ajeitou sua postura sobre sua cadeira flutuante, como se estivesse enfim o ouvindo.

- E no mais, se colonizássemos de vez estas áreas, a movimentação de rebeldes consequentemente se reduziria perto das terras de escravos. O quadrante L seria como uma segunda capital, mas maior e melhor.

A proposta era atrativa, mas Freeza não era do tipo que se impressionava com facilidade.

- O que está me sugerindo é que um plano desses custaria prismas, exército e tempo. Como pode garantir o sucesso de uma colonização? Um erro e tudo estará perdido.
- Não se o senhor estiver presente durante esse processo.

Freeza o fitou cheio de questões, como quem esperava um argumento válido. Ninguém jamais sugeria para o lagarto sair de seu pedestal a não ser que fosse por vontade própria... ninguém exceto uma pessoa. O changelin nem precisou olhar através de Zarbon para descobrir que havia um dedo de Coola ali.

- Sua forte presença evitaria rebeldes meu lorde, o principal e único empecilho para o sucesso da missão. A construção da primeira cidade não lhe custaria mais que seis meses de espera e para seu agrado, as áreas de nosso interesse no planeta tem um clima tropical. O senhor mesmo me disse que não suportava o inverno infernal da capital. Seria esta a oportunidade de sair em viagem que esperava?

Sim, era tudo o que Freeza queria ultimamente.
Mas... ele ainda não parecia convencido. Isso fez Zarbon engolir em seco discretamente.
Por ora, o lagarto deteve-se em apenas dizer:

- Vou refletir sobre isso em meus aposentos. Dispensado.
- Obrigado meu lorde. - Zarbon se reverenciou.

Após desligar o painel holográfico da mesa, o general se preparou para se retirar á companhia de Coola, mas este foi detido:

- Por que não fica mais um pouco, meu irmão? - o tirado soou a frase numa voz atipicamente simpática. - Faz tempo que não passamos um momento juntos.

Zarbon apenas continuou seu caminho sozinho, sentindo nós se formando em seu estômago. Coola balançou sua calda com leveza e sorriu de maneira ensaiada:

- Nada me agraciaria mais.

Tudo estava dando certo.


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A fundição de minério no planeta de gelo foi saindo com o passar dos dias, então logo, as primeiras pilhas de aço iam se amontoando pelos cantos da caverna. Como esperado, Lemo e Chirai fizeram um ótimo trabalho em equipe. Aproveitaram muito a pureza do aço que haviam extraído e o nível de excelência deles deixava Bulma boquiaberta.

Aquela manhã em especial, Lemo despejava o aço derretido na forma longa que havia moldado para o projeto mais uma vez. A placa de metal precisava ter um formato curvilíneo e alto antes de estar pronta para ser soldada na câmara, como instruído na planta da irmã de Tights. Assim que fosse batido mais vezes, estaria perfeito para se unir as placas finalizadas.

Pois bem, o ser alaranjado estava bem concentrado no próprio trabalho; No entanto, era impossível ignorar os olhares nada discretos daquela garota de cabelos azuis sobre ele. A fitou de soslaio um instante, se perguntando se havia algo de errado com ele.

Bulma continuava parada há alguns metros, fixando a vista em todos os movimentos dele. Cerrou as sobrancelhas, a achando estranha. Lemo nunca desconfiaria que aquelas centenas de olhares se tratavam de admiração e espanto com as capacidades biológicas dele.
Ele pegava aço derretido com as mãos como se fosse apenas uma massa corpulenta!

- Uau... - a moça se impressionou em voz baixa, talvez pela décima vez.

Ela adorava datar informações sobre espécies interestelares o máximo que podia.
Um dia gostaria de voltar no tempo apenas para afirmar com clareza que humanos nunca estiveram sozinhos. O universo era tão impressionante!

- Vai ficar aí parada como uma estaca? Está atrapalhando a passagem...

A forma como Vegeta soava rude ás vezes dava nervos em Bulma.
Ela rolou os olhos e o encarou cheia de desdem. Porém, não era como se ele estivesse sendo grosseiro de maneira gratuita. Com a instalação dos equipamentos de fundição, os trajetos para atravessar a caverna haviam se reduzido bruscamente.

- Há espaço o suficiente para nós dois aqui. - mas ela não se deixou abater, rapidamente suavizando as expressões. - Dá pra acreditar que em breve vou estar configurando o sistema gravitacional na câmara?

A forma ansiosa da qual ela narrava era acolhedora. Isso também fez o saiyajin suavizar sua expressão fechada, acostumado com todos os trejeitos irritavelmente adoráveis da moça.
Se ao menos pudesse sentir sua energia mais uma vez...

- Não tenha pressa nessa parte, não quero morrer esmagado no primeiro teste. - ressaltou, ciente de que alguém teria de se responsabilizar em testar a máquina e provar se seria sucedida.
- Ah, não é para tanto! Como a câmara vai se parecer com um pressurizador vou me certificar de não ultrapassar nenhum limite físico durante a manipulação da gravidade. - explicou, defensiva.
- Tsc... - e ele estalou a língua em resposta.

Enquanto ela continuava a argumentar, o assegurando de que ia sair vivo do teste, Vegeta se concentrou no cabelo dela. A maneira como perpassou os dedos na lateral dos fios azuis para capturar alguma coisa foi natural, quase inconsciente tanto para ele tanto para a terráquea.
E o estranho gesto atraiu a atenção de Tights, não muito longe.

- O que é? - Bulma indagou, olhando para a palma da mão fechada do homem. - O que achou no meu cabelo?
- Fuligem. - ele revelou, esmigalhando o pequeno fragmento de cinzas até que desaparecesse. - Não devia respirar esse ar o dia todo, tem pulmões fracos.
- Por que está fingindo que se importa comigo? - e franziu as sobrancelhas.
- Porque Kakaroto não está aqui agora para te dizer essas besteiras.

Kakaroto havia saído da nave poucas vezes desde que descobrira que o irmão estava morto. Os dias não o trouxeram nenhuma iluminação ou conforto, mais parecia que ele preferia continuar se isolando por enquanto. A única coisa que ele havia dito em sua última aparição era que prepararia a sala de treinos para a montagem da câmara gravitacional. Provavelmente era a forma dele de mostrar utilidade mesmo na invalidez, como fora ensinado a viver nos moldes tradicionais saiyajins.
Bulma suspirou com a verdade. Quase sempre o rapaz estava a orientando e a lembrando de fazer suas obrigações básicas para que não se afundasse apenas em planejamentos e cálculos.
Kakaroto cuidava dela... não imaginou que Vegeta perceberia isso.
Estava sentindo falta dele...

- Tá. - deu de ombros ao príncipe deserdado. - Também não precisa dizer essas coisas como se eu fosse um ventríloquo.
- Se eu pudesse te controlar já estaríamos em Ludo. - e a cortou depressa. - Não pense que essa fumaça é atrativa como os tais cigarros terráqueos que gosta. Acorde!

A exclamação surgiu sobre a cabeça da azulada.
Então ele não se lembrava do rosto de Raditz mas ainda se lembrava de tê-la ouvido falar sobre os cigarros que roubava de seu pai, na Terra?
Estranho Vegeta. Mas antes que pudesse questioná-lo ele já havia se distanciado o bastante de sua figura. Abaixou os ombros, suspirando alto.

Por que tinha a impressão de que ele sabia mais sobre ela do que ela sabia sobre ele?
Homens saiyajins eram difíceis de decifrar. Chutou uma pedra solta do chão rochoso da caverna e andou até perto da bancada com aço recém-fundido, onde Chirai estava.

- Sinceramente, estou muito feliz por encontrar outras garotas. - Bulma ajeitou a franja, assim que chegou perto da pequena mulher esverdeada. - Tem dias que a exibição de testosterona à minha volta me deixa furiosa.
- Ah, sei bem do que está falando. Eles são tão insensíveis… - Chirai rolou os olhos. -Jaco e Lemo são como duas rochas ásperas. Antes de Tights aparecer me sentia completamente solitária.
- Então você está seguindo viagem com eles faz tempo? - e sentiu a liberdade de perguntar, já que ela havia tocado no ponto.
- Os conheci quase ao mesmo tempo, na verdade. Conheci Lemo no comboio de transporte aonde fomos transferidos para a capital. Jaco era um dos supervisores do setor da central. Tights só apareceu em nossas vidas meses depois.

Transferência.
Se ela havia encontrado Lemo em um comboio de transporte, era porque ela era escravizada em outro planeta além de Ludo. Teve bom senso de não entrar em detalhes, sabia que não seriam memórias gloriosas para Chirai.

- Bem... tem alguma coisa que eu posso fazer para te ajudar nisso? - sugeriu, cansada de ficar de mãos abanando.
- Estou pesando e separando o aço. Você foi bem específica quanto ao peso que cada placa de metal sustentando a câmara deveria ter, então estou cuidando disso antes da moldagem.
- Posso separar por você, para acelerar o processo.
- Não precisa, mas se quer tanto.

As mulheres conversaram animadamente por um período de tempo.
A maneira cuidadosa da qual Chirai se preocupava com os processos de cada coisa realmente lembravam algumas manias que o pai de Bulma tinha. Era como se nenhum detalhe passasse despercebido por seus olhos.
Sorriu com a lembrança, atipicamente sentindo-se acomodada, como se estivesse aonde precisava estar.





Vegeta estava parado, analisando as placas terminadas minuciosamente.
Do jeito fixo que olhava até fazia parecer que eram valiosas iguais a ouro, constatou a irmã de Bulma ao se aproximar dele. O saiyajin definitivamente não era o melhor ajudante que tinham em mãos, mas ao menos se deu ao trabalho de carregar as placas mais pesadas e servir de cobaia para o experimento. Era nítido que a tal câmara era de seu interesse.

Tights depositou o caixote de ferramentas ao lado do homem.

- As coisas estão saindo como planejava? - perguntou, mais para evitar o silencio constrangedor.
- Não exatamente.

Vegeta não contava com a aparição inesperada daquela mulher na jornada, mas admitia que veio em boa hora. O encontro superou suas expectativas, contudo não se deu ao trabalho de explicar. Não era da conta dela.

- Bem, espero que ao menos estejam satisfatórias. - e a loira coçou a nuca.

Silêncio.
Ele era tão calado. Tights não fazia ideia de como iniciar um diálogo com aquela figura de personalidade tão enigmática.
No fim das contas apenas se retirou sem premissas, exatamente como havia chegado.


- Então você está aí? - Tights se prontificou atrás de Bulma quase em seguida, chamando sua atenção. - Estava te procurando.

Tights estava segurando as plantas da câmara gravitacional, com uma das sobrancelhas erguidas. É mesmo... até então Bulma estava de mãos abanando porque havia combinado com a irmã que revisariam o sistema de gravidade mais uma vez.

- Merda, eu esqueci completamente.- soltou, levemente constrangida. A ideia fora dela desde o início. - Chirai, você se importa de cuidar do meu resto sozinha? Sinto muito...
- Fica tranquila. - mas Chirai deu de ombros. - Garotas precisam se ajudar, certo?
- É. - e Bulma acenou, confidente. - É o que eu acho. Muito obrigada.

E após acenar se retirou com a irmã, praticamente sendo arrastada para debaixo da lona do acampamento na caverna, para que pudessem conversar mais sem serem interrompidas.
Vegeta só seguiu seu rumo adiante, cansado de ficar parado.




Os detalhes finais para a construção da câmara eram revisados por Tights. Não era como se ela duvidasse da capacidade mecânica de Bulma, mas duas mentes pensavam melhor do que uma e uma segunda opinião de quem entendia sobre o assunto só traria melhorias ao sistema gravitacional em criação. Mas por ora, apesar da concentração investida naquela planta bem desenhada, as irmãs também aproveitaram o tempo a sós para trocar suas confidencialidades com mais tranquilidade.

- Nós nunca tínhamos brigado desse jeito. - Bulma relembrava a briga recente que havia tido com Kakaroto antes de reencontrar Tights, com os braços apoiados na mesa de centro enquanto a loira traçava linhas. - Fiquei em choque quando ele levantou a voz para mim.
- Pudera... - a irmã fez uma negação divertida. - Por que ele deveria confiar numa maluca querendo seguir um sinal desconhecido?

Bulma sorriu de lado.

- Não o julgo pela atitude. De toda forma, seus amigos também parecem ter motivações semelhantes à seu respeito para discutir.
- É verdade que eu sou bem difícil.
- Nem fale. - rolou os olhos. - Lembra quando fomos sozinhas para o interior e você brigou com Yamcha a viagem inteira para ficar do lado da janela?
- Ei, eu havia avisado que iria na janela dois dias antes! - a loira ainda tentou se justificar. - Aquele idiota ficou com raiva à toa.

Elas riram em sincronia com a recordação.
Aquela viagem de avião foi tão longa e exaustiva, e no presente parecia tão cômica.

Por um raro instante Bulma se perdeu na própria análise.

Por que tinha a impressão de que ela e a irmã haviam embarcado em uma viagem longa separadamente e agora se reencontrado?
A galáxia em que estavam era tão diferente da que a que haviam se originado e ainda assim pouca coisa havia mudado entre elas.

No fim das contas a azulada ainda não sabia dizer se a impressão era boa ou angustiante. Ao menos Kakaroto esteve certo sobre uma coisa: falsas esperanças nunca fariam as coisas a serem como antes. Suspirou e segurou os próprios joelhos.

- ... não sei se foi uma boa ideia ter vindo até aqui. - confessou, fazendo Tights arquear uma sobrancelha.
- Uau, então você atuou bem pra cassete no nosso reencontro.
- Não foi atuação, senti mesmo sua falta e teria ficado arrasada se não tivesse encontrado ninguém neste planeta... mas ao mesmo tempo, essa vozinha insistente no fundo da minha consciência parece tão assustada com a velocidade de acontecimentos. Digo, minha relação com meus companheiros ficou por um fio graças a minha teimosia, você está viva e vivendo em grupo, o irmão de Kakaroto está morto...

"Está me fazendo desistir de papai." , pensou sem coragem de dizer em voz alta.

- E agora estamos terminando os detalhes finais de um projeto meu. - suspirou. - Entende o que quero dizer?
- ... sinceramente, não.
- Esse reencontro desencadeou tantos segmentos com consequências. Alguns bons, outros ruins. - tentou explicar com suas palavras. - Sempre tive medo de estar seguindo minha jornada lentamente, mas agora, estou com medo de estar indo rápido demais.

Antes Bulma estava tão animada com as linhas iniciais do plano.
Finalmente as coisas estavam se ajeitando. Mas…

- E se der tudo errado? - se questionou o que sempre evitava.

Todos diziam isso o tempo todo, finalmente estava começando a acreditar.
As coisas davam errado com frequência.

As vezes Bulma Briefs se via tentando ser como uma garota forte para fugir de seus próprios medos, quando na verdade sempre estava insegura com o que poderia encontrar à frente.
Era como uma fraude...

- Cala boca. - e Tights a cortou, como se tivesse a dado um soco com a grosseria.

Se entreolharam em silêncio até a loira decidir prosseguir.

- Sabe o que papai diria numa hora dessas? Dois Briefs…
- ... pensam melhor do que um. - e a azulada completou. - Parece uma frase prepotente. - e sorriu amargurada, coçando o ombro. - Ele dizia isso o tempo todo.
- Dizia. Principalmente quando brigávamos e ficávamos dias sem nos falar. - a mulher nasalou. - Na época eu não fazia questão de procurar significados por trás disso, mas papai sabia que ao longo de nossas vidas nos depararíamos com muitos desafios. Ele queria dizer que independente dos problemas, contanto que estivéssemos unidas, nada nunca seria longo demais para não ser superado. - disse, serena. - É por isso que eu nunca desisti de te encontrar.

Ela também nunca havia desistido de sua irmã. Sorriu amena.

-...e também é por isso que me sinto tão relutante sobre ver você indo para Ludo. - e revelou, deixando Bulma surpresa.

Não imaginou que Tights faria um esforço para enxergar a ida à Ludo de uma maneira flexível. Ainda assim, a tarefa parecia continuar difícil para ela.

- Ainda que eu lute contra a sua ideia estúpida... sinto que se fizermos isso juntas, há uma chance de sucesso.

Bulma suspirou profundamente. Era tudo o que ela precisava ouvir.
Ela realmente queria acreditar nisso... mas foi impossível.

- Eu aprecio seu esforço para entender, por mais que minha ida á Ludo não faça sentido. Mas você não parece confiante em suas próprias palavras…
- Sei que não vou conseguir te impedir de ir te apoiando ou não. Talvez a coisa certa a se fazer seja mesmo te ajudar a entrar naquele inferno... mas eu realmente não quero que as coisas sejam assim.

Bulma cerrou as sobrancelhas, quase como se sentisse muito por pensamento. Desde o início estava evitando prometer coisas que não podia cumprir e o descontentamento da irmã a feria. O caminho era incerto e isso preocupava Tights, ainda disposta a convencê-la a seguir viagem consigo.

Contudo, por ora, a loira suspirou alto e apenas voltou a riscar a planta:

- De toda forma... estava me divertindo mais quando estava falando de seus companheiros. - mudou de assunto.- E então, o que mais tem a dizer sobre eles?

Logo, Bulma supôs que seria melhor deixar suas preocupações em pendente outra vez, até que o tempo chegasse à seu limite.

- Kakaroto é... consciente. - franziu o cenho como se não tivesse pensado em descrição melhor, perdendo-se no assunto. - É comunicativo, sensível e sincero sobre como se sente, inteligente e curioso; e para o nível de um saiyajin definitivamente sabe como tratar uma garota bem.
- Hmn, então vocês são próximos?
- Eu diria que sim. Quer dizer, ao menos é possível dialogar com ele.- a moça devaneou. - Apesar de apreciar Vegeta ás vezes conversar com ele é um desafio.

Enfim havia uma brecha para falar do tal Vegeta.
Tights decidiu não perder a oportunidade.

- Engraçado citar isso. - a Briefs mais velha a olhou de soslaio. - O que você tem com o príncipe deserdado dos saiyajins afinal?

A suavidade da expressão de Bulma desapareceu rápido, a fazendo fitar a irmã cheia de interrogações.

- O que?

A moça riu nasaladamente, achando graça da expressão inocente. É verdade que a irmã caçula era rápida ao resolver cálculos, mas lerda para desvendar as situações "humanas" que a rodeavam.

- Desde que chegaram ele não para de rondar você.- disse como se fosse óbvio. - O que rola quando estão sozinhos?

A observação repentina deixou Bulma atônita.
Quando ele rondava ela afinal? Estava sempre a agredindo com palavras como um bruto...

Mas antes que a azulada tivesse chances de responder alguma coisa Jaco apareceu para atrapalhá-las, para a felicidade de Bulma e a tristeza de Tights, cada dia mais desconfiada com as intenções daquele saiyajin de sangue azul.

- Rápido, venha ver as formas das peças internas que Lemo está moldando. - Jaco apressava Bulma, ainda atrapalhada com as perguntas estranhas da irmã. - Se ele cometer algum erro agora Chirai provavelmente vai empalá-lo.
- Certo, certo…

Tights bufou com a intromissão, vendo-os se afastar.
Ela ainda iria descobrir mais sobre o trio do qual a irmã caçula estava, ela querendo ou não. Como havia admitido, Ludo era possível, mas ainda não era o caminho.




(...)



Kakaroto não sentia sua mente neblinosa.
Notou isso repentinamente aquela noite, abaixo do solitário loft.

Estava ocupado aqueles dias, que pareceram tão longos. A sala de treinos estava pronta para receber instalação, como disse a Bulma que faria. Havia até se dado ao trabalho de desmontar o painel de comando para facilitar o serviço da azulada. Ela definitivamente iria gostar.
Assim que os amigos da irmã de Bulma trouxessem o equipamento da câmara, uma nova fase se iniciaria na nave.

Suspirou, entediado. A gata felpuda parecia confortável em dormir em sua barriga, como se não o temesse. Os animais domésticos da Terra tinham comportamentos estranhos, mas seria mentira se não dissesse que Pixel foi uma boa companhia para ele durante seu tormento pessoal. Ela não falava, mas parecia sempre saber quando se fazer presente para distraí-lo da tristeza.
Acariciou-lhe no topo da cabeça.

- Gata folgada... - resmungou num grunhido.

O termostato indicava que o clima do lado de fora continuava frio, mas Kakaroto teve a impressão de que estava mais ameno, bem distante das tempestades de neve dos dias anteriores. Lhe parecia uma boa oportunidade para sair do casulo e tomar ar fresco.
Levantou-se de seu sofá/cama, cansado de ficar deitado. A ação repentina afugentou a gata, que correu alguns passos do sofá, o observando cheia de desconfiança.
O rapaz se agasalhou com o casacão cinza que havia na nave, pronto para dar uma volta ao redor da caverna. Estava precisando esticar as pernas, não encontrava motivos para treinar há um tempo e seria bom se movimentar.

Apertou o botão para descer a rampa, vendo-a afastando e marcando a neve ao redor.
No entanto, quando deu o primeiro passo para fora, as vozes vindo da entrada da caverna chamaram sua atenção o parando.

- Ah, sinto falta de ser amado... - murmurou Jaco, após uma sequência de risos.

Eles estavam se aquecendo na fogueira como de rotina, de certo após o jantar.
O ambiente estava agradável, supôs Kakaroto.
Tights continuou a dar corda ao assunto.

- Ser amado é mesmo tudo de bom, mas amar é uma loucura! - a loira se perdeu um instante no passado, cruzando as pernas em lótus enquanto sorria abobada. - Você faz planos em conjunto para um futuro incerto, fica disposto a abandonar os velhos hábitos para agradar, se torna mais esperançoso... e se sente tão estúpido à ponto de se perguntar se está demente!

Kakaroto achou a pauta de assunto um tanto peculiar.
Amor? Geralmente as conversas que tinha em grupo envolviam planos que traçavam maneiras seguras de sobreviver. Qual era a finalidade daquilo?

- A cultura humana é estranha. - foi tudo o que Jaco conseguiu responder.

"De fato.", Kakaroto completou por pensamento.

- Humanos tem comportamentos estranhos. - e Tights deu ênfase. - Mas uma das coisas que eu mais amava sobre a Terra é que lá você podia ser quem quiser. - finalizou, sorrindo de maneira nostálgica.
- Parece uma bagunça interessante. - Chirai riu, sem conseguir acreditar.
- É... - a loira sorriu, dando de ombros. - Quer dizer, essa ideologia não funcionava cem porcento na prática, mas tentávamos fazer o possível para dar certo.
- É verdade. - Bulma concordou.

A maneira animada da qual a conversa fluía incomodou Kakaroto de alguma forma. Principalmente porque - com exceção de Vegeta -, as energias de todos os presentes na roda pareciam tranquilas e envolvidas.

Sentou-se sobre a rampa.
Ouvir conversas de longe não era de seu feito, mas achou que seria melhor se continuasse ali. Era ele quem havia tido uma perda recente e se sentido mal, então sabia que sua presença poderia desequilibrar aquela doce tranquilidade. Afinal, quando olhassem para ele automaticamente pensariam: "Não toquem sobre aquele assunto…"
Ainda não estava preparado para receber olhares penalizados.


- Parece bem diferente de onde venho. - Lemo entrou na discussão de repente.

Isso atraiu Bulma, que esperou pela narrativa atenta.
Como sempre, estava interessada sobre as curiosidades das outras espécies à rodeando.

- Não existe exatamente a escolha de um parceiro. - tentou explicar de um jeito que os fizesse entender. - Quando as luas de meu planeta se alinham nossa espécie libera uma quantidade enorme de feromônio de nossos corpos e se é iniciado a época de reprodução.
- Em outras palavras: se é iniciado uma grande orgia. - e Tights riu nasalada, acenando maliciosa.
- Não, mas... sim! - e o ser riu de volta. - Minha ideia de família é bem diferente da qual vocês disseram. Atingimos a idade adulta rápido, então não precisamos de pai e mãe.

Bulma riu à companhia dos outros. Havia tanta diversidade no universo, sua realidade terráquea parecia tão distante daqueles relatos!

Pareceu o momento ideal para saber mais sobre diferenças culturais.
Principalmente quando Tights olhou para Vegeta e o indagou:

- O que a sua cultura diz sobre amor?

Isso atingiu Bulma como um raio, agonizando por dentro. Principalmente porque em seguida a loira olhou para ela de soslaio e sorriu de canto.
"O que rola quando estão sozinhos?", a pergunta ousada da irmã mais velha ecoou mais uma vez na mente da azulada, como se de fato acontecesse alguma coisa extremamente pessoal entre ela e Vegeta. Passou uma das mãos discretamente pelo rosto.

Como Tights conseguia ser descarada daquele jeito?!
Era óbvio que aquele diálogo inteiro era como uma preparação de terreno para que ela tentasse ler Vegeta e descobrir mais sobre ele. No que estava pensando?!

E enquanto isso, o príncipe fechava a expressão.
Não era como se fosse o integrante mais participativo da roda, mas estava prestando atenção até certo ponto. Não podia treinar, não podia sair da caverna... tudo o que tinha no momento era o fogo, para aquecê-lo. A maneira como a irmã de Bulma sempre tentava incluí-lo em suas conversas era irritante, certamente teria a matado no passado.
A curiosidade irritante dos Briefs devia ser passada através de genética...

- Saiyajins valorizam a concepção. - mas revelou, sem nada mais interessante para fazer, surpreendendo Bulma. - Repassar sua genética é visto como uma necessidade biológica, então a busca pelo parceiro ideal está mais ligada as capacidades físicas que ele poderá proporcionar, para te dar filhos fortes.

A forma didática da qual falou fez parecer que sabia bastante sobre o assunto.

- Uau. - Chirai comentou. - Parece bem instintivo.
- Somos bem instintivos. - e ele afirmou, em seriedade.
- Tá. - porém Tights interrompeu, chamando atenção outra vez. - Mas pessoalmente, o que você acha disso?

Bulma agonizou outra vez, agora com a insistência da loira.
Vegeta arqueou uma das sobrancelhas, como se não entendesse.
Por que as perguntas específicas haviam sido reservadas só para ele?

- Você está biologicamente de acordo, ou acha importante se envolver com uma parceira antes de pensar em engravidá-la? - exemplificou, fazendo Jaco rir em negação.
- Eu não penso sobre isso.
- Mas numa hipótese otimista em que precisasse pensar, como faria?

Ele cerrou as sobrancelhas, pensando sobre. E ficou mais difícil de processar quando aquela Briefs completou com um "Em uma hipótese otimista".

- Otimista? - se questionou, fazendo uma negação. - Seria incabível para mim pensar em qualquer besteira sentimental. Sou da realeza, é minha obrigação perpetuar minhas origens e quando esse dia chegar é esperado que eu busque uma saiyajin capaz de me dar guerreiros dignos. Se não fosse por isso eu faria questão de não decorar o nome das fêmeas do distrito real, parceiros são apenas sinônimos de atraso e fraqueza.

A forma grosseira como ele falou deixou todos um pouco surpresos com a sinceridade.
Então era assim que sua mente era moldada quando você crescia em um palácio?
 

No mais, para Kakaroto, não era como se as palavras de Vegeta fossem absurdas.
Homens queriam parceiras capazes de dá-los herdeiros poderosos e vice e versa.
Saiyajins se apaixonavam como qualquer outra espécie, mas para eles era mais comum agir pensando geneticamente e Kakaroto tinha uma vasta experiência sobre o assunto: Quando o apresentaram o sexo logo percebeu que não era um macho visto para ser um parceiro.
Não possuía características desejáveis como Vegeta, por exemplo.
Apesar de ser bem afeiçoado, havia nascido fraco e sua família não possuía uma grande posição social na nobreza para ter um sobrenome invejável.
Os machos diziam que ele era o tipo de saiyajin que nunca seria enxergado pelas fêmeas.


Biologicamente, é claro.

 

Afinal, havia apenas um momento em que a biologia podia ser ignorada: na boêmia.
Ser bom com mulheres fazia os problemas axiológicos de Kakaroto parecerem irrelevantes. Ele sempre as ouvia e dizia o que queriam ouvir, as fazia rir e as proporcionava prazer onde realmente precisavam. As fêmeas diziam que ele as trazia diversão, e para ele, isso sim importava.
Entre quatro paredes, ele era mais atrativo que o macho mais poderoso ao conquistar a fêmea mais volúvel da vila e até a filha do nobre de posição mais alta do reino.


Talvez amar fosse mesmo uma besteira…
Mas um pensamento corriqueiro o fez se sentir inseguro.
Como ele poderia imaginar tal coisa? Amor o fez nascer. Mal notou os flocos de neve caindo e coroando sua cabeça...





Bulma se sentiu alguém estupidamente fantasiosa por um segundo, assim que Vegeta despejou todas aquelas coisas em roda. Sua mente a pregava tantas peças com ideias repetitivas...
Parceiros eram sinal de fraqueza e atraso? Que diabo de ideologia era aquela?!
Todos precisavam de amor... talvez a falta disso resultasse na personalidade horrível daquele príncipe nada encantado.

Aonde estava com a cabeça quando cogitou a possibilidade de que estava...

Respirou fundo, logo reformulando a frase.

Quando cogitou a possibilidade de que havia algo especial em Vegeta.
Isso a chateou.


O silêncio do recinto enfim incomodou Vegeta.
Principalmente quando ele percebeu que aquele olhar brilhante e curioso havia desaparecido das feições de Bulma. Maldita mulher!

- ... mas duvido que eu vá chegar a fazer isso de verdade. - engoliu em seco, completando em contragosto. - Provavelmente vou morrer antes.

Um clima estranho ficou parado no ar.

- .. e você Chirai? Como a busca por um parceiro funciona no seu planeta? - Tights quebrou o gelo, numa tentativa nada discreta de mudar de assunto.

Ao menos a esverdeada colaborou.

Enquanto as atenções iam para ela, ficou nítido para Tights que algo novo estava acontecendo entre sua irmã e o príncipe dos saiyajins.

Bulma fungou, de volta à realidade.
Ela e Vegeta eram de espécies diferentes, para início de conversa.
Podiam ter semelhanças, mas eram culturalmente muito diferentes. Devia parar de pensar que havia algo incomum e extraordinário sobre ele.

E curiosamente, por algum motivo, Vegeta estava pensando na mesma coisa.

Havia esfriado mais. Kakaroto voltou para a nave finalmente.
 

 

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O salão de estar na área restrita do palácio da capital era pouco frequentado.
Não era como se Freeza sempre estivesse disposto a ter momentos de lazer, então a área mais parecia um desperdício de espaço. No entanto, era justamente ali que Coola passava grande parte do tempo, logo abriu uma exceção a seu descaso naquela tarde fria de inverno.

- É a primeira vez desde que cheguei à capital que fez menção de me ter por perto. Está se sentindo solitário? - Coola o questionou, sentado de frente para ele.

Ele pendia o cálice dourado entre seus dedos longos para misturar o líquido arroxeado dentro dele, observou Freeza.

- Sua presença não é lá notável, talvez eu apenas tenha me esquecido de que estava aqui. - e o imperador respondeu a provocação à altura, arrancando um sorriso do irmão.

Coola era a única criatura viva corajosa o bastante para tratá-lo daquela maneira insolente e isso o irritava. O irmão mais velho deu uma longa golada em sua bebida, sem parecer preocupado com qualquer gesto suspeito que pudesse aborrecê-lo.

- Você gosta mesmo desse tipo de destilado. Parece que é a única bebida disponível nessa maldita ala. - o caçula desdenhou, olhando aos redores.
- É feito de akebia. A menção da fruta não te deixa nostálgico?

A akebia era um fruto nativo do planeta natal dos lagartos.
Era usado para diversas finalidades, mas Coola gostava de pensar que a melhor forma de aproveitar o fruto era o usando como matéria prima em bebidas. Principalmente, porque a fruta só podia ser consumida pelos changelings, imunes ao efeito das toxinas corrosivas e paralisantes presentes em sua polpa. Era a bebida favorita de rei Cold, pai deles. Era por isso que Coola falava de nostalgia...

- Se lembra da roda da morte? - e o primogênito prosseguiu, sem esperar por respostas de Freeza. - Sempre que tomava um planeta, papai reunia os principais anciões nativos numa roda e batizava um dos cálices com akebia antes de distribuí-los aleatoriamente. Ao fim de cada rodada, alguém morria.
A prática doentia era muito apreciada por rei Cold, sempre agraciado em observar suas vítimas agonizarem até o último suspiro. Não foi uma tradição que Freeza escolheu manter após sua coroação, interessado em formar alianças com estrangeiros para se tornar mais influente ao invés de matá-los.

- Não há nenhuma lembrança graciosa sobre o planeta natal, pare de falar sobre isso. - e prontamente interrompeu o irmão.

Ele não tolerava ouvir menções sobre o pai saindo da boca de Coola.
O changeling mais velho cruzou as pernas, levando uma das mãos a bochecha.

- Então por que estamos aqui Freeza? Sei que não faz convites repentinos e espontâneos.
- Sei que está manipulando Zarbon. - foi direto. - Posso ter um general brilhante, mas sei que ele não seria capaz de fazer planos de colonização mirabolantes por conta própria.
- No fim das contas ele passa mais tempo se preocupando em exercitar seu físico do que o cérebro, não? - e Coola não negou, se servindo de mais bebida.

O olhar gélido de Freeza sequer o deixava paralisado, acostumado a lidar com ele desde que era um simples embrião no ovo.

- Qual a verdadeira intenção de me fazer sair da capital? Certamente, é uma ideia sua.
- Achei que já havia recebido um motivo. - Coola levou o cálice à boca outra vez. - O quadrante L precisa ser colonizado ou será tomado por rebeldes, como previsto por seus próprios subordinados. Quem mais poderia assegurar que não haveria uma tomada de território durante o período de terraformação e colonização?

A razão e sensatez pareciam estar ao lado de Coola, como se fosse um ser realmente visionário. Ainda assim, Freeza nunca se convencia com nenhuma das declarações dele.

- No mais, havia trabalho demais para um único general cumprir e o ajudei na melhor das intenções. Não acho que está sendo prudente com suas expectativas.
- Fique fora dos meus negócios. - e Freeza o cortou rápido.
- Tem certeza? Os problemas na capital e nas redondezas que estavam lhe dando dor de cabeça diminuíram gradativamente desde que passei a ajudar seu general. - dizia entediado, antes de tocar no ponto interessante. - ... até consegui as informações valiosas sobre Vegeta-sei que queria.

A rigidez na expressão de Freeza não era consoladora, mas havia uma parte do lagarto cativado sobre aquilo. Coola suspirou.

- Entenda, não estou fazendo isso porque quero te prejudicar meu irmão. - gesticulou. - Na verdade, estou preocupado com seu bem estar. Sempre faz seus subordinados crerem que está infeliz e esgotado da capital... apenas imaginei que se fosse para outro lugar se sentiria mais relaxado.

Coola era um ótimo mentiroso. Diziam que ele era capaz de enganar uma divindade e Freeza estava cansado dos truques dele.

- Então, ao invés de se enfurecer e pensar em punir seu pobre general, por quê não pensa mais sobre esse assunto? Seria bom para que você espairecesse sua mente. Tudo o que eu quero é o seu bem. Eu faria qualquer coisa por você... cuidar da família é uma missão sagrada.

A última frase dita fez um desejo sombrio e assassino crescer sob os olhos selvagens de Freeza, sem acreditar no que estava ouvindo. Ás vezes parecia que Coola relembrava bordões familiares como aquele apenas para perturbá-lo de propósito.
A expressão de inocência e preocupação no rosto do primogênito só fortificaram a impressão densa, fazendo Freeza cerrar o punho até sentir suas unhas perfurarem sua carne.

- Família é sagrada. Não é? - mas se deteve em dizer apenas isso, quase como um boneco sem emoções.

- Sim. - e Coola acenou, como se concordasse veemente.

As gotículas de sangue caíram pelo chão impecavelmente limpo, nada discretas. Freeza enfim parou de se ferir, afrouxando o punho.

- Vou pensar no assunto. - deu uma resposta, que apesar de não ser concreta, já era alguma coisa.
 

O imperador se retirou sem se despedir, alvo do olhar carismático e preocupado do irmão. E quando a porta do salão finalmente se fechou, esses mesmos olhos foram se carregando de frieza e indiferença. Observou as manchas vermelhas se destacando no piso branco.

- Então você sangra. - sussurrou para si mesmo.


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Vegeta estava na entrada da caverna, de olho no horizonte completamente branco além da montanha, farto de enxergar tanta neve.

A cúpula da câmara gravitacional enfim estava sendo construída.
O trabalho em grupo fluiu melhor do que ele esperava, os amigos da irmã de Bulma certamente eram profissionais no que faziam. Aquela altura do projeto a azulada ainda se deu ao trabalho de reprogramar seus robôs de treino temporariamente para que tivessem mais mãos de obra que ajudassem no processo de solda, então podia dizer que estava começando a ficar satisfeito com o rumo das ações.

Ou ao menos foi o que idealizou para tentar compensar suas outras frustrações, pensou bufando em desgosto.

Estavam ali há quase uma semana e meia e até então ele não havia tido nenhuma oportunidade de tentar sentir energia outra vez. A desculpa palpável que seu subconsciente encontrava para justificar esse atraso era de que estava concentrado demais no trabalho braçal para dar atenção à isso, mas no fundo sabia que estava passando por uma espécie de bloqueio. Quando Vegeta sentiu energia pela primeira vez foi de um jeito repentino, praticamente por instinto. Se não tivesse sido capaz de ler a energia de Bulma e vivenciá-la em Gub, aquele dia a garota teria morrido. Só ela poderia despertá-lo, como o monstro da montanha havia orientado e previsto desde o início. O príncipe fora da linha de sucessão apenas nunca imaginou que seria daquele jeito, quando temesse perdê-la.

A sensação era humilhante... quase uma fraqueza.

Naquela ocasião ele não mentiu quando disse que não queria que a garota terráquea morresse, mas também não podia negar que os dias seguintes não o deram ideias de como experienciar aquela sensação outra vez. Se ele havia atingido aquele estado espiritual ao vê-la diante dos perigos, deveria por acaso expô-la a eles outra vez? Haviam vários métodos de tortura eficientes que podia usar para testar isso sem colocar a vida dela em risco.

O desejo egoísta nunca poderia ser atendido no entanto; Um incomodo grande preenchia sua garganta com tais pensamentos perversos. Recostou-se na parede rochosa, angustiado e frustrado. Ela jamais o olharia do mesmo jeito...

O que mais ele deveria tentar?!

Estava cansado de perder tempo... e estava cansado de receber aquele olhar de um estranho pelas costas.

- Vai me observar em silêncio para sempre? - e disse em voz alta, impaciente.

Era bom reforçar que desde o início Vegeta não estava sozinho naquela entrada, sendo fitado de longe. Os anos como soldado de elite ao menos o deixaram perspicaz para aparições surpresas, independente se teria um radar de energia com ele ou não. Tights não se abalou com a sagacidade do homem ao descobri-la, rumando na direção dele. Parou do outro lado da parede da caverna, oposta a ele. Ficaram em silêncio por um período, perdidos no branco do lado de fora.

- Desde que chegaram uma questão amarga vem martelando minha mente e não posso mais adiar essas dúvidas. Afinal, por que você e Kakaroto concordaram em seguir para Ludo?- a pergunta direta saiu, o fazendo franzir o cenho. Ele não imaginava que ela continuaria a tocar na mesma tecla todos os dias. - Sei que Bulma é uma garota genial, mas ela ainda é imatura e inconsequente demais para medir os problemas de seus objetivos quando está obcecada por eles.

Vegeta estava sozinho ali e finalmente Tights tinha uma oportunidade de confrontá-lo sobre a ida à Ludo. Não queria ouvir apenas as palavras da irmã, cega por fantasias heroicas onde em todos os finais ilusórios ela voltava para casa com o pai são e salvo.
Es apesar de não gostar realmente da presença daquele saiyajin, estava o dando uma chance de convencê-la de que estavam traçando o destino certo.

- Achei que a vida de procurados iluminaria suas cabeças, mas parece que sempre estão indo direto para à forca. - no entanto, expôs o que realmente achava. - Por que?
- Aparentemente gostamos de estar aonde o perigo está. - e Vegeta pareceu soar sarcástico. - A jornada não se torna mais divertida?

A loira arqueou uma sobrancelha.
O sorriso dele desapareceu por completo em um segundo, como se fosse bipolar.

- Você deveria saber melhor do que ninguém que Bulma é autoritária, não é como se alguém tivesse fomentado suas ideias insanas.
- E mesmo assim vocês disseram sim a essa loucura. - a loira não deu o braço a torcer.
- Por acaso acha que sua irmã não lutou e insistiu para ouvir um "sim" de Kakaroto e de mim? Nosso consentimento nos planos foi custoso para ela.

Tights mordeu a ponta do dedão com a resposta, como se maquinasse e Vegeta não gostou da ideia de incluir Kakaroto na conversa. As decisões que motivaram ele e Kakaroto eram completamente diferentes.

- Isso não está certo... não está dizendo tudo.

A certeza na fala da loira enfim desregularam os parâmetros de hostilidade do homem.

Tights continuou a martelar. Segundo Bulma, Kakaroto era pacífico para o nível de um saiyajin. Era fácil ter sua simpatia e cumplicidade para conseguir o que queria. Mas... como raios Bulma havia conseguido o apoio daquele outro macaco, tão orgulhoso e ignorante? Ela nem conseguiu listar alguma qualidade sobre Vegeta durante suas conversas.
O "sim" dele claramente não era espontâneo, principalmente quando pensou na câmara.
"Negócios", lembrou da palavra que Bulma usou quando a questionou sobre o porque da construção da máquina. O veredito final a deixou furiosa:

- Está explorando-a. - soltou, incrédula. - Está usando o desejo dela de encontrar papai para ter o que quer e depois seguir seu rumo. Você é mesmo... - "Desprezível", pensou, mas não conseguiu completar apenas em negação.

Vegeta não pareceu impressionado. Suas intenções sempre foram óbvias, queria ser mais forte para enfrentar Freeza e recuperar sua honra. Por que depois disso continuar a brincar em trio continuaria sendo favorável para si? Aliás, a irmã de Bulma devia estar feliz, ele desconsiderou a parte inicial perturbadora de seu plano, onde abandonava o trio após assassiná-los. Talvez até desse moradia em Vegeta-sei para Bulma se ela não quisesse voltar para a Terra, apesar de nunca ter tocado no assunto com ela.

Mas já que de Ludo o assunto se emaranhou até a malícia dele, ao invés de dar uma justificativa sólida o saiyajin apenas indagou o que vinha o incomodando há dias:

- Está me observando desde que chegamos aqui, como se eu fosse alguma ameaça. - sorriu de canto, daquela maneira provocativa que só ele sabia. - Por acaso acha que sou um perigo para sua irmãzinha?
- Não confio em você, é verdade. - e despejou sem receios.- Ouvi muitas coisas ruins à seu respeito na capital e não me inspira tranquilidade.
- Quais coisas? - cruzou os braços, desencostando-se da parede e se aproximando lentamente. - Que já exterminei vilarejos inteiros? Que já matei e torturei quem quis? Que sou impiedoso?
- Isso e muito mais. - o repudiou.

O homem nasalou, fechando o cenho em irritabilidade.

- ... eu não dou a mínima se confia em mim ou não graças à meros boatos. Quer descobrir uma verdade? Cumpro o que prometo. - a voz saiu rouca e baixa, ameaçadora. - E sabe o que torna a coisa toda interessante? Sua irmã está do meu lado justamente porque revoguei e reconsiderei a promessa mais fiel que fiz à ela.

A sensação de encurralamento deixou Tights com um frio na barriga, como se estivesse diante de uma besta. Fez o que pode para se manter firme.

-Que promessa? - cuspiu, raivosa.

"Matá-la", a mente respondeu.
Porém, enfim as expressões do príncipe se suavizaram.

- Por que não pergunta pra ela? Parece que gostam de falar muito sobre mim quando estão sozinhas.
Ela jamais desconfiaria que ele teria uma audição aguçada à ponto de ouvi-la fofocar com Bulma dias atrás. Se constrangeu, mas não se abalou ao ranger os dentes.

- Vou fazer o que puder para fazê-la mudar de ideia sobre Ludo.
- Sabe que ela não vai desistir. Estabelecemos um trato, e independente das motivações por trás, por enquanto eu vou aonde ela for. A onde ela for. - deixou claro. - Viemos de muito longe para desistir aqui e se eu precisar tomar providências para me livrar de você não hesitarei.

A maneira hostil da qual falava não fazia tudo parecer um blefe e isso doeu, principalmente por saber que Bulma jamais desistiria. Ainda assim, Tights não se conformou com a ameaça do homem. Ela o recepcionou de braços abertos mesmo não o apreciando e era assim que era recompensada. Tinha pena da irmã, mais uma vez ele fazia parecer que era mais próximo dela do que queria que acreditassem.

Novamente se indagou: Devia deixá-la ir ou continuar em negação?

Vegeta a olhou de cima em baixo, quase como se a desprezasse e se retirou. Já havia dito tudo o que precisava e ficou nítido para a loira que ele não estava mais aberto à discutir qualquer assunto que ela viesse a tratar com ele.
A mulher engoliu em seco e socou a parede quando se viu só, frustrada e desanimada.
Então... apoiar Bulma era a única opção viável?
A constatação duvidosa não a deixou feliz. Foi atrás de Jaco sem vontade, ciente de que ele era o único ser que poderia ajudá-la com aquela questão. O tempo para continuar a hesitar havia se esgotado.




Vegeta parou para observar as placas de metal recém terminadas mais uma vez, perdido em devaneios, mesmo após a troca de ofensas com a irmã de sua companheira de equipe. Sentiu-se estranhamente apto para voltar a tentar sentir energia. Sempre que Bulma se infiltrava em seus pensamentos ele parecia pronto para enfrentar qualquer coisa.
Supôs que era por isso que o monstro da montanha sempre falava dela para ele.
As imagens da garota estavam o consumindo e o chateando como um vírus, mesmo que ela o achasse o ser mais rude da galáxia. Por que ela precisava deixá-lo tão irritado?

Agora ele sabia, definitivamente conseguiria atingir um resultado.



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Outra oscilação de energia atrapalhou a navegação do monitor da central. Os funcionários, nervosos e inseguros com o sobrecarregamento do sistema operacional, concentravam-se apenas em evitar possíveis perdas. Zarbon estava inquieto ao lado de seu assistente, notando que os itens soltos sobre o painel de controle tremulavam levemente como se estivessem no meio de um terremoto. Suspirou alto, movimentando-se após verificar o trabalho da equipe.

- Certifiquem-se de não perder nenhum arquivo importante. - avisou aos seres, antes de se sair do recinto.

O assistente atarefado o acompanhou em sua saída, suando frio.

"Quando isso vai acabar?", e alguém sussurrou entre os murmúrios discretos da sala.

Aí estava uma boa pergunta.
Os surtos de lorde Freeza não eram frequentes, afinal, ele podia ser considerado paciente e comedito até certo ponto já que sempre parecia ter o controle de tudo à sua volta.
Contudo, recentemente a situação havia mudado.
Os rebeldes, os Briefs, Vegeta-sei e os saiyajins... eram assuntos demais para que o tirano lagarto pudesse tê-los em suas mãos sem deixá-los escapar entre os vãos de seus dedos; e agora com Coola por perto, seu controle enfim parecia fora de seu eixo. Não deveriam estar surpresos com a ira do imperador, em seu limite.

- O senhor precisa fazer alguma coisa sobre isso. - a criatura sussurrou ao lado do belo general. - Nosso lorde vai destruir o palácio se continuar se descontrolando desse jeito!

Os scooters de todos os soldados estavam desregulados, como se a energia de Freeza estivesse por todos os lugares para assustá-los.
Zarbon apenas ignorou os protestos de seu estúpido assistente, afinal, devia estar mais preocupado em descobrir como a intensidade da fúria de seu lorde o atingiria. Para estar irritado, Freeza definitivamente deveria saber que Coola estava trabalhando com ele. Talvez a ideia de colonizar o quadrante L não fosse tão espetacular…
Paralisou por dentro ao lembrar do que o lorde fez com Dodoria, após um deslize estúpido. A imagem do coração do antigo companheiro bombeando nas mãos de Freeza pela última vez o deu calafrios. Seria aquele seu destino ou o lagarto o reservaria algo pior? Zarbon sabia que não era o primeiro general do império e certamente não seria o último.

- Senhor Zarbon! - o assistente continuava insistente.

O assistente foi puxado pelo colarinho, tremulando de medo ao despertar a fúria de seu chefe. Não fora de seu intuito soar intragável, mas estava tão assustado quanto qualquer outro empregado e queria uma solução rápida.

- Cale-se! - o general vociferou, irritado. - O que espera que eu faça, idiota?!

Mais estrondos se fizeram presentes, balançando os lustres.
Zarbon tensionou o maxilar e o soltou ríspido, o fazendo cair no chão.

- Continue fazendo seu trabalho, estarei em meu escritório. - e foi breve ao dar o recado, ciente de que era bom se manter distante.

Tudo o que podiam fazer era rezar para que o palácio não caísse sobre suas cabeças enquanto o lorde explodia em seu aposento. Até o fim do dia a certeza era uma só: o imperador precisaria de uma nova mobília.

O que diabos lorde Freeza e Coola haviam conversado para as coisas terminarem daquele jeito?

Ter família era problemático.


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- O que é isso? - Bulma franziu o cenho para a irmã, quando a mesma interrompeu seu café da manhã cheia de papeladas aquele dia.

Haviam bolsas de olheiras abaixo dos olhos da loira, mas ela parecia estranhamente disposta.

- Sua entrada para Ludo. - foi tudo o que disse.

A frase fez a azulada engasgar com o próprio chá, deixando todos muito surpresos com a ação repentina. Tights havia cedido e deixado seu orgulho de lado?! Definitivamente era um dos sinais do apocalipse. A atitude em especial deixou Vegeta antenado e desconfiado. Depois da conversa que tiveram, nunca seria capaz de prever aquele resultado.

- Está se sentindo doente?!- Bulma indagou, ainda incrédula.
- Talvez eu esteja, é melhor aproveitar. - e a irmã fez uma negação, abrindo os projetos na mesa plana.

 

Bulma ainda tinha uma série de perguntas formuladas em sua cabeça para compreender a mudança de opinião repentina de Tights, mas ao mesmo tempo em que estava em conflito, estava interessada em saber o que a mesma havia preparado para sua ida à Ludo antes que mudasse de ideia. O coração começou a bater rápido quando disse por instinto:

- Eu irei!

Tights a fitou por alguns segundos, enquanto seus companheiros se esgueiravam até elas cheios de curiosidade. O príncipe deserdado estava mais distante, mas definitivamente estava ouvindo cada palavra. Talvez sua ameaça tenha sido efetiva? Estranho, ele não quis verdadeiramente assustá-la com as palavras.

- Certo... eu virei a noite pensando em tudo, então fazer uma revisão profunda das etapas vai ser crucial agora. - Tights refletiu um instante, antes de dar continuidade. - Mas antes me deixe perguntar, você já tinha um plano para Ludo? - indagou a Bulma.


"O plano.", Vegeta repetiu mentalmente, quase rindo com a falta de argumentos da azulada. Ela devia estar começando a ficar nervosa. Bulma manteve a expressão séria, apesar de se sentir intimidada.

- Ainda não havia nenhuma ideia sólida, mas tinha certeza de que iria entrar de alguma maneira. - respondeu, fitando os próprios dedos. - Quer dizer, eles capturam pessoas para serem escravos... imagino que ia precisar me colocar em uma situação dessas para ir para as colônias.

É verdade que a construção da câmara havia consumido grande parte de seu tempo para pensar em fazer um plano de resgate para Ludo. No momento estava contando mais com a sorte à seu favor do que etapas perfeitamente calculadas, por mais que repudiasse isso. E Tights cortou seu otimismo depressa.

- Esse seria seu primeiro erro. Seres exóticos e atraentes são caros, eles não ignorariam seus cabelos azuis. - foi sincera.- O último lugar que te levariam seria para as colônias.

A inocência de Bulma podia prejudicá-la.
Até que a Briefs mais velha não era tão estúpida, imaginou Vegeta.

- Esse foi o primeiro impasse que encontrei. Além de conseguir te fazer entrar, como fazer você ir para as colônias de Ludo sem revelar seus atributos? - a loira gesticulou. - Se descobrirem que é uma garota bonita, vai para os bordéis ser prostituída. E se descobrirem que tem habilidades práticas específicas, te mandam para a central ou qualquer outro setor do império. Sempre, onde papai não vai estar.
- O primeiro impasse já parece me deixar encurralada! - Bulma se tensionou, sem conseguir encontrar saídas.

Entrar na colônia era uma tarefa que só ela podia realizar, até então desconhecida pelo império. Kakaroto e Vegeta seriam reconhecidos e mandados para a capital imediatamente, então sabia que não podia contar com eles.

- Dada as conclusões, percebi que a única coisa que podia ser feita seria se você não fosse você.

O novo ponto atiçou ainda mais a curiosidade dos ouvintes, cada vez mais aprofundados nas palavras de Tights.

- Vai precisar fingir que é um homem. - revelou. - Jovem e com capacidades práticas e físicas limitadas que só os faça acreditar que é bom com trabalho braçal. No entanto, a corrida pela sobrevivência será maior... e esse com certeza esse é o destino mais perigoso.

A solução e problemas imediatos fizeram Bulma empalidecer, pensando mais uma vez em todas as coisas horríveis que havia ouvido sobre aquele planeta perverso.

-Você literalmente está indo cavar sua cova e nada garante que ao fim da jornada não seja obrigada a pular nela. - a loira completou, séria. - Um erro e não há mais volta. Ainda quer continuar me ouvindo?

Diante da realidade onde enfrentaria de tudo sozinha, Bulma se sentiu pequena. Não estava preparada para uma jornada daquelas, ainda mais porque não tinha certeza do que encontraria dali para frente, mas não se acovardou. Desde que colocou Ludo na cabeça estava ciente de todos os desafios, positivos ou não.

-... eu entendo. - cerrou as sobrancelhas. - Vou continuar, mesmo que custe minha vida.
- Tudo bem. - Tights tentou camuflar sua fraqueza.

A certeza na voz de Bulma parecia inabalável. Tights sentiu uma pontada de angustia no peito. Ver a irmã tão decidida e não cautelosa -como era acostumada - ainda era novidade.
Precisava se conformar com aquilo.
E Vegeta... bem, pensou que a coragem daquela garota de cabelos azuis podia ser comparada a de um saiyajin. Ela havia mesmo mudado muito desde que iniciaram a viagem.
Logo a azulada prosseguiu:

- Até agora me apresentou todos os riscos e disse como deveria me disfarçar para continuar nas colônias, mas ainda não disse como vou ir parar lá de fato. - citou o ponto importante. - Não adianta pensar tão adiante quando a entrada ainda parece neblinosa.
- Eu estava deixando isso para o final de propósito, afinal, como Jaco disse a entrada também pode ser seu meio de saída. - e a loira manteve sua postura séria.

Para Bulma a saída sempre lhe pareceu o obstáculo maior, por isso franziu o cenho com as palavras da irmã. Olhou para o ser de traje roxo, como se esperasse uma explicação.
Jaco respirou profundamente:

- Raiti e Zaacro são dois vigaristas da raça Lychee que transportam coisas ilegalmente. A espécie deles tem o dom de transmutar a própria aparência através de ilusões, então entram e saem de qualquer planeta quando querem, porque podem ser quem quiserem. Como estão sempre nos quadrantes de comércio, a cidade de Ludo é uma boa rota para seus desvios de mercadoria, venda de escravos e fraudes... a última notícia que tive deles era que estavam lá disfarçados de namekuseijins desviando cápsulas para rebeldes. Eles provavelmente são sua única chance de se infiltrar nas colônias, desde que tenha uma grande quantia para dar.
- Parece ótimo, mas imagino que haja um porém... -e Bulma não se fez de otimista daquela vez, quando ele terminou de falar.

Enfim estava começando a aprender que tudo tinha um custo. Jaco continuou.

- Apesar de não apoiarem o império e nem mesmo os rebeldes, Lychees como Raiti e Zaacro não são seres de confiança. Mesmo ineficazes em batalha, conseguem ler mentes através do toque e roubar toda informação que precisam para enganá-lo. São mentirosos sem escrúpulos e venderiam a própria prole por um bom preço. Se abaixar a guarda, certamente vão seguir seus próprios planos e traí-la.
- Então preciso evitar ser tocada. Acho que entendi…
- Não só isso, não pode tirar o olho deles um segundo sequer. São nas menores distrações que eles criam ilusões para tirar vantagem dos outros. Se por acaso descobrirem que é uma Briefs, acha que simplesmente vão deixá-la na entrada das colônias? Garota... vai precisar ter um olho na frente e atrás da cabeça.

A azulada respirou fundo. Não era um plano fácil de ser realizado.
Tights não havia sido exagerada em sua premissa inicial de que Ludo era o inferno…

- Vou dar o máximo de mim para ser cuidadosa. - assentiu. - Prossiga...
- O serviço deles vai ser caros, principalmente se a sua viagem for de ida e volta. Precisa se certificar de acertar o preço do trabalho deles no dia de partida e estar no ponto de encontro combinado assim que o prazo de volta que eles te darem se esgotar. Mesmo se não conseguir salvar seu pai precisa partir, do contrário irão ir embora sem você!

Então até em Ludo precisaria ser rápida. Acenou como se entendesse, mas no fundo sentiu insegurança pela primeira vez. Ir e não salvar o pai... que hipótese terrível. Vegeta sempre dizia a ela para não se esquecer daquela possibilidade dura.
Respirou profundamente, voltando a encarar Tights.

- Mesmo que as coisas deem certo com Raiti e Zaacro, o que acontece à seguir quando eu estiver em Ludo?
- Bem, infelizmente essa é a parte em que você vai improvisar. - e a irmã foi realista. - Não dá pra prever o que vai acontecer nas colônias, então vai ter de localizar papai por conta. É melhor perguntar tudo o que puder para Lemo antes de partir. - sugeriu, já que o próprio não estava presente entre os demais ao redor da mesa. -Tudo o que sei sobre o assunto é que no castelo de Dolltaki existe um setor aonde as cápsulas são emitidas, mas parece que escravos não tem acesso a ela. Vai precisar se misturar e colher informações por ora, até ser capaz de calcular o momento do grande clímax.

Bulma engoliu em seco.

- Que será...?
- O momento do resgate. Vai ser aí que seus companheiros vão entrar em ação.

Vegeta se interessou por tal parte, ainda mais atento.
Resumidamente, por ser perto do castelo do regente egocêntrico, as colônias eram protegidas não só por soldados mas também por órfãos da ceita. Pouco se sabia sobre eles, mas eram usados em situações extremas. Vegeta e Kakaroto também iriam para Ludo, mas se infiltrariam nas cidades, onde Jaco tinha contatos confiáveis. E quando o momento de fugir chegasse, atacariam furtivamente os geradores de energia das colônias para distrair a atenção geral dos escravos e dos androides. Assim que as pulseiras eletrônicas estivessem desligadas, Bulma precisaria de um localizador para mandar um sinal de que estava à salvo aos companheiros para que assim recuassem. O ponto de encontro seria em Gilease, onde os Lychees a deixariam.

- Na teoria parece bem simples...- Bulma esfregou a têmpora, ainda memorizando tantos detalhes únicos. - Ainda assim, acho que minha porcentagem de sucesso pende mais para o fracasso. - e sorriu sem humor, ciente de que tinha um caminho árduo pela frente.
- É sua única, hipotética e arriscada chance de resgatar nosso pai. - Tights completou. - Você sabia que nunca seria fácil.

Ainda haviam muitos detalhes a serem discutidos e Bulma sabia que Lemo seria uma peça fundamental para falar sobre a escravidão em Ludo, mas por ora, se concentraram em outros detalhes. Tights era tão impressionante quanto Bulma ao idealizar planejamentos, a forma como havia pensado em tudo aquilo da noite para o dia era impressionante.

- Eu encontrei algumas plantas das colônias entre os arquivos que furtei da central, então serão úteis para vocês agora.
- Tive algumas ideias. - Bulma comentou, olhando para os papéis sobre a mesa junto dos outros. - Quando era uma mera cobaia Kakaroto fez uma pulseira localizadora irrastreável para mim, talvez seja a ferramenta que eu precise ter comigo.
- É uma ideia a ser considerada. Se ele puder mostrar como essa pulseira funciona...

Vegeta enfim se aproximou da roda, gostando do que havia ouvido enquanto o grupo conversava. Lançou um olhar para a loira, que retribuiu de soslaio enquanto todos pareciam distraídos olhando as plantas. Era como se raios de ódio recíproco se compartilhassem entre os dois, diante da possível ida à Ludo dentro dos conformes.

"Acho que minha porcentagem de sucesso pende mais para o fracasso.", a voz de Bulma ressoou em seus pensamentos. Uma indiferença momentânea o acometeu, enquanto a ouvia falar.

Certas coisas tinham preços grandes. Baixou os olhos e focou nas plantas, afinal, desde cedo aprendeu que cada destino podia ser o último. Por sorte, ainda não havia encontrado o seu.


Mas, teria Bulma a sua sorte?

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O som da chuva estava começando a incomodar. O senhor de idade olhou para a esquerda, vendo os respingos de água vindos da lateral da parede do subsolo mesclando-se a camada de sujeira sobre o vitral ao alto de sua sala, que já não era limpo à muito tempo. Suspirou ao esfregar o próprio rosto, lembrando que Kuririn e Teshinhan haviam decidido ir para o térreo justamente quando um temporal estava prestes a se formar. Estúpidos rapazes... ficavam a importuná-lo o dia todo em casa e quando não deviam sair, saíam.

E por pensar em importunação, as batidas na porta o fizeram ficar ainda mais ranzinza. Ergueu-se de seu assento e ligou a câmera lateral de entrada, para ver quem era pelo painel de vídeo. Uma Suno impaciente batia um dos pés insistentemente no chão, fixando o olhar para a câmera como se soubesse o que o velho estava fazendo aquele exato momento. Bufou e puxou o trinco, após digitar a senha do cadeado digital.

- Que demora! - reclamou, tomando o espaço do senhor e pendurando sua jaqueta úmida no primeiro gancho que encontrou. - O mundo do lado de fora está desabando sabia?

A bolsa térmica presa em seu tronco já deixava uma dica do que havia ido fazer ali. O velho apenas cruzou os braços quando ela lhe entregou aquele pote cheio com seu almoço.
Quando deu por si já estava sentado em formato de lótus perto da mesinha central da sala comendo, alvo dos olhares entediados da moça de cabelos vermelhos como fogo.

- Já disse que não precisa trazer comida para mim e os idiotas. - reclamou, fazendo pausas enquanto mastigava.
- Sua boca cheia parece dizer exatamente o contrário. No mais, minha suposta caridade existe apenas para evitar desperdícios. - explicou, como fazia todas as vezes que aparecia na casa do velhote. - Eles não aproveitam as sobras de comida aonde trabalho.

O silêncio os abateu, como de costume. Suno nunca entenderia como o senhor conseguia comer usando aqueles dois palitinhos, supostamente culturais na área aonde ele havia vivido na Terra. Recostou o cotovelo na mesa, usando a mão de apoio para o rosto enquanto o observava. Ela também queria ter lembranças de casa como ele, mas era muito nova quando foi levada pelo império. Tudo o que sabia sobre a Terra vinha daquele senhor...
Era estranho pertencer a um lugar, sem de fato parecer pertencer.

- Faz tempo que não chove assim, né? - foi retórica. - Até o subsolo está molhado, me pergunto como os outros estão lá em cima. Não deram nenhuma notificação de deslizamento hoje, mas é de se desconfiar. Sempre que chove alguma casa cai do penhasco...

Era certo que as épocas raras de chuva daquele planeta eram almejadas pelos habitantes que viviam nos campos, mas o povo da cidade não gostava tanto. Afinal, as moradias das cidades de Ludo ficavam ao alto das montanhas, suspensas e íngremes. O subsolo era o único lugar plano e com estrutura para suportar as fortes enxurradas que vinham da superfície através da grande fresta que havia ao pico da montanha, para descarregar de tudo nos abismos.

- Lembra-se quando a enxurrada quebrou uma das pontes de travessia? - o senhor recordou, depois de engolir mais massa. - A parte oeste do subsolo ficou à deriva por dias, até que as chuvas cessassem para a manutenção. Eu tomaria cuidado ao passar perto da fresta, pode ser levada pelas águas para o abismo sem perceber.
- Ah vovô Gohan... - a mulher cerrou os olhos, irritada. - O senhor precisa dizer uma coisa dessas justo quando eu preciso ir trabalhar nas arenas hoje?! Passar pela fresta é inevitável! - bateu na mesa.
- A fresta é o centro do subsolo, não é um dia ruim apenas para você. - deu de ombros. - E não me chame desse jeito, não sou seu avô.

Suno mordeu o polegar, tentando relaxar. Do jeito que as coisas estavam, tinha a leve esperança de que as lutas na arena seriam canceladas.

- Posso fingir que estou doente... - começou a maquinar enquanto o idoso se divertia com a insegurança da moça, até que um apito estranho chamasse a atenção dos dois.

A moça olhou aos redores, procurando a fonte do som. Tudo indicava que vinha de outro cômodo. Ia se preparar para questionar o velhote sobre o barulho, mas a expressão séria dele chamou a atenção. Ele se ergueu prontamente, deixando a refeição praticamente finalizada de lado.

- Obrigado pela comida. - disse. - Pode guardar o resto de Teshin e Kuririn e ir embora assim que a chuva diminuir. Com licença.

Mais parecia que estava sendo convidada a se retirar, pensou Suno. Mas não indagou mais nada ao senhor, apenas o obedecendo a medida que o via se afastando.
Lavou os utensílios por ele, pensativa. Vovô Gohan era um bom homem, tinha certa influencia no subsolo e era respeitado por todos por ter uma conduta exemplar mesmo tendo vindo de um planeta tão distante há muitos anos. Mas... é verdade que poucos sabiam daquela parte de sua vida, onde ele sempre parecia fazer coisas e falar com pessoas misteriosas demais.
O velho era uma incógnita.
Fez o que lhe foi pedido e apenas se retirou da casa, ciente de que ele devia estar lidando com alguém daquele tipo. Voltaria para vê-lo no dia seguinte quando estivesse livre, pronta para ouvi-lo reclamar mais uma vez sobre a comida que trazia.



O velho Gohan apanhou o comunicador apitando abaixo de um piso solto. A mensagem codificada e cheia de coordenadas logo o fez identificar de quem podia ser.
Franziu as sobrancelhas com o novo trabalho em mãos e pela primeira vez em anos pensou em ignorar um chamado. No entanto, uma sensação forte e instintiva o fez prosseguir.

Ainda não sabia ao certo o que Jaco queria, mas a certeza era uma só: algo grande estava para acontecer em Ludo.


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O príncipe deserdado dos saiyajins estava dentro da câmara de gravidade. A construção da máquina teve altos e baixos durante seu processo e os deu trabalho, mas finalmente estava finalizada. Depois de inúmeros testes bem sucedidos, estavam prontos para testar os efeitos da câmara em um ser vivo. Enquanto Vegeta se alongava, Kakaroto e Tights o observavam através do visor no painel de comando, registrando tudo.
O saiyajin havia dispensado a armadura aquele dia, usando apenas o macacão azul do império para ter mais flexibilidade, os eletrodos espalhados por seu torso estavam lá para que pudessem acompanhar as mudanças em seu corpo á medida que a gravidade aumentasse. A mulher loira enrugou a testa ao dar uma boa olhada no físico definido e torneado dele, entendendo porque sua irmã caçula parecia caidinha por ele.

- Vocês parecem gostar muito de treinar. - comentou por cima, enquanto Kakaroto analisava dados.
- Faz parte da nossa natureza. - e o rapaz se contentou e responder apenas isso, lembrando da época na academia onde os treinos em grupo eram como uma espécie de tortura.

Atualmente Kakaroto gostava mais de seu estilo de luta, então os treinos estavam tendo resultados e haviam se tornado mais sérios. Não podia reclamar.

- De toda forma, ele está impaciente e ansioso, então é melhor sermos breves. - e o saiyajin mais jovem comentou, na verdade, tão ansioso quanto o próprio Vegeta para descobrir como treinar naquela máquina seria.
- Só vai levar uns minutos para a checagem...

Ele parecia melhor. Era bom, mas como Tights havia falado pouco com Kakaroto não eram tão familiarizados um com o outro. Pensou em Bulma, que naquele momento era crucial durante a realização do teste. O projeto era dela, seria como assistir o nascimento de um filho! Ela sempre ficava tão animada. Contudo, com Ludo perto, a azulada havia dado seu tempo à Lemo para saber mais sobre as colônias. Provavelmente era o certo a se fazer, mas... ela estava mesmo fazendo falta ali. Suspirou, acenando para Kakaroto assim que a análise da câmara foi concluída.
Ele apertou um botão e se aproximou do microfone interno:

- Vamos iniciar.

Vegeta sorriu de canto, se posicionando assim que alguns robôs de treino surgiram das laterais da cúpula. O regularizador de gravidade se iniciou e começou a girar, deixando o ambiente avermelhado.

- Primeiro vamos ajustar para a gravidade de Vegeta-sei. - a voz de Kakaroto soou pelos alto falantes.




Enquanto isso na caverna, Chirai e Jaco estavam encapsulando os equipamentos de fundição.

- Esse negócio é pesado! - o mirrado Jaco reclamava, tentando empurrar uma das máquinas até a área da cápsula.
- Claro, idiota. Precisamos de pelo menos quatro pessoas ou um saiyajin para mover isso. - a alienígena esverdeada debochou. - Se bem que com esse seu físico eu duvido que você consiga levantar uma colher.
- O que disse?! - se enfezou.
- Talvez eu tenha sido exagerada demais. Um palito, aposto que não consegue carregar um.

E em meio aos murmúrios irritantes de Jaco e as risadas maldosas de Chirai, Bulma e Lemo se mantinham mais distantes. Diferente da conversa boba dos colegas à frente, o clima entre eles era bem mais denso.

-Tínhamos direito à duas refeições por dia. Se o trabalho individual rendesse, três. - Lemo recordava com assombro dos seus dias de escravidão. - Eram muitos seres variados para pouca comida. Muitas vezes a fome doeu mais do que as punições...

Bulma se encolheu. Já havia passado por situações aonde a comida havia sido escassa, mas nunca havia passado fome. A densidade da experiência que teria em Ludo traria novos parâmetros de realidade para sua bolha, onde nunca teve dificuldades materiais severas.

- Os escravos costumam se dividir em grupos separatistas em cada um de seus setores. Seja nos campos, nas minas, até como serventes no castelo de Dolltaki ou na igreja... sempre priorizam a própria sobrevivência. Não espere encontrar aliados de verdade, apenas alguém que possa te proteger na área que ficar. Recomendo que opte por se misturar entre outros terráqueos, as diferenças culturais e étnicas por vezes são gritantes entre espécies... nem todos são tolerantes como você, que acha tudo incrível.

Sentiu-se decepcionada por não encontrar muitas pessoas que se sentiam maravilhadas com o novo à sua frente. Detestava separações. Bem, ao menos ela entendia de sobrevivência.

- Falou sobre grupos e setores. Por acaso existe uma seleção que determine para onde cada escravo vai?
- Sim, mas a maioria vai para o campo e a mina. - explicou. - São as áreas mais requisitadas. Apenas os mais inteligentes e habilidosos conseguem subir de nível, mas isso exige experiência. Tente apostar nisso de uma forma que não te mandem para a capital, quanto mais perto estiver do castelo de Dolltaki, mais perto estará de seu pai.
- E as questões religiosas?
- Ao menos duas vezes por semana os escravos são reunidos na capela para admirar e velar os nascidos e mortos. Vão batizá-la assim que chegar, para poder entrar em solo sagrado. Em hipótese alguma repudie o deus deles na presença de superiores, se for considerada herege vão te punir de várias formas. Seja barrando o alimento ou te batendo.
- Então nem todas as punições fazem eles recorrer as... - e abaixou a voz antes de continuar, abordando o tema sensível. - pulseiras.
- É. - mas ele respondeu sem pestanejar. - Punições onde eles usam as pulseiras são consideradas mais graves e apenas soldados de patente alta tem permissão para ativá-las. Os geradores de energia perto do castelo fornecem um sinal de rede que cobre a colônia inteira, dando vista de todos que estão presos nela. Traição, fugas, assassinato de superiores ou de sacerdotes... são motivos que tem uma penalidade grande. Quando seus membros são explodidos e amputados, você tem sorte se sobreviver... e ao mesmo tempo azar. Tudo fica pior.

Que horrível.
Se perguntava o que Lemo havia feito para perder sua perna. No fim das contas ele foi transferido para a capital e ganhou uma prótese, mas se só escravos de "alto nível" conseguiam aquele feito supôs que talvez ele tenha tentado fugir. De toda forma, não perguntou, com receio de não ter aquela intimidade com o ser. Ele prosseguiu, datando tudo o que lembrava:

- Os dormitórios são asquerosos, tanto na limpeza quanto nos usuários. Esteja sempre preparada para conhecer os piores lados de todos e não tenha piedade dos feridos pedindo ajuda, eles sempre estarão fora do alcance de sua compaixão na batalha pela vida. Tenha isso em mente.

Aí estava algo difícil de ignorar.
E mesmo diante de tanta atrocidade, ela não conseguia pensar em recuar. Afinal, se tudo saísse como planejado em pouco tempo teria seu pai consigo. Era o único motivo de ter embarcado naquela jornada e não voltaria atrás agora.

- Fale mais.







Felizmente, na nave do grupo, não havia nenhuma alteração na gravidade artificial fora do despressurizador da cúpula da câmara. Era um sinal de que a máquina de gravidade estava funcionando bem.

Vegeta apenas desviava dos ataques dos droides, sentindo o corpo pesar cada vez que Kakaroto dizia pelo alto falante que a gravidade seria aumentada. A sensação ainda era suportável, mas sabia que estava ficando lento. Não sabia até que ponto os robôs resistiriam à gravidade, mas em geral, pareciam mais fortes dos que costumava treinar. As Briefs os deram melhorias notáveis.

- Ele está indo bem. - Tights disse, lendo outra vez o status do corpo de Vegeta. - Pode aumentar mais um nível da gravidade.

As primeiras gotas de suor começavam a brotar na testa do saiyajin da realeza. O pouco tempo parado teve efeitos negativos em sua resistência, mas imaginava que a gravidade maior à sua volta tinha certa responsabilidade para sua situação. No mais, estava pronto para atingir limites.
Desviou de outra emboscada de robôs.

Duzentos e cinquenta e sete. Foi o nível de gravidade que Vegeta conseguiu chegar em seu primeiro treino na câmara antes de curvar o corpo em exaustão, para a surpresa de Tights e Kakaroto. Não imaginaram que ele chegaria tão longe logo de início.
Deixaram a cúpula agir ao desligar a máquina enfim, para despressurizar a gravidade em seu nível natural. Os robôs foram desativados e voltaram para o mesmo lugar que haviam saído. A leveza súbita do ambiente fizeram Vegeta sentir alívio enquanto ofegava, ensopado de suor. A porta forte foi destravada e em poucos minutos Kakaroto estava lá para vê-lo.

- Desgraçado, não sei se fico feliz ou triste ao vir aqui elogiá-lo. - foi a primeira coisa que o rapaz soltou, alvo do olhar e sorriso provocativo do homem da realeza.

Ele se sentiria convencido para sempre!

- Não devia se espantar, sou um prodígio.

Kakaroto rolou os olhos, mas não conseguiu evitar aquele sorriso.
Ver Vegeta forte o motivava a se empenhar ainda mais em superá-lo.




O comunicador sobre as pernas de Bulma chiou, indicando que Tights estava a contatando. Lemo se calou, curioso com o resultado da câmara que havia ajudado a fundir. A terráquea estava tão curiosa quanto.

- Deu tudo certo. Sua máquina de gravidade é um sucesso e seu saiyajin é muito resistente, parabéns.

Isso fez a moça e Lemo sorrirem, felizes com os resultados positivos. Foi uma boa distração após a conversa sombria.

- Eu sei. - concordou. - Mas nunca diga a ele que te disse isso! Nos vemos mais tarde.

A loira fez uma negação.
Tinha tantas perguntas para fazer…






Á cada novo corte da tesoura as longas madeixas azuis de Bulma iam caindo pelo chão, se espalhando e emaranhando. Por mais que a Briefs caçula não fosse o tipo de pessoa apegada ao próprio cabelo sentiu uma pontadinha de dor ao ver os milhares de fios sob seus pés, agora separados de seu corpo. A extensão de cada fio era recheada de histórias sobre a sua jornada, como se fossem uma imagem figurada da pessoa que havia se tornado desde que embarcara em uma nave pela primeira vez.

Por acaso seu novo penteado também seria o presságio de um novo ciclo?
Sentiria falta daquela sua versão...

- Espere um pouco. - Tights sussurrou ao segurar sua cabeça com leveza, alinhando os pequenos fios soltos atrás da orelha.

Bulma obedeceu o pedido, ansiosa e impaciente.

- Falta muito? - indagou.
- Mais ou menos, um aparador de cabelos está fazendo falta...

A moça nunca havia cortado o cabelo tão curto antes e se perguntava se o penteado realmente a tornaria menos feminina. Esperava que sim, afinal de contas, era esse justamente o propósito de estar fazendo tal coisa.

- É um bom momento para retomarmos aquele assunto, não? - e de repente Tights interrompeu os devaneios de Bulma.
- Que assunto?

A garota estranhou. O único assunto pendente que tinham à tratar era sobre a ida a Ludo e imaginou que o tópico já havia sido resolvido.
Que raio de assunto...

- Vegeta. - e Tights a fez franzir as sobrancelhas. - Você evitou falar demais sobre ele da última vez que falamos sobre seus companheiros, então fiquei curiosa.
- Não é disso que eu me lembro. - e Bulma suspirou alto, ciente a que tipo de curiosidade a irmã se referia.

"O que rola quando estão sozinhos?"

- Escute, não tem nada acontecendo entre nós, antes que tire conclusões precipitadas. - a azulada gesticulou.
- Engraçado, tenho a impressão de que ele não para de olhar pra você. - e a loira insistiu.
-Vegeta olha para muitas pessoas o tempo todo, como um maldito psicopata. Está variando. - desdenhou.
- Você também olha pra ele. - a loira soou como se não fosse boba.
- Como é? - depressa Bulma levou uma mão ao peito, como se fosse absurdo. - De onde tirou essa ideia ridícula?
- E olha para ele como se olhasse para Yamcha. - provocou, prosseguindo. - Só consigo pensar que deve existir algum motivo que te faça conseguir arrastar esse homem para onde vai. Estou certa? - Tights completou, indagando-a.
- O que está insinuando?! Vai tirar o tempo livre para me atormentar agora Tights?
- Do jeito que ele me disse, até pareceu que te seguiria até o inferno se fosse preciso.

Bulma bufou, ajeitando sua postura no assento e cruzando as pernas.
Desde quando Vegeta falava sobre ela?

-Se Vegeta te fez interpretar isso é porque minha parceria é conveniente para ele no momento. - fez uma negação, lembrando-se das coisas horríveis que ele já havia feito com ela. - Você não o conhece.

No entanto, não ousou dar um detalhe sequer para a irmã, que podia se assustar e achá-lo ainda mais terrível para conviver no mesmo ambiente que ela. Bem, Vegeta era terrível... mas não há um nível em que deveria ser completamente evitado.

- E você o conhece? -a irmã a questionou.

A pergunta a fez ficar em silêncio um momento, facilmente influenciada a cair naquele diálogo constrangedor que queria evitar. Apertou as bordas do assento, pensativa.

Não, por vezes sentia que não conhecia... mas…

Depois de tudo o que ele fez em Gub ficou difícil dar uma resposta sólida.

- Eu não sei. - engoliu em seco, em sinceridade. - Ele não confia em ninguém e é péssimo em demonstrar o que sente além de raiva. É sistemático, calculista, egoísta, ainda guarda resquícios de crueldade e grande parte do tempo faz parecer que faz de tudo para ser odiado. É muito difícil conviver com ele.

Tights não sabia desse lado, porém, antes que a deixasse tirar mais conclusões:

-Mas, sabe? Apesar de tudo, eu não consigo odiá-lo por mais que ás vezes queira. No fundo todos os seus problemas são consequências de como foi obrigado a viver. Não somos diferentes nesse aspecto e eu não o culpo por agir desse jeito, sei que é como um reflexo de defesa. - ponderou . - Vegeta gosta muito de falar sobre o quanto acha os outros desprezíveis… mas mais parece que ele se acha desprezível.

Ele conseguia deixá-la penalizada e íntima, de alguma maneira. Era da realeza, mas pareceu nunca ter tido uma vida realmente fácil. Todas as vezes em que havia se aberto para falar sobre si mesmo fora com ela. Tarble, os pesadelos, até durante o jogo bobo de perguntas...

- Sempre que eu estive em perigo, ele esteve lá para me salvar, até mesmo quando parecia ser mais meu inimigo do que aliado. - revelou, cheia de memórias. -Quando estive perto de morrer em Gub, ele não hesitou em me salvar mesmo que isso custasse sua vida. Mesmo tendo acabado de dizer que me odiava. - e logo sorriu, como se a lembrança fosse engraçada depois da mágoa. - Eu estava tão frustrada e irritada… e ainda assim ele me aqueceu com sua energia e não saiu do meu lado até que estivesse segura. O calor dele foi acolhedor...

"Não é como se eu quisesse que morresse.", e a lembrança da frase dele fez Bulma arrepiar por dentro, a causando um incômodo estranho na barriga. Gostava de quem ele vinha se tornando.
Refletiu, cerrando as sobrancelhas.

-Ele não é o monstro que parece Tights. - falou com mais serenidade. - E quer saber? É verdade. Vegeta tem um bom coração, só está muito ferido para poder enxergar isso por conta própria.


Era tão estranho para Bulma dizer aquelas coisas em voz alta, fazia tanto tempo que ela não pensava sobre Vegeta daquele jeito. Suas observações sobre ele haviam mudado da água para o vinho agora que haviam passado mais tempo juntos. Sentia-se satisfeita com a evolução.
Queria ajudá-lo a enxergar e compreender suas próprias mudanças também.
Claro, até a seguinte constatação da irmã:

- Ah não... - Tights franziu o cenho, parando de mexer a tesoura um instante como quem estava prestes a dizer algo secreto. - Está se apaixonando por ele.

A azulada pareceu processar a informação, até cair na real e começar a ficar mais corada do que gostaria. Por que Tights precisava dizer besteiras como aquela?

- Não! - e Bulma negou rápida. - Eu o admiro de certa forma, confesso. Mas não há ponto de confundir ás coisas.

Foi o que se convenceu.
Mas ... por que seu coração pareceu gelar de insegurança com sua resposta?
Que droga! Estava prestes a embarcar numa missão suicida! Devia se concentrar nela…

- Sua admiração parece se chamar amor. - a irmã mais velha voltou a mover a tesoura. - ... e daqueles intensos e com tendências dolorosas. Se eu fosse você me afastaria dele.

A insinuação pareceu ferir Bulma, quase concordando. Depois do que ele disse ao redor da fogueira era evidente para ela que ele era inalcançável. E a caçula se repreendeu logo em seguida, como se estivesse insana por pensar e sentir de uma maneira tão confusa. Talvez fosse mesmo seguro se afastar... mas Bulma simplesmente não suportava a ideia. Desde o início havia prometido que não haveriam segredos e nem desavenças entre o trio e esperava continuar sendo assim, independente do quão louca estivesse.

Rapidamente Tights deu um suspiro vendo que havia tocado em um ponto sensível e fez uma piada, para dispersar a nuvem cinzenta sobre a cabeça da irmã:

- Mas bem... se não tiver jeito, sabe qual será a parte interessante? - continuou, brincando. - Vocês vão redefinir uma nova categoria de atração de gêneros: Inter espécies. - deixou no ar. - Seus filhos estão fodidos.

Deus, Tights já estava viajando a ponto de falar em filhos?!

- Você é maluca. Primeiro persegue ele e agora debocha? - levantou-se rápido, esquecendo-se alguns segundos que havia uma tesoura afiada apontada para ela enquanto era alvo de piadas. - Se é assim, eu posso dizer que você tem um romance com o Jaco. Parece engraçado?
- Credo, o Jaco parece um sapo! - a loira cerrou as sobrancelhas. - Se ele fosse um saiyajin gostoso eu até entenderia o porquê da minha atração estranha. Sei que o rabo de macaco pode ser ignorado depois de algumas bebidas.

Bulma quis se afundar no chão. No entanto, logo suavizou a expressão nervosa e riu junto dela. Era estúpido e realmente bom se perder em devaneios como aquele, igual aos velhos tempos, tapou o rosto fazendo uma negação com a cabeça. Havia sentido tanta falta de Tights.
O momento foi divertido, para variar.
Enfim percebeu o peso a menos sobre a cabeça e recordou-se:

- Oh, o corte! - exclamou, sentindo os fios curtos com as mãos. - Minha movimentação o deixou torto?
- Para a sua sorte eu já havia acabado antes que fizesse isso.

Suspirou aliviada e apanhou o espelho portátil que Tights levava consigo, enfim vendo o resultado final de seu novo penteado.
Á princípio se estranhou, desacostumada com sua figura. Tights havia cortado sua franja na altura da testa e basicamente seguido e repicado os fios daquela medida pelo resto do cabelo. A parte de trás ficou alguns centímetros mais comprida que a frente, mas nada feio o bastante para fazer o corte lembrar um mullet.

- Ficou melhor do que eu esperava. - revelou, surpresa. - Acha que estou parecida com um garoto?
 

Tights pareceu analisá-la de cima em baixo.

- Se estiver usando roupas largas, uma faixa no busto e não falar muito, talvez se pareça com um rapazinho entrando na puberdade.

Não foi lá uma resposta consoladora.

- Espero mesmo que isso dê certo.

A azulada encarou sua imagem mais alguns minutos, sob a supervisão da irmã.

- Eu ainda não confio nesse cara. - Tights soltou de repente, voltando o diálogo até o príncipe dos saiyajins. - Mas, se você diz que ele não é como eu penso, então eu acredito. Porque confio em você. - foi sincera. - Só... tome cuidado. Não crie expectativas que não existem, pelo seu bem.

A maneira convicta da qual Tights falava até fazia parecer que ela já sabia o que iria acontecer no futuro e isso deixou Bulma intrigada. Pensou em chamá-la de louca mais uma vez, mas teve medo de ouvir um: "Eu te conheço".
Engoliu em seco e voltou a mexer no cabelo, distraindo-se.




(…)



Auroras boreais se formavam no céu limpo e noturno do planetoide, bem ao alto. O frio estava suportável, possibilitando aquela garota terráquea a andar pelo lado de fora com tranquilidade. Bulma cruzou os braços vendo fumaça saindo de sua boca.
A rampa da nave estava aberta, Kakaroto estava sentado na ponta da saída, curtindo o fenômeno astronômico na mesma intensidade que ela. Se aproximou amigável.

- Bonito, não?
- É. - respondeu, sem olhá-la nos olhos. -Bonito de te deixar sem fôlego.

A mulher subiu pela lateral do metal para se sentar ao lado dele, mais relaxada. Pixel estava aconchegada no interior da nave, dormindo. Isso fez a azulada sorrir, achando-a a criatura mais fofa da galáxia. Kakaroto parecia bem mais receptivo do que nos outros dias então decidiu aproveitar.

- Sabia que auroras boreais emitem sons? - perguntou de maneira retórica. - Quando as partículas solares que as formam entram em contato com o campo magnético da atmosfera uma interferência audível é gerada. Você só precisa ser muito atento para ouvir… dizem que parecem aplausos.

E ela ficou em silêncio absoluto junto do rapaz, como se de fato esperasse ouvir alguma coisa. Enfim, isso fez Kakaroto a fitar por alguns segundos.

- Cabelo curto fica bem em você. - ele comentou, chamando a atenção dela.
- Oh... - tocou nas madeixas recém cortadas, sentindo falta do antigo volume. - Você acha mesmo?

Ele acenou e ela sorriu. Ser elogiada fez bem para sua alta estima e ergueu seus ânimos.
Não soube bem o que a levou a falar sobre aquele assunto, mas foi instintivo:

- Por que você é adorável? - segurou os joelhos, sentindo frio. - Esses dias Vegeta disse que saiyajins estão mais interessados em compartilhar genética do que se apaixonar, mas tenho certeza de que qualquer garota saiyajin se apaixonaria por você. - comentou. - Mesmo que não faça parte da sua cultura...

A frase deixou Kakaroto cheio de interrogações. Ele? Adorável?
Porém, logo encontrou a motivação por trás das palavras quando uma lembrança invadiu seus pensamentos.

"Sou da realeza, é minha obrigação perpetuar minhas origens e quando esse dia chegar é esperado que eu busque uma saiyajin capaz de me dar guerreiros dignos. Se não fosse por isso eu faria questão de não decorar o nome das fêmeas do distrito real, parceiros são apenas sinônimos de atraso e fraqueza.", a declaração de Vegeta ecoou em sua mente.

Isso pareceu decepcioná-la e Kakaroto ainda não conseguia encontrar uma razão sólida para a frustração dela. Não devia ficar surpresa, afinal, era de Vegeta que se tratava; ele tinha responsabilidades reais e era moldado para pensar daquele jeito.
Mas mesmo assim... ele também prosseguiu a conversa por ímpeto.

- É difícil para mim concordar com isso. Eles se amavam, sabe? - soltou inconscientemente.
- O que? - e a terráquea se confundiu. - Quem?
- Meus pais. - revelou. - Eles se tornaram parceiros porque tinham sentimentos um pelo outro, diferente dos outros casais.

Isso atiçou a curiosidade da moça, que o fitou como se quisesse ouvir tudo à respeito daquilo. O rapaz piscou algumas vezes e voltou a olhar para as auroras.

- Em Vegeta-sei encontrar parceiros para formar família é um investimento. A forma que a natureza age durante a concepção é implacável, mas já estávamos em uma época aonde podíamos selecionar o melhor óvulo e o melhor espermatozoide, então os nobres sempre estavam à procura de guerreiros do alto escalão e fêmeas com boa predisposição genética para compartilhar genes. O resto, era resto. Crianças fortes e saudáveis são como uma pequena fortuna.

Isso parecia dizer bastante à respeito do próprio nascimento de Kakaroto, imaginou Bulma. Ele sempre disse que não foi uma daquelas crianças afortunadas...

- Meu pai era do alto escalão e ganhou nobreza depois de inúmeras batalhas sucedidas, ele literalmente podia escolher a fêmea que quisesse para ter filhos, mas nada o fez desistir de minha mãe. Na verdade, ela sempre diz que é como se ele tivesse implorado para ser escolhido por ela. - sorriu, como se fosse uma lembrança bem humorada. - É nítido que parceiros com vínculos tem uma convivência mais duradoura. Porém, como já disse, as vezes a natureza da concepção continua implacável. E eu nasci para provar isso.

Raditz era relativamente forte para ser considerado um guerreiro de elite, mas não tiveram a mesma sorte com o segundo filho.

- É por isso que poucos saiyajins se permitem seguir instintos como o amor. Ter baixo poder de luta é um tabu, uma mancha na linhagem. - explicou. - Se torna a sua fraqueza e maldição, mas... parece que na imensidão, só o amor te faz suportar ser pequeno diante de tantas situações fora do seu controle.

Talvez fosse a coisa errada a se acreditar para aqueles homens que só conseguiam enxergar a guerra, mas Bulma não se opôs à Kakaroto. Afinal, o amor que sentia por sua família a levou até ali. Foi um dos pilares poderosos que a sustentou para que continuasse de pé.

- Quando eu era criança me perguntava constantemente se um dia poderia ser amado por meu pai. - o rapaz recordou-se de Bardock, falando dele com naturalidade como raramente fazia. -Ele pode ter sido infeliz com algumas de suas escolhas e atitudes, mas ele nunca desistiu de mim. Nem por um segundo. Amar não se resume apenas a palavras, certo? Queria poder ter sido menos ignorante para enxergar isso antes, mas suponho que a ordem de acontecimentos corroboraram com a minha cegueira.
- Provavelmente. - a azulada concordou, ciente da situação.

As faixas horizontais continuavam espalhadas pelo céu, divididas em pontos de luz azuis e amarelos que se misturavam aos poucos simultaneamente de um jeito magnífico. Bulma deu um suspiro com a vista, encantada.

- O amor é poderoso. Transcendente, inconstante e puro... talvez uma das forças mais poderosas que existem. - Kakaroto concluiu. - Um dos únicos sentimentos que fazem a natureza e o orgulho parecerem pequenos.

Por algum motivo isso fez o rapaz pensar em Raditz.

Apesar de concordar, as duas últimas palavras atraíram a terráquea.
Natureza e orgulho. Por que ele precisava usar justo aquelas duas que descreviam aquela pessoa tão bem? Era até como se Kakaroto soubesse o que ela queria ouvir.
Bufou e se endireitou, mudando o foco.

- Acho que tem razão. - esfregou a testa, antes de olhá-lo de canto. -...você está bem?

A pergunta dela pareceu cautelosa. O rapaz deu de ombros.

- Vou ficar. - a voz saiu pouco receptiva, mas tratou de disfarçar. -Por ora vamos continuar vendo as auroras e pensando sobre Gilease. É a nossa próxima parada, certo?
- Sim.

A nave estava prestes a ser carregada, claro.
Logo estariam seguindo para Ludo e Tights para a Terra, numa direção completamente oposta. Apesar de achar repentino, Kakaroto não a questionou nenhuma vez sobre a finalização do plano que os levaria ao planeta de escravos. Ele pouco sabia sobre o rumo de acontecimentos já que havia ficado isolado aquele tempo todo, ainda assim, não pareceu contrário a nada apenas seguindo o fluxo de ideias.

- Estou finalizando o chip de sua antiga pulseira localizadora. Provavelmente vai precisar de um implante subcutâneo, para que os soldados não o encontrem. - a informou, antes que se esquecesse.- Mas não se preocupe, não vai doer e vai passar despercebido por radares.

Não era a primeira vez que Bulma implantava coisas em seu corpo, quando construiu a nave de fuga havia desenvolvido um sistema de ativação do motor parecido, ligado a sua pulsação para que Vegeta nem pensasse em passar a perna nela.
Ela acenou, divagando.

- Sabia que existem auroras astrais? - e surgiu com mais um de seus assuntos aleatórios repentinamente, quando o evento astronômico acima mudou de cor mais uma vez.

Kakaroto franziu o cenho, mas deixou que prosseguisse.
Finalmente estava começando a ficar farto de estar sozinho. Ainda bem.

- O que é uma aurora astral? - e a indagou.





Jaco encapsulou dois baús, usando as cápsulas disponíveis que tinha.

- Os mantimentos já foram. O que mais falta? - Tights anotava coisas em uma caderneta, perdida.
- Roupas! Você disse que ia dar roupas novas para sua irmã. - Chirai lembrou.

É verdade que Tights havia tido bastante tempo de viajar por inúmeros quadrantes com seu grupo, tendo contato com diferentes culturas e usufruído de muitos trajes e objetos - afinal, tinha cápsulas de sobra para ter um closet inteiro. Jaco a chamava de louca materialista, mas Chirai mesmo adorava os ataques consumistas da loira porque ganhava presentes.
Bulma reclamou em uma ocasião que sentia falta de ter mais de uma peça para usar, então Tights decidiu dar parte do que tinha. Agradaria a irmã e a ajudaria pessoalmente a deixar de ser uma acumuladora, diga-se de passagem.

- Estão separadas ali. - apontou para mais um dos baús metalizados, até onde Jaco se direcionou.
- Até que enfim se livrou dessas galochas horrorosas...
- Você usa um collant roxo pavoroso e nem tem um corpo bonito para exibir. Quem acha que é para falar de estilo?

O ex-mercenário achou um ultraje, enquanto Chirai ria compulsivamente.
Lemo fez uma negação, ajeitando seus objetos pessoais em seu saco alheio a parte da conversa boba dos companheiros. A tranquilidade monótona era uma de suas coisas favoritas.
Ele quase não notou Vegeta passando por ele, até então, praticamente invisível aos olhos do grupo de Tights. Se assustou com leveza, como se o saiyajin fosse uma entidade, mas o mesmo apenas o ignorou. Parecia estar com a mente em outro lugar.
Lemo franziu o cenho. Pensando bem, fazia uns dias desde que aquele saiyajin se mantinha mais distante do que o normal, preso aos próprios pensamentos. Se perguntou se todos os saiyajins eram daquele jeito. Logo, voltou a arrumar suas coisas.

O que Lemo não suspeitaria era que justamente naquele instante, a tormenta interior de Vegeta havia acabado de chegar ao fim.


Como poderia descrever? Foi como uma manifestação.
Vegeta não precisou meditar por muito tempo, sequer idealizar o nada absoluto para tentar chegar a algum estado de espírito metafísico... só aconteceu, como sentiu que seria. Se vangloriou por dentro, como se tivesse acabado de bater Kakaroto. O ambiente rochoso da caverna ficou mais vivido de repente, exatamente do jeito que havia ocorrido dias antes. As vozes ao redor foram se tornando distantes, como se estivessem em segundo plano.
Estava sentindo energia finalmente e isso o deixou regozijado. Enfim, quando sentiu a essência doce daquela energia tão pura outra vez, soube exatamente aonde devia ir.

A entrada da nave aonde Kakaroto e Bulma estavam parecia distante, mas isso não o impedia de senti-los tão perto. Não pareceram perceber sua presença na saída da caverna, portanto achou que seria melhor assim. Diferente da última vez que sentira o poder espiritual de Bulma, quando ela foi rondada pela morte, daquela vez podia afirmar que ela estava amena e aconchegada. A audácia de costume continuava ali em algum canto, mas a distração parecia dominar seus pensamentos profundos.

Desde o início o príncipe deserdado supôs que assim que sentisse energia rondaria Kakaroto primeiro para descobrir mais sobre o poder oculto dele, mas... nem mesmo tão próxima dele Bulma conseguia ter seu espirito ofuscado.
O rapaz comentara certa vez que algumas energias eram atrativas e mais fáceis de serem sentidas. Seria aquele o caso daquela terráquea que o deixava instigado?

O desejo de tocá-la pareceu aumentar, até então não havia a visto com o novo penteado. Era como se nada pudesse deixá-la menos atraente. Permitiu-se contemplá-la em segredo aquele momento, quando pode sentir ki apropriadamente pela primeira vez.

Ele sequer parou para pensar em Ludo, quando podia estar prestes à perdê-la.
Foi uma experiência calorosa e única da qual ele nunca se esqueceria.

As belas auroras mudaram de coloração mais uma vez. Por coincidência, azuis.


(…)





O dia alvoreceu.
A neve parecia brilhar do lado de fora da caverna. Bulma olhou para o céu sem nuvens por alguns minutos. Era dia de partir e dia de iniciar uma nova jornada.
Quando Kakaroto saiu do interior da nave, ficou nítido para a azulada que o modelo já estava aquecido para a partida. Foi mais rápido do que a moça gostaria, então não podia enrolar mais em sua despedida. Olhou para sua irmã e seus companheiros sorrindo de frente para ela, também prontos para seguirem seu caminho.

- Eu estive evitando pensar sobre esse momento. - a azulada deu de ombros, como se não soubesse ao certo o que devia dizer ou fazer.

Detestava separações. Sempre sofria antecipadamente e chorava muito, mas havia prometido a si mesma que aquele dia seria forte.

- Desde o início, encontrar minha irmã aqui foi como um tiro no escuro. Vê-la à minha frente ainda parece tão impossível... - piscou. - Imaginem para mim, supor que ela ainda estaria acompanhada do grupo mais receptivo, unido e leal de todos. Isso me acalenta e me deixa tão grata.

A terráquea segurou a borda de uma das mangas de seu casaco, tímida. Sentia que era terrível fazendo discursos em grupo, mas apenas deu voz ao que seu coração parecia transbordar.

- Eu me diverti passando cada minuto perto de você Chirai. Você é tão carismática e atenciosa. Todas as vezes que te vi trabalhando eu pude enxergar uma paixão genuína em cada uma das suas ações e isso me fez pensar muito em meu pai. Tights, Lemo e Jaco tem sorte de ter você.

A moça esverdeado pareceu envergonhada, como se não merecesse ouvir tudo aquilo. De toda forma, seu interior aquecido e alegre deixaram explícito para Kakaroto que ela havia gostado muito do que havia ouvido.

- E Lemo, apesar de calado, sempre que fala você exala experiência. Definitivamente sabe mais sobre como sobreviver do que qualquer um aqui e tem toda a minha admiração. Queria poder ter tido mais tempo para ouvi-lo, mas me instruiu bem até onde pode. Assim como o planeta de onde vem, você transborda calor por onde passa. - e sorriu terna. - Sou grata por ter tido a oportunidade de conhecê-lo.

E apesar de contrário à sua natureza, o coração frio de Lemo realmente pareceu transbordar de calor aquele instante, mesmo que ele não fosse bom em demonstrar isso.

- Jaco. - Bulma olhou para o companheiro mais falante do grupo de Tights. - Não conversamos muito, mas sei que é como uma estrela brilhante que sempre mantem os ânimos de todos lá em cima. Queria poder ter de conhecido melhor.

Diferente dos outros dois, este foi mais claro com o que pensava.
"Ouviram isso? Ela disse que quer me conhecer melhor.", e riu baixo, levando uma cotovelada do Makyan alaranjado ao seu lado.

- E claro, também queria agradecer à todos pela ajuda mais uma vez. Sem vocês a câmara nunca teria sido concluída à tempo e eu provavelmente ainda estaria longe de ir para Ludo encontrar meu pai. Espero conseguir retribuir minha dívida um dia.
- Que é isso... - Tights coçou a nuca. - Somos uma família aqui, não existem cobranças.
- Sim, fique tranquila! - e Chirai reforçou.
- Eu poderia aceitar alguns prismas. - Jaco disse sério e foi alvo de olhares incrédulos de Chirai, Lemo e Tights pela falta de cortesia. - Cedo demais? - e arqueou uma sobrancelha.

Ao menos ele arrancou algumas risadas, até Kakaroto deu um raro sorriso. Talvez ele e aquele ser estúpido tivessem se dado bem…
Algumas conversas triviais surgiram assim que Bulma acolheu os amigos de Tights em um abraço firme. Alguns pareceram confusos com o gesto pessoal, mas não a impediram.
A ideia terrível de que aquele podia ser um adeus absoluto ficou distante, mais parecida com um "Até logo." De repente as atenções foram dadas a Kakaroto, que mesmo isolado aqueles dias, não era menos importante. É verdade que ele achou todos muito estranhos.

Bulma riu leve e aproveitou o momento para se despedir apropriadamente da irmã.
Suspirou profundamente antes de se aproximar dela, até então distraída.

- E nos separamos de novo, felizmente, dessa vez de um jeito mais natural. - soprou a franja. - Isso me lembra aquele verão de 2010, onde passou suas férias escolares em um acampamento e me abandonou em casa.
- A diferença é que agora você está me abandonando. - e a loira sorriu de lado, segurando as mãos da irmã.
- Eu cresci.
- ... eu sei.

Elas apenas apreciaram a presença uma da outra um momento. Tights pareceu apertar um pouco mais suas mãos, geladas graças ao frio.

- Não se esqueça; assim que chegar a Gilease precisa ir direto até Zaacro e Raiti negociar. Seja cautelosa.
- Sim, você disse isso umas cem vezes hoje. - a azulada riu, fazendo mais fumaça escapar por sua boca. - Eles não vão ignorar meus prismas, fique calma.
- E esconda a cor de seu cabelo com gracha! - lembrou.
- Irei.
- Não deixem que descubra que é mulher.
- Vou fazer o possível.

Tights pareceu pensar em mais instruções das quais a irmã não se lembraria, mas as palavras lhe faltaram. Bulma sorriu amena.

- Eu sei que estamos em um universo selvagem mas, ... não vamos fazer parecer que isso é um possível adeus. Por favor.

A Briefs mais velha puxou a irmã contra si de repente para abraçá-la, assustando-a no ímpeto.

- Deus, não posso perdê-la. - sussurrou trêmula, enquanto lágrimas brotavam em seus olhos.

Bulma não conseguiu dizer nada, parada no tempo por aqueles curtos segundos que pareceram durar eras. Apertou as costas da irmã, demonstrando seus receios livremente enfim.
Ela não queria morrer. Não podia.
Quase se esqueceu de sua pequena promessa, perto de cair aos prantos.
Por fim, afrouxou o aperto, fungando o nariz e tocando a face de Tights para poder dar uma boa olhada em seu rosto.

- Posso te pedir um favor? - a voz saiu num fio, enquanto segurava o próprio choro.
- Qualquer coisa.

Bulma respirou fundo e deu alguns passos para trás, perto de onde Kakaroto estava. Olhou-a de soslaio, enquanto ela pegava aquela gaiola ao chão. O saiyajin sentiria falta daquela figura que havia sido sua melhor companhia naquele período sombrio de sua vida, mas se a terráquea achava que tomar aquela decisão era a melhor coisa a ser feita, apoiava.

- Uau... um gato? - Tights ficou surpresa. - Achei que nunca mais veria um.
- Essa é a Pixel. - apresentou a gata malhada à irmã e aos outros. - Ela tem sido parte do trio desde sempre. É um pouco preguiçosa, mas garanto que é uma boa companheira.

A loira fitou o felino, acariciando o topo de sua cabeça manchada. Ela a cheirou um pouco, mas como era uma gata dada aproveitou os agrados que recebeu. Chirai observou a criatura de longe, tentando entender o que era. Jaco e Lemo não pareciam diferentes.

- Por mais que eu esteja tentada a continuar a levando comigo, Ludo muda esse cenário otimista da viagem. Fico receosa de colocá-la em risco também.
 

Era compreensível. Nem tudo estava ao alcance de Bulma e seria melhor se Pixel não estivesse com eles no planeta escravista.

- Então, assim que nos reencontrarmos... - fez uma pausa leve, respirando cheia de ideias pessimistas mas que logo foram afastadas. - vou pegá-la de volta. Não se preocupe com a comida, temos tudo o que ela precisa de sobra.

- É claro que vou cuidar dela. - e Tights a acalentou, pegando a gaiola. - Então bichano, pronta para ir para a Terra? - e sussurrou, adorando o animal.

"Essa coisa entende o que elas falam?"
"Não faço ideia."

Os companheiros alienígenas de Tights continuavam perdidos.

- Espere por mim. Vou morrer de saudades... - Bulma se despediu de sua gata como se estivesse dando mais um pedaço de seu coração para a irmã.

Será que engordaria mais? Aprenderia a saltar mais alto?
Deixou as questões em aberto por enquanto, mais nostálgica com as lembranças felizes que havia armazenado com a gatinha. Seria melhor assim...
Kakaroto havia chamado Pixel de gorda e preguiçosa uma última vez. Sabia que o animal estaria em boas mãos.

- Então é isso. - a azulada juntou as mãos. - Acho que é hora de ir.

Enfim foi a vez de Vegeta surgir através da rampa da nave. Parou bem na entrada, como se apenas esperasse a terráquea e o outro saiyajin. Ele não fez tanta questão de se fazer presente, achava demonstrações de afeto longas demais irritantes, mas ninguém se incomodou. Aqueles dias na caverna deram tempo para o grupo de Tights perceber que aquele era o jeito do príncipe deserdado.

"Cuidem dela!", Bulma ouviu Tights dizer à Kakaroto, quando chegou sua vez de se despedir. No entanto, parecia mais distraída olhando para Vegeta com as mãos na cintura.

- Você não vai nem ao menos agradecer? - o indagou.

Podia estar sempre em conflito quando o assunto era ele, mas jamais deixaria de demonstrar o que pensava das atitudes dele por isso. O saiyajin pareceu tensionar o maxilar e a fitar com seus perigosos olhos semicerrados, mas ela não pareceu nem um pouco intimidada.
"Como é irritante.", pensou.

Porém antes de pensar em se retirar e a ignorar, o saiyajin pegou a todos de surpresa quando abaixou as mãos e curvou o tronco com leveza, como se fizesse uma reverência.
Permaneceu assim por alguns segundos e enfim se ergueu, arqueando uma sobrancelha antes de olhar para a garota.

- Satisfeita?

E foi embora, sem esperar por um veredito de fato.
Bulma sorriu e voltou a olhar para a irmã e os amigos, como se tivesse controle sobre o homem sem notar Kakaroto enrugando a testa, incrédulo. Para a realeza saiyajin, se reverenciar para pessoas em posições inferiores era um ato nobre de respeito mútuo. Simplesmente, a maior das honras. Cruzou os braços e riu sozinho. O príncipe finalmente estava aprendendo alguma coisa sobre companheirismo e retribuição…

- Vamos. - e tocou Bulma nas costas, para que partissem enfim.

Subiu os primeiros centímetros da rampa, enquanto ela o acompanhava acenando uma última vez. O peito de Tights pareceu se comprimir, assim como o de Bulma.
Se afastaram aos poucos, sem perder uma a outra da vista.

- Diga à mamãe que estou bem. - avisou num grito, enquanto a rampa começava a subir e as turbinas se moviam fazendo barulho. - Nós vamos voltar a nos ver Tights! Vamos nos encontrar com a família completa!

A promessa era presunçosa e vazia, sem quaisquer resquício de certeza e alívio. Mas a loira deixou de dar ouvidos ao seu lado racional, como se o que Bulma dissesse fosse uma previsão do futuro.

- Sim, nós vamos! - gritou de volta.

A imagem de Tights sorrindo com os olhos brilhando ficariam gravadas na memória da Briefs menor. Seu coração disparou e enfim, deixou uma lágrima silenciosa escapar pelo canto de seu olho. Sorriu e a limpou depressa, sem poder mais controlar todo o pranto que veio á seguir.
Ao menos ela conseguiu ser forte até onde precisou.


O aeromodelo prateado saiu da atmosfera finalmente, os levando mais uma vez para o inóspito e silencioso espaço. Era hora de voltar á realidade e enfrentar o caminho árduo pela frente. Finalmente.





Contudo, aquele não era um dia de despedidas apenas para o trio naquele planetoide gelado. Na capital, há milhares de quilômetros dali, uma nave cruzeira terminava de ser preparada também.

-... o buraco de minhoca até o quadrante L vai cortar grande parte do trajeto, meu lorde. - um funcionário do império repassava os detalhes finais mais uma vez ao imperador, perfeccionista e impaciente.

Freeza não precisava de armaduras, seu corpo em sua costumeira fase final era como uma. Era por isso que as concentrações em seu preparo eram voltados exclusivamente à sua poltrona móvel, aonde sempre estava.
Coola surgiu perto da plataforma, acompanhado de Zarbon. Queria estar presente durante a partida do irmão. E este, o fitou descaradamente quando apareceu.

- Fico contente que tenha repensado sobre as colônias, querido irmão. - o Changeling de cor roxa disse ao se aproximar. - Não é todo dia que um quadrante inteiro tem a honra de tê-lo por perto, não? Me pergunto o que pode tê-lo feito mudar de ideia...
- Zarbon. - e Freeza cortou Coola de propósito, que só sorriu como se não se importasse em ser ignorado. - Cuide da capital durante minha ausência.
- Sim meu lorde. - e o general se reverenciou. - Obrigado por confiar tal tarefa à mim.

Receber a honra de comandar a capital não era para qualquer um.
Zarbon sempre se perguntou porque Dodoria havia tido aquela oportunidade primeiro e não ele, mas era nítido, Freeza preferia tê-lo por perto ao invés do ser rosa irritante.
Devia mesmo querer estar sozinho para não chamá-lo a expedição ao quadrante L…

- Vá terminar a contagem de tripulação.
- Sim senhor. - e se retirou, deixando os irmãos lagartos a sós.

Coola observou Freeza, que parecia analisar o painel de sua máquina.
Não haviam palavras a serem trocadas entre si além de farpas. Infortunadamente aquele dia não havia bolado nada para provocá-lo, satisfeito demais com o rumo da situação.
No entanto, foi surpreendido:

- Pode continuar a mover Zarbon por aqui, ele vai precisar. - o imperador soltou. - Mas, saiba que se me der algum motivo para desconfiar de sua boa vontade ao me afastar da capital, está morto.

A ameaça não era um blefe. Freeza nunca precisava blefar.
O olhar de Coola congelou um segundo, realmente sentindo a morte por perto... mas rapidamente passou.

- Como se alguma vez eu já tivesse o dado motivos para isso. - debochou. - Fico honrado. - e se reverenciou frivolamente, bem diferente de Zarbon.

O silêncio de Freeza foi sepulcral.
Assim que a revisão de seu assento estava pronto, se preparou para entrar na nave, enquanto os soldados do palácio que iriam para a expedição se alinhavam à espera do imperador respeitosamente.

- Dê motivos para fazer família parecer sagrado. - foi a última coisa que disse, antes de partir.


Parecia ter exagerado ao tocar no ponto sensível, dias atrás...

Coola observou a nave cruzeiro sumir na linha do horizonte, provavelmente junto de todo o planeta. Moveu a calda com leveza, deixando-a ereta na extensão e curva na ponta em sinal de alacridade. Enfim, tinha a capital em suas mãos.

Seu irmão ficaria feliz com sua liderança?


Notas Finais


Ano retrasado eu fiz um super texto nas notas finais do último capítulo de 2019 de amostra sobre o quanto aquele ano não havia sido fácil, mas então, 2020 chegou numa voadora arrasando os planos e sonhos de todos em escalas mundiais.
O vírus, o isolamento social, pessoas surtando...
Ninguém saiu com o psicológico inteiro. Em especial, os últimos meses de 2020 foram uma bosta pra mim. Foi tipo, O AUGE, pra encerrar o ano com chave de ouro. Aconteceu de tudo; consegui um trampo q me deixou cansada demais pra continuar a fic, entrei em uma depressão fodida, a fonte do meu PC queimou e ainda fiquei super resfriada na virada do ano - pq desgraça é sempre pouca. Eu ainda não tenho lá grandes expectativas pra esse novo ano q chega e queria poder ser mais otimista por aqui, mas ñ custa nada ter esperanças. Espero q 2021 possa ser mais feliz...
(E antes q alguém se preocupe comigo, já tá td ok, vida q segue)

Vamos ao capítulo:
QUANTA COISA! Ñ é à toa q demorou uma eternidade pra ter atualização.
Apesar da presença mais apagada, eu gostei de escrever todas as cenas em q o Kakaroto está. Esse foi um capítulo mais focado nos pensamentos dele, então espero q todo mundo tenha conseguido dar uma boa visualização da pessoa q ele é. Ele ainda tem tantas inseguranças, mas ao mesmo tempo tá tentando ser melhor nesse aspecto, e ainda assim está precisando lidar com a perda do irmão. Tudo isso vai moldar ainda mais a personalidade dele, então daqui pra frente vcs conhecerão novos lados dele.
Ludo está próximo, FINALMENTE! E isso não podia deixar Bulma mais... receosa. Tudo indica q a ida as colônias ñ trarão lembranças memoráveis, mas esse será o preço a ser pago para q ela encontre o próprio pai. E em meio á todos esses perigos, enfim, tivemos muitas brechas para focar no VEGEBUL.
EU AMEI DESENVOLVER TODAS ESSAS CENAS!
A Tights pressionou tanto a Bulma q ela ñ conseguiu mais se esconder huashusa. É OFICIAL, nossa azulada sabe q tem alguma coisa no coração dela q clama pelo Vegeta, mas é orgulhosa demais para dizer em voz alta. E Vegeta... eu acho q ele é tão orgulhoso q na vdd nem sabe q pode haver um sentimento a mais além de desejo por Bulma no peito dele.
E por citar o Vegeta,ELE SENTIU KI! Ok, pode ter soado meio repentino e vago se for comparar como aconteceu com o Kakaroto, mas achei q seria melhor assim - bem instintivo. E no mais, no próprio anime ñ é explicado exatamente como o Vegeta aprende a sentir energia depois da visita à Terra, só acontece. De toda forma, gostei de seguir nesse formato.
Gostaram da introdução dos novos personagens? Tivemos muitas perspectivas...
Oq falar da Tights? Ela é como uma versão mais resolvida da Bulma hshsua. O jeito q ela confrontou o Vegeta tantas vezes foi mara kkjk. Lemo, Jaco e Chirai tbm são adoráveis! Foi muito bom dar esse acréscimo ao trio e fazer todos eles parecerem um único grupo.
Pixel, infelizmente está fora da jornada :(, mas foi um mal necessário.
Tbm houve um momento em q apresentei sutilmente novos personagens importantes para a saga "Ludo". Ainda tenho pouco a escrever sobre eles aqui, mas serão personagens recorrentes por enquanto daqui para frente. (Inclusive, curti muito acrescentá-los na fic agora)
E finalmente, mas não menos importante, FREEZA!!! Eu tenho planos de dar um destaque em um capítulo futuro para os irmãos lagartos, para que possamos conhecê-los de uma dimensão mais profunda. A certeza é uma só: o clima entre os irmãos lagartos ñ é dos melhores. Alguém aqui confia no Coola?
Só digo uma coisa: essa saidinha do Freeza promete.

Por enquanto, o próximo capítulo está em desenvolvimento, mas já aviso aqui q será um capítulo curto - apenas de conclusão. Mas em especial, um capítulo muito legal q tenho idealizado há tempos. Ansiosa!
Espero q tenham gostado da narrativa, dos novos personagens...
Me digam oq acharam nos comentários, por favor. Gosto muito de saber oq tem achado da trama e do desenvolvimento dos personagens. Acho q hj tem bastante coisa para listar né? Kkkkk (até fiquei com dor de cabeça aqui)

Bjos e - por favor, Deus - um ótimo ano à todos!
(e perdoem os erros, provavelmente passados despercebidos - depois de 50 páginas vc fica meio tonto).
Até a próxima atualização :D


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