Mira
Meus dias eram até que mais agitados do que eu havia imaginado. Ajudar o velho era uma tarefa árdua e complicada. Ele era exigente, muito exigente. Eu acabei conhecendo grande parte do bairro por causa de suas tarefas. Leva isso ali. Traga aquilo. Era só o que eu ouvia o dia inteiro.
Era fim de tarde. Eu olhava para o relógio, aguardando a chegada de todos. Suni e Meelo foram os primeiros a chegar, eles discutiam alguma coisa a respeito de uma criança. Sina chegou logo depois. Muito mais exausto do que qualquer um. Ele estava se empenhando no trabalho, o ruim era pensar que ele fazia isso para tentar esquecer do que havia ocorrido com Hina.
Eu estava ansiosamente esperando Riku. Nós ainda não havíamos começado a treinar, e apesar das desculpas dele, hoje eu não deixaria passar.
Só que ele estava demorando muito.
— Que horas mesmo que o Riku volta? – Eu perguntei para Sina.
— Por volta às 18h. Um pouco antes do sol se por.
E eu fiquei impaciente.
Suni até se ofereceu para treinar comigo já que Riku estava demorando tanto.
Quando a impaciência mudou para preocupação. Eram mais de 20 horas. Sina andava de um lado para o outro.
— Ele não cumpriu o combinado. Eu tinha avisado para ele.
Isso me deixou apreensiva. Não é que eu não confie nele, mas dependendo da situação ele mesmo não consegue se controlar.
— Ele deve estar bem. Você sabe como é a situação das ruas nessa cidade? – Suni disse amenizando a situação.
Eu suspirei. Não quero ficar pensando no pior.
O velho vendo toda aquela situação. Interveio.
— Ikir é meio lerdo mesmo. Deve ter colocado o menino para fazer toda a burocracia daquela espelunca.
O que ele disse me deixou tão apreensiva quanto antes. E se ele surtou por causa disso?
A maçaneta se mexeu perto às 23 horas. Somente Sina e eu estávamos acordados.
— Riku? – Eu chamei.
Quando ele apareceu. Eu fiquei chocada. Seu cabelo estava bagunçado. Havia um enorme hematoma entre seu olho e sua bochecha, sem contar os roxos por todo o seu braço.
— Eu esperava que todos estivessem dormindo. – Ele falou despreocupado.
Sina se aproximou dele. Seus olhos eram um misto de raiva e preocupação. O pegou pelo colarinho e o prensou contra a porta.
— O que você fez? – Ele disse quase gritando.
— Difícil de acreditar que eu estou assim por que eu não fiz nada? -- Riku disse.
Sina pensou um pouco e o soltou. Fazia sentido. Ele não sairia ferido de uma batalha a menos que quisesse.
Dessa vez fui eu que o cercou.
— O que você quis dizer com isso? Quem te bateu? Que porcaria aconteceu com você?
Ele desamassou o colarinho e sorriu.
— E vocês me chamam de esquentado?
Com toda a confusão, os outros acordaram.
— Você está todo quebrado! – Suni disse o óbvio quando o viu.
Meelo tentou acalmar nossos nervos. Ele pegou um pouco de água para tentar ajudar Riku.
— Tome. Tente esfriar e coloque no rosto dele. – Ele me disse me entregando.
Eu não sabia o que fazer.
Meelo suspirou.
— Congele. Você não aprendeu nada nas aulas de cura?
Ah sim. Às vezes eu esquecia que a dobra servia para outras coisas além de lutar.
Eu toquei a água no copo que ele havia trago. Era estranho dobrar a água agora. Era inconsistente, vazia.
Pedi para que o Riku ficasse na minha frente. Eu encarei seus olhos claros. Eu não sabia o que ele estava pensando. Meu rosto esquentou e eu tentei me concentrar no que eu estava fazendo.
Eu toquei o seu ferimento com a mão envolvida pela água. Seu rosto estava quente. Eu quase podia sentir a sua respiração. Ele não disse nada. Apenas esperou. Meu corpo esfriou por alguns segundos e a água entre nos dois também.
— O que aconteceu? – Eu perguntei com calma.
— Eu me segurei, e aguentei. Ninguém sabe que sou um dobrador. Não precisam se preocupar.
Isso deveria me dar alívio. Mas, eu fiquei mais brava.
— E quem fez isso com você?
— Uns fracotes idiotas. Bandidos de um lugar ai.
— Se por acaso você encontra-los de novo. Eu não quero que se segure.
Ele sorriu.
— E você quer que todo mundo saiba aonde estamos?
Me emburrei.
— Então eu baterei neles.
Ele parecia se divertir com toda aquela situação. Isso era típico dele. Eu continuei com a minha mão em seu rosto, até que senti seu rosto desinchar. Ele não parava de me encarar. Mas, eu não podia culpa-lo.
Quando eu estava prester a tirar minha mão do seu rosto. Ele a segurou.
— Espere.
Ele levou a minha mão a sua testa.
— Você machucou a cabeça? – Eu perguntei.
Ele apenas acenou positivamente.
Ele fechou os olhos e parou de me encarar. Um semblante de alivio tomou conta do seu rosto.
— Obrigada. – Ele disse de olhos ainda fechados.
E eu nunca imaginei que esse Riku fosse capaz de agradecer. Meu rosto que já estava quente, ficou pior ainda.
Eu tirei a minha mão abruptamente. Meu coração estava acelerado, e minha barriga dava voltas. Eu senti vergonha em olhar para ele, por isso eu fui para o quarto antes que ele falasse qualquer coisa.
Respirei fundo e contei até 10 algumas vezes. O que estava acontecendo comigo?
Suni havia vindo atrás de mim. Ela estava com um sorriso suspeito no rosto.
— O que foi? – Eu perguntei nervosa.
— Nada. Apenas estou confirmando umas teorias.
— Que teorias?
Ela riu.
— Meelo disse para eu não me envolver. Eu posso atrapalhar as coisas.
Eu apertei meus olhos e olhei em sua direção.
— É melhor você me contar.
— Se não? – Ela me completou.
Eu fui até ela e usei meu ataque secreto.
— Cócegas! – Eu gritei.
E antes que ela pudesse reagir eu já estava fazendo cócegas nela.
Suni ria estrondosamente.
— Para. Para. – Ela gritava de volta.
— Você vai me contar!
— Então eu terei que contra-atacar.
Ela sabia meus pontos fracos. Assim que ela tocou em baixo dos meus braços eu não consegui me segurar. Aquela sensação era engraçada e ruim ao mesmo tempo.
Nós duas rolamos no chão. E riamos como se não existissem outros problemas. A porta se abriu ocasionalmente e Meelo, Sina e Riku nos olhavam com curiosidade.
— O que foi? – Eu perguntei para eles
— Só queríamos saber o porquê da gritaria.
— Não é nada. – Nós duas respondemos.
Sorrimos uma para outra e nos levantamos do chão.
O velho que também havia acordado com a confusão nos deu uma bronca.
— Amanhã também é dia de trabalho! – Ele dizia com raiva.
E com isso nós fomos dormir.
Quando eu fechei os olhos. Eu me senti no meio de uma grande e raivosa tempestade. O mar estava agitado e violento. Eu vi o espirito do Rio Yue bay surgir no horizonte.
A forma transparente estava maestrando as ondas, que vinham com força e arrastavam tudo para o mar.
Só que ela aos poucos estava desaparecendo, e a tempestade ficando cada vez pior. Quando ele sumiu por completo, eu fui engolida por uma onda que me levou para o mar.
Eu acordei abruptamente. Senti minha cabeça molhada de suor.Me senti ofegante. Olhei para a pequena janela que existia no nosso quarto e não havia nenhuma fresta de luz tentando atravessá-la. Ainda era noite. Me levantei e fui até a cozinha beber um pouco de água.
Até que vi que não era só eu que estava desperta. Me dirigi até a sala e vi o velho olhando para fora.
— Uma grande tempestade está vindo. – Ele disse quando me percebeu.
Eu olhei pela janela e vi o clarão que se formava atrás das nuvens escuras.
O vento também estava diferente. Eu sentia que ele soprava sem rumo. Sem uma direção correta.
— Há muito tempo.—Ele começou a contar. – Nesse lugar, os espíritos da água, da terra, do ar e do fogo se reuniram. Eles queriam saber o que fazer com os humanos, que pouco a pouco estavam usando a dominação de elementos para destruir uns aos outros. Já existia o avatar naquela época. E ele foi o mediador dessa reunião. Porém álguem muito ruim e perverso descobriu, e tentou aprisionar os espíritos e matar o avatar. Dizem que foi um morador dessa cidade, dizem que a ilha inteira se reuniu para ajudá-lo . Só sei que as consequências desse ato repercurtem até hoje. Pelo menos e o que diz a lenda.
Eu fiquei pensativa com as suas palavras, assim pelo pouco que sei dos espíritos, eu sei que eles seriam capazes de condenar essa cidade a todos esses desastres.
— E por que essas pessoas ainda vivem aqui. Sabendo de tudo isso?
— Apesar de tudo aqui é o lar delas. Todos sempre acabam voltando. E como um imã que sempre nos trás de volta.
As nuvens negras estavam carregadas, eu sentia o vento começou a soprar mais forte.
Ouvimos uma forte batida na porta.
— Eles chegaram.
O velho pediu que eu abrisse. Eram os poucos empregados que trabalham para o velho e suas famílias. Eles ficariam aqui até a passagem da tempestade.
— E as outras pessoas? – Eu perguntei.
— Infelizmente minha casa é pequena, e essa cidade é grande. A grande maioria já está acostumada com tudo isso. Não se preocupe. Eles sabem o que fazer.
Eu tinha um mau pressentimento sobre tudo isso. Não era apenas o vento que me dizia, mas a terra, até ela parecia aflita.
— O que é tudo isso? – Suni disse sonolenta.- Ah, é a tempestade? Alguem me disse hoje que iria chover.
Quem dera fosse apenas chuva. OS raios eram o que mais me preocupava. Eles cortavam o céu e caiam na terra com violência. Eu podia sentir os tremores. No fim quase todos nós acordamos com a tempestade. Menos Riku é claro. Ele dormia profundamente.
— O dia dele foi cansativo. – Eu disse para Sina que tentava acordá-lo.
— E o meu não?
— Eu sei, mas deixe-o dormir. Por favor. – Eu supliquei a ele.
Enquanto estávamos discutindo por isso. Mais pessoas chegaram a casa vermelha.
— Precisamos do garoto e de toda a ajuda necessária. – Era o homem que havia nos trago aqui. E trabalhava com o Riku.
— Temos duas casas incendiadas, além das enchentes na parte baixa.
— Não existem bombeiros por aqui? – Meelo perguntou.
— Os que estão vivos estão ocupados. Porém eles não são suficientes.
O homem estava com as roupas úmidas, mas sujas de cinzas. OS olhos deles estavam fundos, e ele parecia muito cansado.
— Só preciso do garoto. Convocaram todas as forças públicas, e como queremos que saibam, ele faz parte dela.
Eu não havia percebido, mas Riku havia acordado. Ele estava na porta do quarto, com o rosto marcado por um mau-humor assustador.
Ele andou até o homem. E suspirou fundo.
— Vamos, logo. Eu quero voltar a dormir.
Com poucos minutos ele trocou de roupa. E sob o protesto barulhento de Sina, que não concordava nenhum pouco com isso. Ele estava pronto para sair.
— Espere. – Eu disse. – Eu posso ajudar! Me deixe ir também.
Todos olharam para mim como se eu fosse uma princesa indefesa.
— Nem pensar. – Meelo falou sem hesitar.
Eu o fuzilei com o olhar.
— Eu posso ajudar. Eu tenho que ir também.
Sina, riu um pouco.
— Pior do que o Riku ir sozinho, e ele ir com você.
Eu olhei para todos, fiz a minha melhor cara de cachorro abandonado.
— Olha, Mira, normalmente isso funciona comigo, mas até eu acho isso perigoso. – Suni falou.
— Riku?
Ele não disse nada. E de tudo foi o que mais doeu.
Pensando em tudo o que aconteceu comigo, de tudo que ainda está acontecendo, eu percebo que ninguém liga realmente para o que eu quero. Eu vim para esse lugar obrigada. Estou seguindo ordens, ou recebendo broncas desde que chegamos. Eu não sou tão maleável assim. A culpa ainda me persegue só que a cada dia eu percebo que eu estou aqui somente para ficar escondida, que toda aquela coisa de treinar está ficando em segundo plano. Tudo que remete ao Avatar está ficando.
— Ainda bem que ninguém aqui é meu Pai. – Digo indo para o meu quarto.
Suni é a única que me segue.
— O que você está fazendo?
— Não está vendo? Estou me arrumando para sair.
— Mas, já não foi decidido que você não vai?
Eu paro o que estou fazendo e olho para ela. Suni está visivelmente preocupada.
— Suni, não acho que ninguém aqui tem o direito de decidir. E além do mais, não posso deixar de ajudar alguém que precisa.
As imagens do desabamento do palácio presidencial não saiam da minha cabeça. Eu cavando, tentando encontrar sobreviventes... Encontrando a Hina.
Eu não podia deixar isso acontecer.
— Você está ajudando. Mira, não podemos ser descobertos. Nem pela União do fogo nem pelo Haru.
— Eu sei Suni, mas se eu me deixar limitar por isso, eu vou estar sempre do lado perdedor.
Terminei de me aprontar e sai.
Meelo e Sina pareciam mais abismados do que deveriam.
— Eu disse que eu vou. E ninguém vai me impedir. Sina você sabe muito mais do que ninguém o que eu estou sentindo.
Ele não disse nada apenas abaixou o olhar. Eu odiava ter que tocar nessa ferida que nós dois compartilhamos.
Meelo parecia impassível.
— Eu não vou dizer mais nada. Nem para você nem para ninguém. Vocês não me escutam nunca.
Assim antes dele continuar a falar, eu sai. Riku e o homem que veio busca-lo, já tinham ido. Olhei para o horizonte e vi um foco de fumaça distante. Sem dúvidas eles estariam lá.
Pingos grossos de água caiam sob a minha cabeça. Minha roupa estava encharcada e meu cabelo grudado no meu rosto. O vento soprava forte, por isso eu firmei os meus dois pés no chão.
Os prédios a minha volta se mexiam. Eles balançavam de um lado para o outro. Várias coisas voavam com o vento. Lixo, folhas e pedaços das construções. Me desviei de várias.
Olhei para os dois lados, não havia ninguém a vista. Sei que eu não deveria fazer isso, Meelo iria provavelmente me matar se soubesse.
Com as palmas das mãos eu espalmei o vento, fazendo com que a corrente de ar se invertesse. Com as mãos erguidas, eu fui seguindo o meu caminho.
Quando eu vi o primeiro sinal de vida, eu parei.
Quanto mais próxima eu estava do prédio incendiado, mas eu me sentia estranha. O cheiro de fumaça era intenso e a chuva que caia não parecia ser capaz de apaga-lo.
Vi várias pessoas em volta. Todos pareciam aflitos.
Era uma casa de três andares. Muito antiga. O fogo estava em todos os andares e as labaredas saiam pelas janelas e impossibilitava a saída ou entrada de qualquer um. Riku estava lá com uma porção de homens. Todos encaravam o lugar sem fazer nada.
Me aproximei e ele me viu.
— Você é teimosa.
Não só Riku, mas alguns dos homens que estavam com ele se viraram. A primeira coisa que eles notaram foram as minhas roupas, que apesar se estarem molhadas, ainda passavam a minha classe social. Eles me cumprimentaram.
— Senhorita. -- O mais jovem disse. – É melhor ir para um lugar seguro.
Eu o ignorei totalmente.
— Riku. Como eu posso ajudar?
Ele não parecia animado.
— Não há muito o que fazer. Eles não tem nenhum equipamento, e ninguém consegue entrar.
Eu podia ouvir pessoas pedindo por socorro, e aquilo era agoniante.
— Como assim? Temos que ajudar aquelas pessoas.
— Não há como.
— Como assim não há? Eu sou uma dobradora. Eu consigo.
— Fale baixo.
— Eu falar baixo?
Ele me puxou para longe das pessoas.
— Sabe eu não gosto de ser a voz da razão. Esse papel não é meu. Mas, você está estragando tudo o que fizemos.
Ele me irritou.
— Você me dizendo isso? O mundo está em caos mesmo.
Agora era ele que parecia irritado.
— Você sabe muito bem que se fosse por mim. Eu já teria derrubado essa porcaria de prédio, teria mandando aqueles idiotas para os ares. – Ele aponta para o grupo que estava com ele. – Mas, por sua causa, tudo por sua causa. Eu estou me esforçando. Calar aquela voz não é fácil. Não fazer nada é bem mais difícil para mim do que qualquer coisa.
Eu fiquei sem palavras, de todas as pessoas, a única que eu não esperava me dar um sermão era o Riku.
— Você tem razão. Só que a minha vida não pode ser mais importante do que a de ninguém. Por minha causa inúmeras pessoas morreram naquele incidente. Por minha causa.
— Alguém já te disse que você é muito dramática?
— Não, ninguém.
Ele sorri.
— Não tem outra forma. Então você vai ter que tomar isso como uma lição.
— Uma lição?
— Sim, da dobra de fogo. Eu sei que muita gente acha que somos imunes ao fogo e a temperaturas altas.
— E não são?
— Na realidade só somos imunes ao nosso próprio fogo. E resistimos bem a temperaturas altas.
Nos afastamos mais ainda e ele me mostra a sua mão, uma chama azul a envolve.
— O meu fogo é mais quente que os outros. Então eu irei cobrir todo o meu corpo com as minhas chamas não importa a temperatura que esteja lá dentro, eu vou conseguir sobreviver ao calor. Só que existe um grande porém.
— Qual?
— Fogo consome oxigênio, assim eu terei que prender a respiração enquanto eu faço isso.
Eu fiquei realmente preocupada.
— Quanto tempo?
— Eu consigo 4 minutos em média. Acho que será suficiente para pelo menos dispersar o fogo da entrada e tirar todo mundo do primeiro andar.
— Você já fez alguma coisa parecida antes?
Ele virou a cabeça de lado e sorriu.
— Digamos que sim. Mas, não era para salvar pessoas. Pelo contrário.
Um arrepio subiu pela minha coluna.
— As vezes eu esqueço quem você é.
— Não se preocupe, eu sempre te lembrarei...
E nós fomos para próximo a porta. O calor era quase insuportável, e chuva que caia não conseguia amenizar nada.
— O que você está fazendo? – Um homem careca perguntou para Riku.
— Eu vou salvar o dia
Antes que qualquer pessoa conseguisse impedir ele saltou para o meio do fogo.
— Ikir vai nos matar. – Alguém disse preocupado.
— Quatro minutos. – Eu preciso ficar concentrada no tempo.
Olhei para o careca.
— Me empresta o seu relógio.
Ele negou.
— Eu preciso do seu relógio. – Fiz a minha melhor voz de menina rica. Tentei imitar a Suki.
Ele me entregou.
— Não demore.
— Não se preocupe, só vou precisar por quatro minutos.
Naquele momentou começou minha agonia. Se ele desmaiar? Se algo desabar por cima dele? Eu pensava o pior. O que é que eu fiz? Por que eu tive que vir?
— 3 minutos. – Eu disse em voz alta. – Faltam 3 minutos.
Claro que eles não me deixariam vir sozinha. Não demorou para Sina, Meelo e Suni virem atrás de nós.
— Cadê o Riku? – Eles me perguntaram.
— 2 minutos. – Eu respondi.
Sina finalmente percebeu o que havia acontecido.
— A quanto tempo ele está lá? – Ele me perguntou.
— Há 3 minutos. – Eu respondi ainda concentrada no relógio.
— 3? Então ele já deve estar voltando. Ele nunca conseguiu prender a respiração por mais tempo.
Eu olhei para ele.
— Riku já está lá a quase quatro.
— Não. Ele não consegue segurar por tanto tempo. A dobra de fogo cobra oxigênio do seu próprio corpo, ele nunca conseguiria ficar por mais de três, é suicídio.
Aquela sensação de impotência e de culpa se intensifica. Eu preciso salvá-lo. Eu começo a sentir aquele calor familiar, aquela luz ofuscante quer tomar o meu corpo.
— Mira.
Eu ouço alguém chamar ao longe.
O primeiro tremor de terra é uma previsão do que está prestes acontecer.
NInguém aqui tem força para me parar. Eu aponto a minha mão para a casa e sinto suas paredes de pedra, sinto o chão cedendo pouco a pouco, e sinto pessoas andando devagar em direção a saída.
Isso me acalma.
Chamas azuis explodem contra a porta, e finalmente algumas pessoas conseguem sair.
Um homem carregando uma mulher no colo, duas crianças com tecidos em suas bocas. Mas, e o Riku?
O relógio já marcou quatro minutos há algum tempo. Só que ele não voltou.
Eu não sinto mais ninguém naquele lugar. Pelo menos ninguém vivo.
Eu caio de joelhos no chão.
É culpa minha. Sempre é culpa minha.
— Riku! – Eu grito em direção a casa.
Meus pés ficam levemente mais altos que o chão.
— Se concentre Mira, não deixe que isso tome a sua consciência. – É a voz do Meelo.
Ele sempre tem razão. Eu deveria escutá-lo mais vezes, porém eu sou uma idiota.
Vou em direção a casa. O calor dela é intenso, mas não chega perto do que eu sinto dentro do meu peito. Não se compara ao calor que eu estou tentando conter. Eu aponto minhas mãos e faço a água da chuva se acumular acima de nós.
Eles descobrem que eu sou uma dobradora quando eu controlo a água. Quando eu a dobro para dentro das janelas e faço com que o fogo se acabe. E eles descobrem que eu sou o Avatar quando eu disperso a fumaça fazendo com que o ar a leve cada vez mais para cima.
Meus amigos me olham com receio. Porém imediatamente depois disso eles começam a me ajudar.
Suni vasculha os escombros, afastando as paredes e vigas, Meelo tenta limpar o espaço e Sina tenta acalmar os nervos daqueles que nos observam.
Nenhum deles parece nos julgar. Eles parecem supresos, porém vejo olhares de agradecimento.
Mas, isso não importa naquele momento. Riku, e o único que permeia meus pensamentos.
Com o fogo apagado. Eu passo entre os escombros.
Não há sinal de nada.
Sina, conversava com as pessoas que os Riku resgatou.
— Nós estávamos presos em um dos quartos no térreo. E um garoto apareceu. Vi pelas roupas que ele era da policia. E isso me aliviou. Ele tentou achar uma saída, porém não havia uma.
O homem recuperou o fôlego. Ele aparentava estar bem, mas sua respiração estava ruim.
— Foi como mágica. O fogo começou a nos evitar. Era como se estivéssemos envolvidos por um cobertor. Quando passamos pela sala de entrada. Ele finalmente falou conosco e perguntou se não havia mais ninguém naquele lugar. Eu respondi que não, mas a minha filha pediu pelo bichinho. Pelo seu Gatilo. Depois disso a porta explodiu e ele voltou para o meio do fogo.
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