Gilbert já estava de banho tomado, e devidamente vestido. Passou pela sala sob o olhar de Sebastian que tomava o café por alí sem cerimônia alguma. Mesmo agora morando a algumas casas de distância com Muriel, ele não abondonou o trabalho na fazenda.
A princípio os dois discutiram sobre essa volta ao trabalho, e ele acabou dizendo que nunca permitiria viver somente com o salário de professora da esposa. Senhorita Stacy acabou trocando a palavra "esposa" no discurso, por "mulher" invertendo o sentido e tomando como uma ofensa disse energicamente por exatos três minutos o quanto mulheres poderiam ser capazes de manter uma casa melhor que muitos homens.
Sebastian a duras penas explicou que não quis dizer isso, ou desmerecer a função dela, e somente queria voltar a trabalhar nem que fosse para se sentir últil e auxiliar nas despesas domésticas, pois fora o trabalho como marinheiro no porão de um navio, o trabalho braçal nos campos, ainda que não fosse perfeito nisso era tudo o que sabia fazer. Assim ambos se reconicliaram as coisas voltaram a normalidade.
Gilbert parou sobre o carpete e se abaixou perguntando:
_ Bash, viu o canivete que ganhei no natal por aí? Preciso dele para abrir um lacre impossível.
Olhou por entre as frestas do sofá, o outro o encarou do cômodo intercalado a sala com uma feição risonha e respondeu:
_ E eu sei lá. Esqueceu que não moro mais aqui?
Gilbert revirou os olhos um pouco vermelho e riu:
_ Não me diga.
Sebastian assoprou a xícara e balançou a cabeça:
_ Por que não procura na cômoda do seu quarto? A da janela? Você sempre larga quase tudo lá.
_ Tem razão... Ah quer saber? Eu procuro isso quando voltar, já está ficando tarde.
Se virou e apanhou as chaves, resolveu que não vestiria a boina, e encarou o embrulho que Juddy comprou, nem se deu ao trabalho de saber o que era porém confiou no gosto de uma garota de verdade. Antes de sair pediu:
_ Tranque a fazenda para mim Bash por favor.
_ Tudo bem, - respondeu o homem._ Divirta-se!
A última parte já não foi ouvida, Gilbert ia longe , tinha ficado de buscar Anne em Green Gables e dali iriam direto para a festa.
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Diana ajeitou o penteado daquela noite. Um irrepreensível coque preso por grampos de pérola na metade da cabeça, com cascatas de cabelo negro jogadas para a direita propositalmente emoldurando o rosto. Carregava um camafeu de uma espécie de pedra branca no pescoço, e poria singelos brincos também de pérolas.
Rubby a esperava na varanda, Moody e Charlie passariam de carruagem para apanha-las. Não teria acompanhante hoje, mas sabia que aquilo era mero detalhe, muitos convidados iam sem um par e cediam uma ou mais danças a outra pessoa. Estava tão bonita, tinha tudo para ser uma noite divertida, mas a conversa que teve com Jerry na manhã do dia anterior ainda perturbava seu juízo.
Quando contou sobre suas suspeitas, a princípio ele ficou decepcionado, perplexo, o que não durou muito dando espaço a tristeza e a preocupação de como remediar aquela situação agora. Concluíu que o jeito era pagar outra vez a mensalidade perdida e rezar para que essa fosse aceita.
Diana não aguentou vê-lo naquela agonia, deu o apoio que pôde mesmo sabendo não ser o suficiente. E enquanto o abraçava seu senso de justiça queimava dentro de si. Foi embora cedo esperando encontrar o pai em casa para confronta-lo.
No entanto, não foi possível, ao que parecia ele Mine May e sua mãe foram visitar um conhecido da família. O que adiou a conversa, mas não contribuiu para diminuir sua raiva pelo acontecido. Agora concentrada em procurar o feixe do brinco suas mãos estagnaram ao escutar a voz dele irrompendo atrás de si:
_ Espero que volte cedo.
Girou lentamente e sem tirar a atenção do brinco, se dirigiu ao gancho próximo a fim de pegar o xale, passando pelo pai como se fosse mais um dos móveis:
_ Eu sempre volto. E mesmo que não voltasse, você não poderia fazer muito.
William deu uma risada sarcástica e respondeu:
_ Seu namoradinho já sabe muito bem o quanto eu posso fazer. Se eu fosse você tomaria como exemplo.
Diana respirou com força, com os olhos faiscando de raiva virou de uma vez:
_ Então assume? Assume que foi você quem contactou Sr. Campbell para impedir que o pagamento da mensalidade da faculdade de Jerry fosse negado? O que pretendia com isso papai? Sabotando os sonhos de um inocente que trabalhou justamente para conseguir o direito de ter uma boa educação?
Despejou as acusações sem poupa-lo. Ele não merecia. O homem deu de ombros como se não tivesse sido atingido e respondeu:
_ Parte da culpa disso é toda sua. Eu disse que não mediria as consequências se me desobedecesse e continuasse a se encontrar com o moleque.
Ela fechou os olhos e os abriu incrédula.
_ Primeiramente ele não é um moleque. Jerry é um homem, mais homem do que muitos hipócritas que conhece, e me perdoe papai, mas não vou mais tolerar que tente atingir as pessoas que eu amo para me fazer ceder aos seus caprichos. Não vou me casar com o filho de nenhum dos seus amigos e nem serei negociada. Peço por favor que comece a me tratar como uma igual, e se me permite já é tarde, meus amigos estão me esperando.
Assim sendo segurou firme as barras do vestido e saiu, fechando a porta com o maior auto controle para não bate-la. Rubby a olhou preocupada e perguntou gentilmente:
_ Tudo bem Diana?
Moody ao seu lado lhe lançou um olhar de piedade. Provavelmente tinham escutado a discussão, os olhou, estavam tão bonitinhos aquela noite como um casal de porcelana. Sorriu e respondeu:
_ Está sim, vamos. Estamos atrasados.
Concordaram com a cabeça e Charlie caminhou na sua direção estendendo o braço e educadamente a ajudou a subir na carroça. Pegou as rédeas do cavalo e assim os quatro partiram.
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Kakweet vinha pela estrada com a caixa nas mãos. Só conseguia pensar como detestava o frio, estava louca para chegar de uma vez a festa e entrar em um cômodo aquecido. Apertou mais o poncho elegante que usava, uma das poucas peças de roupa que realmente pediu a tia Josephine para comprar.
Aderida pelos brancos, um poncho que mais tarde cairia no gosto das senhoritas, era o suficiente para combinar qualquer roupa. E para alguém que não tinha paciência para pensar muito na toalete embora a mantesse impecável, era uma mão na roda.
O seu era de veludo, azul com lírios bordados nos ombros com fios prateados e uma borda de camurça confortável, e o mais importante, a ajudava a sobreviver aquela ventania.
Umideceu os lábios, sua cara deveria ter passado do bronzeado natural para um vermelho irritante que cobria até mesmo seu nariz. De longe escutou o tote rápido de um cavalo.
Apertou o passo, com medo de quem poderia ser. Mas logo escutou um timbre grave que penetrou seus ouvidos e relaxou seus músculos:
_ Hana, espere.
Billy parou ao seu lado, e acalmou o animal sem deixar um minuto de olha-la nos olhos:
_ Onde vai?
Kakweet sorriu e o ar quente escapou em fumacinha dos seus lábios:
_ Então quer dizer que ganhei uma babá?
_ Não seja irritante.
Ele fez um biquinho inconsientemente que o deixou parecendo um menino sapeca. Ela riu mais e explicou:
_ Estou indo para a festa.
Ele ficou sério, e ela observou o seu olhar ir até o embrulho nas suas mãos, agora sem sacola alguma que o escondesse. Pensou que ele iria embora, porém o que disse a surpreendeu:
_ Suba aqui. Eu te levo.
_ Como?
_ Eu te levo.
Respondeu tediosamente como quem responde 1 1=2 . Kakweet ergueu uma das sobrancelhas claramente desconfiada e disse:
_ Mas você não vai a festa. Não tem por que desviar do seu caminho para me levar.
Billy bufou e se mexeu sobre o cavalo:
_ Acho que não preciso de uma desculpa para acompanhar a "minha" namorada e deixa-la em segurança.
O modo como ele disse "minha" com uma espécie de ênfase quase possessiva, fez com que um arrepio acariciasse sua coluna. Ainda tentou argumentar:
_ Não é como se eu correse o risco de ser atacada daqui ali...
Na verdade era sim, mas ela não iria dar esse gostinho de informção. Billy puxou a corda de modo que o casco do cavalo agitado golpeasse a neve:
_ Eu vou te levar por que quero, agora deixe de ser birrenta e venha de uma vez.
Estendeu a mão , ela pensou um pouco e deu o braço a torcer subindo no cavalo também. Com o embrulho cheio de fitas no colo se encostou a ele achando a posição familiar. Ele passou os braços ao redor da sua cintura e em torno dos seus ombros para pegar as rédeas mais uma vez.
Aquilo foi curiosamente eficiente para espantar o frio por completo. Billy sem que ela esperasse beijou o lóbulo da sua orelha de modo a que se contorcesse inteira e disse baixo:
_ Você não é nem um pouco romântica sabia? Isso é frustrante, outras moças achariam encantadora a idéia de serem levadas em um cavalo branco.
Ele estava aprendendo a ser um provocador e tanto. Kakweet jogou a cabeça para trás e reprimiu um grunhido, suspirando, tirou uma mecha do cabelo da testa e rebateu:
_ Primeiramente o cavalo nem é branco Billy. E em segundo lugar você realmente não prefere as românticas se não não estaria comigo.
Ele entortou a cabeça sorrindo e disse;
_ Realmente o cavalo não é branco. Mas não é a sua amiga Anne que diz que devemos usar a imaginação?
Foi irônico. Kakweet riu e respondeu:
_ Eu adoraria te mostrar tudo que eu imagino querido, mas o convite marca as sete horas.
Billy soltou um resmungo, e ela deu um sorrisinho vitorioso. Ele tocou o animal e assim partiram pela trilha que cortava a floresta.
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