JiHye. Era esse o nome da filha mais velha dos Han, a família mais rica e influente de Verona. Era essa garota que MinHo deveria procurar na festa.
Lee MinHo era, também, de uma família de elite. Mas oh, os Lee tinham uma história com os Han. Uma história odiosa, que nunca realmente chegou aos ouvidos de MinHo. Tudo o que ele sabia era que ele e JiHye deveriam, a mandato da Igreja, acabar com aquela rivalidade de décadas.
Com um casamento.
MinHo não queria aquilo. Nas primeiras cartas com que trocou com JiHye, já ficara claro que ela também não queria, mas o faria pelo bem das famílias. Já depois de alguns encontros pessoais, ela pareceu trocar de ideia. Afinal, MinHo não era um homem para se jogar fora. E MinHo apreciava a companhia de JiHye. Eles formavam um belo casal.
Quer dizer, formariam.
Pois, afinal, havia um pequeno problema — pequenininho, mixuruquinha.
Han JiHye tinha um irmão um pouco mais novo, de dezoito anos. Han JiSung.
Não que JiSung causasse confusão. Ele era bastante educado, apenas um pouco imaturo, e falava um pouco alto demais.
O problema estava em MinHo.
Veja bem...
MinHo era gay.
...e JiSung era adorável.
Deu para perceber para onde essa história está indo, não é?
Era impossível que MinHo tivesse olhos para JiHye quando JiSung estava bem ali, todo sorrisos para ele. Sorrisos esses que encantavam MinHo profundamente. Olhinhos brilhantes sempre que o Lee lhe dirigida a palavra. Corpo franzino e delicado, mas ainda assim de um jovem bonito.
Isso sem contar que o Han era dono de uma personalidade invejável — era afável, suave e caloroso como o abraço das brisas de final de primavera. Era cavalheiro, saudou MinHo cumprindo toda a etiqueta como o jovem nobre que era. Ele não tinha rancor em seus olhos como os pais deles. Não trocava farpas com MinHo por ele estar noivo de sua irmã, e como suas famílias se odiavam, MinHo esperava que ele fosse ser um tantinho rude com ele, mas não. Ele se mostrou gentil para com ele. E — detalhe — não gostava de caçar com os homens da família nos sábados, preferia ficar estudando plantas. É, MinHo não entendeu muita coisa quando JiSung o levou para seu quarto para lhe mostrar seus estudos. MinHo não estava nem um pouco interessado nos estudos, diga-se de passagem. Ele observava Han JiSung animadamente lhe mostrar seus desenhos botânicos e gesticular enquanto falava do jardim, e que MinHo precisava ir conhecer o jardim. E que ele o levaria até lá de bom grado, se seus pais permitissem que ele o fizesse.
MinHo percebeu que Han JiSung também não era bobo nem nada, e que ele reparou nos flertes sutis que o Lee jogava em sua direção. E abaixava os olhos com um sorriso bobo toda vez que MinHo direcionava uma cantada para ele. E ele tentava flertar de volta, mas não conseguia. Gaguejava um pouco, ficava envergonhado e desistia. MinHo sorria ternamente diante da clara timidez do Han.
Claro que isso não aconteceu muitas vezes. Eles precisavam tomar cuidado.
Não era como se a família MinHo não soubesse. Bem, eles sabiam, apenas não aprovavam e o reprimiam. Contanto que ele não agisse em cima daquilo, eles iriam fingir que nunca aconteceu — que eles nunca flagraram um MinHo de quatorze anos aos beijos com o garoto que trabalhava no estábulo deles. MinHo apanhou bastante daquela vez. Claro que demitiram o garoto e a família dele, ameaçando-os caso eles contassem qualquer coisa para qualquer alma viva ou morta daquela cidade. MinHo nunca mais o viu e nunca mais se atreveu a ficar com outro garoto.
Viver naquela sociedade não era fácil, sendo MinHo quem ele era. Ser gay era errado, sodomia era crime. E com pena de morte. O pai de MinHo uma vez foi acusado, mas não deu em nada. Eram comuns acusações assim, quando se queria difamar alguém. Claro que os rumores sobre o sr. Lee correram rápidos e morreram pouco depois, como todos os rumores de sodomia que rondavam por aí. Mas MinHo lembrava de que seu pai ficara furioso ao ser confrontado por acusações assim.
MinHo não tinha medo de ser acusado, porque ele sabia que provavelmente não daria em nada. Agora, do que ele sempre teve medo de verdade era de realmente fazer aquilo. Ele sentia vontade — mas era errado. Aos quatorze anos, ele agira por impulsos, mas ele cresceu ouvindo que era errado.
Mesmo assim, ele não se importou quando ele e JiSung se esconderam nos fundos do jardim, atrás de uma roseira alta, e trocaram beijos sedentos — ainda não apaixonados, mas eles logo seriam. Não deu a mínima quando se encontraram na noite seguinte para mais beijos, e esses encontros se tornavam cada vez mais frequentes.
Agora, meses depois, ele estava na festa de uma outra família influente, os Kim. Os Kim eram naturais de Veneza, e traziam às suas festas a tradição das máscaras — e era, afinal, época de carnaval! Eles comemoravam o casamento de seu filho, que acontecera alguns dias antes. MinHo deveria estar procurando por JiHye, mas era difícil encontrá-la quando todos usavam máscaras que cobriam todo o rosto. Ele detestava as festas dos Kim, pois nunca sabia quem era quem por trás das máscaras.
Seus pais o tinham dito como seria a máscara dela: branca, suntuosa e que cobria o rosto por completo e ela estaria com um vestido carmim. Mas haviam tantas moças com máscaras brancas lindíssimas, e carmim estava na moda. Então, encontrar JiHye seria uma tarefa impossível. E ele não tinha motivação alguma para procurá-la.
Oh, mas encontrar JiSung era um de seus objetivos. Certamente era. Ele tinha um plano em mente. Bebeu alguns cálices do vinho branco que os anfitriões serviam aos convidados apenas para conseguir coragem e, sabendo quem JiSung era (não foi difícil reconhecê-lo, pois sua máscara cobria apenas seus olhos), foi até ele, que estava sozinho em um dos cantos do salão.
— JiSungie — murmurou ao pé do ouvido do Han, que imediatamente reconheceu sua voz macia e quase derreteu ao ouví-lo. O Lee sorriu ladino.
— MinHo — ele disse após um longo suspiro.
— Vamos dar uma volta?
A "volta" que eles deram acabou por levá-los ao casarão dos Han, e eles sorrateiramente subiram ao segundo andar, indo até o quarto de JiSung.
Naquela noite, eles infringiram leis. Mas amaram um ao outro como se não houvesse amanhã.
E de fato, logo não haveria um amanhã no qual eles poderiam se amar — nunca houve, na verdade, mas eles não pararam para reparar naquilo. Logo MinHo casaria com JiHye, e nenhum deles queria causar tamanha dor àquela jovem moça, tão doce e ingênua, que nunca percebia os olhares apaixonados que o futuro marido lançava ao seu irmão.
Ambos caíram na cama de JiSung, tentando recuperar o fôlego sem fazer tanto barulho, apesar de que todos os empregados já dormiam àquelas horas e não havia ninguém para ouvir seus suspiros.
— Han JiSung — MinHo murmurou, chamando a atenção do jovem. Ele afastou as madeixas úmidas de suor de seus olhos e se aproximou para dar-lhe um beijo carinhoso em seus lábios. — Nós acabamos de cometer um crime — disse, entre risinhos.
— Arrependido?
— Nem um pouco — respondeu, aninhando JiSung em um abraço. — Faria tudo de novo.
— Eu também... — murmurou, logo escondendo o rosto nas mãos, tímido. — Aish, não acredito que- nós realmente- eu... — MinHo se afastou um pouco para retirar as mãos do Han de seu rosto. Ele sorria. — Eu estou tão feliz.
Seu sorriso lentamente morreu e seus olhos se encheram de lágrimas.
— Ei — MinHo disse, preocupação crescendo em seu peito. — JiSungie, o que foi?
— Não podemos continuar com isso MinHo. A minha irmã, ela... ela não merece isso.
MinHo suspirou.
— Não, ela não merece. Mas nós também não merecemos isso, nós-
— Eu pedi a meus pais que eles me deixassem estudar no exterior, MinHo — JiSung assumiu. — Eu... vou me afastar. Nós precisamos parar. É errado em tantos sentidos, meu amor...
Era a primeira vez que JiSung o chamava assim. MinHo sentiu um aperto em seu peito.
— Não, por favor-
— Você vai encontrar a felicidade ao lado da minha irmã. Você vai aprender a amá-la.
MinHo sabia que aquilo não aconteceria.
— Não, JiSung, eu não vou conseguir.
— Vai, sim, eu sei que vai.
— Não, JiSung, eu te amo. Eu sinto muito, mas não amo e nunca vou amar a sua irmã do mesmo jeito que eu te amo. — Ele estava começando a se desesperar, seus olhos também marejados. JiSung estava escorregando por entre seus dedos e MinHo não conseguia segurá-lo.
JiSung ficou em silêncio mais um pouco antes de responder, baixinho e secreto:
— Eu também te amo, MinHo. — Ele se inclinou um pouco para beijar MinHo outra vez, mas o Lee estava se sentindo mal, e se afastou dos lábios de JiSung.
— Não, JiSung, eu acho que você não entende. Eu passei a te amar tanto... Eu não quero que você vá embora... por favor, não vá embora...
— Eu entendo, sim, MinHo. E porque eu te amo também é que estou fazendo isso. Você vai ser mais feliz com a minha irmã. Em um relacionamento certo.
— JiSung, o que nós estamos fazendo não é errado...
— É sim. MinHo, eu te amo, não vamos complicar as coisas. Estávamos fadados à desgraça do momento em que-
MinHo o calou com um beijo. Um beijo que começou tão terno e casto, mas logo passado o choque inicial, tomou outras dimensões.
— MinHo. Por favor, eu te imploro, eu só quero que nós dois sejamos felizes do jeito certo.
MinHo queria contra-argumentar, dizer que ele não seria feliz sem tê-lo consigo. Mas JiSung parecia acreditar tanto que sua irmã poderia fazê-lo feliz. MinHo duvidava. JiHye era uma mulher maravilhosa, dotada e gentil, mas MinHo era gay! E ainda por cima, estava apaixonado por Han JiSung. Seu coração tinha um lar, e era no abraço de JiSung que ele se sentia seguro.
Porém, ele assentiu minimamente com a cabeça.
— Está bem. Está bem...
JiSung desatou a chorar — ele também não queria aquilo, aquilo estava sendo forçado sobre eles.
— Promete que vai tentar? Amar a minha irmã como vocês dois merecem?
MinHo assentiu, puxando o Han para um outro abraço apertado, derramando lágrimas também.
— Você também. Quero que encontre a felicidade, JiSungie, e se você acha que eu não faço parte do seu futuro-
— Não ouse terminar essa frase. — Ele respirou fundo, enterrando o rosto no peito de MinHo. — É diferente, MinHo. Você faz parte dos meus sonhos. E nos meus sonhos, você não estaria casando com a minha irmã, e sim comigo. Já pensou que bizarro?
Ele deu uma risadinha amarga, sentindo os batimentos de MinHo acelerarem.
— Você gostou dessa ideia — JiSung constatou.
— Eu amei essa ideia — murmurou dolorido, com lágrimas nos olhos. — Então… o que eles disseram? — perguntou temeroso. — Os seus pais. Sobre ir para outro país estudar, sabe?
— Eles acham uma boa ideia. Vou ir para a Alemanha.
— Quando?
— Assim que me aceitarem em uma universidade. Provavelmente um pouco depois do seu casamento.
Eles foram engolidos por um silêncio que machucava. A noite parecia tão mais fria agora que sentiam como aquela proximidade toda fosse insignificante — eles poderiam estar nos braços um do outro, com um aperto tão forte os unindo, e ainda assim iriam se sentir distantes.
— Vamos nos encontrar mais vezes antes que você vá embora — MinHo pediu. Não havia o tom de pergunta em sua voz, mas JiSung entendeu que era uma súplica. — Eu preciso de você, do seu coração batendo junto ao meu. Eu preciso ter você mais uma vez, pelo menos mais uma vez antes do nunca mais.
— Tudo bem — JiSung respondeu, buscando os lábios do Lee para outro beijo. — Tudo bem, eu também preciso de você.
MinHo levantou o tronco de modo a conseguir ficar por cima de JiSung outra vez. JiSung fechou os olhos e esperou pelo que quer que fosse que MinHo iria fazer. Mas ele sentiu algo pingar em seu rosto e abriu os olhos.
— Por quê? — o Lee se perguntava, chorando. — Por que eu não posso simplesmente ser feliz com você?
— Eu queria entender também, MinHo. — Ele segurou o rosto de MinHo, sorrindo com angústia transparente em seus olhos brilhantes de lágrimas. — Mas é assim que as coisas são, amor, amor da minha vida, por favor não chore...
MinHo deixou escapar um soluço atormentado pela dor e enterrou o rosto na curva do pescoço do Han.
— Por favor, que você pelo menos encontre alguém que pode te fazer feliz, se eu não vou conseguir. — MinHo pediu. — Por favor, não se esqueça de mim. Não se esqueça do quanto eu te amo, Han JiSung. Porque eu não vou te esquecer, meu primeiro grande amor.
— Não vou te esquecer, isso seria impossível, MinHo.
Eles ficaram em silêncio, trocando beijos pelo resto da noite. Pelo fim da madrugada, início da manhã quando alguns passarinhos começavam já a cantar, MinHo foi embora, escapando pela sacada do quarto de JiSung.
Quando JiSung ficou sozinho, ele debulhou-se em lágrimas.
Quando MinHo saiu do terreno dos Han, escondeu-se em uma mata próxima e chorou.
Oh, se choraram.
Pela manhã, as empregadas de JiSung o encontraram largado nu na cama, imóvel senão pelos ombros sacolejantes.
E um grupo de caça encontrou MinHo no meio da estrada, bêbado, andando a passos trôpegos. O reconheceram e o levaram de volta para casa.
Eles se viram toda noite antes da partida de JiSung.
Depois disso, nunca mais.
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