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História Até que a Morte nos Una - Orgulho


Escrita por: Nuwandah

Notas do Autor


Antes de tudo, queria agradecer a todos por ainda estarem acompanhando essa minha história! Eu realmente não esperava por essa reação de vocês, muito obrigada! <3 <3 <3
Esse é o primeiro capítulo que está 100% com a minha escrita atual... O anterior já estava com uns 85% pronto há muuuito tempo (tipo poucos meses após a postagem do "Meu Amigo"), apenas faltava o flashback *foge das pedradas* Então é agora que vocês vão ter uma noção da mudança de estilo e escrita que aconteceram naturalmente com o tempo e... o capítulo ficou bem grandinho~ digamos que o dobro do maior capítulo que já produzi até então, e isso porque eu vi que ele estava ficando grande demais e cortei pela metade o roteiro, então vocês terão um capítulo duas vezes maior que o normal mas que, na verdade, é a metade de um :v Se quiserem, podem considerar que são dois capítulos postados juntos nesse espaço de seis meses que demorei para postar, poderiam me perdoar pela demora assim? *puppy eyes* mas eu demorei também porque, além do meu compromisso com a faculdade, revisei toooda a fanfic (primeiro, porque eu mesma precisava relembrar a história e voltar à linha dela e, segundo, comecei a postar essa história no Nyah! também e ninguém merece aqueles erros antigos meus)
Bem, agora estou mais animada com a história, como podem ver. No capítulo anterior, mal escrevi nesse espaço, confesso que estava muito desanimada, me forçando a escrever apenas por compromisso e mais nada, maaaas estou de volta e com tudo! (até onde a faculdade permitir euisewhkefiçw)
Boa leitura, amores! Espero os comentários de vocês no final <3

Capítulo 21 - Orgulho


Fanfic / Fanfiction Até que a Morte nos Una - Orgulho

Eu realmente gostaria de poder voltar a dormir – assim eu, ao menos, adiaria qualquer contato humano (ou perto disso) naquela manhã. Poderia evitar a tagarelice de Sakura logo tão cedo, os problemas com Naruto e seu espírito também tagarela, que não foi nem um pouco afetado pela surra que ele tomou daquele filho da puta no dia anterior; também evitaria desculpas esfarrapadas com Itachi – desculpas que ele nunca foi de engolir, na verdade. Itachi sempre foi mais perspicaz que uma mãe... Por falar em mãe, se eu voltasse a dormir, correria o risco de ter um pesadelo ou mais alguma lembrança relacionada àquele dia, já que minha mente estava tão envolta nesse assunto.

Pensando melhor, era melhor não dormir. Além do mais, pela janela por cima de mim, que estava de cortinas abertas, pude notar a coloração do céu começando a mudar, sinal de que, em pouco tempo, o sol se mostraria no horizonte inexistente de Tokyo, encoberto pelos milhares de prédios. Já devia ser hora de sair da cama, mesmo.

Na verdade, a “cama” era o sofá da sala, e meu corpo fez questão de me lembrar disso, estalando dolorosamente quando me levantei. Não que aquele lugar fosse desconfortável, mas cama é cama, e não era eu quem tinha mania de cair no sono no sofá enquanto via filme.

O som de algo leve caindo no chão ao meu lado me chamou a atenção, e vi que era uma coberta, e ela não era nem minha, mas, sim, de Itachi. Provavelmente, ele deve ter chegado e me visto dormindo na sala, foi pegar algo para me cobrir no meu quarto e descobriu Naruto nele e, já que a coberta não é minha, Naruto já devia ter adormecido e Itachi não quis incomodá-lo e pegou uma de seu próprio quarto. Ele nunca perdia uma chance, né?

A pequena pontada que senti ao pensar em Itachi com a mente ainda envolta naquele sonho assombroso não foi nada reconfortante. Itachi nunca foi bobo nem nada, e mesmo que as informações sobre aquele fatídico dia fossem ínfimas, será que ele não teria chegado à mesma conclusão que a minha, a de que eu era o culpado de tudo aquilo? Por minha causa, nossos pais morreram, mas não foi apenas isso que eu causei. O falecimento de nossos progenitores acarretou uma série de novos problemas, principalmente para Itachi como primogênito e único maior de idade. Toda a parte financeira e burocrática – tanto na parte empresarial herdada da parte dos nossos pais quanto na parte pessoal – caiu sobre as costas dele, abalando o seu mundo, que era exclusivamente dedicado ao estudo universitário até aquela época.

Minha insensatez causou tudo de ruim que poderia a Itachi, não me surpreenderia se ele me odiasse. Outra fisgada me atingiu no peito ao pensar naquela possibilidade factual, afinal, eu podia ser o último membro restante de sua família, mas eu não era nada além de um peso morto, uma casca vazia que morava sob o mesmo teto que ele.

Tudo aquilo fazia muito sentido na minha cabeça, mas por que aquele tecido caído no chão parecia me dizer ao contrário? O simples fato de ele ter me coberto à noite – ainda mais com sua própria manta – significava que ele se importava comigo, certo? Será que ele não sentia remorso de mim?

Balancei a cabeça para tentar me livrar daquela linha de raciocínio que não era nem um pouco útil àquela hora da manhã. Recolhi o cobertor e o dobrei. Estava de pé antes de Itachi dessa vez, ele nem estava na cozinha preparando o café da manhã ainda. Que bom, assim Naruto e eu poderíamos sair mais cedo e encurtar qualquer interação com Itachi e diminuir a possibilidade do abestado dar pistas sobre o real motivo da estadia dele aqui. Já era ruim o Itachi apenas saber da breve presença de Naruto ali.

Fui para o meu quarto com passadas leves, não queria correr o risco de avisar ao Itachi que eu já estava acordado. Abri minha porta devagar e entrei, logo a fechando de novo. Pronto, a primeira parte foi um sucesso, só faltava acordar Naruto e ir para a escola.

Há poucas coisas que não encontro palavras apropriadas para descrever, e a forma como Naruto dormia entrava para a minha lista naquele momento. O corpo distribuído de forma totalmente desleixada e irregular pela cama, metade do rosto afundado no travesseiro de uma forma que não me pareceu muito confortável e a mandíbula parecia deslocada de tão repuxada para o lado, alcançando a superfície do travesseiro, sendo esta a única forma aparente de ele estar respirando. Ele parecia estar... babando nas minhas coisas! Eu definitivamente iria trocar a roupa de cama naquele dia, mas só depois de terminar de quebrar o que Toya não quebrou.

Mas, apensar de ele merecer, me contive, e apenas puxei o travesseiro de um jeito rápido e brusco, de forma que o fizesse bater o rosto contra o colchão. Naruto fez uma careta, nada feliz com a minha forma de ter sido acordado, mas não abriu os olhos, apenas ajeitou a cabeça no novo relevo – provavelmente por birra.

- Anda, levanta. Temos que ir logo. – Falei enquanto devolvia o travesseiro à cabeça de Naruto, arremessando-o de um modo nada gentil.

- Bastardo! – A voz dele veio contida pelo travesseiro que ainda estava sobre seu rosto.

- Bom dia pra você também. Agora levanta.

Ele agarrou o travesseiro nas mãos enquanto punha-se sentado na cama, seus olhos semicerrados olhando para lugar nenhum e sua boca em bico denunciavam a sua completa falta de vontade de acordar cedo.

- Vejo que já se sente melhor. Vai dar para ir à escola hoje sem problemas. – Naruto nada me respondeu, pelo menos não em palavras. Quando olhou para mim, lançou de volta o travesseiro certeira e diretamente no meu rosto, mas consegui segurá-lo ainda no ar, antes que encostasse em mim. – Está bem melhor. – Corrigi-me, já que ele foi capaz de fazer um indelicado movimento de arremesso sem expressar dor. – Vai se arrumando logo, vamos tentar sair antes que Itachi te veja aqui.

- Tá, tá... – Naruto disse imparcial, tirando o edredom que havia se enrolado em volta de seu corpo durante o sono agitado e arrastando as pernas preguiçosamente para fora da cama.

Observei que ele não havia trocado de roupa e mantinha o uniforme danificado pela briga com Toya, também deveras, ele não estava em condições de se mexer nem que fosse para colocar uma muda nova. Mas agora que ele tinha se recuperado de forma espantosa, possivelmente dando-se em grande parte pelo remédio de gosto ruim de Sakura, ele estava apito a não só trocar de roupa como também ter um dia quase que normal. Um sentimento de gratidão por aquela garota de cabelos róseos fez com que meu peito se aquecesse de forma agradável. Balancei a cabeça, confuso com essa sensação contrária; o foco do momento era o moleque loiro ainda um pouco débil à minha frente. Era ele quem precisava de mim naquele instante. Não só de mim como de um uniforme descente.

Girei os calcanhares e caminhei até o meu armário, Naruto me observava enquanto permanecia sentado na beira da cama; encontrei uma muda limpa do meu próprio uniforme e tomei-a nas mãos. Naruto era um pouco menor que eu e não era tão magro quanto, mas ainda assim caberia bem nele. Joguei para ele as roupas dobradas e estas pousaram com precisão em seu colo.

- Você tem uma boa mira, deveria participar do clube de arco e flecha. – Ele comentou casualmente, observando as roupas sobre si ainda alinhadas.

- Um dia, quem sabe. Se eu puder usar o Toya como alvo, entrarei no clube com prazer. – Brinquei, puxando uma lateral dos lábios em um sorriso sádico e Naruto riu da mesma maneira.

- Se fosse assim, os membros atuais do clube ficariam loucos, pois o Seika inteiro iria querer fazer arco e flecha! – E ele gargalhou de forma mais maldosa ainda, porém se arrependeu logo em seguida, fazendo uma careta de dor, provavelmente advinda do maior esforço de seu abdômen.

- Sem escândalo, Naruto! Vai acabar acordando o Itachi assim! – Falei com urgência. – E tome cuidado consigo mesmo, você ainda não está 100%. – A tonalidade mudou para algo mais timorato, e isso fez com que Naruto se acalmasse e olhasse para mim como se escutasse seu padrinho. Suspirei, sentindo-me tão responsável por aquele garoto quanto o detentor de sua guarda. – Vá tomar um banho e tente não demorar, sim?

- Ok, kaa-chan. – Respondeu ironicamente, mas não antes de revirar os olhos diante da minha tentativa de bancar a “mãezona”. Levantou-se a contragosto e caminhou para o banheiro preguiçosamente, era nítida a sua vontade de dar meia-volta e se enterrar na cama novamente.

Quando ele fechou a porta para finalmente tomar seu banho, foi a minha vez de ansiar por aquele pequeno paraíso formado de espuma, metal e algodão, salva a diferença de que eu podia. E assim o fiz. Permiti que minhas pernas amolecessem e caí sentado, sentido a roupa de cama ainda quente e meu corpo quicar por sobre as molas. Lutei bravamente contra o desejo de me aconchegar ali para uma pequena soneca, meu corpo ainda estava muito cansado depois de toda a agitação e adrenalina no dia anterior. Ter feito uma verdadeira caçada atrás de Sakura que me levou a centenas de quilômetros para longe do Tokyo e o espancamento de Naruto certamente foi demais para mim num único dia. É, quem sabe só um pouquinho... Eu merecia me dar uma folga.

Com tal pensamento em mente, deixei minhas costas também irem de encontro ao colchão, meus olhos se fecharam quase que de imediato, sendo protegidos pelo antebraço da luz elétrica que iluminava meu quarto.

Só uns minutinhos, enquanto não é minha vez de tomar banho...

Eu já conseguia sentir meu consciente ser tomado e levado para um outro plano, dando lugar ao meu tão almejado descanso, mas ele foi brutalmente amarrado e trazido de volta à dura realidade quando uma voz soou perto de mim:

- Sasuke-kun, ainda na cama? – O timbre feminino inconfundível do único ser do gênero que tinha convívio comigo me fez choramingar numa careta de frustração, deslizando o braço para o lado, derrotado, e podendo fitar aquelas esmeraldas brilhantes com o olhar mortífero.

Mas, naturalmente, ela ignorou a afronta e sorriu brandamente.

- Bom dia! – E foi aquele rosto risonho que me quebrou, não conseguia sentir raiva pela interrupção inoportuna dela, mas mantive a boca torta em descontentamento para prezar meu orgulho.

Sentindo que meu breve sono agora se encontrava longe do meu alcance, pus-me novamente sentado, os olhos entreabertos implorando pelo que lhes foram privados. Tal movimento vez Sakura perceber algo, pois ela desfez o semblante e ergueu as sobrancelhas.

- Veio fazer companhia ao Naruto durante a noite? – Ela terminou a pergunta com um sorriso sacana, revelando seu lado “sombrio”. (N/A: Peço perdão pela piada, sei que muitos que acompanham a história não gostam de yaoi, mas lembrem-se de que a Sakura na história original é realmente uma fujoshi, então, né, eu precisei!)

Quando me toquei do que ela queria insinuar com aquilo e o motivo era eu estar deitado no mesmo lugar que o cabeça-oca dormira naquela noite, levantei em um pulo, enojado com aquela ideia que invadiu a minha cabeça como um inseto asqueroso e repugnante; tentava invalidar o fato de eu ter estado deitado ali apenas com o fato de não estar mais. Sakura dobrou seu corpo em uma gargalhada que aposto que até o Naruto sentiria inveja pelo escândalo que a garota era capaz de fazer. Puta que pariu, pensar no Naruto agora me deixava até de estômago embrulhado.

- Você só pode estar brincando! – Sentia meu rosto esquentar, mas não sabia se era por ira ou constrangimento, ou as duas coisas juntas. Que diabos ela estava falando de mim?

- Mas eu estou! – Ela conseguiu falar ainda em meio aos risos, quando controlou minimamente seu ataque.

Estalei a língua atrás dos dentes, incomodado com aquela cena e bravo comigo mesmo por ter levado as palavras dela a sério, meu orgulho acertado em cheio. Mas, mesmo assim, não conseguia ter raiva dela. Ao olhar para aquele rosto, meu espírito se apaziguava e qualquer emoção negativa relacionada a ela desaparecia.

Alguma coisa estava realmente errada comigo.

- Não se esquece de levar comida para o filhotinho, ok? – Após um momento se recuperando, ela voltou a falar normalmente. A mudança de assunto foi brusca, algo bem característico dela. – Estou em dúvida ainda quanto ao nome dele... O que você acha? – Comentou olhando para nada em específico, com a mente muito ocupada pensando no assunto.

- Pra que se preocupar com isso?

- Ora, dar nome a um bicho significa que ele é importante para você. É um gesto de afeição, também é quase como dar o lugar dele no mundo. – Sakura dizia tudo aquilo com seriedade e certo ar de um profissional de explicava sua área para alguém totalmente alienado. Dessa vez tive dificuldade de deduzir de onde ela havia tirado essas coisas e a olhei com mais atenção.

- O que você tem lido? – Estreitei os olhos numa tentativa de comunicá-la o quão estranho tudo aquilo que disse era, porém Sakura apenas me olhou com uma feição que beirou a ostensividade.

- Muita coisa.

Era até óbvio que ela lesse muita coisa, afinal, não tinha obrigações e sequer dormia. O que mais uma garota como aquela, fascinada pelo conhecimento, faria naquelas condições? Podia até imaginá-la pendurada no ombro de algum estudante e lendo, junto com ele, os livros que ele folheava. Era certo de que, em pouco tempo, ela estaria no nível de um universitário e teria até um diploma – pelos planos dela que li em seu diário, de Medicina – se fosse viva...

A observação da “vida” que Sakura estava para continuar a levar resultou em uma pequena batida gelada no meu peito. Ela era do tipo que iria dar um grande retorno para a sociedade através de seus conhecimentos medicinais e afins, mas agora as pessoas que seriam beneficiadas por ela sequer saberão o seu nome, e Sakura jamais terá o prazer de ouvir um “obrigado” de alguém que ajudou, o brilho voltar para os olhos... E enquanto isso, eu não conseguia prestar nem para ajudar a identificar os assassinos de meus pais, não conseguia lembrar-me de nenhum detalhe significativo, tudo era um borrão em meio ao denso breu... Mas que droga, eu não conseguia nem identificar o modelo ou a placa do carro que eles usavam, quanta inutilidade! A vida era realmente uma droga... Por que pessoas como Sakura tinham que morrer e pessoas como eu permaneciam vivas? Isso não era nem um pouco justo.

- Dormindo de olhos abertos? – A voz de Sakura me arrancou de meus devaneios, felizmente. O rumo que meu raciocínio estava me levando não era nem um pouco agradável de pensar.

Meus olhos voltaram a focar na garota à minha frente. Ela tinha um ar curioso e ao mesmo tempo divertido, enquanto mantinha as costas encurvadas para me ver mais de perto. A proximidade inesperada me pegou de surpresa, senti minha nuca e dedos formigarem imediatamente e lutei para que as sensações acabassem aí. Sakura voltou a ficar ereta quando pisquei atordoado e notei que tinha, inconscientemente, prendido a respiração.

- Tudo bem? – Ela ergueu uma das sobrancelhas em estranhamento antes de me fazer a pergunta.

- Ah... Sim. – Sasuke, foco! – Tá tudo bem, por quê? – Ok, pareceu meio forçado, mas Sakura não notaria uma coisa dessas. Porém, quando ela levantou a outra sobrancelha, percebi que ela notaria, sim.

- Está meio aéreo, isso não é muito a sua cara. – Mas então Sakura sorriu do novo, o sorriso que sempre ficava estampado em seu rosto, e riu de leve pelo nariz. – Deve estar sonolento ainda. – Ela ergueu uma mão e levou a ponta do indicador até a altura do meu nariz, provavelmente fingindo estar cutucando-o. – Acooorda! – Ela falou de forma prolongada, sorrindo ainda mais abertamente.

Retrocedi com a cabeça, torcendo o nariz, e levantei a minha mão para estapear a dela da minha frente, mas ela passou através do membro sem nenhum esforço. Às vezes, a presença daquela garota-fantasma se tornava tão natural para mim que eu esquecia a parte não-natural dela. Sakura parou diante à minha tentativa totalmente frustrada e riu sonoramente, pelo menos acabou por tirar a mão de frente do meu rosto, mas em compensação conseguiu me deixar sem jeito pela segunda vez em menos de dois minutos.

E eu ainda não conseguia sentir raiva dela ou, ao menos, ficar irritado. Seria devido ao que acarretou a nossa última briga, quando eu explodi com ela? Realmente, ter dito todas aquelas coisas, sem pensar em como a afetaria, me deixou com um grande remorso difícil de ser dissipado. Foi por causa daquilo que jurei que nunca mais faria Sakura chorar, não queria que ela sofresse mais. O destino já havia dado a ela um fardo muito pesado de se carregar e, se eu pudesse, queria dividi-lo comigo e conseguir garantir para ela algo de feliz. Mesmo sendo um amaldiçoado imprestável, eu iria me esforçar para isso.

- Só estou um pouco cansado, que coisa. – Voltei ao assunto anterior ao que a fez rir de mim, numa tentativa de fazê-la esquecer logo daquilo.

- Você não fica cansado fácil. Tem que monitorar melhor seus horários, o descaso é crucial para um corpo saudável.

Quem é a “mãezona” agora?, o pensamento cruzou divertido a minha mente. Se Naruto pudesse ver Sakura e ouvir tudo que ela dizia, ele certamente pensaria duas vezes antes de achar que era eu quem sempre tentava ter a última palavra e ser superprotetor ao mesmo tempo.

- Você seria uma boa médica... – O pensamento acabou por ser dito baixinho sem querer. Mordi a língua em repreensão, não era para Sakura ouvir aquilo e torcia para que não o tivesse.

Soube tristemente que ela havia me escutado quando ela deu um sorriso doce e balançou a cabeça negativamente.

- Mesmo não podendo ser médica, eu já tenho paciente para cuidar, de qualquer jeito.

E eu entendi que ela se referia ao trabalho e preocupação que Naruto ou eu a estava dando. Resolvi, então, mostrar-me mais cooperativo e ceder.

- Vou dormir mais cedo hoje, feliz? – Falei, fazendo questão de deixar uma boa porcentagem de zombaria na ultima palavra, talvez querendo minimizar a tensão que sentia.

- Certamente. – Ela respondeu, passando por cima de todo o meu deboche simplesmente ignorando-o.

A cena foi interrompida pelo som da porta do banheiro sendo destrancada e aberta logo em seguida. Dessa vez a sorte sorriu para mim, e Naruto saiu do banheiro no momento que eu não estava falando com Sakura.

- Até que a roupa deu bem. – Ele comentou enquanto autoanalisava o trajo ainda de botões abertos, expondo a blusa branca por baixo.

- Vai terminar de ajeitar a roupa, não? Voltou a nevar. – O Naruto sempre usava o uniforme de modo despojado, nunca abotoava a blusa completamente, mas eu tinha certeza de que, num frio daquele, ele priorizaria se aquecer do que ir contra as regras do colégio.

- Vou, é que eu lembrei que não peguei minhas luvas e meu cachecol pra colocar lo... – Ele parou de falar de sobressalto e levantou o olhar um tanto arregalado para mim, tinha percebido alguma coisa. – Eu esqueci na rua, né? – E então eu me toquei que na pressa em tirar Naruto daquele beco e trazê-lo para casa, esquecemos do acessório que havia se desprendido do corpo dele durante a briga.

- Não tem problema, pode usar um meu. – Disse tentando ampará-lo, voltando ao meu guarda-roupa e tirando de lá um cachecol cinza. Sabia que Naruto gostava de cores mais vibrantes, mas era o mais claro que tinha. Joguei a peça no seu peito e ele a agarrou nas mãos antes que caísse dessa altura. – Desculpa, mas não tenho laranja ou coisa do tipo.

- Tudo bem, posso ser o Snape por um dia sem problemas. – Não entendi como ele podia se achar parecido com tal personagem só por causa do conjunto escuro, afinal a cor dos olhos e cabelos era totalmente oposta à dele.

- Você nem se parece com ele, não se preocupe. – Tentei ingenuamente tranquilizá-lo.

- Eu sei, isso é com você. Falei isso porque vou usar suas roupas. – Ele respondeu cinicamente, ainda encarando o cachecol que segurava. Agora, entendendo as reais intenções dele com aquela comparação, aceitei o convite para uma “amigável” discussão matinal rotineira:

- Melhor do que ser o mesmo tapado estúpido de todos os dias.

- Meninos, sem briga. – Sakura interferiu, já prevendo a discussão recheada de xingamentos de baixo nível que estava para começar.

- O senhor deveria se concentrar mais no ensino de Defesa Contra as Artes das Trevas ao invés de... – Naruto começou com mais uma investida, mas foi cortado com o meu usual som prepotente de quem já cantava vitória:

- Hunf. – Resolvi dar ouvidos a Sakura e ignorar o resto da resposta de Naruto, mesmo sendo tentador contra-atacar. Além do mais, não tínhamos todo o tempo do mundo para um bate-boca naquele momento, já que tínhamos que sair rápido de lá. Catei mais uma muda de uniforme no armário de portas abertas ainda ao meu lado e caminhei logo para o banheiro, fazendo pouco de qualquer coisa que o garoto mestiço ali proferia contra mim. – Não saia desse quarto sem mim, ok? – Disse a ele antes de fechar a porta.

- Sabia que ia perder essa e saiu correndo, né? – Pude ainda ouvir a voz de Naruto implicante do outro lado e resisti à vontade de replicar, tinha que me apressar em me arrumar logo.

 

- Itachi-nii-chan, bom dia! – Naruto cumprimentou meu irmão logo que saiu do meu quarto e o avistou na cozinha aberta. Os honoríficos e o tom de intimidade não passaram despercebidos por mim, obviamente, e contorci o rosto em desgosto. Lembrava que eles já tinham se falado por telefone há um tempo, quando Naruto e os outros usaram Itachi para me convencer a ir naquele desastroso goukon.

- Ciúmes? – Ouvi Sakura perguntar ao meu lado e odiei-me por permitir que fizesse uma expressão daquelas sem querer, ainda mais com alguém podendo ver.

Revirei os olhos para ela como resposta. Claro que eu não estava com ciúmes do Itachi, que pergunta mais besta.

- Naruto-kun, bom dia. – Pude enxergar o sorriso simpático que Itachi deu para o Naruto em resposta. Mas o que diabos...!

- É, ciúmes, certamente. E sem chance de defesa. – Sakura se pronunciou mais uma vez, atestando aquilo num tom que ela devia ter ouvido em algum seriado sobre advocacia que Itachi assistia. Minhas sobrancelhas, já estreitadas por presenciar aquela cena, apenas uniram-se ainda mais quando encarei Sakura repreensivamente.

- Bom dia, Sasuke. – Itachi me cumprimentou quando eu finalmente entrei em seu campo de visão, tendo isso levado mais tempo, pois estava atrás de Naruto.

- Hm.

- Alguma preferência do que comer? Ainda não comecei a cozinhar. – Itachi voltou a se direcionar a Naruto, que agora se debruçava por sobre o balcão que ficava na entrada da cozinha, buscando ver o que ele já estava a preparar.

Naruto abriu a boca para responder enquanto os olhos brilhavam, ignorando qualquer instrução anterior minha sobre evitar falar com o Itachi para evitar dar merda, mas desde quando o paspalho me dava ouvidos, não é? Antes que ele liberasse qualquer som daquela boca grande, interferi:

- Não vamos comer aqui, estamos com pressa. Compramos algo no caminho.

O olhar de Itachi caiu sobre mim novamente. Não era usual eu sair antes do meu horário.

- Por quê?

- Temos coisas a fazer na escola. – Escolhi uma desculpa desprovida de detalhes propositalmente. Quanto menos eu revelava a Itachi, menos formas de me contornar ele tinha.

- É mesmo? – Ele perguntou casualmente, retornando usa atenção ao que fazia na pia, tentando parecer não suspeitar daquilo e fazendo pouco caso, mas eu, como irmão mais novo, já conhecia todo aquele jogo e sabia, sabia que ele não tinha engolido aquela minha desculpa nem por um segundo.

- Sim. – Tentei não vacilar na voz para não deixar a mentira transparecer (ele podia já saber que eu estava mentindo, mas fingia que não, então eu também iria fingir que acreditava no teatrinho dele e seguiríamos na nossa peça de mentiras, fantasiando que tudo estava bem), mas ele estava me intimidando com aquele comportamento tão simplório que quase deixei o timbre cair.

- Fiquem atentos ao tempo, foi dado um alerta de possível nevasca hoje. – Itachi desviou do assunto, buscando o celular no bolso e provavelmente checando se a informação climatológica se mantinha. Mas era óbvio para mim que aquela desculpa para quebra de olhares era para que ele se refreasse quanto a fazer mais perguntas e se sentisse um pouco confortável naquela situação.

- Nevasca? No início de dezembro? O clima realmente está louco. – Naruto seguiu no rumo da conversa sem perceber o que se passava entre Itachi e eu naquele momento.

- Pois é, parece que o inverno se adiantou esse ano. Há uma frente fria vindo do oceano. – E o olhar minucioso de Itachi subiu da tela de seu celular, indo até Naruto à sua frente e parando em seus lábios por um milésimo de segundo, estreitando-o nesse mesmo tempo ao ver o pequeno corte que havia lá. – Por favor, tome cuidado. – Ele completou ao fitar os olhos ainda inocentes de Naruto, que não interpretou aquele pedido da mesma forma que eu.

- Pode deixar! E vou tomar conta do Sasuke também!

A afirmação quase que paradoxal daquele loiro idiota tomou totalmente a minha atenção, fazendo-me trocar o modo de defesa contra as investidas de Itachi para o modo de defesa do meu orgulho.

- Tsc, eu posso cuidar de mim mesmo.

Naruto girou o pescoço em minha direção, fazendo uma cara ainda mais débil do que achei que ele fosse capaz naquela hora da manhã.

- Será?

Seu tom foi implicante, mas lancei-lhe uma afronta significativa e acusatória. Quem precisou cuidar de quem ontem mesmo?

Meus olhos se reviraram quando ficou clara minha ineficácia em destruir a aura enticante de Naruto, ele realmente não estava cooperando para a saída ligeira que eu havia planejado. Só dependia de ação pela minha parte, portanto. Marchei até Naruto e agarrei o braço dele, arrastando-o comigo, sem me importar com os tropeços dele e sem diminuir o ritmo rumo à porta de saída.

- Estamos indo. – Anunciei.

- Itekimasu, Itachi-nii-chan! – Ele balançou exageradamente o braço livre para Itachi, tentando virar o corpo para visualizá-lo enquanto falava, dificultando mais ainda dar os poucos passos necessários para deixar aquele apartamento. Quando parei para destrancar a porta, Naruto se viu livre para falar mais. – Outro dia volto aí pra compensar a saída rápida de hoje e fazer companhia, já que o Sasuke tá mais para um espantalho do que pra gente. – Instantaneamente e por força do hábito, soltei a mão dele e joguei meu cotovelo em direção à sua costela, na intenção de reprimi-lo. Naruto encurvou levemente o corpo em função da dor. Digo “levemente” porque era a vez dele tentar prezar pelo próprio orgulho e não deixar expor toda dor que sentiu naquele singelo golpe. Admito que só me lembrei do estado dele após tê-lo atingido, mas devo admitir também que não me arrependi do que fiz. Ele estava pedindo por isso. – Ai, bastardo, só falei a verdade...

Não me dei ao trabalho de responder, girei a maçaneta e saí, ouvindo o “iterashai” de Itachi atrás de mim. Naruto veio logo depois, fechei a porta no momento em que ele passou por ela e a tranquei novamente.

- Você realmente não consegue controlar essa boca, né? – Levei minha mão aos meus olhos novamente cansados graças àquele lerdo, e os pressionei. – Francamente...

- Eu estava tentando agir naturalmente para que o Itachi-nii-chan não estranhasse, ué! – Pois é, se fosse do jeito que Naruto pensava, ele merecia um Oscar, porque ele realmente estava agindo com toda naturalidade do mundo. – E acho que o enganei bem, ele parece não ter suspeitado de nada! – Ele acrescentou a sua justificativa com um certo orgulho do feito que achava ter conseguido fazer.

- Não, ele sabe. – Murmurei, aquela afirmação me tirando a firmeza da voz. – Além disso, ele sabe que menti e notou que você se envolveu em alguma briga. – Naruto piscou, surpreso com a revelação e visivelmente desnorteado por não entender como aquilo aconteceu. – Ele não comentou porque sabia que não iria adiantar em nada.

- Como ele percebeu essas coisas? Ele pareceu tão normal... – Naruto estava certamente perdido com aquilo. Dei de ombros, fazendo pouco caso da minha resposta. Já estava mais do que acostumado com o jeito extremamente perspicaz de Itachi e aquilo não me era nenhuma novidade.

- O Itachi é assim mesmo, sempre vê o que ninguém vê, sempre pensa à frente. – A resposta soou mais como um conformismo do que uma mera resposta.

Naruto mantinha a expressão lerda e atônita no rosto. Foi preciso alguns segundos de silêncio e algumas piscadas para que ele esboçasse alguma reação, e esta não foi lá uma das que eu esperava, já o ele abriu um largo sorriso.

- Seu irmão é demais, Sasuke. – Naruto virou o corpo, abrindo passagem para caminharmos para o elevador, e eu buscava entender o porquê dele dizer algo como aquilo enquanto andávamos. Era consciente e acostumado à inteligência acima da média de meu irmão, achava diferente era ver como as pessoas que se impressionavam com ele.

- Mas é claro! O que esperar do irmão mais velho do Sasuke-kun? – Sakura disse em algo que me soou como orgulho presunçoso.

– E sabe, ele se importa com você de verdade. – Naruto acrescentou quando apertei o botão para chamar o elevador que descia. Minha mão ficou estatelada no ar com aquelas palavras e o encarei. Por acaso ele e o Itachi tinha formado um complô para tentar me sensibilizar ou algo assim? Naruto levantou os ombros para a minha cara descrente. – Não precisa ter os olhos de águia do seu irmão, qualquer um vê isso.

Teria Naruto lido os meus pensamentos daquela manhã? Era como se ele estivesse respondendo aos questionamentos que eu fizera. Aquele moleque tinha um dom semelhante ao de Itachi para ler as pessoas, pena que tanta lerdeza se sobressaísse à parte dele. Porém, aquele comentário não devia advir de uma análise cuidadosa, na verdade, mas, sim, de pura admiração por parte do Naruto para com o Itachi, e ainda por cima, Naruto não sabia como era uma figura fraterna, já que era filho único. Estar em contato com Itachi devia deixá-lo animado exatamente por poder ter a sensação – mesmo que de forma extremamente superficial – de como seria ter um irmão mais velho.

E eu não estou com ciúmes disso. Claro que não. Sakura que é muito implicante.

Apenas notei que fiquei muito tempo em silêncio quando ouvi o sinal do elevador e a porta deste se abriu na nossa frente. Entramos sem cerimônia, e eu ainda não sabia o que responder a ele. Na dúvida, o melhor a fazer era abster-se, e foi isso que fiz: mantive-me quieto e torci para que Naruto não considerasse isso significativo. Para minha sorte, foi isso que aconteceu, e ele apenas aceitou minha mudez como faz todo dia.

 

Como esperado, Naruto e eu chegamos ao colégio bem antes do horário, havia pouquíssimos alunos já presentes esperando suas respectivas aulas começarem. Resolvi aproveitar o horário livre para levar comida e trocar a água do filhotinho que estava “hospedado” aos fundos da área escolar. Naruto me acompanhou, já que ele inevitavelmente ficou sabendo da existência do pequeno cão quando interrompi nossa caminhada da estação até a escola para comprar um saco de ração para filhote de cachorro. E claro que ele quis ir comigo e conhecer o ilustre.

- Ooh! É branquinho! – Se eu já não estivesse acostumado ao jeito espalhafatoso de Naruto, certamente me assustaria com o quase-grito que ele soltou quando o projeto de cachorro veio correndo em nossa direção. – Ah, não, as orelhas não são. – Ele notou ao pegar o bichinho no colo. – Como tiveram coragem de abandonar uma coisinha dessas? – Ele ria enquanto deixava, sem nenhum pudor higiênico, o cachorro lamber seu rosto. Cheguei a considerar a possibilidade de chamá-lo a atenção a respeito de cuidados com a saúde, mas prontamente a descartei, já que ele com certeza não me daria ouvidos.

- Se quiser para você... – Já que ele gostou tanto do bichinho, não custava tentar.

- Até que eu o levaria comigo, mas o Ero-Sennin vai criar caso por causa dos sapos dele... – Ele disse cabisbaixo.

O padrinho dele era um velho com manias estranhas. Eu não o conhecia, mas dava para se notar isso só de ouvir falar dele. Além de um tarado de alta categoria, ele tinha uma grande paixão por sapos e os mantinha em seu apartamento como bichos de estimação. Inclusive, constantemente ele estava explorando lugares à procura de novas espécies. Essa combinação de gostos exóticos o deu, merecidamente, o apelido inventado pelo próprio Naruto.

- É, faz sentido. – Concordei com o inegável. O que faria um filhote hiperativo junto a um monte de sapos? Certamente faria os pobres anfíbios de brinquedo com seus dentes e garras afiados e sua inocência de quem não tem noção de sua capacidade destrutiva.

- Acho melhor deixar todo o saco de ração para ele comer, Sasuke-kun. – Sakura começou a falar ao meu lado. Ela provavelmente não se aproximava do cachorro ainda porque ele poderia direcionar sua atenção a ela e Naruto ficaria bastante confuso com o bichinho pulando e latindo para nada no ar. – Se a nevasca realmente vier, vai saber quando vai poder vir alimentá-lo outra vez.

Aliás, a sugestão dela havia sido bem pertinente e não tinha me passado na cabeça que deveria providenciar suprimentos e acomodações próprias para o animal suportar sem dificuldades o frio que poderia se instalar ali.

Estávamos no fundo do depósito de restos de festivais e outros eventos escolares, lugar perfeito para improvisar uma cama térmica e algo para guardar a ração que fosse independente de ação humana para sua manutenção. Não seria muito difícil; eram tantas caixas de papelão recheadas dos mais diversos materiais empilhadas aos montes que corredores eram formados como que quase um pequeno labirinto no galpão. Sem contar, claro, das prateleiras que tomavam praticamente todo o espaço alto das paredes lotadas de baldes de tinta e outros produtos que deviam ser guardados em local arejado.

Mas antes de colocar a mão na massa, precisava dar logo o café da manhã do pequeno hóspede, e então eu me viraria em montar algo quente para ele. Assim o fiz, abri a embalagem da ração e o ser nanico, adotado de invejável olfato, pulou imediatamente do colo do frustrado Naruto, que choramingou com a troca de preferência.

Com os lábios contorcidos em bico, o loiro me observou me agachando para alimentar o filhote – que já aparentava ser seu mais novo xodó – e me desvencilhando de suas investidas a fim de alcançar a comida canina em minha posse.

Com um tanto de dificuldade, fui capaz de servir-lhe a refeição e ele a comeu tão afobado que parecia nunca ter comido na vida. Cães não possuíam nenhum pudor, mesmo... Por isso também preferia gatos. Gatos mantêm a compostura praticamente em qualquer ocasião e por isso os considerava seres muito dignos.

Um ronco arrastado e baixo transferiu minha atenção do cachorro que comia ferozmente para o garoto ainda agachado perto de mim. Ele pareceu não notar o meu olhar para ele e nem se importar com o som que seu estômago acabara de fazer; mantinha seus olhos por sobre o animal que se alimentava ali. Seria possível que ele sentiu fome ao ver o cachorro comer ração? Não consegui deixar de repuxar os lábios em um sorriso sacana.

- Quer um pouco? – Arrastei o saco de ração canina em direção a Naruto, e este se sentiu perdido com a minha pergunta, mas quando entendeu o ato sugestivo, revirou os olhos.

- Ha, ha. – Ele soltou as sílabas sem nenhuma emoção. – Muito engraçado.

Diferente do que eu dissera a Itachi, não comemos no caminho para a escola. Enquanto eu simplesmente havia me esquecido de parar em algum lugar para fazer o desjejum, Naruto ficou totalmente tomado pela história de eu ter resgatado um cachorro de rua e o manter escondido nas dependências da escola.

- Se está com fome, vai lá fora comprar algo. Eu me viro aqui sozinho. – Falei para ele de forma compreensiva. Deduzi que ele estivesse se sentindo na obrigação de ficar ali enquanto achasse que fosse necessário, o melhor era tranquilizá-lo quanto a isso. Não era uma tarefa complicada cuidar de um cachorro, afinal de contas.

- Ok, vou comprar algo e daqui a pouco volto. – Ele cedeu sem grandes dificuldades, já se levantando. – Quer algo também?

A pergunta de Naruto me fez perceber algo de mim mesmo que eu tinha ignorado até então: eu estava faminto. Era incrível como eu não tinha me tocado disso, fazia mais de 24 horas que eu não colocava algo na boca.

Desde o dia anterior, quando eu me dei conta de que Sakura não apareceria e saí em seu encalço, não parei por um instante, nem para comer. Foi tudo inteiramente focado em “Sakura” e mais “Sakura”, e à tardinha, quando estava finalmente para sossegar e pensar em minhas próprias necessidades, houve o infeliz acontecimento com Naruto e, mais uma vez, fiquei totalmente concentrado em relação a outro alguém. Dessa forma, no dia anterior, eu não tive nenhuma refeição sequer e só me tocava disso agora.

Era estranho pensar o quanto aquelas pessoas ali comigo conseguiram tal efeito sobre mim, e mais estranho ainda era tentar entender o porquê daquilo. O Naruto, tudo bem, a situação dele era crítica e, inclusive, a encarei como um caso de vida ou morte. Era natural alguém se preocupar assim com um... um... amigo?

Era verdade, não conseguia negar, ao menos para minha própria pessoa, que aquele garoto demasiadamente alegre e tapado acabou por me cativar. Não que fosse admitir isso em voz alta, claro, mas entre eu e mim mesmo, denegar a existência de um laço de amizade entre nós não era mais cabível e nem sustentável. Afinal, depois de tudo o que passamos, principalmente no dia anterior, depois do modo que fiquei conturbado e até mesmo apavorado com a possibilidade de que Naruto fosse machucado, a recíproca do sentimento de amizade já estava mais do que confirmada.

Agora, quanto à Sakura, a situação já era mais complexa. O que eu sentia em relação àquela garota? Não era o mesmo que sentia pelo Naruto, não era camaradagem, disso tinha certeza absoluta. Sakura me provocava sensações que nenhum outro conseguia, sensações estranhas e, até mesmo, constrangedoras.

Por que ontem ela me desestabilizou a ponto de sair sem rumo à sua procura só pelo simples fato de ela não ter aparecido no horário de costume após eu ter sido um completo imbecil com ela? Por que eu fiquei tão agonizado, com um peso tão grande na consciência pelas palavras desmedidas que lancei contra a garota tão dependente de mim? Por que eu passei por cima do meu orgulho tão facilmente e quis pedir desculpas? Quem era aquela garota, afinal, capaz de fazer algo tão marcante e preso a mim como o meu orgulho, ser reduzido a nada?

Eram tantas perguntas sem respostas... Sakura tinha algum poder sobre mim, e eu não sabia o que era ele e nem seu por quê. Apenas sabia que, quanto mais em pensava em Sakura, mais perdido e confuso me sentia. Então era melhor parar de imaginar em tanta baboseira e responder logo a pergunta de Naruto; o lerdo era ele, e não eu.

- Vou querer, sim. – Respondi, apalpando os bolsos da minha calça para encontrar minha carteira. Peguei-a e a arremessei para Naruto, não tinha noção do quanto ele iria precisar para comprar o que eu queria, então que levasse logo a carteira. – Compra um obento que tenha bastante onigiri com okaka e mais qualquer coisa que não seja doce.

- Tá, daqui a pouco volto. – E o perdi de vista quando ele se enfiou nos corredores de caixas, rumo à saída do galpão.

Aquela parte da manhã seria cheia... Ainda precisava encontrar o diretor Mirose para deletar o seu próprio filho delinquente e, definitivamente, não poderia fazer isso sozinho. Não teria a mínima chance de, ao menos, gerar a dúvida na cabeça daquele homem se apenas eu fizesse a acusação. Precisava de alguém que topasse dar a cara à tapa comigo, e alguém de confiança. Talvez o membro do Conselho Estudantil, Neji, fosse a melhor escolha para aquele movimento. Apenas esperava que ele aceitasse, caso contrário, teria que me dar ao trabalho de tentar convencer outro membro do nosso grupo e arriscar ir à luta com alguém de histórico não tão imaculado.

Suspirei, cansado só de pensar em todas aquelas coisas e levantando-me para fuçar aqueles materiais e improvisar algo minimamente descente.

Fiz uma rápida busca visual em uma das pilhas de madeira, encostada à parede dos fundos, selecionando os pedaços que pareciam medir os tamanhos desejados.

- Parece que o Naruto está bem melhor, né? – Sakura comentou casualmente em meio aos ruídos de atrito entre a chapa de madeira que eu puxava para fora da pilha e as restantes. Disfarçava a dor incômoda que se instalara no meu ombro esquerdo desde que a temperatura diminui consideravelmente e que era ainda mais sentida com aquele esforço. Já era de meu conhecimento que frio não era o melhor amigo de feridas como aquela, mesmo que cicatrizada.

- É, ele está se recuperando bem rápido. – Respondi sem lhe dar muita atenção, colocando o pedaço de madeira no chão e já partindo para apanhar o próximo.

- E você? – Sakura devia estar querendo jogar conversa fora agora que finalmente estávamos sozinhos e seríamos capazes de desenvolver um diálogo descente. Eu prometi a mim mesmo que seria mais condescendente e compreensivo, fazia parte entender que nossas conversas eram vitais para ela, uma vez que eu era o único com quem ela era capaz de estabelecer tal contato. Não iria me irritar com ela e muito menos seria grosso e ignorá-la por ela querer falar de assuntos triviais comigo.

- Eu o quê?

- Está melhor? – Aquela pergunta estourou em uma pequena bomba de inconveniência e intromissão. A segunda chapa de madeira ficou erguida em minhas mãos, o barulho das outras madeiras acomodando-se com a movimentação cessou-se em um silêncio desconfortável; continuava de costas para Sakura, permanecendo imóvel. E tudo porque ela queria falar sobre como eu estava após ver aquela infeliz reportagem no dia anterior, do modo nada contido que reagi àquilo; queria falar de sentimentos.

Grande piada! Sakura queria bancar a psicóloga! Nem ajuda de tal profissional eu aceitara após sair daquele maldito hospital – apesar de ter sido forçado a participar de algumas sessões (a maioria acompanhada de algum oficial da polícia, que tentava tirar alguma informação proveitosa de mim) quando estava internado nele, incapacitado de fugir daquilo –, quem dirá de uma enxerida tagarela como ela. Não, nem pensar, isso estava fora de questão.

Mas não era preciso expor toda a minha repulsa quanto àquele assunto para freá-lo, bastava ser franco e assumir que aquilo não era de meu agrado.

- Não vamos falar sobre isso. – Exprimi secamente, buscando deixar claro que estava realmente sério, e continuei o movimento interrompido antes pela investida dela, levando a madeira ainda envolta por minhas mãos até onde havia colocado a anterior, ao chão.

- Ah, vamos, sim. – Certo, parecia que a minha predisposição em não me irritar com Sakura estava para se dissolver como se tivesse sido mergulhada em ácido clorosulfônico.

- Apenas não quero falar nisso, não quero nem pensar nisso. – Finalmente voltei-me para ela, e exibia a expressão mais indignada que Sakura já recebera de mim, o timbre da voz prestes a escapar um pouco do meu controle com aquele nó que começava a apertar a minha garganta. – Esqueça o que você acha que sabe!

Mas, ao contrário do que eu esperava, Sakura não se intimidou, pelo contrário, seu olhar ficou mais firme, e ela estufou o peito, pronta para começar uma discussão acirrada.

- Pois você tem feito exatamente o contrário do que acabou de dizer, não percebe? Você só pensa no passado, fica se martirizando com algo que já passou, acaba cegando a si próprio e não vê o que o presente está lhe oferecendo.

Não é como se ela estivesse falando alguma novidade para mim, eu não era idiota, sabia fazer autoanálise. Sabia o quão deplorável era o meu estado após a morte dos meus pais, mas isso não queria dizer que eu iria aceitar numa boa Sakura jogando isso na minha cara. Por que diabos ela tinha que se meter em tudo?

- E daí?! – Vociferei, dessa vez não tentando amenizar o timbre alterado da minha voz.

Sakura quase pareceu sentir-se ofendida, e rebateu de imediato:

- E daí que você perde o seu futuro quando se apega ao passado! – Nunca que eu esperaria uma resposta como aquela. Aquilo, sim, era algo no qual eu nunca havia pensado a respeito.

Estaria eu realmente pondo meu futuro a perder por estar remoendo o meu passado? Sakura disse que eu me cegava e acabava por não aproveitar o presente e, inevitavelmente, desperdiçava o meu futuro por isso.

Meu presente... conseguia pensar nele com tantos outros nomes, tantos sinônimos, e sabia que era isso que Sakura queria que eu pensasse e, principalmente, em quem.

Todavia, antes de me sensibilizar com pensamentos inúteis sobre minhas relações interpessoais, tinha que terminar o papo-amigável-construtivo-pseudo-profissional com a garota irritante ali e voltar ao meu ponto: por que ela se achava no direito de se intrometer nesses assuntos que não eram de sua incumbência?

- Mas por que você tem que se meter nessas coisas? Nada disso é da sua conta.

Dessa vez, Sakura não se importou em me lançar um olhar ofendido.

- Mas claro que é da minha conta!

- Ah, sim! – Exclamei com o mais puro sarcasmo. Como eu queria que semancol fosse algo transmissível! – E por que você acha isso?

- Porque eu te amo! Eu me importo com você, por isso não posso ficar apenas parada e te ver acabando consigo mesmo, isso me dói muito. – Os olhos dela me imploravam por misericórdia, como se ela estivesse desesperada para me fazer entendê-la.

Aquela declaração me pegou de jeito, e hesitei. Não que eu não soubesse dos sentimentos de Sakura por mim, mas ouvir tais palavras da boca dela me desconcertava de uma forma que eu ficaria muito feliz em levar para minha cova, bem longe do conhecimento de qualquer um. Além disso, como assim ela era afetada pelo que eu fazia ou deixava de fazer em relação a mim mesmo? Aquilo soou tão estranho para os meus ouvidos que nem sabia o que pensar.

Seria isso o amor que ela nutria? Empatia, compartilhar sentimentos? Do tipo “se você ficar triste eu também fico e se você ficar feliz eu também fico”? Não podia ser essa a definição de amar, de jeito algum, porque eu... eu sentia essa mesma “empatia” pela Sakura. Eu me sentia bem e reconfortado quando ela estava feliz, e ficava inquieto quando ela não estava. Era tão absurdo pensar até mesmo naquela possibilidade; eu não gostava de Sakura do modo que ela gostava de mim, claro que não.

Tal pensamento somado àquele reboliço de sentimentos estranhos e contraditórios causados pelo que Sakura falava – principalmente a última parte, que me fez sentir como um impotente necessitado de ajuda – resultou em um golpe doloroso no meu orgulho. Trinquei os dentes e deslizei o olhar de Sakura para o chão, tentando barrar aquelas sensações perigosas que borbulhavam dentro de mim.

- ... Então não olhe. – A voz saiu muito mais fraca e com menos firmeza do que eu queria, talvez delatando o que eu realmente sentia naquele instante.

E foi a vez de Sakura trincar os dentes, pude ver isso na forma que a mandíbula e os lábios dela se contraíram. Ela estava possessa.

- Mas que droga, Sasuke! Por que você tem que ser tão cabeça dura?! – Se, em algum momento, tive alguma sombra de dúvida sobre o estado de espírito de Sakura após minhas últimas palavras, a réplica dela a desfez de imediato. Os vocábulos mais duros, nada comuns no repertório linguístico de Sakura, e a ausência do sufixo ao pronunciar meu nome eram a maior prova de que eu a estava levando ao seu limite; e isso me espantou a ponto de perder o resto da postura de ataque e mudar totalmente para defensiva. – Eu entendo que é doloroso tudo isso que você passou e tem passado, mas precisa superar isso! Sei que seus pais eram importantes para você, mas você tem se esquecido muito facilmente que ainda tem o seu irmão, seus amigos... e a mim também. – Ela foi amansando a fala no final, voltando para sua expressão piedosa de outrora. – Nós estamos aqui, não ignore isso. Você não está sozinho e nunca esteve.

Mais uma vez, as falas de Sakura foram um baque em mim. Ter falado diretamente de Itachi, de todos que me rodeavam, me retomou o raciocínio sobre o que se definia sobre o meu “presente”.

Meu presente era o que restou para mim desde aquele noite funesta, meu presente era Itachi, o que sobrou da minha família. Não que Itachi fosse “resto”, ele nunca foi, ele era meu único irmão, o meu “parceiro no crime”, quem sempre foi capaz de me decifrar como um livro aberto. Mas depois da tragédia, depois de ter que aceitar o fardo de ser o culpado da morte dos próprios pais, como eu encararia o Itachi? Não fui apenas eu quem ficou órfão, ele também. Como eu, ele devia me culpar por tudo que aconteceu, e tudo o que aquela desventura acarretou.

Afinal, quem ficou com toda a parte burocrática foi Itachi, e aposto que foi ele quem segurou a barra com a mídia, que se sentiu fortemente atraída pelo sequestro seguido de morte dos principais gestores da empresa em ascensão Fan’s Eletronic e a praticamente milagrosa sobrevivência do caçula deles. Pensando bem, eu podia estar sofrendo um inferno após ter acordado do coma e ficado preso em um leito em recuperação por longas semanas, mas Itachi também sofreu. Enquanto os meus demônios estavam na minha consciência – salvo os policiais e peritos, que me visitavam para tentar coletar informações, e médicos e enfermeiros demasiadamente curiosos sobre “o menino que estava na tevê” –, os de Itachi estavam em todo o resto: desde sócios que suspeitaram do sequestro e temeram da possibilidade daquilo ter alguma ligação com os negócios da empresa, até repórteres sensacionalistas que visavam nada além de lucro à custa de desgraças alheias. Quem dera que a única preocupação dele fosse a providência da cerimônia fúnebre...

Mas não eram apenas papeladas e pessoas inconsequentes que tomavam Itachi. Havia a faculdade também, óbvio. Por sorte (ou não), o período estava para acabar e seria algo a menos para se preocupar. Ouvi uma vez duas enfermeiras do período da manhã falando sobre Itachi (mais tietes para o fã clube dele). Elas comentavam sobre não o verem no turno delas durante uma semana inteira, poucos dias após eu ter sido internado. Foi aí que o final do período o influenciou: quando as férias estavam para chegar, vinham as provas finais de brinde. Era fácil deduzir que, com exceção daquela semana de ausência, Itachi matou aula para ficar no hospital junto ao meu corpo inerte, mas foi obrigado a ir à faculdade durante a semana de provas para não pôr a perder um semestre inteiro – juntamente com o seu boletim impecável. Nem consigo imaginar como seria prestar exames em meio a um problema pessoal desta magnitude...

Era doloroso pensar no que Itachi passou e me deixou à parte para não piorar o meu estado, no que ele teve que suportar sozinho, pois o irmãozinho estava, mesmo depois de sair de seu estado vegetativo, inutilizado e abalado demais num hospital, mal trocando palavras com ele após ter sido posto a par dos acontecimentos que o levaram para lá.

É, tudo e todos foram muito duros com Itachi injustamente, e eu deveria tentar ser mais afável com ele, mesmo que o próprio me culpasse por tudo que nos aconteceu, eu iria usar a mesma “política de bom comportamento” que estava aplicando à Sakura (ou tentando, ela parecia gostar de dificultar as coisas). De alguma forma, daria menos trabalho e preocupação a ele e, assim, quem sabe, um dia meu irmão ainda possa me perdoar.

Mas claro, a situação dele teria sido muito melhor se os resultados tivessem sido inversos: se meus pais, pilares da nossa família e da empresa tivessem sobrevivido e eu morrido. Após tudo aquilo, eu me tornei em nada senão um peso morto, um fardo pesado que Itachi era obrigado a carregar em suas costas em meio a tantas complicações causadas pela falta de nossos progenitores.

Meus pais eram importantes, tinham relevância no meio em que estavam. Eu era um inútil, que não tinha capacidade nem de guiar a polícia para seus assassinos, que estavam ainda à solta graças a mim. Eu não merecia continuar vivo, mas meus pais, sim. Sakura, sim.

Os pensamentos de mais cedo sobre Sakura também voltaram à minha mente, numa forma de aumentar o meu martírio. Sakura era uma pessoa maravilhosa, mantinha o alto-astral mesmo naquelas circunstâncias excruciantes e anormais. Mesmo já estando morta, ela fazia a diferença. Quantas vezes já me trouxera algum sentimento positivo com a sua presença e seu jeito de ser, quantas vezes já me tirara de situações de risco... Ah, Sakura... Não sabe o quanto seu dom é desperdiçado com uma pessoa como eu.

- Tudo isso é muito injusto! Por que logo você tinha que estar morta e... – Mordi forte a língua para me parar, logo que notei que estava externando pensamentos que não deveriam ser compartilhados. Mas que droga! Estava tão desestabilizado que até disse o que não queria. Eu nunca agia impulsivamente, o que estava acontecendo comigo?

- “E” o quê? – Sakura indagou firme. Ela usava nuanças que eu nunca escutei dela, e isso apenas me encurralava mais. Desviei o olhar evasivamente dela mais uma vez

- Esquece.

- Fale! – Seu tom foi como o da autoridade de uma mãe; estremeci com aquilo e cedi prontamente, amargurado por ser controlado tão facilmente pelas palavras de Sakura.

- ... e eu estar vivo.

O aspecto de Sakura alterou-se de imediato, e me encolhi involuntariamente, sentindo-me uma criança prestes a levar a maior bronca de sua vida diante daquela nova figura de Sakura: inabalável, dominativa e irrefutável.

- Você nunca mais diga isso! – Ela ralhou, quase gritando. – Você sequer pense nisso!

Abaixei a cabeça, envergonhado demais para me atrever a respondê-la e até mesmo fitá-la. Nunca, nunca que eu deveria expor aqueles minhas idéias para alguém! Como isso era humilhante! Não conseguia nem decidir se aquilo era menos pior pelo fato de ter acontecido com Sakura, já que qualquer segredo que chegasse ao seu conhecimento iria com ela para a cova – mesmo que isso soe irônico –, ou se era pior por ela não se sentir intimidada em me confrontar sempre que achar necessário.

Mas o fato era que isso só aconteceu porque era justamente com Sakura. Só ela conseguia esse efeito em mim, me desestabilizar a ponto de me tirar até mesmo meus questionamentos mais íntimos; nem Itachi, nem Naruto, nem mais ninguém, esse era um feito exclusivo que aquela garota de cabelos róseos tinha sobre mim.

E como isso doía no meu orgulho! Estava tão machucado que nem tinha forças para rebater Sakura para restabelecê-lo ao menos um pouco e isso era muito estranho. Porque eu nunca ficava na defensiva, sempre que sentia que estava para ser acuado, atacava de forma mais... energética, e saía, ao menos, com o ego preservado, mesmo que perdesse – como era no caso das discussões com Itachi –, mas jamais ficava daquele jeito vexaminoso!

Não sabia dizer por quanto tempo fiquei calado, olhando para baixo enquanto o silêncio incômodo se instalou entre nós dois. Sakura devia esperar uma resposta minha, talvez algo mais hostil de minha parte, mas ao ver que eu permaneceria manso e acanhado, relaxou sua postura e suavizou suas expressões; ao menos foi o que pude constar com minha visão periférica.

- Não notou? – Ela questionou desta vez num tom terno, tentando uma nova abordagem diante da nova perspectiva de comportamento.

Aquele novo tratamento somado à curiosidade causada por aquela pergunta me deu coragem para encará-la novamente.

- O quê? – Perguntei um pouco além de um sussurro.

- O quanto você já ajudou outras pessoas. – A primeira frase abriu portas para uma avalanche de confusão e incredulidade. – Lembre-se daquela garotinha no parque, esse cachorrinho que você não deixou para trás, o Naruto que você protegeu. Ah, e não se esqueça de mim! – Sakura andou dois passos suavemente em minha direção, podendo, assim, nós dois vermos os traços um do outro detalhadamente e nos interpretarmos sem erro. Sem dúvida, ela estava sendo totalmente franca naquelas palavras. – Sasuke-kun, mesmo sabendo o que me prende aqui e até mesmo antes de descobrir isso, você não me rejeitou, continua me fazendo companhia todo santo dia. Se eu tivesse ficado sozinha naquele hospital e você não tivesse voltado para me ver como prometido, eu teria enlouquecido! Se eu consigo ser feliz mesmo nesse estado, é graças a você.

Ouvir o que poderia ter acontecido à Sakura e sua sanidade me fez sentir uma particular dor no peito, mas essa sensação veio estranhamente acompanhada por um sentimento se esperança.

Então eu não servi apenas para auxiliá-la na recuperação de sua memória e descobrir por que ela ainda não apertou a mão de Buda? (O que se provou inútil, no final das contas. Afinal, minha vida era o que prendia a alma dela aqui e ela só poderia partir para o estágio seguinte da morte se eu morresse.) Tal como Sakura tinha seu efeito sobre mim, eu também a influenciava? E positivamente? Eu?

Não é como se eu tivesse ajudado todas aquelas pessoas citadas por Sakura – inclusive a mesma – por compaixão, tudo que fiz foi por impulso, meu corpo se movia sozinho. Não havia nenhum mérito nisso. E mesmo tendo feito aquelas boas ações, elas não eram nada comparadas ao que Sakura seria capaz se ela estivesse viva! Ela ajudaria muito mais pessoas, salvaria muito mais, seria importante, fundamental para um número incontável de vidas. E tudo isso porque ela queria, muito diferente de mim.

- Mas... – Sakura me interrompeu antes que conseguisse formar mais palavras recheadas de dúvida e remorso.

- Se o problema ainda é eu estar morta, também não se preocupe com isso. – Aquela singela frase me fez desistir imediatamente de todo o discurso que havia planejado para aquele instante. Acaso ela estava lendo minha mente através de meus olhos? – Já cuido de um paciente muito importante.

Ora, ela estava brincando comigo? Era claro que ela não tinha ninguém sob seus cuidados. Infelizmente, ela não, podia...

- Um paciente? Como...

E, mais uma vez, Sakura não me permitiu externar minha dúvidas que, aparentemente, para ela, possuíam as respostas mais simples do mundo.

- É você. – Ela falou, triunfante, porém com um sorriso apaziguador nos lábios.

Sabia que não se relacionava só ao lado físico, não eram só àqueles machucados nas minhas costas ou até mesmo o remédio feito para Naruto, era muito mais que isso. Era à minha alma, tão machucada e abalada, que Sakura se referia.

- Sasuke-kun, irei dizer mais uma vez: eu já estou morta, meu tempo já passou, mas o seu, não. Se isso te incomoda, então viva por mim, viva por nós dois. Faça valer à pena.

Eu reconhecia aquele pedido, Sakura já o havia feito alguns dias antes quando, subliminarmente, se declarou para mim ao presenciar um desequilíbrio emocional meu. Mas por que ela estava insistindo com isso mais uma vez? Não entendia como ela poderia me considerar para tal tarefa. Além de ser a última pessoa indicada para isso, mal a compreendia! No que ela estava pensando? Se eu topasse com aquilo, falharia miseravelmente e, ainda por cima, tornaria a “vida de Sakura” tão medíocre quanto a minha.

Não percebe, Sakura? Eu poderia te afundar junto comigo.

Porém, se Sakura continuasse junto a mim, me mudando tanto quanto estava até o momento, poderia tomar seu legado para mim. Desejava fortemente dentro de mim que ela fosse paciente e persistisse, talvez um dia essa luz dela consiga iluminar toda a escuridão que me consome e me salvar desse abismo sem fim. Conseguia sentir esperança quando pensava em Sakura continuar a caminha comigo. Podia parecer egoísta esse pensamento, mas preferia imaginar que isso era apenas o início da reciprocidade na necessidade de companhia um do outro. Sakura havia se tornado essencial para mim, e isso, eu também não conseguia mais negar.

Vou me esforçar para poder aceitar o seu pedido... Prometo.

Antes que eu formulasse qualquer resposta para dar a Sakura oralmente (uma resposta muito diferente daqueles meus pensamentos, é claro. Aquela decisão me aqueceu por dentro com o sentimento de determinação, e meu orgulho se reergueu com o novo ânimo.), Naruto apareceu esgueirando-se por entre os corredores de caixas, segurando uma sacola plástica transparente, pude ver as características caixas de obento empilhadas com alguns pacotes pequenos por cima e senti meu estômago contorcer-se com a expectativa de finalmente se saciar.

- Comprei seus onigiris com okaka e escolhi o com salmão. Espero que seja do gosto da madame, porque esse era o último, tive que correr na frente de uma velhinha pra pegar pra você. Você e seu gosto de velho me devem uma. – Naruto foi falando cinicamente enquanto olhava para a sacola erguida. Eu já abria a boca para retribuir a pequena afronta, quando Naruto direcionou seu olhar para mim e notou as chapas de madeira separadas ao meu lado e voltou a falar antes que eu soltasse um “A”, como sempre sendo o melhor na arte da fala. – Pra que essas madeiras?

Resolvi desistir de mais uma discussão vazia repleta de implicâncias motivadas pelo simples prazer de importunação alheia e respondi sua pergunta:

- Pra fazer uma casinha térmica pro cachorro.

- Ah, verdade, ele vai precisar. Eu te ajudo. – Ele falou com boa vontade e voltou a andar para mais perto de mim, mas parou ao pensar em algo e olhar para a sacola envolta por seus dedos. – Quer comer antes ou depois da gente pôr a mão na massa?

Considerei as possibilidades. Seria bom comer logo antes que meu corpo resolvesse dar mais um sinal de que estava ficando fraco. Após eu notar que estava há tanto tempo sem me alimentar, meu cérebro – que tinha um senso de humor negro aparentemente muito grande – começou a agir praticamente como um auto-sabotador e passei a sentir os sintomas de um corpo sem muita subsistência, por isso minhas mãos já tremiam levemente no momento em que conversava com Naruto.

Certo, que começássemos pela prioridade.

- Vamos fazer as coisas pro cachorro primeiro, podemos nos ajeitar para comer depois, se não der tempo até a aula começar.

- Sasuke-kun... – Sakura falou repreensiva ao lado de Naruto. Ela devia ter notado que eu estava há um tempo sem me alimentar, apesar de não saber que era tanto tempo assim. Se soubesse, ela estaria me gritando ordens até que eu cedesse.

- Certo. – Naruto disse, levado a sacola que carregava para uma das estantes e passando por dentro de Sakura no processo, alheio à sua presença ali. – Vamos trabalhar.

Mesmo machucado e com certos movimentos limitados, Naruto se provou um bom auxílio. Ele levava jeito com trabalhos manuais desse porte, e não foi preciso muitos minutos para que montássemos um caixote térmico eficiente com chapas de madeira, folhas de isopor, papelão e Silver Tape para manter tudo junto e resistente para ajudar a manter uma temperatura boa para o filhote. Colocamos um pedaço da cortina de veludo do Café por dentro para garantir que ele ficaria quente e confortável. Deixamos o pote com água dentro dele para que ela não congelasse caso esfriasse mais.

Para a ração, montamos uma bugiganga simples inspirada em comedor automático usando os acessórios recém-utilizados do Café: apenas uma garrafa, que enchemos com a ração e viramos de cabeça para baixo em cima de uma bandeja. A gravidade faria todo o serviço de repor a comida para o cachorro à medida que ele fosse comendo. Mais prático, impossível.

Graças ao reforço de Naruto, acabamos tudo a tempo para nosso desjejum. Se eu estivesse sozinho, certamente demoraria o dobro do tempo e ficaria sem comer mais uma vez – e possivelmente desfaleceria em algum momento, a julgar pela fraqueza de meus dedos, que mal conseguiam abrir a embalagem do obento. Dificuldade essa muito bem disfarçada, para dizer a verdade. Naruto estava muito concentrado em sua própria comida e Sakura enojada demais pelo modo impudico que ele desfrutava de seu café da manhã.

- O cachorrinho come de forma mais educada que o Naruto... – Ela soltou enquanto torcia o nariz sem desgrudar os olhos do garoto que continuava a comer sem tomar conhecimento daquela ponderação. – Olhando assim, parece até uma raposa faminta.

Tentei, juro que tentei segurar o riso quando ele brotou no fundo da minha garganta, mas aquele comentário foi demais para mim; Naruto realmente lembrava uma raposa, e em vários aspectos! Só consegui me segurar quando senti que estava para me engasgar com o arroz que mastigava, mas já tinha chamado a atenção do cara-de-raposa para mim e... Droga, eu vou rir de novo...!

- Que foi? – Naruto perguntou com a cara mais lesada do mundo, exclusividade dele.

Pigarreei, tentando conter os impulsos dos risos que ainda queriam estourar da minha boca.

- Nada, não. – E consegui diminuir a risada para um sorriso, que foi direcionado a Naruto juntamente com a minha resposta.

Se ele pretendia me contestar, suas intenções caíram por água abaixo com aquele meu singelo gesto. Sua expressão ficou ainda mais boba – se isso era possível – e depois ele sorriu também, porém à sua maneira, de forma mais branda, dando-me um empurrão de brincadeira, que prontamente foi retribuído.

Que idiota feliz...

A comida foi consumida bem mais rápido que o normal, já que nós dois estávamos com fome, e por isso, quando terminamos de comer, ainda faltavam uns quinze minutos para a aula começar.

Carregamos nossas mais novas “invenções” para a sala de equipamentos esportivos abandonada ao lado, onde era o refúgio original escolhido por mim para o cachorro. Além do mais, uma sala pequena seria mais quente do que um galpão, era mesmo o melhor lugar ali disponível.

Após uma longa despedida e juras de retorno, Naruto finalmente desgrudou do animal e nos direcionamos para a parte coberta do pátio frontal da escola como se nada tivesse acontecido e ficamos ali esperando o resto do nosso grupo chegar e dar o horário para subir para nossa classe.

Não tardou nem dois minutos e um grupo conhecido passou pelo portão, adentrando o terreno escolar, mas não era o que esperávamos, mas, sim, o de Toya. Ele conversava com os outros despreocupadamente, esticando os lábios para as laterais.

Olhar para a cara sorridente daquele babaca me deixou com o sangue fervendo e estreitei os olhos, contrastando com a minha pose relaxada de antes. Como ele tinha a audácia de sorrir daquele jeito depois que...! Quase que imediatamente, comecei a dar as primeiras passadas pesadas para frente, na direção de Toya. Eu ia dizer umas boas verdades para aquele puto e tirar satisfações... depois que ele estivesse no chão com pelo menos metade do nariz afundado para dentro da cara e cuspindo os próprios dentes.

- Sasuke, não! – Senti a mão de Naruto segurar firme o meu braço, impedindo que eu continuasse a marchar rumo ao meu deleite.

Tentei amaciar minha expressão e o olhar, que devia estar em chamas, antes de virar a cabeça sobre o ombro para encarar Naruto. Não entendia o motivo de ele tentar me parar. Naruto podia estar acovardado, mas eu, não.

- Eu só quero conversar com ele. – Tentei explicar minhas intenções... ao menos, parte delas.

- Sei muito bem que tipo de “conversa” você ta a fim de ter. Tá louco? – Naruto às vezes parecia (apenas parecia) que não era tão tapado assim.

- Não ligo se for suspenso, vale o preço. – Virei-me para continuar a andar, mas senti a pegada em meu braço apertar e me puxar para trás. A voz de Naruto soou mais perto, mais baixa, urgente.

- Não estou falando disso, droga! Use essa cabeça de gênio aí para algo além de matéria! Você vai comprar briga com Toya e ser possivelmente suspenso, ok, mas e depois? Você acha que ele vai deixar por isso mesmo? Sem dúvida vai ser pior do que fizeram comigo.

A naturalidade beirando o conformismo naquelas palavras me fez abaixar o olhar para um ponto qualquer no chão e me limitar a apenas tremer de raiva e frustração. A atitude que estava para tomar era impulsiva e estúpida; mesmo que eu conseguisse acertar Toya, seria mais devido ao elemento surpresa, pois estava na desvantagem e, mesmo assim, ele e seu grupo revidariam depois e alegariam autodefesa. Além de me machucar por pura imbecilidade, ainda sofreria as conseguências perante as autoridades escolares e Toya sairia como vítima: os papéis se inverteriam, seria como dar um tiro no pé.

Mas, mesmo assim, ira inaceitável aquele canalha continuar impune e sorrindo daquele jeito superior depois de tantas atividades atrozes!

Senti meus dentes trincarem com aqueles sentimentos borbulhantes, quase conseguia ouvi-los ranger.

- ... Isso tem que acabar...! – O som saiu alterado pelos molares, que não se separaram nem para a fala, quase que gutural, e a frustração, tão evidente por isso, não passou despercebida por Naruto, que me respondeu mais complacente:

- Um dia vai, mas com certeza não será assim.

Vai acabar, mesmo!, não pude deixar de constatar em pensamento, afinal, a justiça podia tardar, mas não falhava. Eu não iria permitir que falhasse. O que era de Toya e dos amiguinhos dele estava guardado.

Já iria denunciá-los, de qualquer forma. E eu iria me conter enquanto isso – apesar de ser extremamente tentadora a idéia de sentir os ossos dele quebrando sob meus punhos -, afinal, o irracional que agia por impulso ali era Naruto, não é? Mas eu não estranhava o fato de ele ser quem agia como o sensato naquele momento, os Uchiha são movidos por instintos primitivos quando estão com os sentimentos à flor da pele. Estava no sangue, oras.

Já mais calmo, virei-me de volta para Naruto, pousando levemente a minha mão sobre a dele que ainda me detinha, tentando demonstrar que eu já não estava mais tomado pelo sentimento de vingança – ao menos, não no momento – e ele entendeu o recado, e finalmente largou o meu braço.

Naruto ainda me encarava sério, mas claro, ele não conseguiu manter o semblante por muito tempo. Quando ele constatou que eu não exibia mais nenhum traço de raiva ou qualquer emoção ou ímpeto negativo, curvou para cima a lateral de seus lábios num sorriso que transbordava confiança. E aquele pequeno movimento facial mudou minha certeza quanto a Naruto em relação a Toya: ele não estava com medo, afinal de contas.

Desta vez, não me contive, e imitei seu gesto. Iríamos ganhar essa guerra.

Mas não pudemos compartilhar aquele sentimento de convicção um com o outro por muito tempo, pois logo senti meu pescoço ser envolvido e puxado para baixo, fazendo com que eu me curvasse. E, por um breve momento, temi que estivesse sendo atacado por Toya, mas tal preocupação logo foi dissolvida quando ouvi a voz de Suigetsu estridente no meu ouvido:

- Chegaram mais cedo e nem avisaram, hein?! Ficamos igual uns idiotas esperando vocês dois na estação.

Sem me dar ao trabalho de responder (Naruto já tentava dar alguma desculpa a troncos e barrancos, e eu não estava nem um pouco a fim de ajudá-lo a encobrir um episódio como aquele. Que ele se virasse e fosse pego nas próprias mentiras.), calmamente retirei o braço de Suigetsu que enlaçava meu pescoço amigavelmente sem muito esforço, toda a atenção dele já estava voltada a Naruto. Passei os olhos pelo resto do grupo que chegava e formava uma roda conosco, até encontrar o meu alvo:

- Neji. – Chamei-o alto o suficiente para tomar sua atenção, mas não sobressaindo à conversa que se instalava ali para não ter atenção indesejada.

Quando Neji voltou seu olhar para mim, apontei com o queixo para trás da roda e, em seguida, caminhei para fora dela, apenas um pouco distante para se ter uma discussão privada. Ele entendeu o meu recado de que precisava conversar a sós e acompanhou meus passos, também saindo sem ser notado.

- O que foi? – Ele perguntou, aparentando um pouco mais curioso do que gostaria de demonstrar.

- Vou delatar a gangue do Toya para o diretor Mirose. – Fui direto, não conseguia mais enrolar com aquele assunto que eu tanto queria dar um final.

A expressão de Neji, mais uma vez, foi além de seu controle, e ele deixou sua máscara de calmaria cair e exibiu todo o pavor que aquela minha pequena fala podia lhe proporcionar.

- O quê?! Que idéia é essa? – Ele falou exaltado, e implorei com os olhos para que ele se apaziguasse (caso contrário, colocaria o interesse de todos os outros do grupo sobre nós), o que ele logo fez, retomando a compostura ao cruzar os braços e permanecendo calado, dando-me espaço para que me explicasse.

Pigarreei de leve enquanto pensava na forma mais sucinta de me esclarecer.

- Vou acabar com essa palhaçada e gostaria que você, como membro do Conselho Estudantil, fosse junto para me apoiar.

- Mas nem pensar! Isso não vai dar certo, não temos nada para comprovar que... – Já sabia de todo o longo e inútil discurso sobre as complicações de denunciar a gangue de Toya que estava por vir, então o interrompi com a revelação, que seria a parte decisiva naquela minha tentativa de persuasão:

- Naruto foi covardemente espancado pela gangue de Toya ontem.

Se não estivesse levando aquilo tão a sério, até me vangloriaria pela reação que causei no mais exímio membro do ginasial no Conselho Estudantil: pude notar que seu corpo ficou paralisado quando prendeu a respiração, seus olhos se arregalaram de uma maneira nunca vista antes. Ficou bem claro para mim que aquilo era um – senão o maior – de seus piores medos, e que tinha acabado de se concretizar.

- ... Quê? – A voz de Neji saiu fraca, ele ainda estava abalado pela notícia nada boa. Era minha chance de convencê-lo.

- E sabe por quê? Porque ele fez o Toya passar vergonha em público no dia do Festival de Inverno. Entende que se não fizermos nada quanto a isso, se apenas ficarmos na defensiva formando esses “grupos de resistência”, Toya se sentirá cada vez mais confiante e vai ser cada vez mais ousado? Ele deve ser detido o mais rápido possível.

Neji continuava estático, salvo seus olhos, que corriam rapidamente de um lado para o outro enquanto ainda processava tudo aquilo em sua cabeça, até erguer um olhar descrente para mim, e sua resposta apenas me fez revirar os olhos, farto de todo aquele medo desmedido em tomar uma atitude.

- ... mas e as provas?

- O corpo machucado do Naruto é o nosso trunfo. – Tornei a esclarecer pacientemente o restante. – Mesmo que você não tope, eu vou arranjar outra pessoa para dar apoio. – E cruzei os braços tal como ele, tentando provar o quanto estava sério quanto àquilo. – Mas eu queria que fosse você, que tem mais moral para isso. As chances de sucesso seriam maiores; é com você.

Neji ficou em silêncio por um tempo considerável, provavelmente ponderando os prós e os contras naquele novo quadro. Tinha absoluta certeza que a pressão da minha decisão de tomar a dianteira e a nova perspectiva da situação com Toya estar para se agravar pesariam para o lado que eu desejava. Ele relaxou o corpo pela primeira vez após saber o que foi feito a Naruto, e quando seus olhos voltaram a focar nos meus, fiquei satisfeito ao ver firmeza neles – apesar de misturada com um pouco de receio, já era o suficiente.

- Espero que saiba o que está fazendo, Uchiha.

E não pude deixar de estampar um sorriso prepotente naquela hora:

- Nunca tive tanta certeza de algo na minha vida.


Continua...


Notas Finais


Ah, alguém mais por dentro do que tem acontecido no site do que eu pode me dizer o que raios fizeram com a Galeria? As fotos de uns cosplays meus estavam lá ;A;


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