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História As Vantagens de Ser Invisível. - Parte Dois.


Escrita por: pouya

Capítulo 3 - Parte Dois.



                                                              7 de novembro de 1991
Querido amigo,
Esse foi um daqueles dias em que eu não me importo de ir à escola porque o dia estava lindo. O céu estava coberto de nuvens e o ar parecia um banho morno. Não acho que tenha tido essa sensação de limpeza antes. Quando fui para casa, tive de aparar a grama para ganhar minha mesada e não me importei nem um pouco. Eu só ouvi música, vivi o dia e rememorei coisas. Coisas como andar pelo bairro, olhar as casas, os gramados, as árvores coloridas e ficar satisfeito com tudo.
                    Eu não entendo nada de zen e essas coisas que os chineses ou indianos fazem como parte de sua religião, mas uma das garotas da festa com a tatuagem e o piercing no umbigo era budista desde julho. Ela fala muito pouco, exceto de como os cigarros estavam caros. Eu a vejo no almoço às vezes, fumando entre Patrick e Sam. O nome dela é Mary Elizabeth.
                   Mary Elizabeth me disse que uma coisa sobre o zen é que ele faz com que você se conecte com tudo no mundo. Você é parte das árvores, da relva e dos cães. Coisas assim. Ela chegou a explicar como sua tatuagem simbolizava isso, mas não consigo me lembrar como. Então, acho que o zen é um dia como esse, quando você é parte do ar e se lembra de coisas.
                   Uma coisa de que me lembrei é que os garotas costumavam brincar de um jogo. O que você tinha de fazer era pegar uma bola de futebol ou de qualquer outra coisa, uma pessoa a carregaria e todos os outros tentariam derrubá-la E depois quem estivesse com a bola correria com ela e os garotos tentariam derrubá-lo. Isso podia durar horas. Eu nunca entendi direito o sentido desse jogo, mas meu irmão adorava. Ele não gostava de correr com a bola tanto quanto de derrubar as pessoas. Os garotos chamavam o jogo de "detonar a bicha". Até agora não sei o que isso significa.
                 Patrick me contou a história sobre ele e Brad, e agora eu entendo por que o Patrick não ficou com raiva de Brad no baile de ex-alunos por ele ter dançado com uma garota. Quando eles eram calouros, Patrick e Brad foram a uma festa juntos com o resto dos garotos populares. Patrick já era muito popular antes que Sam comprasse fitas legais para ele.
                  Patrick e Brad beberam muito naquela festa. Na verdade, Patrick disse que Brad estava fingindo ser um bebedor melhor do que de fato era. Eles estavam sentados no porão com uma garota chamada Heather e, quando ela saiu para ir ao banheiro, Brad e Patrick ficaram sozinhos. Patrick disse que foi constrangedor e excitante para os dois.
― Você está na turma do Sr. Brosnahan, não é?
― Você já viu o Laser Light Show do Pink Floyd?
― Cerveja antes de bebida mais pesada. Não enjoa nunca.
              Quando acabou o assunto, eles ficaram olhando um para o outro. E terminaram se agarrando ali mesmo no porão. Patrick disse que foi como se o peso de todo o mundo tivesse desabado nos ombros deles.
Mas na segunda-feira, na escola, Brad dizia uma coisa só:
― Cara, eu estava tão chapado. Não me lembro de nada.
           Ele dizia isso a todo mundo que esteve na festa. Disse isso algumas vezes às mesmas pessoas. Chegou a dizer a Patrick. Ninguém viu Patrick e Brad se agarrando, mas Brad continuava dizendo mesmo assim. Naquela sexta-feira, eles foram a outra festa. E desta vez Patrick e Brad ficaram chapados, embora Patrick tenha dito que Brad estava fingindo ficar mais chapado do que na verdade estava. E eles terminaram se agarrando de novo. E na segunda, na escola, Brad disse a mesma coisa:
― Cara, eu fiquei tão doidão. Não me lembro de nada.
               Isso durou sete meses.
            Chegou a um ponto que Brad começou a ficar doidão ou bêbado antes da escola. Não é que ele e Patrick se agarrassem na escola. Eles só faziam isso nas festas às sextas-feiras, mas Patrick disse que Brad não podia sequer olhar para ele no saguão, que dirá falar com ele. E isso foi duro também, porque Patrick gostava mesmo de Brad.
           Quando chegou o verão, e não era preciso se preocupar com a escola nem nada disso, Brad bebeu e fumou ainda mais. Houve uma grande festa na casa de Patrick e Sam com a turma menos popular. Brad apareceu, o que causou uma agitação, porque ele era popular, mas Patrick não revelou por que Brad tinha ido à festa. Quando a maioria das pessoas foi embora, Brad e Patrick foram para o quarto do Patrick.
                Eles fizeram sexo pela primeira vez naquela noite.
       Não quero entrar em detalhes sobre isso, porque é uma coisa muito particular, mas direi que Brad assumiu o papel de garota em termos do onde você põe as coisas. Acho que é muito importante contar isso a você. Quando eles terminaram, Brad começou a chorar muito. Tinha bebido demais. E dessa vez estava doidão o mesmo.
      Independentemente do que Patrick fazia, Brad continuava a chorar. Brad não deixou Patrick abraçá-lo, o que parece triste para mim, porque, se eu faço sexo com uma pessoa, vou querer abraçá-la depois.
Por fim, Patrick vestiu as calças em Brad e disse a ele:
― Finja que você apagou.
             Depois Patrick se vestiu e andou pela casa para voltar para a festa a partir de um ponto diferente. Ele também estava chorando muito e decidiu que, se alguém perguntasse ele diria que os olhos estavam vermelhos de tanta fumaça. No fim, ele deu uma sacudida e foi para a sala onde a festa estava acontecendo. Fingiu que estava bêbado. Procurou a Sam. "Você viu o Brad?" Sam viu como estavam os olhos de Patrick. Depois ela falou para a festa:
"Ei, alguém viu o Brad?"
      Ninguém na festa o tinha visto, então algumas pessoas começaram a procurar por ele. Finalmente o encontraram no quarto de Patrick... dormindo.
        Por fim, Patrick chamou os pais de Brad porque ficou preocupado com ele. Ele não lhes disse o porquê, mas disse que Brad se sentiu mal na festa e precisava ser levado para casa. Os pais de Brad chegaram, e o pai dele, junto com alguns dos rapazes, incluindo Patrick, levaram Brad para o carro.
       Patrick não sabe se Brad estava realmente dormindo ou não naquela hora, mas, se não estava, ele fingiu muito bem. Os pais de Brad o mandaram para um curso de reforço porque o pai não queria que ele perdesse a oportunidade de uma bolsa de estudos de atleta na universidade. Patrick não viu Brad pelo resto do verão.
        Os pais de Brad nunca imaginaram por que seu filho estava chapado e bebendo o tempo todo. Nem eles nem ninguém. Exceto as pessoas que sabiam.
        Quando as aulas começaram, Brad evitou muito o Patrick. Ele nunca ia nas mesmas festas que o Patrick até pouco mais de um mês atrás. Foi na noite em que ele jogou umas pedras na janela de Patrick e disse a ele que ninguém poderia saber, e Patrick entendeu. Eles só se veem agora nos campos de golfe e nas festas, como as de Bob, onde as pessoas são tranquilas e compreendem essas coisas.
Perguntei a Patrick se ele ficou triste de ter de guardar segredo, e Patrick só disse que ele não ficou triste porque pelo menos agora Brad não tinha de beber ou ficar doidão para fazer amor com ele.
Com amor,
Charlie.

                                                          8 de novembro de 1991
Querido amigo,
          Bill me deu meu primeiro B em inglês avançado por causa do meu trabalho sobre Peter Pan. Para dizer a verdade, eu não vi diferença nenhuma dos outros trabalhos. Ele me disse que meu senso de linguagem está melhorando, junto com minha estrutura frasal. Acho ótimo que eu possa estar melhorando nessas coisas sem perceber. Por falar nisso, Bill me deu um A no meu boletim e cartas a meus pais. As notas nesses trabalhos ficaram somente entre nós dois.
             Decidi que talvez eu queira escrever quando crescer. Só não sei o que eu escreveria. Acho que talvez eu escreva para revistas, assim não terei de ler artigos dizendo coisas como as que mencionei antes.
        "Enquanto limpa o molho de mostarda dos lábios, me fale sobre seu terceiro marido e o poder curativo dos cristais." Mas, sinceramente, acho que ser um repórter seria muito ruim, porque não consigo me imaginar sentado à mesa com um político ou uma estrela de cinema fazendo perguntas. Acho que provavelmente só pediria um autógrafo para minha mãe ou coisa assim. E provavelmente ficaria vermelho por fazer isso. Assim, eu pensei em talvez escrever para um jornal, em vez de revista, porque podia fazer perguntas para pessoas comuns, mas minha irmã diz que os jornais sempre mentem. Eu não sei se isso é verdade, então terei de ver quando ficar mais velho.
           Comecei a trabalhar em uma revista de fãs chamada Punk Rock. É uma revista em xerox sobre rock punk e o The Rocky Horror Picture Show. Eu não escrevo para ela, mas ajudo.
              Mary Elizabeth é quem coordena a revista, como é ela quem coordena os shows do Rocky Horror Picture Show. Mary Elizabeth é uma pessoa muito interessante porque tem uma tatuagem que simboliza o budismo, um piercing no umbigo e usa um penteado que a faz parecer maluca, mas quando ela coordena alguma coisa, age como meu pai quando chega em casa depois de "um longo dia". Ela é uma veterana e diz que minha irmã é implicante e esnobe. Eu disse a ela para não falar aquelas coisas da minha irmã novamente.
               De tudo o que eu fiz este ano até agora, acho que gostei mais do Rocky Horror Picture Show. Patrick e Sam me levaram ao cinema para ver o filme na noite de Halloween. É muito divertido, porque todos os garotos se vestem como os personagens do filme, e eles imitam o filme diante da tela. Além disso, as pessoas gritam as dicas para o filme. Acho que você provavelmente já conhece, mas acho melhor contar, para o caso de você não saber.
             Patrick representa "Frank'n Furter". Sam representa "Janet". É muito difícil assistir ao filme porque Sam fica andando de calcinha quando representa Janet. Eu estou me esforçando muito para não pensar nela daquele jeito, e isso está ficando cada vez mais difícil.
Para dizer a verdade, eu amo a Sam. Não é como nos filmes de amor. Eu só olho para ela às vezes e acho que ela é a pessoa mais bonita e mais legal em todo o mundo. Ela também é muito inteligente e divertida. Escrevi um poema para Sam depois que a vi no Rocky Horror, mas não mostrei a ela porque fiquei com vergonha. Eu o escreveria para você, mas acho que seria falta de respeito com a Sam.
            O caso é que a Sam agora está saindo com um cara chamado Craig.
         Craig é mais velho do que meu irmão. Acho que ele talvez tenha vinte e um, porque bebe vinho tinto. Craig representa "Rocky" no Rocky Horror. Patrick diz que Craig é do tipo "atraente e bem-talhado". Não sei de onde Patrick tira essas expressões.
Mas acho que ele está certo, Craig é atraente e bem- talhado. É também uma pessoa muito criativa. Ele está concluindo o Instituto de Arte daqui por ser modelo dos catálogos da JCPenney e coisas assim.
            Ele gosta de tirar fotografias. Eu vi algumas delas e são muito boas. Tem uma foto da Sam que é simplesmente linda. Seria impossível descrever como é bonita, mas vou tentar. Se você ouvir a canção "Asleep" e pensar naqueles lindos dias de chuva que fazem você se lembrar das coisas, e você pensar nos mais belos olhos que já viu, e você chorar, e a pessoa abraçar você, então eu acho que você vai ver a fotografia.
             Eu quero que a Sam pare de gostar do Craig.
          Agora eu acho que talvez você pense que é porque eu tenho ciúmes dela. Não é isso. Sinceramente. É só que Craig não a ouve quando ela fala. Não quero dizer que ele seja um cara ruim, porque não é. É só que ele sempre parece distraído. É como se ele tirasse uma foto da Sam e a foto saísse linda. E ele pensasse que o motivo para a foto sair bonita fosse ele fotografar bem. Se eu fizesse a foto, saberia que o único motivo da beleza é a própria Sam.
          Eu acho que é ruim quando um cara olha para uma garota e pensa que a forma como ele a vê é melhor do que a garota realmente é. E acho ruim quando a forma mais sincera de um cara olhar uma garota é através de uma câmera. E muito difícil para mim ver a Sam se sentir melhor consigo mesma só porque um cara mais velho a vê desta forma.
                   Perguntei a minha irmã sobre isso e ela disse que a Sam tinha uma autoestima baixa. Minha irmã também disse que a Sam tem uma fama de quando estava no segundo ano. De acordo com a minha irmã, a Sam costumava ser uma "rainha da felação". Espero que você saiba o que isso significa, porque eu realmente não posso pensar desse jeito na Sam e descrever isso para você.
Eu estou mesmo apaixonado pela Sam e isso dói muito.
                  Perguntei a minha irmã sobre o garoto no baile. Ela só falou nisso quando eu prometi que não contaria a ninguém, nem mesmo ao Bill. Então eu prometi. Ela disse que estava vendo esse cara secretamente, desde que papai disse que ela não podia. Disse que pensa nele quando ele não está. Disse que vai se casar com ele quando os dois terminarem a faculdade, e ele terminar o curso de direito.
Ela me disse para não me preocupar porque ele não bateu nela novamente desde aquela noite. E disse para não me preocupar porque ele não vai bater nela de novo. Ela não disse mais nada além disso, embora continuasse falando.
                 Foi legal sentar com minha irmã naquela noite, porque ela quase nunca gosta de conversar comigo. Eu fiquei surpreso de ela falar tanto assim, mas acho que, como tem de guardar aquele segredo, não pode conversar com todo mundo. E acho que ela estava louca para conversar com alguém.
             Mas apesar de ela ter me falado o contrário, eu me preocupo muito com ela. Afinal de contas, é minha irmã.
            Com amor,
            Charlie.

                                                     12 de novembro de 1991
Querido amigo,
                Eu adoro Twinkies, e o motivo para eu estar dizendo isso é que todos nós pensamos em razões para viver. Na aula de ciências, o Sr. Z. nos falou de um experimento em que eles pegavam um rato ou um camundongo, e colocavam o rato ou camundongo em um lado de uma gaiola. Do outro lado da gaiola colocavam um pedaço de comida. Depois, colocavam o rato ou camundongo no lado original, e desta vez colocavam eletricidade em todo o piso onde o rato teria de andar para chegar à comida. Fizeram isso por algum tempo e o rato ou camundongo parava de ir até a comida a um certo nível de voltagem. Depois eles repetiram o experimento, mas substituíram a comida por alguma coisa que dava um prazer intenso no rato ou camundongo. Não sei o que era isso que dava tanto prazer, mas estou imaginando que era algum tipo de porre de rato ou camundongo. De qualquer modo, o que os cientistas descobriram foi que o rato ou camundongo suportava uma voltagem muito maior para ter prazer. Ainda mais do que para a comida.
Não sei o significado disso, mas achei muito interessante.
                       Com amor,
                       Charlie.

                                                                   15 de novembro de 1991
Querido amigo,
              Está começando a ficar muito frio por aqui. O belo clima do inverno está quase chegando. A boa notícia é que os feriados de fim de ano estão chegando também, o que eu adoro especialmente agora, porque meu irmão virá para casa em breve. Talvez até para o Dia de Ação de Graças! Pelo menos eu espero que ele faça isso por minha mãe.
              Meu irmão já não telefona para casa há algumas semanas, e mamãe continua falando de suas notas e hábitos de dormir e o que ele come, e meu pai continua dizendo a mesma coisa.
"Ele não está vindo aqui para ser maltratado."
                Pessoalmente, prefiro pensar que a experiência de meu irmão na faculdade é parecida com os filmes. Não quero dizer aquele tipo de filme de festa de fraternidade. É mais como o filme onde o cara conhece uma garota inteligente que veste um monte de suéteres e bebe chocolate quente. Eles falam de livros e coisas assim e se beijam na chuva. Acho que isso seria muito bom para mim, especialmente se a garota fosse de uma beleza não convencional. Elas são o melhor tipo de garota, eu acho. Pessoalmente, acho as "supermodelos" estranhas. Não sei bem por quê.
               Meu irmão, por outro lado, tem pôsteres de "supermodelos", carros, cerveja e coisas como essas nas paredes do quarto dele. Acho que se você juntar a isso um chão bagunçado, vai entender como é o quarto dele. Meu irmão sempre odiou fazer a cama, mas mantém o guarda-roupa organizado. Vai entender.
                 O caso é que, quando meu irmão liga para casa, ele não fala muito. Conversa sobre as aulas um pouco, mas principalmente sobre o time de futebol. A atenção no time é muito grande porque eles são muito bons e têm grandes jogadores. Meu irmão disse que um dos caras provavelmente será milionário um dia, mas que ele é "burro como uma porta". Acho que quis dizer que é burro demais.
Meu irmão contou uma história em que o time todo estava sentado no vestiário, falando todo tipo de coisas que eles tinham de fazer para ir ao futebol universitário. Eles finalmente acabaram falando nas notas dos testes de aptidão, que eu nunca fiz.
                    E esse cara disse: "O meu é 710."
                    E meu irmão disse: "Matemática ou verbal?"
                    E o cara disse: "Hã?"
                    E todo o time caiu na gargalhada.
            Eu sempre quis estar num time como esse. Eu não sei exatamente por que, mas sempre achei que seria divertido ter "dias de glória". Depois, eu teria histórias para contar a meus filhos e colegas do golfe. Acho que podia falar com as pessoas sobre o Punk Rockye ir a pé da escola para casa e coisas assim. Talvez sejam estes os meus dias de glória, e eu não percebi ainda porque eles não envolvem uma bola.
           Eu costumava praticar esportes quando era pequeno, e era realmente muito bom nisso, mas o problema é que sempre me deixavam muito agressivo, e os médicos disseram à minha mãe que eu teria de parar.
            Meu pai teve seus dias de glória antigamente. Eu vi fotos dele quando era jovem. Ele era um homem muito elegante. Não sei nenhuma outra forma de dizer isso. Parecia como todas as fotos antigas. Fotos antigas parecem muito austeras e novas, e as pessoas nas fotografias sempre parecem um pouco mais felizes do que você.
              Minha mãe parece bonita nas fotos antigas. Ela realmente parece mais bonita do que qualquer um, exceto, talvez, a Sam. Às vezes, olho para meus pais e me pergunto o que aconteceu para que eles ficassem como são agora. E depois me pergunto o que vai acontecer com minha irmã quando o namorado dela se formar na faculdade de direito. E como será o rosto do meu irmão em uma figurinha de álbum de futebol americano, ou como ele se parecerá se nunca estiver em uma dessas figurinhas. Meu pai jogou beisebol na faculdade por dois anos, mas teve de parar quando minha mãe engravidou do meu irmão. Foi quando ele começou a trabalhar no escritório. Sinceramente não sei o que meu pai faz.
            Às vezes ele conta uma história. É uma história ótima. Ele tinha de jogar no campeonato estadual de beisebol quando estava no segundo grau. Era o final do nono turno e havia um runner no primeiro. Houve duas bolas fora e o time do meu pai estava atrás por um run. Meu pai era mais novo que a maioria do time da universidade porque era só um segundanista, e acho que o time pensava que ele ia ferrar o jogo. A pressão estava toda em cima dele. Ele ficou muito nervoso. E assustado. Mas depois de alguns lançamentos, ele disse que começou a se sentir "no pique". Quando o lançador ergueu o braço e lançou a bola seguinte, ele sabia exatamente onde ela estava indo. Bateu muito mais forte que qualquer outra bola que já havia batido em toda a sua vida. E fez um home run, e seu time venceu o campeonato estadual. A melhor coisa dessa história é que toda vez que meu pai a conta, ela nunca muda. Ele não é de exagerar.
             Eu penso nessas coisas às vezes, quando estou assistindo a uma partida de futebol americano com Patrick e Sam. Olho para o campo e penso no cara que acabou de fazer um touchdown. Penso que são os dias de glória para o cara, e esse momento será outra história algum dia, porque todos os caras que fazem touchdowns e home runs um dia se tornam pais. E quando seus filhos virem sua foto no Livro do Ano, pensarão que seu pai era austero, elegante e parecia muito mais feliz do que eles são.
Espero poder lembrar a meus filhos de que eles são tão felizes quanto eu nas fotos antigas. E espero que eles acreditem em mim.
                       Com amor,
                        Charlie.

                                                         18 de novembro de 1991
Querido amigo,
                Meu irmão finalmente telefonou ontem e ele não pode vir para casa no fim de semana de Ação de Graças porque tem que ficar na escola por causa do futebol. Minha mãe ficou tão triste que me levou ao shopping para comprar roupas novas.
Eu sei que você vai pensar que o que vou escrever agora é um exagero, mas eu juro a você que não é. Do momento em que entramos no carro à hora em que voltamos para casa, minha mãe literalmente não parou de falar. Nem uma só vez. Nem mesmo quando eu estava na cabine de provas experimentando calças compridas.
                Ela ficou de pé do lado de fora da cabine e falava mais alto. Toda a loja podia ouvir o que ela estava dizendo. Primeiro, era que meu pai devia ter insistido para meu irmão vir para casa mesmo que somente por uma noite. Depois, era que minha irmã tinha de começar a pensar mais no futuro dela e a fazer os exames para faculdades "seguras" no caso de as boas não darem certo. E depois ela começou a dizer que cinza era uma cor boa para mim.
Eu entendo como minha mãe pensa. Entendo mesmo.
               É como quando eu era pequeno e íamos ao supermercado. Minha irmã e meu irmão brigariam por coisas que meus irmãos sempre brigavam, e eu me sentaria atrás no carrinho de compras. E minha mãe ficaria tão chateada no final das compras que dirigiria o carro mais rápido, e eu me sentiria como se estivesse num submarino. Ontem foi mais ou menos assim, exceto que agora eu me sento na frente.
             Quando vi Sam e Patrick na escola hoje, eles concordaram que minha mãe tinha excelente gosto para roupas. Eu disse isso à minha mãe quando cheguei em casa, e ela sorriu. Ela me perguntou se eu queria convidar Sam e Patrick para jantar um dia desses depois dos feriados, porque minha mãe fica muito nervosa durante as festas de fim de ano. Eu chamei Sam e Patrick e eles disseram que iriam.
E eu fiquei empolgadão!
           Da última vez em que um amigo foi jantar na minha casa, foi Michael no ano passado. Comemos tacos. A melhor parte foi que Michael ficou para dormir aqui. Terminamos dormindo muito pouco. Ficamos o tempo todo falando de garotas, filmes e música. A parte de que eu me lembro muito bem foi a de andar pelo bairro à noite. Meus pais estavam dormindo, junto com o resto das casas. Michael olhava em todas as janelas. Estava escuro e silencioso.
― Você acha que essas pessoas são legais? ― disse ele.
― Os Anderson? São. Eles são velhos ― respondi.
― E estas aqui
― Bom, a Sra. Lambert não gosta que joguem beisebol no jardim dela.
― E estas aqui?
― A Sra. Tanner foi visitar a mãe dela por três meses. O Sr. Tanner passa os fins de semana sentado na varanda dos fundos, ouvindo as partidas de beisebol. Eu não sei realmente se eles são legais, porque eles não têm filhos.
― Ela está doente?
― Quem está doente?
― A mãe da Sra. Tanner.
― Acho que não. Minha mãe sabe, mas ela não diz nada.
Michael concordou.
― Eles estão se divorciando.
― Você acha isso?
― Acho.
         Continuamos andando. Michael às vezes tinha uma norma de andar em silêncio. Acho que eu devia mencionar que minha mãe ouviu que os pais de Michael se divorciaram. Ela disse que só setenta por cento dos casais ficam juntos quando perdem um filho. Acho que ela leu isso em alguma revista.
Com amor,
Charlie.

                                                                           23 de novembro de 1991
Querido amigo,
            Você gosta de passar as festas de fim de ano com sua família? Não quero dizer sua mãe e seu pai, mas seu tio e tia, e os primos? Eu, pessoalmente, gosto. E tenho vários motivos para isso.
Primeiro, tenho muito interesse e fico fascinado em ver como as pessoas se amam, mas não gostam realmente umas das outras. Segundo, as brigas são sempre as mesmas.
              Elas em geral começam quando o pai da minha mãe (meu avô) termina seu terceiro drinque. É mais ou menos nessa hora que ele começa a falar pra caramba. Meu avô em geral só se queixa dos negros que estão se mudando para o antigo bairro, e então minha irmã se aborrece com ele, e depois meu avô diz a ela que ela não sabe do que está falando porque mora no bairro mais afastado. E depois ele reclama que ninguém o visita no asilo. E por fim ele começa a contar todos os segredos da família, como o primo fulano "emprenhou" aquela garçonete do Big Boy. Eu devia mencionar que meu avô não ouve muito bem, então ele fala todas essas coisas num tom de voz muito alto.
           Minha irmã tenta brigar com ele, mas ela nunca vence. Meu avô é definitivamente mais teimoso do que ela. Minha mãe em geral ajuda a tia a preparar a comida, que vovô sempre diz que é "seca demais", mesmo que seja sopa. E a tia então chora e se tranca no banheiro.
           Só tem um banheiro na casa da tia da minha mãe, e por isso é um problema quando toda a cerveja começa a afetar meus primos. Eles ficam se contorcendo, batem na porta por alguns minutos e quase convencem minha tia-avó a sair, mas então meu avô a atormenta com alguma coisa e o ciclo recomeça.
         Com a exceção de um feriado, quando meu avô apagou logo depois do jantar, meus primos sempre têm de ir ao banheiro nos arbustos do lado de fora. Se olhasse pela janela como eu faço, veria todos eles, e você teria a impressão de que estavam em uma das caçadas que faziam. Fiquei com muita pena das minhas primas e de minhas outras tias-avós, porque elas não têm a alternativa dos arbustos, especialmente quando está frio.
         Eu devia mencionar que meu pai em geral se senta em completo silêncio e bebe. Meu pai não é de beber muito, mas, quando está com a família da minha mãe, ele fica "alto", como diz meu primo Tommy. No fundo, acho que meu pai preferia passar as festas de fim de ano com a família dele em Ohio. Dessa forma, ele não teria de ficar perto do meu avô. Ele não gosta muito do meu avô, mas não fala nada sobre isso. Nem na viagem para casa. Ele só não acha que aquele seja o lugar dele.
             Quando a noite vai chegando ao fim, meu avô em geral está bêbado demais para fazer alguma coisa. Meu pai, meu irmão e meus primos o levam para o carro da pessoa que está com menos raiva dele. Sempre é minha tarefa abrir as portas para eles pelo caminho. Meu avô é muito gordo.
           Eu me lembro do que houve uma vez, quando meu irmão levou meu avô de volta para o asilo e eu fui junto, meu irmão sempre entendia meu avô. Raramente ficava com raiva dele, a não ser que vovô dissesse alguma coisa sobre minha mãe ou minha irmã, ou fizesse uma cena em público. Lembro que estava nevando muito e tudo estava muito silencioso. Quase pacífico. E meu avô se acalmou e começou a falar de uma coisa diferente.
            Ele nos disse que, quando tinha dezesseis anos, teve de deixar a escola porque o pai dele havia morrido e alguém tinha de sustentar a família. Ele falou da época em que tinha de ir para a fábrica três vezes por dia para ver se havia algum trabalho para ele. E falou do frio que fazia. E de como ele estava faminto, porque ele queria que sua família comesse sempre antes dele. Que não entenderíamos o que ele estava dizendo porque tínhamos sorte. Depois, ele falou de suas filhas, minha mãe e tia Helen:
          ― Eu sei como sua mãe se sente a meu respeito. Conheço a Helen também. Houve uma vez... eu ia para a fábrica... não tinha trabalho nenhum... cheguei em casa às duas da manhã... muito chateado... sua mãe me mostrou os boletins da escola... média C+... e eram garotas inteligentes. Então, eu fui ao quarto delas e chamei as duas à razão com uns tapas... e depois disso, quando elas estavam chorando, peguei os boletins e disse... "Que isso nunca mais aconteça novamente." Ela ainda fala nisso... sua mãe... mas sabe de uma coisa?... nunca aconteceu novamente... elas foram para a faculdade... as duas. Tudo o que eu queria era mandá-las para a universidade... Sempre quis que elas estudassem... Queria que Helen compreendesse isso. Acho que sua mãe entendeu... no fundo... ela é uma boa mulher... vocês devem ter orgulho dela.
          Quando contei isso à minha mãe, ela pareceu ficar muito triste, porque ele nunca disse essas coisas a ela. Nunca. Nem mesmo quando ele a acompanhou na igreja em seu casamento.
           Mas aquele Dia de Ação de Graças foi diferente. Foi o jogo de futebol do meu irmão, trouxemos uma fita de videocassete dele para meus parentes verem. Toda a família ficou reunida em torno da TV, até minhas tias-avós, que nunca assistiam a futebol. Eu nunca vou me esquecer da expressão no rosto delas quando meu irmão entrou em campo. Foi uma mistura de todas as coisas. Meu primo trabalha em um posto de gasolina. E meu outro primo parou de trabalhar por dois anos desde que machucou a mão. E o outro primo estava tentando voltar à faculdade há uns sete anos. E meu pai disse uma vez que eles tinham muita inveja do meu irmão, porque ele teve uma oportunidade na vida e estava tirando proveito dela.
              Mas, naquele momento, quando meu irmão entrou em campo, tudo aquilo passou e todos ficaram orgulhosos. A uma certa altura, meu irmão fez uma grande jogada no terceiro tempo e todos gritaram, apesar de alguns de nós já termos visto o jogo antes. Olhei para o meu pai e ele estava sorrindo. Olhei para minha mãe e ela estava sorrindo, apesar de estar preocupada com que meu irmão não se machucasse, o que era estranho, porque era um vídeo de um jogo antigo, e ela sabia que ele não tinha se machucado. Minhas tias avós, meus primos e seus filhos, todos estavam sorrindo também. Até a minha irmã. Só duas pessoas não sorriam ali. Eu e meu avô.
Meu avô estava chorando.
             O tipo de choro que é silencioso e secreto. O tipo de choro que só eu percebi. Pensei nele indo ao quarto da minha mãe quando ela era pequena e batendo nela, erguendo o boletim e dizendo que as notas ruins nunca acontecessem novamente. E acho agora que talvez ele se referia a meu irmão mais velho. Ou minha irmã. Ou eu. Que ele tinha certeza de que foi o último a trabalhar numa fábrica.
Não sei se isso é bom ou ruim. Não sei se é melhor ter seus filhos felizes e não irem para a faculdade. Não sei se é melhor estar perto de sua filha ou ter certeza de que ela tenha uma vida melhor do que a sua. Simplesmente não sei. Eu fiquei em silêncio e o observei.
              Quando o jogo acabou e o jantar terminou, todos deram agradeceram a Deus. Grande parte teve a ver com meu irmão ou a família, ou filhos, ou Deus. E todos foram sinceros quando disseram isso, apesar do que pudesse vir a acontecer no dia seguinte. Quando chegou a minha vez, pensei muito, que era a primeira vez em que eu sentava à mesa grande com os mais velhos, uma vez que meu irmão não está aqui para ocupar este lugar.
                     ― Sou grato por meu irmão ter jogado futebol na televisão, porque assim ninguém brigou.
           A maioria das pessoas em torno da mesa ficou sem graça. Algumas pareciam com raiva. Meu pai parecia pensar que eu estava certo, mas não quis dizer nada porque era da família. Minha mãe ficou nervosa com o que o dela faria. Só uma pessoa na mesa disse alguma coisa, minha tia-avó, aquela que em geral se tranca no banheiro.
                     ― Amém.
          E de certa forma, eu vi que estava tudo bem.
         Quando estávamos prontos para ir embora, fui até meu avô e lhe dei um abraço e um beijo na testa. Ele limpou a testa com a palma da mão e olhou para mim. Ele não gostava que os rapazes da família tocassem nele. Mas eu estava muito contente de ter feito isso, para o caso de ele morrer. Nunca fiz o mesmo com minha tia Helen.
Com amor,
Charlie.

                                                       7 de dezembro de 1991
Querido amigo,
          Você já ouviu falar de uma coisa chamada "Papai Noel Secreto"? É parecido com o amigo secreto. É uma brincadeira em que um grupo de amigos tira de um chapéu papeizinhos com os nomes e você tem de comprar um monte de presentes de Natal para a pessoa que você tirou. Os presentes são colocados "secretamente" nos armários das pessoas na escola quando elas não estão lá. Depois, no fim, a gente tem uma festa, e todas as pessoas revelam quem elas realmente são e a quem deram os presentes.
               Sam começou a fazer isso com seu grupo de amigos três anos atrás. Agora é uma espécie de tradição. E a festa no final é sempre a melhor do ano. Acontece à noite, depois de nosso último dia de aula e antes das férias. Não sei quem me tirou. Eu tirei o Patrick. Fiquei muito contente de ter tirado o Patrick, embora eu quisesse ter tirado a Sam. Não tenho visto o Patrick há algumas semanas, exceto na aula de trabalhos manuais, porque ele tem passado muito tempo com Brad, então, pensar nos presentes é uma boa forma de pensar nele.
O primeiro presente será uma fita gravada. Já sei o que vou fazer. Já escolhi as músicas e um tema. Vai se chamar "Aquele Inverno". Mas decidi não fazer uma capa colorida. O lado A tem um monte de canções do Village People e Blondie, porque o Patrick gosta muito desse tipo de música. Tem também "Smells Like Teen Spirit", do Nirvana, que a Sam e o Patrick adoram. Mas o lado B é o que eu mais gosto. Tem o tipo de música de inverno. São estas aqui:
- “Asleep”, dos Smiths
- "Vapour Traip, de Ride
- "Scarborough Fair", de Simon & Garfunkel
- "A Whiter Shade of Pale", do Procol Harum
- "Time of No Reply", do Nick Drake
- "Dear Prudence", dos Beatles
- "Gypsy", da Suzanne Vega
- "Nights in White Satin", dos Moody Blues
- "Daydream", dos Smashing Pumpkins
- "Dusk", do Gênesis (antes do Phil Collins!)
- "MLK", do U2
- "Blackbird", dos Beatles
- "Landslide", do Fleetwood Mac
E finalmente...
- "Asleep", dos Smiths (de novo!)
             Passei a noite toda trabalhando nela e espero que Patrick goste tanto quanto eu. Especialmente do lado B. Espero que ele possa ouvir o lado B sempre que estiver dirigindo sozinho e sentir que pertence a alguma coisa, mesmo que esteja triste. Espero que seja assim para ele.
            Tive uma sensação maravilhosa quando finalmente segurei a fita. Achei que tinha a mim mesmo na palma da mão, era uma fita que continha todas aquelas lembranças e sentimentos e grandes alegrias e tristezas. Bem na palma da minha mão. E penso em como muitas pessoas têm adorado essas canções. E como muitas pessoas passaram por maus bocados por causa dessas canções. E como muitas pessoas tiveram bons momentos com essas canções. E o quanto essas canções realmente significam. Acho que seria ótimo ter escrito uma delas. Aposto que, se eu tivesse escrito uma dessas músicas, ficaria muito orgulhoso. Espero que as pessoas que escreveram essas canções sejam felizes. Tomara que elas se sintam realizadas. Tomara mesmo, porque elas me fazem feliz. E eu não sou o único.
Mal posso esperar para tirar minha carteira de motorista. Está chegando a hora!
            Aliás, eu ainda não lhe falei do Bill. Mas acho que não há muito a dizer, porque ele continua me dando livros que ele não dá aos alunos dele, e eu continuo lendo os livros, e ele continua me pedindo para escrever trabalhos, e eu faço. No mês passado, por aí, li O grande Gatsby e A Separate Peace. Estou começando a ver uma tendência no tipo de livro que o Bill me dá para ler. E, como as fitas de músicas, é maravilhoso colocar cada um deles na palma da minha mão. Todos são meus preferidos. Todos.
Com amor,
Charlie.

                                                 11 de dezembro de 1991
Querido amigo,
            Patrick adorou a fita! Acho que ele sabe que sou o amigo oculto dele, porque acho que ele sabe que só eu teria gravado uma fita como aquela. Ele também conhece minha letra. Não sei por que, só me lembro dessas coisas quando já é tarde demais. Eu devia ter deixado a fita para ser meu último presente.
          Aliás, eu tenho pensado no meu segundo presente para o Patrick. É poesia magnética. Já ouviu falar disso? Caso você não conheça, eu vou explicar. Um cara ou uma garota coloca um punhado de palavras em uma folha de ímã e depois corta as palavras em peças separadas. Você as coloca na geladeira e depois escreve poemas enquanto faz um sanduíche. É muito divertido.
            O presente do meu Papai Noel Secreto não foi nada de especial. O que me deixou triste. Aposto quanto você quiser que Mary Elizabeth é minha amiga oculta, porque só ela me daria meias.
Com amor,
Charlie.

                                        19 de dezembro de 1991
Querido amigo,
                   Depois eu ganhei calças de um bazar de caridade. Também ganhei uma gravata, uma camisa branca, sapatos e um cinto velho. Estou achando que meu último presente na festa será o paletó de um terno, porque é a única coisa que está faltando. Soube por um bilhete datilografado que tenho de vestir o que quer que tenha ganhado para a festa. Acho que tem alguma coisa por trás disso.
                 A boa notícia é que Patrick gostou muito dos meus presentes. O presente número três foi um jogo de tinta para aquarela e papéis. Achei que ele ia gostar, apesar de ele nunca os usar. O presente número quatro foi uma gaita e um livro que ensina a tocar. Provavelmente vai acontecer o mesmo que com a aquarela, mas acredito que todo mundo deve ter aquarela, poesia magnética e uma gaita.
               Meu último presente antes da festa é um livro chamado The Mayor of Castro Street. É sobre um homem chamado Harvey Milk, que foi um líder gay em San Francisco. Fui à biblioteca quando o Patrick me disse que era gay e fiz alguma pesquisa, porque sinceramente eu não sabia muita coisa a esse respeito. Encontrei um artigo sobre um documentário de cinema sobre Harvey Milk. E como não consegui encontrar o filme, procurei por seu nome e achei o livro.
                  Eu mesmo não li, mas, pela descrição, o livro parecia muito bom. Espero que signifique alguma coisa para o Patrick. Mal posso esperar pela festa, e assim poderei dar a ele meu presente. Aliás, tenho de fazer as provas finais do semestre e estou muito ocupado, e eu poderia falar com você sobre tudo isso, mas não parece tão interessante como as outras coisas que vou fazer nos feriados.
Com amor,
Charlie.

                                                      21 de dezembro de 1991
Querido amigo,
                Uau. Uau. Posso descrever o quadro para você, se você quiser. Estávamos todos sentados na casa de Sam e Patrick, onde eu nunca tinha ido antes. Muito despojada. E estávamos todos trocando nossos presentes finais. As luzes do lado de fora estavam acesas, estava nevando e o momento parecia mágico. Como se estivéssemos em outro lugar. Como se estivéssemos em um lugar melhor.
                  Foi a primeira vez que vi os pais de Sam e Patrick. Eles foram muito legais. A mãe de Sam é muito bonita e conta ótimas piadas. Sam disse que ela era atriz quando jovem. O pai de Patrick é muito alto e tem um forte aperto de mão. Ele também cozinha muito bem.
Muitos pais fazem com que a gente se sinta constrangido quando os conhece. Mas não os pais de Sam e Patrick. Eles foram simpáticos durante todo o jantar e, quando o jantar terminou, eles saíram para que nós pudéssemos ter a nossa festa. Não ficaram em cima da gente nem um minuto. Só deixaram a gente fingir que a casa era nossa. Então, decidimos fazer a festa na sala de "jogos", que não tem jogos, mas tem um tapete grande.
              Quando eu revelei que o Patrick era meu amigo oculto, todo mundo riu, porque todo mundo sabia, e Patrick fez sua melhor imitação de surpresa, o que foi legal da parte dele. Depois, todos perguntaram qual era meu último presente, e eu disse a eles que era um poema que eu li há muito tempo. Era um poema do qual Michael havia feito uma cópia para mim. E eu o li milhares de vezes, porque não sei quem escreveu. Não sei se foi em um livro ou numa aula. E não sei a idade do autor também. Mas sei que queria conhecê-lo. Eu queria que esta pessoa estivesse bem.
                Então, todos pediram para eu me levantar e ler o poema. E eu não fiquei envergonhado, porque estávamos tentando agir como os mais velhos, e bebíamos uísque. E eu estava meio alto. Ainda estou um pouco alto, mas tenho de contar isso a você. Então, eu me levantei e, antes de ler o poema, pedi a todos que contassem quem era o autor, se soubessem.
              Quando terminei de ler o poema, todos estavam em silêncio. Um silêncio muito triste. Mas a coisa maravilhosa foi que não era uma tristeza ruim. Era só alguma coisa que fazia com que todos olhassem para os outros e soubessem quem eles eram. Sam e Patrick olharam para mim. E eu olhei para eles. E acho que eles sabiam. Não alguma coisa específica. Apenas sabiam. E eu acho que é tudo o que você pode pedir de um amigo.
              Foi aí que Patrick colocou o lado B da fita que dei para ele e encheu o copo de todos com uísque. Acho que todos parecíamos meio bêbados, mas não nos sentíamos idiotas. Posso afirmar isso a você,
             À medida que as canções continuavam tocando, Mary Elizabeth se levantou. Mas ela não estava segurando um paletó de terno. Na verdade, ela não era minha amiga oculta. Ela era amiga oculta de outra garota com tatuagem e piercing no umbigo, cujo nome era Alice. Deu a ela um esmalte de unhas preto em que Alice estava de olho. E Alice ficou muito grata. Eu estava sentado aqui, olhando em tomo da sala. Procurando o paletó. Sem saber quem o estaria segurando.
                Sam se levantou então, e deu a Bob um cachimbo de maconha feito pelos índios americanos, o que parecia apropriado.
Mais pessoas deram mais presentes. E mais abraços foram trocados. E por fim chegou ao final. Ninguém saiu, exceto Patrick. Ele se levantou e caminhou para a cozinha.
"Alguém quer batatas fritas?"
                Todos disseram que sim. E ele voltou com três tubos de Pringles e um paletó de terno. E caminhou na minha direção. E disse que todos os grandes escritores usavam terno o tempo todo.
             Então eu vesti o paletó, embora não achasse que realmente merecia isso só porque escrevia os trabalhos para Bill, mas foi um presente muito legal, e todos bateram palmas para ele. Sam e Patrick concordaram que eu estava elegante. Mary Elizabeth sorriu. Acho que foi a primeira vez na minha vida em que senti que parecia "perfeito". Sabe o que eu quero dizer? É aquela sensação legal, quando você se olha no espelho e seu cabelo está ótimo pela primeira vez na sua vida? Não acho que deva me basear tanto em peso, músculos e um bom cabelo, mas quando acontece é legal. É legal mesmo.
                O resto da noite foi muito especial. Como muitas pessoas estavam indo com suas famílias para lugares como a Flórida e Indiana, trocamos presentes com quem não havíamos tirado no amigo oculto.
Bob deu a Patrick uma trouxinha de maconha com um cartão de Natal. Ele sequer o envelopou. Mary Elizabeth deu brincos a Sam. E Alice também. E Sam deu brincos a elas também. Acho que era alguma coisa particular das garotas. Tenho de admitir que eu fiquei um pouco triste porque, tirando Sam e Patrick, ninguém me deu presentes. Acho que não sou muito íntimo deles, então isso faz sentido. Mas ainda assim fiquei meio triste.
E então chegou a minha vez. Dei a Bob um tubinho de plástico de bolhas de sabão porque parecia combinar com a personalidade dele. Acho que eu estava certo.
"Demais!", foi o que ele disse.
Ele passou o resto da noite soprando bolhas de sabão no teto.
                  A próxima foi Alice. Dei a ela um livro de Anne Rice, porque ela está sempre falando dela. E ela olhou para mim como se não acreditasse que eu sabia que ela gostava de Anne Rice. Acho que ela não sabe o quanto fala ou o quanto eu ouço. Mas ela me agradeceu da mesma forma. A seguinte foi Mary Elizabeth. Dei a ela quarenta dólares dentro de um cartão. O cartão dizia uma coisa muito simples: "Para serem gastos na impressão em cores do Punk Rocky próxima edição."
              E ela olhou para mim de uma forma estranha. Depois todos começaram a olhar para mim desse jeito, exceto Sam e Patrick. Acho que eles começaram a se sentir mal porque não tinham me dado nada. Mas eu não acho que devesse dar, porque não acho que isso tenha importância. Mary Elizabeth apenas sorriu, agradeceu e depois parou de olhar nos meus olhos.
           Depois foi a Sam. Fiquei pensando em seu presente por um longo tempo. Acho que pensei em seu presente pela primeira vez em que a vi. Não quando a conheci, ou quando a encontrei, mas quando a vi, se entende o que quero dizer. Havia um cartão.
          Dentro do cartão, eu dizia a Sam que o presente que eu estava dando havia sido dado a mim por minha tia Helen. Era uma velha gravação em 45 rpm com "Something", dos Beatles. Eu costumava ouvir todo o tempo quando era pequeno e pensava em coisas de gente grande. Eu ia para a janela do meu quarto e olhava meu reflexo no vidro, e as árvores por trás, e ouvia a música por horas. Decidi na época que, quando conhecesse alguém que eu achasse tão bonita quanto a canção, eu daria o disco de presente a essa pessoa. E não quis dizer bonita por fora. Eu quis dizer bonita de todas as formas. E assim, eu estava dando para Sam.
           Sam me olhou com doçura. E me abraçou. E eu fechei os olhos, porque só queria sentir os seus abraços. E ela me deu um beijo na testa e sussurrou para que ninguém mais ouvisse:
                    ― Eu te amo.
              Eu sabia que ela queria dizer no sentido de amizade, mas não me preocupei, porque tinha sido a terceira vez desde que tia Helen morreu que eu ouvia isso de alguém. As outras duas vezes foram da minha mãe.
            Eu mal conseguia acreditar que a Sam realmente tinha dado um presente, porque eu honestamente pensava o "eu te amo" era o suficiente. Mas ela me deu um presente. E, pela primeira vez, uma coisa legal como essa me fez sorrir vez de chorar. Acho que Sam e Patrick foram ao mesmo brechó, porque seus presentes vieram juntos. Ela me levou o quarto dela e me colocou de pé diante da cômoda, que estava coberta por uma toalha com cores vivas. Ela tirou a toalha, e lá estava eu, de pé em meu velho terno, olhando para uma máquina de escrever com uma fita nova. Na máquina havia uma folha de papel.
           Naquela folha de papel Sam escreveu: “Escreva sobre mim de vez em quando." E eu datilografei só isso para ela, de pé, ali no seu quarto: "Vou escrever."
           E me senti bem em saber que aquelas foram as duas primeiras palavras que eu escreveria na nova máquina de escrever antiga que a Sam me deu. Nós nos sentamos em silêncio por um momento e ela sorriu. Eu voltei à máquina de escrever e datilografei uma coisa:
"Eu também te amo."
E Sam olhou o papel, e olhou para mim.
                   ― Charlie... você já beijou uma garota?
      Sacudi minha cabeça em negativa. Tudo estava muito silencioso.
               ― Nem mesmo quando você era menor?
     Sacudi a cabeça novamente. E ela pareceu muito triste.
      Ela me falou da primeira vez em que beijou. Me contou que foi com um dos amigos do pai dela. Sam tinha sete anos. E ela não contou a ninguém, exceto a Mary Elizabeth e depois Patrick, há um ano. E ela começou a chorar. E disse uma coisa que nunca vou esquecer, nunca:
                  ― Eu sei que você sabe que eu gosto do Craig. E sei que te disse para não pensar em mim daquele jeito. E sei que não podemos ficar juntos assim. Mas quero que você esqueça todas essas coisas por um minuto, tá bom?
                     ― Tá.
                    ― Quero ser a primeira pessoa a beijar você. Tudo bem?
                    ― Tudo.
         E ela me beijou. Foi um tipo de beijo que eu nunca poderia contar a meus amigos como foi veemente. Foi tipo de beijo que me fez saber que eu nunca seria tão feliz em toda a minha vida.

Em uma folha de papel amarelo com linhas verdes ele escreveu um poema
E o intitulou "Chops" porque era o nome de seu cão
E era o que estava em toda parte
E seu professor lhe deu um A e uma estrela dourada
E sua mãe o abraçou à porta da cozinha e leu o poema para as tias
Era o ano em que o padre Tracy levava todas as crianças ao zoológico
E ele deixou que cantassem no ônibus
E sua irmãzinha tinha nascido com unhas minúsculas e nenhum cabelo
E sua mãe e seu pai se beijaram tanto
E a garota da esquina mandou para ele um cartão de Dias dos Namorados assinado com vários X
e ele teve de perguntar ao pai o que significava X
E seu pai deixou que ele dormisse na sua cama à noite
E era sempre lá que ele dormia
Em uma folha de papel com linhas azuis ele escreveu um poema
E o intitulou "Outono" porque era o nome da estação
E era o que estava em toda parte
E seu professor lhe deu um A
e o pediu para escrever com mais clareza
E sua mãe não o abraçou à porta da cozinha por causa da pintura nova
E as crianças disseram a ele que o padre Tracy fumava cigarros
E largava as guimbas no banco da igreja
E às vezes elas faziam buracos
Que era o ano de sua irmã usar óculos com lentes grossas e armação preta
E a garota da esquina riu
quando ele pediu para ver Papai Noel
E os garotos perguntaram por que
a mãe e o pai se beijavam tanto
E seu pai não o cobria mais na cama à noite
E seu pai ficou furioso
quando ele chorou por isso.
Em um pedaço de papel de seu caderno ele escreveu um poema
E o intitulou "Inocência: Uma Questão"
porque a questão era sobre uma garota
E isso estava em toda parte
E seu professor lhe deu um A
e um olhar muito estranho
E sua mãe não o abraçou à porta da cozinha
porque ele nunca o mostrou a ela
Foi o primeiro ano depois da morte do padre Tracy
E ele esqueceu como terminava
o Creio em Deus Pai
E ele pegou a irmã se agarrando na varanda dos fundos
E sua mãe e seu pai nunca se beijavam, nem mesmo conversavam
E a garota da esquina usava maquiagem demais
O que fez ele tossir quando a beijou, mas ele a beijou mesmo assim porque era a coisa certa a fazer
E às três da manhã ele se aninhou na cama
seu pai roncava alto
E por isso que no verso de uma folha de papel pardo
ele tentou outro poema
E o intitulou de "Absolutamente Nada"
Porque era o que estava em toda parte
E ele se deu um A
e um corte em cada maldito pulso
E se encostou na porta do banheiro porque nessa hora ele não pensou que poderia alcançar a cozinha.

Este foi o poema que eu li para o Patrick. Ninguém sabia quem era o autor, mas Bob disse que já o ouvira antes, e ele soube que era um bilhete suicida de um garoto. Eu espero que não seja, porque não sei se gostei do final.
Com amor,
Charlie.

                                          23 de dezembro de 1991
Querido amigo,
            Sam e Patrick viajaram com a família para o Grand Canyon ontem. Não estou me sentindo muito mal, porque ainda posso me lembrar do beijo da Sam. Agora me sinto em paz e em ordem. Cheguei a pensar em não lavar meus lábios, como fazem na tevê, mas depois achei que isso seria vulgar demais. Então, em vez disso, passei o dia andando pelo bairro. Cheguei a pegar meu velho trenó e meu velho cachecol. Há algo de confortável nisso para mim.
               Subi a colina onde costumava usar o trenó. Havia muitas crianças ali. Eu fiquei vendo elas voarem. Dar saltos e apostar corridas. E pensei que todas aquelas crianças um dia iam crescer. E todas aquelas crianças iam fazer as coisas que nós fazemos. E todos eles beijarão alguém um dia. Mas agora andar de trenó era o bastante. Acho que seria ótimo se bastasse um trenó, mas não é assim.
             Estou muito contente que o Natal e meu aniversário estejam perto, porque isso significa que terminarão logo, porque já posso me imaginar indo para um lugar ruim aonde eu costumava ir. Depois que tia Helen se foi, eu fui para esse lugar. Foi tão ruim que minha mãe tenha me levado a um médico e eu tenha perdido um ano na escola. Mas agora estou tentando não pensar demais nisso, porque faz com que eu me sinta pior.
            É como quando você se olha no espelho e diz seu nome. E chega a um ponto em que nada parece real. Bom, às vezes, eu posso fazer isso. Mas não preciso de uma hora diante do espelho. Acontece muito rápido e as coisas começam a escapulir. E eu abro meus olhos e não vejo nada. E depois começo a respirar com dificuldade, tentando ver alguma coisa, mas não consigo. Não acontece o tempo todo, mas quando acontece fico assustado.
Quase aconteceu esta amanhã, mas eu lembrei do beijo da Sam e passou.
          Provavelmente eu não devia estar escrevendo demais sobre isso porque traz tudo aquilo à tona. Faz eu pensar demais. E estou tentando participar. Só que é difícil, porque a Sam e o Patrick estão no Grand Canyon.
          Amanhã, vou com minha mãe comprar presentes para todos. E depois vamos comemorar meu aniversario. Eu nasci em 24 de dezembro. Não sei se já lhe disse isso antes. É um aniversário estranho, porque está perto demais do Natal. Depois nós comemoramos o Natal com a família do meu pai, e meu irmão virá para casa por algum tempo. Depois vou fazer meu exame de motorista, então vou estar muito ocupado enquanto Sam e Patrick estiverem fora.
           Hoje à noite assisti um pouco de televisão com minha irmã, mas ela não quis ver os especiais de Natal que estavam passando, então decidi subir as escadas e ler.
            Bill me deu um livro para ler durante as férias. O apanhador no campo de centeio. Era o livro favorito de Bill quando ele tinha a minha idade. Ele disse que era o tipo de livro feito para nós.
            Li as primeiras vinte páginas. Não sei como me senti em relação a ele, mas parecia apropriado naquele momento. Espero que Sam e Patrick telefonem no meu aniversário. Eu me sentiria muito melhor.
Com amor,
Charlie.

                                                25 de dezembro de 1991
Querido amigo,
                 Estou sentado na velha cama do meu pai em Ohio. A família ainda está no primeiro andar da casa. Não estou me sentindo muito bem. Não sei o que há de errado comigo, mas estou começando a ficar assustado. Queria voltar para casa hoje à noite, mas nós sempre passamos a noite aqui. Não quero contar à minha mãe sobre isso porque ela ficaria preocupada. Eu contaria a Sam e Patrick, mas eles não telefonaram ontem. E nós saímos esta manhã depois de abrirmos os presentes. Talvez eles tenham ligado à tarde. Espero que não tenham ligado à tarde, porque eu não estava aqui. Espero que você não se importe de eu estar contando isso. Não sei o que fazer. Eu sempre fico triste quando isso acontece e queria que Michael estivesse aqui. E queria que tia Helen estivesse aqui. Sinto falta da tia Helen. Ler o livro também não está me ajudando. Não sei. Só estou pensando muito rápido. Rápido demais. Como hoje à noite.
                     A família assistia ao filme A felicidade não se compra, que é muito bonito. E tudo em que eu pensava era por que eles não fizeram um filme sobre o tio Billy. George Bailey era um homem importante na cidade. Por causa dele, um monte de gente saiu da miséria. Ele salvou uma cidade e, quando seu pai morreu, era o único cara que podia fazer isso. Ele queria viver uma aventura, mas ficou ali e sacrificou seus sonhos pelo bem da comunidade. E quando isso o deixou arrasado, ele pensou em se matar. Ele ia morrer porque o dinheiro do seguro de vida seria suficiente para cuidar de sua família.
                      E então um anjo desce e mostra a ele como a vida seria se ele não tivesse nascido. Como toda a cidade teria sofrido. E como sua esposa teria sido uma "velha solteirona". E este ano minha irmã sequer disse alguma coisa sobre como aquilo era ultrapassado. Todo ano ela diz alguma coisa do tipo "Mary estava trabalhando para viver", e só porque não era casada isso não significava que ela era inútil. Mas este ano ela não disse isso. Não sei por quê. Achei que podia ser o namorado secreto dela. Ou talvez o que aconteceu no carro no caminho para a casa da minha avó. Eu queria que o filme fosse sobre o tio Billy porque ele bebe muito, é gordo e sempre perde dinheiro. Queria que o anjo descesse e mostrasse a nós como a vida do tio Billy tinha significado. E assim eu me sentiria melhor.
                   Isso começou em casa ontem. Eu não gosto do meu aniversário. Não gosto de jeito nenhum. Fui ao shopping com minha mãe e minha irmã, e mamãe estava de mau humor porque não tinha vaga no estacionamento. E minha irmã estava de mau humor porque não podia comprar nada para o namorado secreto e esconder isso de mamãe. Ela teria que voltar sozinha mais tarde.
                  Eu me sentia estranho. Muito estranho, porque eu andava por todas as lojas sem sabe que presente meu pai gostaria de ganhar de mim. Eu sabia o que comprar para Sam e Patrick, mas não sabia o que compraria ou daria ou faria para meu próprio pai. Meu irmão gosta de pôsteres de garotas e latas de cerveja. Minha irmã gosta de um bônus do cabeleireiro. Minha mãe gosta de filmes antigos e plantas. Meu pai só gosta de golfe, e esse não é um esporte de inverno, a não ser na Flórida, e nós não moramos lá. E ele não joga mais beisebol. Ele não gosta nem mesmo de se lembrar disso, a não ser que conte as histórias. Eu só queria saber o que comprar para meu pai porque eu o amo. E eu não conheço ele. E ele não gosta de falar de coisas como essas.
                         ― Bom, por que você não se junta à sua irmã e compra aquele suéter para ele?
                         ― Não quero. Quero comprar alguma coisa para ele. Que tipo de música ele gosta?
                     Meu pai não ouve muita música e as coisas que ele gosta, ele já tem.
                        ― Que tipo de livro ele gosta de ler?
                  Meu pai não lê mais muitos livros, porque ele ouve os livros em fitas cassete no caminho para o trabalho e pega de graça na biblioteca.
                    Que tipo de filmes? Que tipo de qualquer coisa?
                    Minha irmã decidiu comprar o suéter sozinha. E ela começou a ficar aborrecida comigo porque precisava de tempo para voltar à loja para comprar o presente para o namorado secreto.
                        ― Compre umas bolas de golfe para ele, pelo amor de Deus, Charlie.
                        ― Mas esse é um esporte de verão.
                        ― Mãe! Quer fazer ele comprar alguma coisa?
                       ― Charlie, calma. Está tudo bem.
        Eu me senti tão triste. Não sei o que aconteceu. Minha mãe estava tentando ser legal comigo, porque, quando eu tenho essas coisas, é ela que tenta manter as coisas sob controle.
                    ― Desculpe, mamãe.
                   ― Não, não peça desculpas. Você quer dar um bom presente para seu pai. É uma boa coisa.
                  ― Mãe! ― Minha irmã estava ficando muito aborrecida.
                 ― Charlie, você pode comprar para seu pai o que quiser. Eu sei que ele vai adorar. Agora, calma. Está tudo bem.
            Minha mãe me levou a quatro lojas diferentes. Em cada uma delas minha irmã se sentou na cadeira mais próxima e resmungou. Finalmente eu encontrei a loja perfeita. Era de cinema. E descobri um vídeo do último episódio de M*A*S*H, sem os comerciais. E me senti muito melhor. Depois comecei a falar com minha mãe sobre quando assistimos ao filme juntos.
             ― Ela sabe, Charlie. Ela estava lá. Vamos logo. Que saco.
           Minha mãe disse à minha irmã para cuidar da própria vida, e ela me ouviu contar a história que já conhecia, deixando de fora a parte em que meu pai chorou porque era nosso segredinho. Minha mãe sempre me dizia que eu conto histórias muito bem. Eu amo minha mãe. E, desta vez, eu disse isso a ela. E ela me disse que me amava também. E as coisas ficaram bem por algum tempo.
            Estávamos sentados à mesa do jantar, esperando meu pai vir para casa com meu irmão do aeroporto. Ele estava muito atrasado e minha mãe começou a se preocupar porque estava nevando muito lá fora. E ela manteve minha irmã em casa porque precisava de ajuda com o jantar. Ela queria que fosse especial para meu irmão e para mim, porque ele estava voltando para casa e era meu aniversário.
           Mas minha irmã queria comprar um presente para o namorado. E estava num mau humor terrível. Parecia uma daquelas pirralhas nos filmes da década de 1980 e minha mãe dizia "jovenzinha" a toda hora no fim de cada frase.
           Meu pai finalmente telefonou e disse que, por causa da neve, o avião do meu irmão ia se atrasar muito. Eu só ouvi o lado da minha mãe na discussão:
             ― Mas é o jantar de aniversário do Charlie... Eu não espero que você tome alguma providência... Ele perdeu o voo? Só estou perguntando... Não fique achando que a culpa é sua... Não... Não posso manter a comida aquecida... Vai ressecar... O que... Mas é o favorito dele... Bem, acho que vou ter de servir o jantar... É claro que eles estão com fome... Vocês já estão atrasados uma hora... Bom, você podia ter ligado...
          Não sei quanto tempo minha mãe ficou ao telefone, porque não fiquei na mesa para ouvir. Fui ao meu quarto para ler. Eu não estava mais com fome. Só queria ficar em um lugar tranquilo. Depois de algum tempo, minha mãe veio ao meu quarto. Ela disse que papai tinha ligado novamente e que eles deviam estar chegando em casa em trinta minutos. Ela me perguntou se havia alguma coisa errada e eu sabia que ela não se referia à minha irmã, e eu sabia que ela não se referia à briga que teve com papai ao telefone porque às vezes essas coisas acontecem. Ela só percebeu que eu parecia muito triste hoje, e não achava que era porque meus amigos tinham viajado, porque eu estava bem ontem, quando voltei com o trenó.
                          ― É sua tia Helen?
              Foi o modo como mamãe disse isso que me fez sentir.
                       ― Por favor, Charlie, não faça isso com você mesmo.
              Mas eu fazia. Como faço todo ano, no dia do meu aniversário.
                      ― Desculpe.
          Minha mãe não me deixava falar no assunto. Ela sabe que eu paro de ouvir e começo a respirar rápido. Ela cobriu minha boca e limpou meus olhos. Eu me acalmei o suficiente para descer as escadas. E me acalmei o suficiente para ficar contente quando meu irmão chegou. E quando jantei, a comida não estava ressecada.
           Depois fomos para fora fazer uma trilha de luz, que é uma brincadeira em que todos os nossos vizinhos enchem sacos de papel com areia e os alinham na rua. Depois, enfiamos uma vela na areia de cada saco e, quando acendemos as velas, a rua se transforma em uma "pista de aterrissagem" o para Papai Noel. Adoro fazer trilha de luz todo ano, porque fica muito bonito, é uma tradição e uma boa distração do meu aniversário.
                Minha família me deu alguns presentes muito legais. Minha irmã ainda estava chateada comigo, mas mesmo assim me deu um disco dos Smiths. E meu irmão me deu um pôster assinado por todo o time de futebol. Meu pai me deu alguns discos que minha irmã disse a ele para comprar, e minha mãe me deu alguns livros que ela adorou quando era garota. Um deles era O apanhador no campo de centeio. Comecei a ler o exemplar de minha mãe do ponto onde havia parado no exemplar do Bill. E isso fez com que eu não pensasse no meu aniversário. Tudo em que eu pensava era que ia fazer meu exame de motorista muito em breve. E essa era uma coisa legal para se pensar. E depois eu pensei no meu instrutor de direção do semestre passado.
                O Sr. Smith, que é meio mal-humorado e tem um cheiro engraçado, não deixava nenhum de nós ligar o rádio quando estávamos dirigindo. Havia também dois segundanistas, um cara e uma garota. Eles costumavam se tocar em segredo nas pernas no assento de trás quando era minha vez. E havia eu. Queria ter um monte de histórias sobre aula de direção. Certamente, havia aqueles filmes sobre mortes nas estradas. E claro que havia policiais vindo falar conosco. E claro que era divertido ter minha licença provisória, mas mamãe e papai disseram que não queriam que eu dirigisse até que tivesse a carteira, porque o seguro era muito caro. E eu nunca consegui pedir a Sam para dirigir picape dela. Não podia.
Esse tipo de coisa me manteve calmo na noite do meu aniversário.
               A manhã seguinte ao Natal começou bem. Papai gostou muito da cópia do M*A*S*H, o que me deixou muito feliz, especialmente quando ele contou a história dele sobre ao que assistimos naquela noite. Ele deixou de fora a parte sobre ele chorando, mas piscou para mim, então eu sabia que ele se lembrava. As duas horas de carro até Ohio foram legais na primeira meia hora, embora eu tivesse sentado no calombo do banco traseiro porque meu pai continuava fazendo perguntas sobre a faculdade e meu irmão não parava de falar. Ele está namorando uma daquelas líderes de torcida que dão saltos mortais durante os jogos de futebol americano da faculdade. O nome dela é Kelly. Meu pai ficou muito interessado nisso. Minha irmã lembrou como as líderes de torcida eram idiotas e sexistas e meu irmão disse a ela para calar a boca. Kelly estava se especializando em filosofia. Perguntei a meu irmão se a Kelly era do tipo de beleza não convencional.
                            ― Não, ela é do tipo gostosona.
              E minha irmã começou a falar que a aparência de uma mulher não é a coisa mais importante. Eu concordei, mas depois meu irmão começou a dizer que minha irmã não passava de uma "sapatão chata". Depois minha mãe disse a meu irmão para não usar aquela linguagem na minha frente, o que era estranho, considerando que eu provavelmente era o único na família que tinha um amigo gay. Talvez não fosse o único, mas era o único que falava nesse assunto. Não tenho certeza. Apesar disso, meu pai perguntou como foi que meu irmão e Kelly se conheceram.
                 Meu irmão e Kelly se conheceram em um restaurante chamado Ye Olde College Inn, ou coisa parecida, na Penn State. Parece que eles tinham uma sobremesa famosa, chamada "grude grelhado". Sei lá. Kelly estava com uma de suas colegas de irmandade e elas iam saindo, mas ela deixou cair o livro bem em frente ao meu irmão e continuou andando. Meu irmão disse que, embora Kelly negue, ele tem certeza de que ela deixou cair o livro de propósito. As árvores estavam em plena floração quando ele topou com ela em frente ao fliperama. Foi assim que ele descreveu. Eles passaram o resto da tarde jogando velhos videogames, como Donkey Kong, e se sentindo nostálgicos, o que é uma declaração genérica e eu achei triste e doce. Perguntei a meu irmão se a Kelly bebia chocolate quente.
                        ― Tá doidão?
                 E de novo minha mãe pediu a meu irmão para não usar aquela linguagem na minha frente, o que era estranho de novo, porque acho que sou a única pessoa na minha família que já ficou doidão. Talvez também meu irmão. Não tenho certeza. Definitivamente, minha irmã não. Talvez toda minha família já tivesse ficado doidona e nós não conversávamos sobre essas coisas.
              Minha irmã passou os dez minutos seguintes atacando o sistema grego de irmandades e fraternidades. Ela ficou contando histórias de "trotes" e de como os garotos morriam antigamente. Depois ela contou uma história sobre como ouviu dizer que havia uma irmandade que fazia com que as garotas novatas ficassem de roupa íntima enquanto elas marcavam suas "gorduras" com pincel atômico. Àquela altura, meu irmão já estava cheio da minha irmã.
                         ― Que merda!
               Ainda não consigo acreditar que meu irmão tenha xingado no carro e meu pai ou minha mãe não tenham dito nada. Acho que é porque ele está na faculdade agora, então está tudo bem. Minha irmã não se importa com a palavra. Ela seguiu em frente.
                      ― Não é merda. Foi o que eu soube.
                      ― Cuidado com a boca, jovenzinha ― disse meu pai do assento da frente.
                     ― Ah, é? Onde você ouviu isso? ― perguntou meu irmão.
                    ― No rádio ― minha irmã respondeu.
                    ― Ah, meu Deus. ― Meu irmão soltou uma gargalhada.
                    ― Bom, foi o que eu soube.
         Minha mãe e meu pai pareciam que estavam assistindo a uma partida de tênis pelo para-brisa, porque ficaram sacudindo a cabeça. Não disseram nada. Não olharam para trás. Tenho de ressaltar, contudo, que meu pai lentamente começou a colocar a música de Natal do rádio em um volume ensurdecedor.
                 ― Você está dizendo um monte de asneira. Como você poderia saber de alguma coisa? Nunca foi a uma faculdade. Kelly não faz uma coisa dessas.
                 ― Ah, é... de acordo com o que ela diz.
                 ― É. Ela me contaria. Não temos segredos um com o outro.
                ― Ah, você faz a linha Nova Era sensível.
        Eu queria que eles parassem de brigar porque eu estava começando a ficar perturbado, então mudei de assunto:
                  ― Vocês conversam sobre livros e essas coisas?
              ― Obrigado por perguntar, Charlie. Sim. Na verdade, nós conversamos. O livro favorito da Kelly é nada menos que Walden, de Henry David Thoreau. E há pouco tempo a Kelly disse que o movimento transcendental forma um paralelo estreito com nossa época.
                ― Uau. Grande discurso. ― Minha irmã virava os olhos melhor do ninguém.
               ― Ah, com licença. Alguém estava falando com você? Acontece que eu estou conversando com meu irmão mais novo sobre minha namorada. A Kelly disse que espera que um bom candidato democrata derrote George Bush. Disse que sua esperança é que a lei de direitos iguais possa finalmente ser aprovada, se isso acontecer. É isso mesmo. Direitos iguais, de que você sempre reclama. Até líderes de torcida pensam coisas assim. E elas podem ser muito divertidas também.
                Minha irmã cruzou os braços e começou a assoviar. Mas meu irmão estava muito ligado para parar. Percebi que o pescoço do meu pai estava ficando vermelho.
              ― Mas há outra diferença entre vocês duas. É o seguinte: Kelly acredita tanto nos direitos da mulher que nunca deixaria que um cara batesse nela. Acho que não posso dizer o mesmo de você.
               Juro por Deus que quase morremos. Meu pai pisou no freio com tanta violência que meu irmão quase voou do assento. Quando o cheiro dos pneus começou a se dissipar, meu pai respirou fundo e se virou. Primeiro ele se voltou para meu irmão. Não disse uma só palavra. Só ficou olhando para ele. Meu irmão olhou para meu pai como um cervo apanhado numa caçada por meus primos. Depois de uns dois segundos, meu irmão se virou para minha irmã. Acho que ele se sentiu mal com o que disse por causa das palavras que vieram:
                   ― Desculpe, está bem? Ah, vamos lá. Não chore.
        Minha irmã estava chorando tanto que eu fiquei assustado. Depois, meu pai se virou para minha irmã. Novamente, ele não disse nada. Só estalou os dedos para distraí-la do choro. Ela olhou para ele. No início ficou confusa, porque o olhar dele não era carinhoso. Mas depois ela olhou para baixo, encolheu os ombros e se virou para o meu irmão.
                 ― Desculpe pelo que disse sobre a Kelly. Ela é legal.
Depois meu pai se virou para a minha mãe. E minha mãe se virou para nós.
               ― Seu pai e eu não queremos mais briga. Especialmente na casa da família. Entenderam?
Às vezes minha mãe e meu pai formavam uma dupla perfeita. É maravilhoso assistir meu irmão e minha irmã concordarem com a cabeça e olharem para baixo. Depois meu pai se virou para mim.
             ― Charlie...
            ― Sim, senhor?
Era importante dizer "senhor" nessas horas. E se eles o chamarem pelo nome do meio, é melhor ter cuidado. Estou falando sério.
          ― Charlie, gostaria que você dirigisse pelo resto do caminho até a casa da minha mãe.
             Todos no carro sabiam que essa era a pior ideia que meu pai teve em toda a vida. Mas ninguém questionou. Ele tirou o carro do meio da estrada. Ficou no assento entre meu irmão e minha irmã. Pulei para o banco da frente, afoguei o motor duas vezes e coloquei o cinto de segurança. Dirigi pelo resto do caminho. Eu não suava tanto desde a época em que praticava esportes, e era um suor frio.
           A família do meu pai era parecida com a da minha mãe. Meu irmão certa vez disse que eram os mesmos primos com nomes diferentes. A grande diferença era minha avó. Eu adoro minha avó. Todo mundo adora a vovó. Ela estava esperando por nós na entrada, como sempre fazia. Ela sempre sabia quando alguém estava chegando.
                   ― É o Charlie que está dirigindo agora?
                  ― Ele fez dezesseis ontem.
                  ― Oh.
             Minha avó era muito velha e ela não se lembrava de muita coisa, mas fazia os biscoitos mais deliciosos. Quando eu era muito pequeno, tínhamos a mãe da minha mãe, que sempre tinha doces, e a mãe do meu pai, que sempre tinha biscoitos. Minha mãe me disse que, quando eu era pequeno, eu as chamava de "vovó doce" e "vovó biscoito". Eu também chamava massa de pizza de "osso de pizza". Não sei por que estou lhe contando essas coisas.
            É como minha primeira lembrança, que acho que foi a primeira vez em que tive consciência de que estava vivo. Minha mãe e tia Helen me levaram ao zoológico. Acho que eu tinha três anos. Não me lembro dessa parte. De qualquer modo, estávamos vendo duas vacas. A vaca mãe e seu bebê bezerro. E eles não tinham muito espaço para andar. Em todo caso, o bezerro estava parado bem debaixo da mãe, tipo passeando, e a mamãe vaca fazia "caca" na cabeça do bebê bezerro. Achei a coisa mais divertida que já tinha visto no mundo e ri daquilo por umas três horas. No início, mamãe e tia Helen também riram, porque estavam felizes que eu estivesse rindo. Parece que eu não falava muito quando era pequeno, e quando eu parecia normal elas ficavam felizes. Mas três horas depois elas tentaram fazer com que eu parasse de rir, mas só o que conseguiam era me fazer rir mais ainda. Não acho que fossem realmente três horas, mas parece ter sido um longo tempo. Até hoje eu penso nisso. Parece ter sido uma espécie de começo "auspicioso".
             Depois dos abraços e apertos de mãos, entramos na casa da minha avó e toda a família da parte de meu pai estava lá: Meu tio-avô Phil com sua dentadura e minha tia Rebecca, que é irmã do meu pai. Mamãe nos disse que a tia Rebecca tinha se divorciado de novo e que não devíamos falar nesse assunto.
             Eu só conseguia pensar nos biscoitos, mas vovó não fez nenhum esse ano por causa do problema nos quadris. Nós sentamos e assistimos à televisão. Meus primos e meu irmão falaram de futebol. E meu tio-avô Phil bebia. E jantamos. E eu tive de me sentar à mesinha das crianças porque havia mais primos na família do meu pai.
            As crianças pequenas falam das coisas mais estranhas. É verdade.
           Depois do jantar é que assistimos ao filme A felicidade não se compra e eu comecei a me sentir cada vez mais triste. Quando estava subindo as escadas para o antigo quarto do meu pai, e olhando as velhas fotografias, comecei a pensar que houve uma época em que essas coisas não eram lembranças. Que alguém tirou aquela foto, e as pessoas na foto estavam almoçando ou coisa parecida.
O primeiro marido da minha avó morreu na Coréia. Meu pai e minha tia Rebecca eram muito novos. E minha avó se mudou com os dois filhos para a casa do irmão, meu tio-avô Phil.
                No fim, depois de alguns anos, minha avó estava se sentindo muito triste porque tinha dois filhos pequenos, e estava cansada de ser garçonete o tempo todo. Então, um dia, ela estava trabalhando no restaurante e um motorista de caminhão a convidou para sair. Minha avó era muito bonita, mesmo naquela velha fotografia. Eles namoraram por algum tempo. E finalmente se casaram. Ele se tornou um sujeito terrível. Batia no meu pai o tempo todo. E batia na tia Rebecca o tempo todo. E batia muito na minha avó. Todo o tempo. E minha avó não podia fazer nada. Eu acho que não, porque isso durou uns sete anos. Finalmente terminou, quando meu tio-avô Phil viu hematomas na tia Rebecca e arrancou a verdade de minha avó. Depois ele reuniu alguns amigos da fábrica. E eles encontraram o segundo marido da minha avó no bar. E deram uma surra nele. Meu tio-avô Phil adora contar a história quando minha avó não está por perto. A história sempre muda, mas em essência é sempre a mesma. O cara morreu quatro dias depois no hospital.
                Ainda não sei como o tio-avô Phil não foi para a cadeia pelo que fez. Perguntei a meu pai uma vez e ele disse que as pessoas que moravam na vizinhança compreendiam que algumas coisas não deviam ser ditas à polícia. Ele disse que, se alguém tocava em sua mãe ou em sua irmã, tinha de pagar por isso, e todos faziam vista grossa.
              Só que foi muito ruim ter durado sete anos, porque tia Rebecca acabou com o mesmo tipo de marido. Com a tia Rebecca foi diferente, porque a vizinhança mudou. Meu tio- avô Phil estava velho demais e meu pai saiu da cidade. Em vez disso, ela conseguia ordens judiciais para mantê-los afastados.
                Fico pensando no que meus três primos, que são filhos da tia Rebecca, se transformarão. Uma menina e dois meninos. Fico triste também porque acho que a menina provavelmente terminará como a tia Rebecca, e um dos meninos provavelmente terminará como o pai dele. O outro menino deve terminar como o meu pai, porque ele pratica esportes e teve um pai diferente dos irmãos dele. Meu pai conversa muito com ele e ensina como lançar e rebater no beisebol. Eu costumava sentir ciúmes disso quando era pequeno, mas não sinto mais. Porque meu irmão disse que meu primo é o único dessa família que tem uma chance. Ele precisa do meu pai. Acho que compreendo isso agora.
                  O antigo quarto do meu pai está quase exatamente como ele deixou, exceto que agora parece mais desbotado. Tem um globo em uma mesa que já girou muito. E velhos pôsteres de jogadores de beisebol. E velhos recortes de jornal sobre meu pai ganhando o grande jogo quando era segundanista. Não sei o porquê, mas eu entendo por que meu pai teve de sair desta casa Quando ele soube que minha avó nunca encontraria outro homem porque não tinha mais confiança e nunca mais olharia para nenhum outro porque não sabia como. E quando ele viu que a irmã começou a trazer versões mais novas dos padrastos para casa para namorar. Ele não podia ficar.
Deitei na sua velha cama e olhei pela janela para a árvore que provavelmente era muito menor quando meu pai olhava para ela. Eu pude sentir o que ele sentiu na noite em que percebeu que, se não partisse, nunca teria sua própria vida. Seria a vida deles. Pelo menos foi como ele colocou. Talvez seja por isso que o lado da família de meu pai assista ao mesmo filme todo ano. Faz sentido. Talvez eu deva mencionar que meu pai nunca chora no final.
                       Não sei se vovó ou tia Rebecca um dia perdoarão meu pai por tê-las deixado. Só o meu tio-avô Phil entende essa parte. É sempre estranho ver como meu pai muda quando está perto da mãe e da irmã. Ele se sente mal o tempo todo e sua irmã e ele sempre dão uma caminhada sozinhos. Uma vez olhei pela janela e vi meu pai lhe dando dinheiro.
Imagino o que tia Rebecca diz no carro quando está voltando para casa. Imagino o que os filhos dela dizem. Imagino que eles falem de nós. Imagino que eles olhem para minha família e se perguntem quem tem uma chance de conseguir. Aposto que é isso o que eles fazem.
Com amor,
Charlie.

                                     26 de dezembro de 1991
Querido amigo,
             Estou sentado em minha cama agora, depois de duas horas de estrada de volta para casa. Minha irmã e meu irmão foram muito legais um com o outro, então eu não tive de dirigir.
             Em geral, na volta para casa, vamos visitar o túmulo da tia Helen. É uma espécie de tradição. Meu irmão e meu pai nunca querem ir, mas eles sabem que não devem dizer nada por causa de minha mãe e de mim. Minha irmã é meio neutra, mas ela é sensível a certas coisas.
             Todas as vezes que vamos ver o túmulo da tia Helen, minha mãe e eu gostamos de falar de alguma coisa realmente boa sobre ela. Na maioria dos anos é sobre como ela me deixou ficar acordado e assistir ao Saturday Night Live. E minha mãe sorri porque ela sabe que, se fosse criança, teria ficado acordada e assistido também.
             Nós depositamos flores e às vezes um cartão. Queremos que ela saiba que não a esquecemos, que pensamos nela e que ela era especial. Ela não sabia disso o bastante quando estava viva, como minha mãe sempre diz. E, como meu pai, acho que minha mãe se sente culpada por isso. Tão culpada que, em vez de lhe dar dinheiro, ela lhe deu uma casa para morar.
              Quero que você entenda por que minha mãe se sente culpada. Eu devia contar a você, mas não tenho muita certeza se devo. Tenho de falar sobre isso com alguém. Ninguém na minha família jamais conversou sobre esse assunto. É uma coisa que eles não fazem. Estou falando da coisa ruim que aconteceu a tia Helen que eles não quiseram me contar quando eu era pequeno.
Toda vez que chega o Natal eu não consigo deixar de pensar nisso... e muito. É uma coisa que me deixa profundamente triste.
                Não vou dizer quem. Não vou dizer quando. Só vou dizer que a tia Helen foi estuprada. Odeio essa palavra. Foi feito por alguém que era muito próximo dela. Não foi o pai dela. Ela no final contou ao pai. Ele não acreditou por causa de quem ele era. Um amigo da família. Isso só tornou as coisas piores. Minha avó nunca disse nada. E o homem continuou a visitá-los.
               Tia Helen bebia muito. Tia Helen se drogava muito. Tia Helen tinha muitos problemas com homens e rapazes. Ela foi uma pessoa muito infeliz na maior parte da vida. Parava em hospitais o tempo todo. Todo tipo de hospital. Por fim, ela foi para um hospital que a ajudou a refletir o bastante para que tentasse ter uma vida normal, e então ela foi morar com a minha família. Começou fazendo cursos para conseguir um bom emprego. Disse a seu último homem que a deixasse em paz. Começou a perder peso sem ter de fazer dieta. Cuidava de nós, então meus pais podiam sair e beber e jogar cartas. Deixava a gente ficar acordado até tarde. Ela era a única pessoa, além de minha mãe, meu pai, meu irmão e minha irmã, que me dava dois presentes. Um de aniversário. Outro de Natal. Mesmo quando ela se mudou para minha casa e não tinha dinheiro. Ela sempre me comprava dois presentes. E sempre eram os melhores presentes.
                 Em 24 de dezembro de 1983, um policial bateu na porta. Tia Helen tinha sofrido um acidente de carro horrível. Estava nevando muito. O policial disse à minha mãe que a tia Helen tinha morrido. Era um homem muito legal, porque quando minha mãe começou a chorar, ele disse que tinha sido um acidente muito grave e que a tia Helen morreu instantaneamente. Em outras palavras, não sentiu dor. Nunca mais sentiu dor.
               O policial pediu à minha mãe para acompanhá-lo e identificar o corpo. Meu pai ainda estava no trabalho. Foi quando eu apareci com meus irmãos. Era meu aniversário de sete anos. Todos nós vestíamos chapéus de festa. Minha mãe fez com que meus irmãos usassem um também. Minha irmã viu a mamãe chorando e perguntou o que havia de errado. Minha mãe não conseguiu dizer nada. O policial se ajoelhou e nos contou o que aconteceu. Meu irmão e minha irmã choraram. Mas eu não. Eu sabia que o policial estava errado.
Minha mãe pediu a meus irmãos para cuidarem de mim e saiu com o policial. Acho que assisti à tevê. Não me lembro muito bem. Meu pai chegou em casa antes da minha mãe.
                        ― Por que essas carinhas tristes?
            Contamos a ele. Ele não chorou. Perguntou se a Tia Helen estava bem. Meus irmãos disseram que não. Eu disse que sim. O policial tinha cometido um erro. Estava nevando muito. Provavelmente ele não conseguiu ver.
              Minha mãe chegou em casa. Estava chorando. Olhou para mim e sacudiu a cabeça. Meu pai a abraçou. Foi aí que eu percebi que o policial não tinha errado.
             Não sei bem o que aconteceu depois, e nunca perguntei. Só me lembro de estar indo para o hospital. Lembro-me de estar sentado em uma sala com luzes brilhantes. Lembro-me de um médico me fazendo perguntas. Lembro-me de dizer a ele que a tia Helen era a única pessoa que me abraçava. Lembro-me de ver minha família no Natal em uma sala de espera. Lembro de não ter tido permissão para ir ao enterro. Lembro que nunca disse adeus à tia Helen.
                 Não sei quanto tempo fiquei indo ao médico. Não me lembro de quanto tempo deixei de ir à escola. Foi por muito tempo. Sei que foi muito. Tudo de que me lembro é do dia em que comecei a me sentir melhor, porque eu me lembrei da última coisa que a tia Helen disse antes de sair de carro na neve.
             Ela estava vestindo um casaco. Eu estava com as chaves do carro porque sempre era o único que sabia onde encontrá-las. Perguntei à tia Helen aonde estava indo. Ela me disse que era um segredo. Continuei atazanando a tia Helen, o que ela adorava. Ela adorava a forma como eu a enchia de perguntas. Finalmente ela sacudiu a cabeça, sorriu e sussurrou ao meu ouvido:
                   ―  Estou indo comprar seu presente de aniversário.
              Foi a última vez em que a vi. Gosto de pensar que agora tia Helen teria aquele bom emprego para o qual estava se preparando. Gosto de pensar que ela encontraria um bom homem. Gosto de pensar que ela teria perdido peso, o que ela sempre quis, sem precisar fazer dieta.
              Apesar de tudo que minha mãe, meu pai e o médico me disseram sobre a culpa, não consigo parar de pensar no que eu sei. E eu sei que minha tia Helen ainda estaria viva hoje se tivesse me comprado um presente só como todo mundo fazia. Ela estaria viva se eu tivesse nascido em uma época em que não nevasse. Eu faria qualquer coisa para que fosse dessa forma. Sinto demais a falta dela. Tenho de parar de escrever agora, porque estou triste demais.
Com amor,
Charlie.

                                           30 de dezembro de 1991
Querido amigo,
            Um dia depois de ter escrito pra você, terminei O apanhador no campo de centeio. Desde então, li o livro três vezes. Não sei bem que outra coisa posso fazer. Sam e Patrick finalmente voltam para casa hoje à noite, mas não irei vê-los. Patrick vai se encontrar com Brad em algum lugar. Sam vai sair com Craig. Eu os verei amanhã no Big Boy e depois na festa de Ano-novo do Bob.
            O que está me empolgando é que eu mesmo vou dirigir o carro até o Big Boy. Meu pai disse que eu não podia dirigir até que o tempo melhorasse, e finalmente ficou um pouco melhor ontem. Gravei minha fita para a ocasião. É chamada "A Primeira Vez que Dirigi". Talvez eu esteja sendo sentimental demais, mas prefiro pensar que, quando eu estiver velho, vou poder olhar todas essas fitas e lembrar das vezes em que dirigi o carro.
          Na primeira vez em que dirigi foi para ver a tia Helen. Foi a primeira vez que fui vê-la sem a minha mãe. Fiz com que fosse uma ocasião especial. Comprei flores com o dinheiro que ganhei no Natal. Cheguei a gravar uma fita e a deixei no túmulo. Espero que você não pense que eu sou esquisito por causa disso.
          Contei toda à minha vida à tia Helen. Sobre Sam e Patrick. Sobre os amigos deles. Sobre minha primeira festa de Ano novo amanhã.   Contei a ela sobre como meu irmão jogaria sua última partida de futebol da temporada no dia de Ano novo. Contei a ela sobre meu irmão partindo e como minha mãe chorou. Contei a ela sobre os livros que eu leio. Sobre a canção "Asleep". Contei a ela de quando nós nos sentimos infinitos. Sobre mim mesmo, obtendo minha carteira de motorista. De como minha mãe nos trouxe aqui. E como eu dirigi na volta. E como o policial que aplicou o exame não parecia estranho nem tinha um nome engraçado, o que para mim pareceu trapaça.
Lembro que quando eu tinha acabado de dizer adeus à minha tia Helen, comecei a chorar. Foi um choro muito verdadeiro também. Não do tipo aterrorizado, que eu tenho muito. E prometi à tia Helen só chorar por coisas importantes, porque eu odiaria pensar que chorar como eu sempre faço diminuiria a importância desse choro pela tia Helen.
Depois eu disse adeus e voltei para casa.
              Li o livro de novo nesta noite porque eu sabia que, se não o fizesse, provavelmente começaria a chorar novamente. O do tipo aterrorizado, eu quero dizer. Li até que fiquei completamente exausto e tive de ir dormir. Pela manhã, terminei o livro e depois comecei imediatamente a lê-lo de novo. Qualquer coisa para não sentir vontade de chorar. Porque eu prometi à tia Helen. E porque eu não quero começar a pensar novamente. Não como eu fiz na semana passada, não posso pensar novamente. De novo, não.
Não sei se você já se sentiu assim, querendo dormir por mil anos. Ou se sentiu que não existe. Ou que não tem consciência de que existe. Ou algo parecido. Acho que querer isso é muito mórbido, mas eu quero quando me sinto assim. É por isso que estou tentando não pensar. Só queria que tudo parasse de rodar. Se ficar pior, eu terei de ir ao médico. E teria aquela coisa ruim novamente.
Com amor,
Charlie.

                                            1° de janeiro de 1992
Querido amigo,
                      Agora são quatro horas da manhã e é Ano novo, embora ainda seja 31 de dezembro, isto é, até que as pessoas durmam. Não consigo dormir. Todo mundo está dormindo ou fazendo sexo. Fiquei assistindo à tevê a cabo comendo jujuba. E vendo coisas se moverem. Queria contar a você sobre Sam e Patrick, e Craig e Brad, e Bob e todo mundo, mas não consigo me lembrar direito agora.
Lá fora está tranquilo. Sei disso. E fui de carro até o Big Boy mais cedo. E vi Sam e Patrick. E eles saíram com Brad e Craig. E isso me deixou triste, porque eu queria ficar sozinho com eles. Isso nunca aconteceu antes.
                   As coisas ficaram piores há uma hora e eu estava olhando esta árvore, mas era um dragão e depois uma árvore, e me lembro de que o dia estava lindo quando eu fazia parte do ar. E me lembro de aparar a grama naquele dia para ganhar minha mesada, como estou removendo a neve da entrada de carros com uma pá para ganhar minha mesada agora. Então comecei a tirar a neve da entrada do Bob, o que é uma coisa estranha de se fazer em uma festa de Ano novo.
                    Meu rosto está vermelho de frio, como a cara de bêbado do Sr. Z e seus sapatos pretos e sua voz dizendo que quando uma lagarta vai para um casulo é como uma tortura, e como leva sete anos para um chiclete ser digerido. E aquele garoto, o Mark, na festa que me deu aquilo saiu do nada e olhou para o céu, e me disse para ver as estrelas. Então eu olhei para cima, e estávamos em uma cúpula gigante como uma bola de neve de vidro, e Mark disse que as estrelas muito brancas eram na verdade somente buracos no vidro negro da cúpula, e quando você foi ao céu, o vidro quebrou, e não havia nada, exceto um monte de estrelas brancas, que são mais brilhantes que qualquer coisa, mas não ferem os olhos. Era imenso, aberto e delicadamente quieto, e eu me senti muito pequeno.
                 Às vezes eu olho para fora e penso que um monte de outras pessoas viu essa neve antes. Assim como eu penso que um monte de outras pessoas leu aqueles livros antes. E ouviram aquelas canções.
                Eu me pergunto como elas estão se sentindo esta noite.
                Não sei bem o que estou dizendo. Provavelmente eu não devia escrever isso, porque ainda vejo coisas em movimento. Quero que elas parem de se mexer, mas provavelmente elas não vão fazer isso por mais algumas horas. Foi o que Bob disse antes de sair de seu quarto com Jill, uma garota que não conheço.
Acho que o que estou dizendo é que tudo isso parece muito familiar. Mas eu não estou familiarizado com isso. Só sei que outro garoto sentiu a mesma coisa. Dessa vez, quando está tranquilo do lado de fora e você vê coisas se mexendo, e não quer isso, e todos estão dormindo. E todos os livros que você leu foram lidos por outras pessoas. E todas as canções que você gostou foram ouvidas por outras pessoas. E aquela garota que é bonita para você é bonita para outras pessoas. E você sabe que, se enxergasse esses fatos quando era feliz, se sentiria ótimo, porque estaria descrevendo a "união".
                         É como quando você está excitado com uma garota e um casal de mãos dadas, e se sente feliz por eles. E outras vezes você vê o mesmo casal e eles te deixam louco. E talvez o que você quer é se sentir sempre feliz por eles, porque você sabe que se for assim significa que você está feliz também. Acabo de lembrar o que me fez pensar desta forma. Vou escrever sobre isso porque, se eu fizer, não terei de pensar no assunto. E não quero ficar triste. Mas o caso é que posso ouvir Sam e Craig fazendo sexo, e, pela primeira vez na minha vida, entendo o final do poema.
E eu nunca tinha entendido. Você tem que acreditar é mim.
Com amor, Charlie.


 



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