– Eu acho melhor vocês ficarem perto de mim!! – Dee passou um braço em torno do pescoço de Nathaniel e Iris. – And try do not scream!!
Ela colocou o tubinho na boca e soprou. As bochechas ficaram vermelhas de tanto soprar naquele tubinho prata. Nath olhou para Iris que respondeu com um levantar de ombros leve, indicando que também não sabia o que estava acontecendo.
– Isso quer dizer que esse negócio aí não é uma bomba? – Iris ficou olhando para a garota enquanto os tiros voavam de um lado para o outro e as coisas explodiam ao redor deles. – Se for, ela tá quebrada!
– Acho que um apito quebrado vai nos ajudar agora e…
Então as janelas, que ainda estavam inteiras do galpão, explodiram quando alguns cães policiais entraram pulando e latindo, partindo para cima dos bandidos. O som dos latidos misturados aos tiros eram ensurdecedores e isso garantia que os cães ficassem ainda mais irritados. Os bandidos agora corriam em desespero para fugir dos cães e abandonavam suas coberturas, o que os tornava um alvo fácil para os tiros dos agentes de segurança.
Iris ao ver aquele monte de cães enormes pulando e correndo abriu a boca para berrar de susto, mas Dee a segurou. Ela entendeu que aquilo fazia parte do plano de Dee. Ela só não sabia o que aconteceria depois daquilo. Ela acenou com a cabeça para saírem dali e irem em direção a uma das portas. Nathaniel, mesmo machucado, decidiu que era mais rápido carregá-la no colo do que esperar ela correr com a perna machucada e mancando como estava.
Cookie parecia liderar o ataque dos cães de forma coordenada e precisa. Sempre que algum dos traficantes estava prestes a atirar contra outro cachorro, algum deles pulava e mordia o braço armado do bandido. Os mais inteligentes se escondiam em algum canto, largavam as armas e ficavam chorando e implorando pela vida. Os outros se arrependeram de não fazer isso na hora que Dee berrou:
– COOKIE!! HORA DO ALMOÇO!!
Os gritos que vieram a seguir indicaram que os cães sabiam exatamente onde morder para causar o máximo de dano. Do lado de fora, os atiradores pararam de disparar e olharam para Armin e Dean confusos.
– Minha unidade K-9? – Dean ficou olhando para os cães correndo e pulando sobre os bandidos. – NÃO ATIREM NOS CÃES!! ELES NÃO SÃO ALVOS!! O Kentin vai me quebrar em dois se um deles sair ferido.
– Senhor… tem um veículo aproximando-se em alta velocidade do galpão!! – um dos atiradores apontou a arma na direção em que o carro estava. – Ordens?
– Espera! – Armin pegou a arma do atirador e mirou em direção ao carro, olhando através da lente telescópica. – Isso só pode ser zueira…
– O que? – Dean pegou a arma de Armin e olhou também. – Eu vou matar a Dee. Eu juro que vou…
Do lado de dentro…
As balas continuavam zunindo por sobre a cabeça de todos, enquanto os bandidos faziam o possível para se proteger dos atiradores e dos cães. Dee, Nathaniel e Iris continuaram correndo em direção a saída mais próxima tentando ignorar o perigo ao redor deles. Foi a hora dos agentes da DPSD entrarem e, como Armin disse, até pelos esgotos.
Homens fortemente armados e com coletes de proteção desciam de rapel, invadiam por janelas, caindo em cima dos bandidos e os rendendo no mesmo instante. Alguns eram imobilizados e algemados com lacres plásticos resistentes e outros, mais teimosos, eram “colocados para dormir” com um golpe bem aplicado na cabeça.
Eles corriam em direção a porta, quando viram um dos bandidos escondido atrás de uma caixa pronto para atirar nos agentes da DPSD pelas costas. Dee enfiou a mão no bolso e entregou algo para Iris.
– Pedra da sorte da Chani!!!
Iris não pensou muito e jogou a pedra certeira na cabeça do bandido que caiu com um filete de sangue escorrendo da têmpora. O agente da polícia olhou a situação e fez um sinal de positivo para a ruiva. Quando estavam perto de chegar a saída, um dos bandidos parou em frente ao trio de estudantes da Anteros e apontou a arma pra eles.
– NENHUM DE VOCÊS TRÊS SAEM DAQUI!! – o cara berrou com a arma engatilhada, mirando em Dee, mas, um barulho estranho vindo do lado de fora chamou sua atenção. – O que é isso?
BLÁM
O carro de Rosalya invadiu com tudo o galpão, derrubando a porta de aço em cima do bandido. O rapaz ficou preso sob o metal e mal teve tempo de gritar antes de perder a consciência. Dee desceu do colo de Nathaniel e correu em direção ao carro, abrindo a porta traseira e indicando para que Nathaniel e Iris entrassem. Rosa colocou a cabeça para fora da janela e encarou Dee.
– EU NUNCA VOU TE PERDOAR POR ENCHER O MEU CARRO DE CACHORROS!! Esse cheiro não sairá nunca mais!!
– Vender ele pra uma pet shop!! – Dee respondeu. – Quick!! Quick!! Enter!!
Iris correu para o banco de trás e entrou no carro. Nathaniel foi logo em seguida e Dee bateu a porta.
– Dee!! – Iris gritou de dentro do carro. – Entra! Vamos embora daqui!! Dee… você não tá pensando…
– I need finish this! – Dee trancou a porta. – Rosa… let’s go!! Levar eles daqui!
– NÃO, DEE! NÃO!! – Iris tentou abrir a porta, mas Rosalya já havia travado e estava acelerando. – DEE!! NÃO!! NÃO!!
Dee correu para pegar a arma do bandido atropelado por Rosalya enquanto ela acelerava com o carro de ré e fugia daquele lugar. Agora Dee estava novamente em meio ao tiroteio entre traficantes, policiais e cães. Ela soprou seu apito de cães e reagrupou seu esquadrão canino para abrir passagem até os reais culpados daquela situação. Rayan e Culaan.
Os dois líderes haviam decidido deixar o lugar logo no primeiro momento em que os tiros começaram a entrar pelas janelas. Culaan saiu na frente com Rayan logo atrás dele, subindo as escadas em direção aos escritórios nos andares superiores. Rayan dava cobertura a fuga, atirando em qualquer um que aparecesse por entre os corredores.
– Espere… espere! Aqui… vamos levar tudo!! – Culaan correu até um cofre e rapidamente abriu a porta, eme pegou a primeira valise que encontrou e começou a jogar dentro todo o dinheiro que conseguiu. – Me ajude aqui! Vamos levar o dinheiro!!
– Não temos tempo! Deixe isso ai!! – Rayan segurou Culaan pela gola do cardigan e tentou puxá-lo para longe do cofre, para que continuassem fugindo. – Vão pegar a gente aqui!!
– Não vou deixar meu dinheiro!! – Culaan se soltou do professor e voltou a encher a maleta. – Vou levar alguns títulos também! Tenho que levar tudo o que puder!
Dee teve de passar por cima do corpo de alguns dos agentes feridos para perseguir os dois líderes até chegar a um espaço aberto, com algumas caixas espalhadas. Parecia um segundo deposito, provavelmente onde eles guardavam o matéria-prima que seria usado pra produzir os tóxicos. Didra entrou, mas rapidamente voltou para o corredor quando ouviu o estampido do tiro em direção a ela.
– É você, O’Connel? – a voz de Rayan ecoou pelo galpão. – Acabou. Você venceu, aproveite sua vitória e vá curtir a sua garota! Nós veremos na próxima aula…
Ambos correram para o que parecia ser um tipo de plataforma elevada. Uma espécie de elevador que terminava em um grande buraco quadrado no teto do galpão a cerca de dez metros de altura do chão. O som de um helicóptero aproximando-se do lugar deixava claro as intenções deles. Eles tentariam fugir pelo ar. Não daria tempo dos policiais chegarem ali. Ela precisava impedi-los ali mesmo.
– No next class for you… – Dee pegou sua bengala e arremessou para dentro do galpão, distraindo Rayan que atirou em direção ao barulho. Agora, ela teria que ignorar toda a dor e correr para dentro também, usando umas das caixas como cobertura. – C’mon guys!! Let’s bring on!!
Ela soprou novamente o apito e os cães que a acompanhavam invadiram o galpão em alta velocidade, pulando sobre as caixas e fazendo curvas por entre o labirinto de engradados com ose estivessem em uma competição de agility. Rayan e Culaan tentaram acertar os cães, mas eles eram rápidos e não se mantinham em uma linha reta ao correr.
Dee também aproveitou para avançar de uma caixa para a outra e, nesse tempo, tentar atingir algum dos dois com um tiro. Rayan não sabia se mirava nos cães, para mantê-los afastados ou em Dee, que chegava perigosamente perto. Culaan, tentava apertar todos os botões para acionar o elevador, mas era claro que ele não sabia como fazer.
– Rayan, que diabos… faça esse negócio funcionar!! – Culaan berrava enquanto socava o painel de controle. – Faça alguma coisa… mas que droga!!
– Não se preocupe, eu farei!! – Rayan pegou um controle remoto com três botões pendurado ao lado da grade de proteção do elevador e apertou um grande botão vermelho. A máquina começou a se mexer para cima, mas de forma lenta. – Eu vou fazer sim!!
Rayan virou-se para Culaan e apontou a arma para ele.
– Eu vou fazer o que vim fazer desde que entrei nesse seu esquema!
– R-Rayan… o que você está fazendo? – Culaan encostou na grade, tentando afastar-se do professor, mas, não havia muito lugar para onde correr. – Aponte isso pra lá… Rayan…
– Lembra que você disse que eu queria me vingar do mundo pelo que aconteceu com a minha esposa? Bom você tava errado! Eu só quero me vingar de você!
– D-do quê você está falando?
– Demorei um tempo pra descobrir quem foram os responsáveis pelos tiros naquele shopping… naquele dia… ela só tinha ido comprar alianças para casarmos no religioso… – Rayan aproximou-se de Culaan, para deixar claro que aquilo era inevitável. – Seus moleques entraram atirando, sem sentido nenhum… Ela estava grávida… Eu perdi tudo naquele dia. E agora, que eu não tenho mais nada… Eu vou finalmente fazer o que eu queria fazer desde o começo.
– Você entrou na minha organização só pra… me matar? – Culaan abraçou a sua maleta de dinheiro. – Tudo isso por vingança??
– Você tirou tudo de mim… é justo que eu tire tudo de você! – Rayan engatilhou a arma. – Pela Chloe!
Antes que ele pudesse atirar, Cookie pulou de cima de uma cadas caixas para o elevador e agarrou o braço de Zaidi. A força da mordida foi tanta que obrigou o professor a soltar a arma, dando a oportunidade para que Culaan o acertasse com a mala. O cão, percebendo que a plataforma estava cada vez mais alta, pulou de volta para a segurança, enquanto os dois homens brigavam.
Apesar de ter sido pego de surpresa, Rayan conseguiu desvencilhar-se dos socos de Culaan e ambos começaram a brigar pela mala, trocando socos e golpes com a pasta de forma desajeitada. A plataforma balançava e o motor rangia. Eles já estavam a quase 5 metros de altura do chão, mas pouco afastados do contêiner no qual Cookie havia pulado.
Eles continuavam brigando até que tudo balançou e tremeu com um chacoalhão forte. Nesse momento, Rayan desequilibrou e Culaan aproveitou para empurrá-lo da plataforma. Ele rolou pela grade e conseguiu segurar-se com uma mão, fazendo o possível para se manter a salvo. Ele tentava voltar para cima, quando alguma coisa o distraiu. E esse foi o seu erro.
– Vou mandá-lo para junto da sua Chloe, Zaidi! – Culaan bateu com a valise na mão de Rayan. – Vai pro inferno junto com ela!! Aaahhhh…
Rayan fazia um esforço para manter-se segurando na grade, mas as pancadas começaram a doer demais. Ele trocou de mão e Culaan continuou batendo, até que ele não conseguiu segurar-se mais. O professor caiu do elevador, despencando 6 ou 7 metros de altura e batendo de costas no chão de concreto sólido. O baque do corpo de Rayan foi alto e o professor ficou inerte em cima de uma pequena poça de sangue que se formava em volta da cabeça dele.
Culaan olhou para baixo, apenas para ter certeza de que estava livre do ex-sócio, enquanto os cães policiais latiam para ele. Culaan riu e encostou-se no painel de controle, apenas para tentar acelerar a subida da plataforma que, por algum motivo, movia-se devagar, como se ainda estivesse carregando o peso de duas pessoas. Demorou um pouco mais que o previsto, mas ele chegou ao telhado do galpão.
Culaan abriu a portinha de segurança e foi em direção ao helicóptero que acabara de pousar no telhado, abraçando a valise de dinheiro. Ele chegou a aeronave e subiu nela, de forma desajeitada, apertando o cinto de segurança ao mesmo tempo que berrava para que o piloto o tirasse dali imediatamente. Com o feche dentro do veículo eles começaram a levantar voo.
Pá Pá Pá…
Culaan encolheu-se ao ouvir os disparos e o vidro do para-brisas do helicóptero trincou obrigando o piloto a subir mais rápido. O reitor olhou para o telhado e Didra estava nele, correndo em direção a beirada, mancando de uma perna e atirando a esmo. Culaan riu da situação patética da garota que ficou pra trás.
– OBRIGADO POR PULAR NAQUELE ELEVADOR!! – agora o chacoalhão e o peso extra do elevador começou a fazer sentido. Foi ela que se pendurou na plataforma. Deveria ter caído junto com Rayan, mas, agora, não fazia diferença. Ele já estava longe o bastante. – DEVIA TER FICADO EM YALE, SENHORITA O’CONNEL!!
Dee parou no meio daquele telhado, com a perna sangrando pelos pontos abertos devido aos movimentos, o corpo dolorido por todos os ferimentos que ganhou durante aquele ano e os braços tremendo pelo esforço de ficar pendurada a 10 metros de altura segurando-se pela própria vida. E, com tudo aquilo acumulado, misturado ao sentimento de raiva e frustração, ela levantou a arma e fez a mira para um tiro absurdamente improvável.
– Ninguém mexe com a minha Iris!
A bala voou em direção a Culaan e atingiu em cheio a valise de dinheiro. O trinco mal fechado da mala explodiu e todo o dinheiro voou em uma espetacular espiral de notas e papéis que se espalharam pelo ar. Culaan, desesperado, tentava agarrar as notas e títulos, fazendo com que o helicóptero balança-se e sacudisse.
– MEU DINHEIRO!! AAAAHHH… – Culaan soltou a mala e tentava segurar as notas com as mãos. – POUSE!! POUSE AGORA!! O MEU DINHEIRO!!
– Senhor, por favor, pare de balançar!! – o piloto berrava e forçava o manche do aparelho que fazia um barulho alto. – Por favor, pare de balançar!!
– MEU DINHEIRO!! MEU DINHEIRO!! – Culaan tentava enfiar nos bolsos as notas que pegava e esticava os braços em desespero. – DESÇA ESSA MALDITA MÁQUINA!!
Clic
Aquele cinto de segurança mal posicionado não conseguiu segurar o corpo do reitor quando o helicóptero sacudiu. Se estivesse um metro mais para a esquerda, Culaan teria caído sobre o telhado do galpão e sairia bem machucado com a queda, mas sobreviveria. Porém, eles não estavam. O som molhado que o reitor fez ao bater no chão deixou claro para ela que tudo havia acabado.
O barulho das sirenes dos carros de polícia aproximou-se do galpão dos fundos enquanto o helicóptero afastava-se rapidamente fez com que ela finalmente pudesse relaxar. Dee não arriscou chegar mais perto das bordas para ver o que havia acontecido. Ela sabia. Não precisaria ver. Didra deitou-se naquele telhado deixando o sol esquentar seu rosto. Enquanto não chegavam, ela tentava se distrair contando as notas de dinheiro e calcular quanto estava voando sobre ela naquele momento.
***
Algum tempo depois… Hospital da Cidade…
Didra acabara de acordar. Estava em um quarto de hospital, outra vez. Seu corpo doía e ela tinha mais faixas enrolando os ferimentos do que já teve na vida. Haviam flores nas mesas de canto e alguns cartões. Ela pegou eles e reconheceu as letras deles.
– “Você me deve uma lavagem completa. - Rosa.” – Dee riu e o corpo doeu. – Vai esperando… “Uma nova pedra da sorte pra você. - Chani.” – ela viu que próximo a onde estava o cartão tinha um pedaço de tijolo. – Vai servir… – ela pegou um último cartão. – “Segunda tem treino. Não falte. - Kim.” Acho que vou voltar a dormir…
A porta do quarto abriu e ela viu a pessoa que mais desejava ver naquele momento. Iris. A garota estava com uma bandeja nas mão e, ao ver Dee acordada, seus olhos brilharam com as lágrimas e ela largou tudo no chão e correu para a cama.
– Dee!! – Iris gritou por entre as lágrimas. – DEE!! MAS QUE DROGA… Você me mata do coração assim!! – Iris abraçou Dee com força e a encheu de beijos. – mas que droga!! Não faz mais isso!! – então deixou a cabeça cair sobre o peito de Dee e chorava.
– Aaaiii… você vai me matar assim! – Didra ria, chorava e gemia de dor ao mesmo tempo. Ela queria afastar Iris de cima do corpo dolorido, mas não conseguia. Ela queria abraçá-la o mais forte que pudesse. – Você está bem? Não te machucaram?
– Eu tô bem!! Eu tava preocupada com você! Dois dias dormindo!! Precisou de três bolsas de sangue! – Iris dava soquinhos em Dee. – Eu achei que você tinha morrido!!
– E deixar você aqui? Não mesmo! – Didra apertava Iris contra o corpo, mesmo doendo. Ela segurava os cabelos da outra garota, deslizava os dedos pela pele do pescoço e beijava onde conseguisse alcançar. – Agora tá tudo resolvido! Acabou Iris!
Elas se beijaram apaixonadamente. Um beijo que parecia não ter começo ou fim. Eram uma só pessoa unida por corpo e alma. Um beijo como e fosse o primeiro. Com direito até a pezinho levantado de Iris. Quando elas perceberam que aquilo aconteceu, elas caíram na risada, mas só até o corpo de Dee começar a doer demais para ela continuar rindo.
– O que aconteceu com o seu inglês?
Dee ficou surpresa ao ouvir aquilo. De fato, ela não tinha mais sotaque e nem confundia as palavras. Aquela ansiedade que ela sentia e fazia com que ela falasse em inglês havia passado. Tudo voltou ao normal. Ela se sentia segura e tranquila nos braços de seu amor doce. Ela estava em casa novamente. E agora era pra valer.
A porta abriu mais uma vez e Armin entrou no quarto. Dois policiais da DPSD ficaram na porta e o murmurinho que vinha do lado de fora indicava que havia mais gente lá esperando. Kentin também entrou e foi até Dee, levando para ela um pacote daqueles mesmos biscoitos de chocolate que ele sempre gostou.
– Se você resolver levar meus cães pra passear, pode, por favor, escolher um lugar que não seja uma zona de guerra? – Kentin segurou a mão de Dee e apertou de leve. – E alimentá-los!
– Acho que a Rosalya não vai emprestar o carro outra vez!
– Bom, parece que o meu plano deu tudo certo, né? – Armin cruzou os braços e abriu um sorriso satisfeito. – Acabei com a operação de tráfico de drogas da Anteros Academy e os culpados etão fora de ação.
– Seu plano? – Dee esforçou-se para sentar na cama e Iris a ajudou. – Eu fiz tudo sozinha, no improviso e com a ajuda das meninas e de uns doguinhos!! Qual parte foi sua??
– Bom, se foi meu plano… então foi uma ação coordenada da DPSD com a polícia local e a ajuda de uma cidadã que será condecorada pelo prefeito… – Armin respondeu cínico. – Agora, se foi seu plano… então você será presa e processada por destruição de propriedade privada, roubo de cães do departamento de polícia e responderá por todos os agentes que se feriram na invasão.
Dee olhou para Iris e Iris para Dee.
– Que bom que o seu plano deu certo, né, Armin? – Dee respondeu. – Bom, então, agora tá tudo certo?
– Você ainda tem mais visitas… – Kentin bateu a porta e os policiais deixaram entrar Peggy acompanhada de um cameraman. – Concordamos em deixar a exclusiva para ela.
– ”Estamos diretamente do quarto de hospital da heroína da cidade de Nantes, Didra O’Connel, que ajudou o Direction de la Protection et de la Sécurité de la Défense na operação que desmantelou um dos cartéis de tráfico de drogas mais antigos e atuava fortemente na Universidade Anteros…” – Peggy (usando calças cumpridas) apresou-se em chegar com o microfone perto de Dee. – ”A ação foi coordenada por Armin Parkins e pelo detetive Dylan O’Connel, porém, quem estava na linha de frente foi a nossa corajosa heroína.” – Peggy apontou o microfone para Dee. – ”Dee, como foi que você se envolveu nisso?”
– ”Foi tudo ideia dele…” – Dee apontou pra Armin. – ”Eu só queria ajudar alguns amigos…”
A entrevista de Peggy foi, como ela já sabia, cheia de perguntas capciosas e pegadinhas, típicas de uma jornalista. Kentin teve que intervir antes que ela perguntasse o que não devia e Iris, usando sua autoridade de enfermeira, colocou todos pra fora. Armin foi escolhido como nova vítima das perguntas dela. Dean entrou logo em seguida e trancou a porta antes que Peggy o pegasse também.
Ele encarou a irmã com um olhar sério e ela também o encarou. Iris percebeu que a situação estava tensa ali e abriu a boca para falar, mas Dean não deixou.
– A Lety disse que vai te matar! Eu disse pra ela entra na fila porque tem a mãe e o pai na frente! – Dean foi até ela e sentou-se em uma cadeira ao lado da cama. – Só que eu vou morrer antes, porque coloquei você nisso.
– Só vai sobrar a puguinha pra continuar a família desse jeito. – Dee respondeu rindo.
– Para de chamar a minha filha de pug! – Dean abriu as pastas e colocou um monte de papéis no colo de Dee. – Tá legal, hora da burocracia… Você tem um monte de papéis para assinar e resolver aqui… A sua parte nesse caso acabou, mas eu ainda tenho algumas coisas pra resolver, corpos para exumar, prender um monte de gente e procurar um foragido.
– Foragido? – Iris perguntou. – Quem fugiu?
– Rayan Zaidi.
– O professor Zaidi? Mas, ele caiu e ficou no chão! – Dee olhou confusa para os papéis. – Eu achei que ele tinha morrido.
– Não morreu… – Dean pegou algo das pastas e entregou para Dee. – No lugar que deveria estar o corpo dele, só tinha isso…
Era uma foto com algumas manchas de sangue. Nela era possível ver Zaidi, muito mais novo, abraçado com uma bela moça loira. Dee imaginou que aquela era a noiva dele, Chloe, aquela que foi morta e o motivou a ir atrás de vingança. Ao lado deles tinha um homem parecido com ele, só que mais velho e, para surpresa de Dee…
– É a tia Agatha?? – Dee apontou para a mulher de cabelos rosa. – É a tia nessa foto?? Quem é esse cara??
– O irmão mais velho do seu ex-professor… Renan Zaidi. – Dean recostou na cadeira e massageou a testa. – O ex noivo da tia Agatha…
Então Dee lembrou-se do dia do seu baile de formatura. Agatha estava com ela no banheiro do ginásio. Dee havia corrido para lá por não aguentar mais a pressão de esconder de Iris que ela iria para Yale, então Agatha surgiu e lhe deu um segundo anel de ouro, par do anel que ela ganhou no primeiro dia de aula na Sweety Amoris. Naquele dia, Agatha revelou que aquele anel de ouro era o seu anel de noivado e o segundo anel estava gravado o nome “R.Zaidi”.
– R. Zaidi? Renan Zaidi? – Dee repetiu mais para ela mesmo do que para os outros. – O noivo que a tia largou para cuidar de mim… quando a gente nasceu…
Ela lembrou-se das palavras da tia:
“Quando vocês nasceram… Tudo na minha vida também mudou. Vocês eram tão pequenos… tão fraquinhos… Mas, você tinha um choro tão forte. Era tão viva!
“Mas, o Dean não. Ele era tão magrinho e fazia um barulhinho tão baixinho. Era óbvio que ele precisava de mais atenção do que tudo ali. Correram com ele para uma sala de cirurgia e colocaram ele em uma incubadora, onde ele ficou quase até fazer um ano.
Seu pai tinha que cuidar dele, preocupar-se com as cirurgias e atendimentos dos médicos. Cuidar para que ele saísse vivo de cada operação que faziam. E a sua mãe, depois que vocês nasceram, estava muito fraca, até para amamentar vocês. Então, quem cuidaria de você?
E foi aí que eu decidi que seria mais do que sua tia. Seria sua fada madrinha. Cuidaria de você enquanto você precisasse.
O seu primeiro banho. Sua primeira mamada. Eu fiz tudo o que sua mãe não pode fazer por você e que o seu pai não podia por estar ocupado cuidando de salvar a vida do Dean. E, então, eu não podia deixar você sozinha… por isso, eu tive que escolher.
E eu escolhi você.”
– Sua tia terminou o noivado para cuidar de você enquanto seus pais cuidavam do Dean? – Dee acenou positivamente com a cabeça em resposta. – E o noivo era o irmão do professor? Caramba… que mundo pequeno, ein… – ela levou a mão até a cabeça e fez o gesto de “minha cabeça explodiu”. – olha …booommm!
– Ela sabe o que aconteceu com o Rayan? – Dee perguntou ainda olhando para a foto. – Ela não pode saber! Ela deve gostar dele, afinal… é o e cunhado dela. Será que ela sabe o que aconteceu com a Chloe?
– Conhecendo a sua tia, eu não duvidaria que ela está aí no banheiro só esperando pra te entregar um presente e ouviu tudo… – Iris respondeu rindo. – Então, ainda corremos algum perigo?
– Acho que não… – Dean juntou os papéis e colocou sobre a mesinha ao lado da cama. Ele olhou duas vezes para o pedaço de tijolo, mas não fez perguntas. – Agora, eu acredito que seja bom você descansar antes da mãe e do pai chegarem aqui, porque o negócio ficará feio pra nós…
– Espera, e o Nathaniel?
– Preso, é claro. – Dean respondeu dando de ombros. – Não tem nada o que posso fazer por ele no momento. Estou tentando convencer o delegado de que ele, assim como a Iris, eram agentes duplos na operação…
– E só o Nathaniel foi preso?
– Não exatamente… – Iris, um pouco encabulada, levantou a barra da calça do uniforme de enfermeiro e exibiu a tornozeleira eletrônica. – E isso é provisório só. Pode ficar pior… por causa de tudo que encontraram na sala do Raphael…
– Então… é isso. Não sei o que posso fazer, mas, eu tô tentando ajudar os dois. – Dean respondeu. – Só que a situação deles não está boa ainda…
– Não se preocupa com isso, Dee… – Iris disse com um sorriso triste. – Não importa se eu for pra cadeia ou não. O que você fez por mim não foi a coisa mais incrível que já me aconteceu! Eu nunca vou te agradecer…
– Iris, fecha o bico um pouco… – Dee se esticou para alcançar a bolsa dela que estava na outra mesa de cabeceira. – …Não salvei você de traficantes pra te deixar ir pra cadeia! Eu preciso me lembrar do número dele… se eu tiver sorte eu ainda tenho ele na agenda.
– E pra quem você vai ligar? – Dean ficou olhando para a irmã enquanto ela discava.
***
Centro de Semi-Liberdade de Nantes
Nathaniel estava em sua cela, deitado em sua nova cama, encarando o teto e pensando que aquele lugar seria seu novo lar por um bom tempo. Se ele tivesse sorte. Se não tivesse, estaria a caminho do Centro Penitenciário onde teria de dividir a cela com outros detentos. Por enquanto, ficar nesse espaço sozinho era tranquilo e seguro.
Ficou imaginando o que o resto dos membros da gangue falariam sobre ele e quanto isso o prejudicaria. Se o resto dos membros que foram presos falarem sobre o que ele fez, não haveria como ele se passar por um agente infiltrado como Dean disse. Não haveria escapatória pra ele. O último recurso seria engolir o orgulho e ligar para o pai, embora não soubesse o que o velho poderia fazer exceto dizer que sabia que o filho iria para a cadeia, mais cedo ou mais tarde.
– Ei.. ei… – o guarda bateu na grade da cela. – Você tem visita! Um advogado!
– Advogado? – Nathaniel sentou-se na cama. – Mas, eu não contratei um advogado. Não é um defensor público?
– Eu não sei! – o guarda abriu a cela e deu passagem para Nathaniel ficar de frente com o segundo segurança que segurava as algemas. – Você quer ir falar com ele ou não?
Nathaniel deu de ombros e foi até o guarda para ser algemado. Provavelmente ambre havia mandando alguém para ajudá-lo e, no momento, ele não tinha muita escolha, exceto aceitar a ajuda dela. Nathaniel foi levado por um corredor de concreto cinza até uma porta de metal com uma luz vermelha sobre ela. A luz acendeu e uma sirene tocou, indicando que ele poderia entrar.
Era uma sala pequena, de concreto, com uma mesa de metal e duas cadeiras de ferro presas ao chão. E, em uma das cadeiras, estava um rapaz de terno roxo e cabelos loiros penteados para trás. Nathaniel olhou pra ele, a pele bronzeada e tinha certeza que o conhecia, mas, havia algo diferente nele. Algo no… queixo… parecia maior e com uma covinha que lhe lembrava o…
– Você… não é o… sobrinho do professor Bóris? – Nathaniel foi atado a mesa de metal pela algema e o guarda saiu, indicando que quando terminasse era só ele chamar. – Você é o cara que… ia lá na escola, não?
– Sim! Sou eu, Dakota Bóris! Você se lembra do meu tio? – Dake abriu um sorriso largo ao ver que Nathaniel o reconheceu. – Cara… que problemão você foi se meter, ein!! Mas é mais fácil de resolver aqui do que o que foi com a sua amiga lá e aquela história da tesoura na barriga da outra garota!
– Como você sabe que eu estou preso?
– Faz diferença? Eu acho que não, né? – Dake respondeu tirando uma série de papéis do processo da pasta de couro marrom que ele levava. – O importante é que estão me pagando uma boa grana pra te tirar daqui e, sinceramente, eu consigo te tirar daqui a tempo de você ir fazer a sua formatura, ein! Promissor, não é? Eu também acho!! Isso é claro, se você quiser!
– Quem está te pagando?
– Outra daquelas perguntas que a resposta é: faz diferença? – Dake colocou os papéis na frente de Nathaniel. – É só você assinar aí e eu começo a trabalhar no caso e aí apresso o julgamento em algumas semanas e aí… você tá livre!
– Mas, como eu… na verdade… sou culpado das acusações! Como você vai me tirar da cadeia?
– Eu te tiro da cadeia, mas é claro, você terá que cumprir penas alternativas, tornozeleira eletrônica, esse tipo de coisa… – Dake pegou uma caneta e ofereceu para Nathaniel. – Mas, você não vai ficar trancado em uma cela e nem precisará dividir o chuveiro com outros caras. Eu acho que é uma boa, não é?
– É claro que é! Onde eu assino? – Nathaniel pegou os papéis e começou a ler empolgado. Para quem não tinha nada a uns minutos atrás, ele estava com bastante sorte. – ...me dá aí a caneta e…
– Mas, tem uma condição que meu contratante colocou… – ele afastou a caneta da mão de Nath. – …Iris Sterling não teve nada a ver com o caso. Tudo o que ela fez foi sob coerção e ameaça. Incluindo o roubo de remédios que ela desviou do hospital. Ela não se envolveu nisso por vontade própria… ok?
– Isso não dificulta a minha situação? – Nathaniel começou a pensar nas consequências daquilo. Seria mais uma acusação com a qual ele teria de lidar e, se fosse condenado, aquilo adicionaria mais uns bons anos a pena. – Quer dizer… eu vou levar a culpa de tudo o que ela fez? Mesmo que eu seja colocado em liberdade condicional ou prisão domiciliar, isso vai acrescentar tempo a minha pena, né?
– Ééééhhh… na teoria sim… – Dake balançou um pouco a caneta e recostou no apoio da cadeira. – Se você não quiser, pode passar 30 anos na cadeia em regime fechado ou, se topar, só cinco em liberdade condicional com tornozeleira. Ainda que você assuma a culpa de coisas que não fez, esse acordo é melhor do que a sua situação atual, não é?
Nathaniel estendeu a mão e Dake lhe entregou a caneta. Ele assinou cada um dos papéis que Dake colocou em sua frente, aceitando que o rapaz seria seu advogado e o defenderia diante do juiz. Assinou também a confissão de que ele havia coagido Iris a lhe fornecer os remédios roubados do hospital e depois devolveu tudo para Dakota. Dake lhe deu um sorriso vitorioso dizendo para que ele não se preocupasse com nada e que voltaria amanhã para falar sobre os próximos passos do processo.
Dee havia salvado a vida dele dos traficantes e estava pagando por um advogado que ele sabia ser capaz de resolver problemas impossíveis, como foi o caso de Rosalya na época do colégio e, em troca, ele levaria a culpa pelos crimes de Iris. Não podia culpá-la. Quando teve de escolher entre ela e Ambre, não pensou duas vezes em jogar Iris na fogueira. Acho que era a forma dela "dar o troco" nele. Gostando ou não, era o mínimo que ele poderia fazer pra retribuir.
Continua…
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.