“ Eu admito que nunca fui um poeta. Esse não era meu papel em nenhuma das relações que eu tive – Que convenhamos... Não foram muitas ou longas. –, eu não me dou bem com palavras rebuscadas e detalhes exagerados. Gosto de pessoas diretas, gosto de ser direto... Sem embolações ou qualquer coisa digna de filmes românticos. Essa não é uma longa carta de amor para o meu amado que vai acordar de manhã e ler e se lembrar dos nossos momentos juntos, me dar um beijo e iremos foder loucamente até quebrar a merda da cama. Não. Sou velho demais pra isso, estou cansado demais pra me importar em medir as palavras, quando se atinge os 67 anos você deixa de se importar com muita coisa. Estou fazendo essa carta porque eu sinto que eu preciso explicar muita coisa pro meu filho... Ele passou os 48 anos de toda a sua vida me fazendo perguntas e eu acho que lhe devo uma resposta antes da minha morte. Afinal, ela pode chegar a qualquer momento... Eu sou a porra de um velho de 67 anos viciado em metadona – Para os leigos, é um remédio usado para tratar o vicio em heroína. Eu basicamente troquei um vicio por outro, mas isso não importa. – e posso morrer enquanto escrevo isso nesse exato momento, mas aí... Todas as minhas memórias morreriam também, Lihun ficaria sem respostas para as suas perguntas... Morreria querendo saber o que houve naquele ano de 68. O melhor e pior ano de toda a minha vida.
Acho que eu preciso de um bom titulo pra começar não é? Então vamos iniciar com: “ A primeira vez que que Xiao Luhan perdoou Oh Sehun” Excitante não é? Me sinto quase um romancista, só que sem a parte da maquina de escrever e o café. Apenas um chá de camomila, e papel e caneta. Enfim... Comecemos então;
A primeira vez que Xiao Luhan perdoou Oh Sehun.
Eu, mesmo que todos saibam, sinto a enorme necessidade de mencionar minha família em uma pequena introdução... mesmo que eu saiba que todas as pessoas que vão ler isso já sabem como eles são e quem são. Mas eles tiveram um papel importante na minha personalidade e nas minha ações naquele ano, quando eu tinha 19 anos e ainda não sabia como existir. Minha mãe e meu pai eram boas pessoas, tenho certeza que eles não fizeram o que fizeram por mal... Mas era difícil imaginar que eu seguiria o mesmo caminho do Yifan, meu falecido irmãozinho mais velho viciado em heroína, afinal, eu não “tinha cara” de quem ia fazer isso. Eu era o terceiro filho. Tinha dois irmãos mais velhos – Yifan e Minseok – e dois irmãos mais novos – Baekhyung e Kyungsoo – então eu poderia me considerar esquecido. Meus três irmãos eram... O máximo, e eu não falo isso de forma boa, afinal, eles tinham as maiores médias em suas respectivas classes do colégio, – No caso do Minseok, da faculdade– e eu nunca fui muito bom em nada além de história. Não tinham tempo pra mim ou pro Yifan – Que nessa época, estava morando me um apartamento fodido, já era um viciado a dois anos quando aquele ano aconteceu. E olha que a Heroína só veio a ser famosa dois anos depois, em meio as discotecas dos anos 70, não que nessa época eu tivesse tempo pra ir, quando a heroína estava no seu auge eu estava cuidando sozinho de uma criança de um ano. –, precisavam cuidar de seus filhos perfeitos e inteligentes.
Me parece muito errado lembrar agora, mas eu já não tenho uma noção muito boa de certo e errado. Mas naquela época, todo o mês, metade da minha mesada eu entregava para o Yifan, heroína era caro, e meu irmão sempre foi bom demais, gentil demais, e atencioso demais pra passar por aquilo. Eu lhe dava o dinheiro para o pico, e às vezes levava comida, quando podia assaltar os armários da dispensa de casa. Eu sabia que era errado, mas... Como disse, o certo e errado eram muito complicados pra mim, o certo sempre era tão ruim e o errado... Era como o mais longo orgasmo, sendo totalmente literal. De qualquer jeito... Ele precisava de mim, e eu não poderia me esquecer dos anos em que eu corria pra sua cama de madrugada depois do papai e a mamãe me mandarem fechar o bico e voltar pra cama, mesmo que eu estivesse apavorado durante uma tempestade, trovões sempre foram uma grande fobia, e isso é algo para qual passei para Lihun, e ele passou pra filha mais nova dele... Dita a cuja não me lembro do nome. A Idade me permite esses gracejos... voltando, Yifan precisava de mim, então eu ia até o apartamento em que ele vivia.
Mas naquele dia, dia 12 de janeiro de 1968, ele me disse pelo telefone que teríamos que nos encontra em um lugar diferente. “Me encontre na rua da neve, estou morando em um lugar diferente agora okay Lu? É um apartamento legal. Vou te esperar no portão as quatro, esteja lá. Eu te amo irmãozinho” as ligações para Yifan sempre eram rápidas assim porque ele poucas vezes arranjava um telefone para se comunicar, então tinham sempre que ser rápido... mas a questão é... Ele tinha me chamado para a “Rua da neve”, qualquer pessoa conhecia aquela rua. Era exatamente o lugar que você deve ir quando quer qualquer coisa ilegal, vendem cocaína no fim daquela rua sem saída como vendem fruta em uma feira, tem prostitutas baratas na esquina de estrada, viciados jogados pelo chão... pelo menos era a minha alusão de como era a rua nessa época. Eu não sabia que era MUITO pior.
Então as três e cinquenta eu estava entrando na rua. O cheiro era de lixo, maconha e algo... mais. Era horrível, eu tinha que admitir, não que todas as ruas daquele bairro fossem maravilhosas, mas ali era onde tudo começava, naquela rua abandonada atrás da estação de trem, sem casas ao redor, sem nada ao redor além de terrenos cheios de mato e trilhos para os trens mais velhos passarem com a sua barulheira infernal. Era um lugar esquecido. Era uma extensa rua sem saída, e muitos becos entre os muitos prédios... Eu naquela época – E talvez até hoje. –ficava imaginando quem foi o idiota que chegou, olhou ao redor e pensou “ Meu Deus, olha que ruazinha de merda abandonada por deus, eu vou construir dezesseis prédios com apartamentos minúsculos aqui, e vender para qualquer viciado que oferecer um órgão por isso.” , não tem sentido nenhum.
Então foi aí, enquanto andava tentando não deixar as sacolas com comida cair, que eu o vi pela primeira vez. Sehun estava encostado em um poste, com o nariz sujo de “neve”, e um cigarro entre os lábios e uma mão dentro do bolso. Ele era como qualquer viciado em cocaína deveria ser, assustador e transbordando ansiedade, demonstrando isso enquanto tremia aquele maldito cigarro apagado enquanto tirava e colocava ele dos lábios. Viciados em cocaína me sí são assustadores, eles são agressivos e imprevisíveis, claro que na época eu só sabia disso porque meu irmão tinha me falado: “Fique longe deles, Lu. Viciados em coca, e em crack... São espontâneos e impulsivos demais, podem quebrar seus dentes apenas porque estão entediados.”, pensando agora... isso é muito hipócrita afinal ele dividia a casa com o Sehun. Não que viciados em heroína sejam santos, mas... Entre brigar com um cara chapado de cocaína e um chapado de heroína, já sabemos a resposta não é? Seguindo...
Ele sequer me olhou. Então eu passei direto, até encontrar o Yifan sentado em um muro baixo, enquanto conversava com dois rapazes que não conhecia. Não que fossem importantes, assim que cheguei Yifan se despediu deles e me deu um abraço. Eu lembro de ter pensado “Você está tão magro maninho” mas não cheguei a falar nada por medo que se zangasse por aquela observação obvia.
O ajudei a entrar com as coisas. Era um apartamento surpreendentemente limpo, e cheiroso. Enquanto guardávamos as coisas, ele me deu um baseado, então no fim ficamos sentados e conversando enquanto chapávamos. Baseado e LSD eram as únicas cosias que eu tinha coragem de experimentar , Yifan nunca me deu proibições estúpidas, ele apenas dizia “Faça o que você acha que deve fazer. Se eu disser não, você não vai ouvir mesmo.” Diferente dos meus pais que diziam quase o contrario mas era só da boca pra fora. Então Como o destino quis, Sehun entrou pela porta com um sorriso sacana e jogou um casaco preto em cima do Yifan.
“Eu vendi 30 gramas... Alguém está me devendo!” Ele disse enquanto se sentava no braço do sofá.
“Ah... Qual é, neve é bem mais barato e popular que H, nem vale.” Yifan quase gritou jogando o casaco de volta, mas acho que não estava zangado. Eles falaram alguma coisa, mas por um bom tempo eu apenas consegui olhar para os lábios do Sehun... Ele sempre disse que não foi amor a primeira vista, e que isso não existia, mas eu ainda acredito que foi. A questão é... Quando ele ergueu os seus lindos olhos e me olhou, finalmente percebendo a minha presença, Eu tentei me manter indiferente, mas o fato do nariz dele estar sujo de coca deixava isso um tanto complicado.
“Quem é o garoto?” Ele perguntou para o Yifan daquela vez e eu fiz questão de responder. “Talvez devesse perguntar diretamente ao ‘garoto’“ e o seu sorriso divertido ainda incendeia cada pedaço do meu coração, igual naquele dia. Foi difícil entender o quem aconteceu daquele momento em diante, eu juro que não sei explicar, apenas embarcamos em um conversa tão profunda, que eu quase esqueci que quem estava a minha frente era um viciado em coca, ele tinha um sorriso... E aqueles olhos, a sua voz, o formato do seu rosto e os cabelos escuros... Era tudo muito maravilhoso demais. Eu perdi horas conversando, tantas horas que até mesmo Yifan saiu e foi fazer algo... Ele tinha se tornado momentaneamente um personagem, secundário enquanto eu e o Sehun estávamos tão vidrados um no outro. Posso descrever na minha vida, que poucos momentos foram tão especiais quanto esse, aquela conversa sem fim, só perde para o dia do nascimento do meu filho em momentos felizes da minha vida. Não são muitos, mas a sua maioria envolve o Sehun ou o Lihun.
“ Por que você não dorme aqui? Eu tenho alguns doces, podemos dividir.” Quando eu disse que precisava ir, ele me fez ficar quando me amostrou a cartela colorida com pequenos quadradinho em cores rosa, azul e roxo... “Muito psicodélico” eu disse, e isso o fez rir, e quando ele riu, eu decidi ficar, meus pais não dariam a minha falta mesmo, e Yifan não me mandaria voltar pra casa se eu estivesse chapado demais, e era isso que faria. Ele colocou um disco de sei lá quem, em uma vitrola empoeirada, e enquanto a música fluía, eu o observei colocar aquilo na língua, e então o beijei. Existe forma melhor de usar Lsd do que pelo beijo? Veja bem, não quero que achem que eu era uma vadia - Não que eu ache algo ruim. –, eu não saio beijando qualquer pessoa morria de medo de ser rejeitado inclusive, era um jovem adulto fodidamente inseguro... Mas eu senti uma ligação que não tinha como ignorar. Não importa, ele correspondeu aquele beijo. Ele passou as mãos pela minha cintura, e me puxou para mais perto. Ele me apertou contra ele. Ele manteve nossos lábios grudados até que todo o ar estivesse acabado.
Eu não me lembro de muita coisa daquela viagem. Faz muitos anos, mas eu lembro do fim... Quando estava amanhecendo, e estávamos sentados no chão do quarto que ele e Yifan dividiam, com uma beliche modesta e um guarda roupa horroroso, eu me lembro de que ele me beijou novamente, e eu senti borboletas. Estávamos chapados, ou quase, e então estávamos na cama de baixo, a cama dele, e os lençóis tinham o cheiro de amaciante e cigarros de menta... Eu me lembro de sentir as mãos dele por todo o meu corpo. E eu me lembro de não ter sequer lembrado – confusa a frase. – de dizer que nunca tinha dormido com ninguém antes... dezenove anos na cara e virgem... Bem, isso não importava muito naquela hora. Não houve dor, não houve anda além de dois corpos em perfeita harmonia, e eu não vou detalhar tudo. Existem coisas que quero guardar do meu intimo, esse momento é uma dessas coisas.
Acordar na manhã seguinte foi tão bom, eu senti seu braço ao redor de mim, senti tudo, seu perfume, a textura da sua pele, eu senti ele.
Mas eu me obriguei a me levantar. Ignorar o incomodo no quadril, me vestir e ir embora antes dele acordar, na verdade eu sequer falei com Yifan, precisava chegar em casa logo. Não queria dar motivos para os meus pais ficarem no meu encalço. Eu cheguei a casa bem, pulei a janela do meu quarto – Vantagens do seu quarto ser o único no primeiro andar. – então me deitei na minha cama para sonhar com Oh Sehun.
Então toda há minha semana eu passei trabalhando no meu trabalho de meio período na única livraria daquela cidade de merda. Mas meus pensamentos estavam apenas naquela terça feira, dia doze de janeiro... Tinha expectativas tão altas, e ele era tão fodidamente maravilhoso. O que eu tinha a perder? Eu não tinha nada. Então esperei ansiosamente a semana passar, para que na outra terça feira eu fosse ver o “Yifan” – Até pouquíssimo tempo depois disso eu ia apenas uma vez por semana ver o meu irmão, pra não dar bandeira. –. Eu não esperava que minha vida virasse um momentâneo inferno naquela quinta feira. Kyungsoo quebrou o braço quando estava “sob a minha supervisão” e não poderia participar das olimpiadas de matemática do colégio porque quebrou o braço que ele escreve... Então o mundo caiu sob a sua cabeça, gritos, e xingamentos, e todos os tipos de ofensa a sua direção. Hoje em dia eu posso entender o que houve e a gravidade da situação, mas ainda acho a atitude deles tão exagerada e cruel.
Antes de criticar a minha próxima ação, ponha-se no seu lugar, eu não surtei “apenas por isso, uma bronca”, eu era um copo cheio, e aquelas gotas foram o suficiente apenas o que eu precisava pra me fazer transbordar, tudo.
Então eu comprei heroína a caminho da casa do Yifan. Eu disse a mim mesmo todo o caminho que só precisaria ver o Sehun pra tirar toda àquela minha paranoica de “Eu preciso usar. Só uma vez. Eu tenho controle, só uma vezinha não vai me matar “, só precisava ver ele sorrindo. Então quando eu entrei direto, e sem bater no apartamento, eu quase bati de frente com uma garota de cabelos negros totalmente bagunçados, olhos fundos, ela estava distraída amarrando a blusa com uma mão só e com a outra passava os dedos pelos lábios. Naquele momento eu me senti tão traída, que apenas entrei e deixei que ela saísse, momentaneamente olhei com uma falsa calma para Sehun, parado e nu na porta do quarto, com a face mais confusa do mundo pra mim. “Onde está o Yifan?” tentei não parecer envergonhado com a sua nudez, ou magoado com a mulher que tinha acabado de sair.
“Ele saiu, foi conseguir um pico. Por que?” Ele estalou os dedos, e eu apenas dei de ombros, não queria deixar tão obvio que estava magoado. Era alguém orgulhoso eu diria.
“ Quero injetar... Mas eu não sei como fazer essa merda.” Eu respondi então tirei o pequeno pedaço de papel alumínio do bolso e joguei em cima de algo que deveria ser uma mesinha de centro improvisada. Feita de caixa de feira, era estranha e irregular. Lembro de ter visto ele erguer a sobrancelhas, como se eu pedir pra usar heroína fosse a ideia mais absurda do mundo, então ele começou a falar varias coisas sobre heroína, cosias ruins e usou o próprio Yifan como exemplo... Eu estava tão cansado de pessoas gritando comigo, estava tão magoado, de uma certa forma... aquilo doía. Então eu comecei a chorar, “Como um menininho”, sentado no chão daquela sala, eu chorei até que ele viesse me abraçar e eu negasse seu abraço.
“Abrace aquelazinha.” Eu lembro de ter cuspido as palavra enquanto secava as lagrimas. Já nem sabia pelo que estava chorando. “Eu achei que você gostasse de mim, por causa... da ultima vez... Isso foi tão cruel!” então ele começou a rir. E me abraçou. Eu juro que não sabia o motivo, nem era tão próximo assim...
“ Eu achei que tivesse ido embora porque não queria mais nada.” Ele disse próximo ao meu ouvido, e só de lembrar disso hoje me dá arrepios. “ Eu posso te ajudar a injetar se você quiser. Prefiro que faça isso com supervisão do que por ai com alguma agulha fodida... mas você me perdoa?”
Eu sorri e assenti. Não sabia exatamente meus motivos pra sorrir, mas não importava. Foi assim que eu entrei para o mundo do vício em heroína. E foi assim que eu perdoei Oh Sehun pela primeira vez.
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