Jesse
Nano e eu paramos de nos beijar e então a avistamos, estava ali imóvel, sem reação, parada em nossa frente, e nós dois sem saber o que fazer ou o que dizer.
- Mãe?
- Jesse? Nano? Eu não acredito nisso. Mas como? Ai, meu Deus!
- Desculpa, dona Juliette, não é o que pa… Não, na verdade é sim. - Minha mãe olhou surpresa para Nano. - Desculpa por eu amar o seu filho, eu tentei ao máximo, mas… - Se pôs a me olhar. - Ele é fantástico, o ser humano mais perfeito que eu já conheci. Perdão.
- Nano, vai pra sua casa, por favor, eu preciso conversar com o meu filho. - Me olhou seriamente, apesar de seu tom de voz não ser agressivo.
- Tá bom, vou chamar a Marilyn. - Falou cabisbaixo.
- Não, pode deixar ela brincando com o Martin, depois você volta para buscá-la ou eu a levo. - Falou sem tirar os olhos de mim, fazendo eu me encolher em mim mesmo.
- Sim senhora. Mas não briga com o Jesse, não, se quiser a gente para por aqui, eu prometo, só não briga com ele e nem nos afaste, por favor.
Nano me deu uma rápida olhada e saiu do meu quarto, seu olhar estava triste, eu sabia que ele estava com medo do que minha mãe fosse dizer ou fazer após ter nos descoberto.
- Eu não acredito nisso, Jesse. Como você pôde? Como você fez isso com a tua própria mãe?
- Desculpa, mãe, eu nunca tinha gostado de ninguém antes, mas o Nano… É diferente, eu sou louco por aquele garoto.
- Ah, Jesse… - Ela se sentou ao meu lado. - Como você se apaixona por alguém e nem me diz nada. Eu sou sua mãe, pensei que você confiasse em mim.
- Quê? Como é? Estou confuso. A senhora não está brava?
- Claro que estou. Estou furiosa. - Falou embora seu timbre de voz não demonstrasse isso. - Eu pensei que quando você se interessasse por alguém, eu seria a primeira pessoa a saber.
- Mãe, eu não estou entendendo. - Falei totalmente confuso. - Eu esperava que você brigasse comigo, afinal, você me pegou beijando o Nano…
- Você está feliz? - Acariciou o meu rosto.
- Estou. Muito.
- Então é isso que importa, se você está feliz, eu também estou. O Nano é um bom garoto, e eu sei o quanto vocês se gostam, só pensei que você me contaria.
- A senhora já sabia?
- Não sabia, mas eu desconfiava. Eu gosto desse garoto, é um bom menino, mas eu sempre fiz questão de tratá-lo bem porque eu sei o quanto ele é importante para você, querido.
- É sim. Mas… Desculpa, eu ainda estou meio confuso. Se você não está brava, por que tratou o Nano daquela maneira?
- Ah, queria dar um sustinho. - Falou entre risos.
- E conseguiu.
- Jesse, você é um garoto incrível, é um bom filho, um ótimo irmão, um bom aluno, claro que as notas podiam melhorar um pouquinho, mas não deixa de ser um aluno bom. E você já passou por tanta coisa, querido, você merece ser feliz, e eu quero muito, muito que tanto você quanto os seus irmãos sejam muito felizes. Mas por favor, não me esconda mais essas coisas.
- Nunca mais. Prometo. - A abracei.
Eu não conseguia crer naquilo que recém tinha acontecido, eu esperava que ela fosse brigar, me xingar, e falar que não queria um filho… um filho como eu, mas a reação dela foi o oposto de tudo que eu imaginei, é, definitivamente minha mãe, dona Juliette, é uma mulher incrível, fantástica, assim como era a… Ah, liguei no mesmo instante para Nano e lhe contei que estava tudo bem, ele ficou super feliz com a notícia, mas teríamos que ter mais cuidado, pois assim como mamãe nos viu podia ter sido o Gary e eu tinha muito medo do que ele poderia fazer se nos visse juntos.
Nano foi mais tarde buscar Marilyn e mamãe fez questão em dizer o quanto gosta dele e que torce por nós, pela nossa felicidade, tem como ela ser menos fantástica?
XXX
Após pensar muito por várias horas sem parar, eu resolvi ir falar com meu pai, queria tanto saber o porquê dele ter nos abandonado. Contei para Leslie sobre minha decisão e ela ficou muito feliz, pois também queria saber o que o levou a nos deixar sem dizer um ‘’adeus’’ sequer. Leslie falou que ele a fez prometer que a gente não falaria para nossa mãe e muito menos para Gary sobre o nosso encontro, mesmo sem entendermos o porquê, minha irmã acabou prometendo isso.
Era um sábado quando combinamos de ir vê-lo. Marcamos em uma lanchonete, mesmo anos sem vê-lo não foi difícil reconhecê-lo.
- Oi. - Falou assim que nos aproximamos dele.
- Pai! - Leslie o abraçou.
- Oh, minha menina, como você cresceu, tá tão linda. - Falou ao analisá-la de uma forma carinhosa.
Papai fez menção em me abraçar e eu recuei, não queria nenhum contato com ele antes de saber o que ele tinha para nos dizer, e ele respeitou minha decisão, e não tentou novamente.
Nós três nos sentamos à mesa, e eu logo já fui lhe perguntando o porquê dele ter nos abandonado quando ainda éramos crianças.
- Ah, meus queridos… A verdade é que eu fui fraco. Muito fraco. - Fez uma breve pausa. - Eu não queria ter feito isso, juro que não queria, eu sempre amei tanto vocês três. Mas infelizmente coisas que eu não imaginava acabaram acontecendo. A mãe de vocês havia começado a trabalhar em um emprego novo e lá ela conheceu um homem totalmente desequilibrado…
- Gary? - Perguntei.
- Ele mesmo. E esse homem sempre foi obcecado pela mãe de vocês, eu cheguei a vê-lo perto de nossa casa a espiando, totalmente louco. Porém, um dia ele passou a me ameaçar, ele me garantiu que se eu não me afastasse para ele tentar um relacionamento com a Ju, ele a mataria, porque se ela não fosse dele também não seria de mais ninguém, e inclusive, ele chegou a ameaçar vocês também, e eu jamais permitiria isso. - Fez uma rápida pausa. - Ah, eu era tão novo, eu só tinha 22 anos, era um garoto, eu fiquei assustado, pensei que seria menos triste me afastar do que perdê-los para sempre. Até hoje não sei se fiz a coisa certa, pois nunca mais eu consegui dormir em paz, e desde então, tenho acompanhado vocês apenas pelas redes sociais, mas eu não estava mais aguentando ficar longe de vocês.
- Maldito! Eu não acredito que ele foi capaz disso, por culpa dele eu perdi por 11 anos o melhor pai do mundo. - Falei.
- Eu era tão pequena, mas lembro do quanto eu te amava. - Disse Leslie.
- E eu a vocês, meus amores. - Pegou em nossas mãos. - Eu quero muito poder tê-los de novo em minha vida, mas sem que a mãe de vocês e o Gary saiba. Vocês topam?
Leslie e eu nos olhamos em silêncio, mas acho que a resposta era óbvia. Eu queria, eu precisava de um pai, um pai de verdade como ele sempre foi, um pai que nos amasse e nos cuidasse, nos protegesse e que não permitisse que ninguém nos machucasse. Ele nunca encostou um dedo na gente que não fosse para nos dar carinho, por mais que ele tenha ficado pouco tempo em minha vida, eu só tinha boas lembranças dele.
Eu tinha tanto medo de reencontrar o meu pai, medo do que eu pudesse sentir, do que ele pudesse dizer, mas fiquei muito feliz por ter aceitado me encontrar com ele e por ter o escutado, agora eu sabia que o culpado era Gary, como sempre. Desgraçado, por que ele tem que ferrar tanto com a minha vida?
Leslie e eu fizemos um lanche com papai e depois fomos ao cinema, ele dizia que queria recuperar o tempo perdido e que mais nada o separaria da gente, nem Gary. Ah, e por falar nele, Leslie e eu optamos por não mencionar as agressões, pois sabíamos que papai não permitiria que isso acontecesse e eu tinha medo do que ele poderia fazer, não queríamos que ele sujasse suas mãos por nossa causa.
XXX
FLASHBACK ON
16 de junho de 2009
Eu estava em meu quarto, meus olhos doíam, estavam vermelhos de tanto que eu havia chorado, mas não era um choro de tristeza, e sim de raiva, muita raiva.
Avistei uma caixa de brinquedos e coisas sem importância e fui até ela. Joguei todos os brinquedos no chão, separei os brinquedos que papai tinha me dado e coloquei em um saco grande, não precisava mais deles, eram brinquedos bobos e idiotas.
Vi uma foto onde eu estava feliz com papai e a rasguei, fazendo ela virar picadinho.
- Eu te odeio! Eu te odeio! - Gritei.
Fui até o quarto da minha irmã e a avistei dormindo em seu berço, era apenas um lindo bebê, acariciei seu delicado rostinho e ela moveu os bracinhos, tirei minha mão do rosto da minha irmã para não acordá-la.
- Desculpa irmãzinha.
XXX
Eu estava na escola, e enquanto meus colegas brincavam eu fiquei sentado à mesa cabisbaixo enquanto pensava se eu era uma criança má por não gostar do meu pai, olhei para minha professora que estava colocando uns bilhetes nas agendas e fui até ela.
- Prof… Acha que eu sou um garoto mau? - Perguntei ao sentar no colo dela.
- Hey… Que pergunta é essa, Jess? Você é um bom garoto, é querido, meigo, educado e sempre está disposto a me ajudar, por que acha que você seria mau?
Fiquei em silêncio enquanto tentava encontrar as palavras certas, mas eu não conseguia encontrá-las, não com tão pouca idade, e como eu diria ‘’eu odeio o meu pai’’? Minha professora nunca entenderia, quer dizer, era o que eu pensava.
- Sério que você acha que eu sou bonzinho? - Perguntei.
- Claro que sim, querido. - Falou docemente.
- Então me leva pra sua casa. Prometo que não incomodo, se quiser ajudo com as tarefas da casa, já sei até lavar louça, sabia? E eu juro que vou obedecer em tudo, não vai nem precisar falar duas vezes, vou ser muito bem comportado. - Parei por um segundo. - Bom, tem a Leslie também, mas ela é muito pequena, é só deixar a fralda dela limpa e dar mamá que nem vai parecer que tem bebê em casa, ela é mais quietinha que eu.
- Hey, pode parar aí, mocinho. Eu posso saber que conversa é essa? Jesse, me conta, o que está acontecendo?
- Eu não sei, professora. - Comecei a chorar e ficar nervoso. - Eu só gosto de você e queria ser teu filhinho.
- Oh, meu bem. - Me abraçou. - Sabe, eu acho que não é só isso. Vem, vamos tomar uma aguinha pra você se acalmar, aí a gente conversa direitinho, tá bem?
Muito trêmulo, eu apenas acenei a cabeça positivamente. Ela me pegou pela mão, e primeiramente, se dirigiu para a diretoria, pediu que a diretora ficasse em nossa sala e então, me levou até a cozinha, onde não tinha ninguém. Ela me deu um copo d 'água, que eu tomei em um único gole.
- Hey, está tudo bem, meu amor. - Se abaixou ficando da minha altura. - Olha, você pode me contar o que quiser… Qualquer coisa… Prometo que não vou brigar e que vou acreditar em tudo o que você disser.
Me aproximei vagarosamente do ouvido de minha professora, e sussurrei:
- Eu tenho um segredo.
Ela se aproximou do meu ouvido, e sussurrou:
- Quer me contar? Prometo que não conto para ninguém.
Olhei para ela enquanto pensava se dizia ou não, lembrei do dia anterior e então, eu lhe contei o meu maior segredo.
FLASHBACK OFF
Acordei muito ofegante, me senti molhado, coloquei a mão na cama e notei que também estava um pouco molhada.
- Não, não pode ser, eu parei com isso aos 12 anos, desde então, eu nunca mais me mijei ao ter esses pesadelos, eu não posso...
Apavorado, coloquei a mão no meio das minhas pernas, mas não estava molhada, quer dizer, só um pouco, então, senti minha camisa colada em meu corpo, ela estava encharcada.
- Ufa, foi só suor. - Respirei aliviado.
Lembrei do sonho, ou melhor, de quando eu passei por tudo aquilo. Porra! Por que eu tinha que ter esses pesadelos mesmo depois de tantos anos? Por que ele ainda me perseguia em meus sonhos? Por que eu não podia simplesmente esquecer e seguir com a merda da minha vida?
- Inferno! - Falei com um tom de voz alta.
- Hey, o que houve? - Martin perguntou sonolento. - Quero dormir.
- Desculpa, é que tive um sonho ruim, mas vou ficar quieto, pode dormir.
- Pesadelo?
- Aham.
- Quando eu estava no abrigo, sempre que eu tinha pesadelo, uma das tias que nos cuidava se deitava do meu lado e ficava comigo até eu dormir de novo, quer que eu fique aí com você?
- Quero sim. - Dei um leve sorriso.
O garoto deitou em minha cama e me abraçou, me pegando de surpresa.
- A tia Marli sempre me abraçava assim pra eu esquecer o pesadelo, será que funciona com gente grande?
- Funciona, sim. Já estou me esquecendo do que eu sonhei. - Falei.
- Boa noite, Jesse.
- Boa noite, Martin.
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