15:04 – 14 DE ABRIL
– É uma linda ponte.
Hyunjin estremeceu com o quão estranha ela soou. Essa era outra daquelas ideias que soavam muito melhor na cabeça dela?
Elas caminharam mais alguns passos, a cerca de um braço de distância da outra. Apesar da vista pitoresca que esta ponte proporcionava, com o rio tranquilo e o tempo nublado, isso não era nada do que Hyunjin havia imaginado. Ela queria se chutar por deixar isso acontecer em primeiro lugar.
É Heejin quem parou e deu uma olhada nela.
– Isso é meio estranho.
– É, não é? Me sinto meia estranha. – Hyunjin disse, com as mãos inquietas com o guia turístico que ela pegou na estação de trem. – Mas tudo bem, certo?
– Sim, isso é ótimo. Vamos a alguns lugares - tente olhar seu livro.
Hyunjin não pôde deixar de sentir que Heejin estava simplesmente fazendo a vontade dela, mas, novamente, essa coisa toda não era para agradá-la de qualquer maneira? O pensamento de Heejin ainda escolhendo passar um tempo com ela, mesmo assim, espalhou calor em seu peito.
– Espere, essa coisa está em alemão. – Hyunjin disse, sentindo o constrangimento queimar a ponta de suas orelhas. Ok, isso não está funcionando. Com medo de que isso pudesse ser a gota d'água de Heejin, Hyunjin a agarrou pelo pulso e caminhou em direção a duas pessoas conversando no que ela tinha certeza que eram alemães.
– Com licença, uh, você fala inglês? – Hyunjin perguntou em inglês.
Os dois homens pararam a conversa para olhar para Hyunjin, e foi o gorducho e baixo um dos dois que lhe deu uma resposta.
– Sim, claro. – ele disse.
– Fala alemão, pra variar? – o outro homem perguntou, e ele teria sido intimidador se não tivesse uma voz tão aguda e uma estrutura esguia.
– Como? – Hyunjin respondeu confusa.
– Foi uma piada. – esclareceu o baixinho. – O que você precisa?
Isso, Hyunjin poderia responder.
– Chegamos em Viena hoje e estamos procurando algo divertido para fazer.
– Como museus, exposições, esse tipo de coisa. – acrescentou Heejin.
O baixinho cantarolou em compreensão.
– Mas museus atualmente não são mais divertidos.
– E também estão fechando agora mesmo. – disse o homem esguio, olhando para o relógio. –Quanto tempo vão ficar aqui?
– Apenas esta noite. – Hyunjin respondeu.
– Por que vieram para Viena? O que podiam esperar?
Por alguma razão, a mente de Hyunjin ficou em branco. O que ela esperava, arrastando uma estranha com ela assim? Ela olhou para Heejin pedindo ajuda e a surpreendeu envolvendo um braço em volta de sua cintura e puxando-a para perto.
– Estamos em lua de mel. – disse Heejin facilmente.
Hyunjin inalou profundamente com suas palavras, a mente ainda preocupada com a mão em sua cintura.
– É, ela ficou grávida, tivemos que nos casar.
Ela ouviu Heejin rir ao lado dela e Hyunjin resistiu ao impulso de dar um tapa em sua testa.
– Você é uma péssima mentirosa. – o baixinho disse, apontando para Hyunjin.
Antes que Hyunjin pudesse dizer qualquer coisa para defender suas habilidades de mentir, os dois homens trocaram algumas palavras em alemão que ela não entendeu. Ela aproveitou para olhar para Heejin, que ouvia a conversa da melhor maneira possível, não parecendo que iria largar a cintura de Hyunjin tão cedo.
– Aqui. – disse o baixinho, pegando dois pedaços de papel que Hyunjin reconheceu serem ingressos. – Essa é uma peça que nós dois atuamos. Gostaríamos de convidá-las.
– Vocês são atores? – Heejin perguntou.
Ela aceitou os ingressos e tentou ler o texto, os olhos semicerrados e uma ruga se formando na testa. Hyunjin adicionou à lista de coisas adoráveis que Heejin faz.
– Não profissionais. Meio período. Apenas por diversão. – o homem esguio corrigiu. – É uma peça sobre uma vaca e um índio procurando por ela. Também há políticos, mexicanos...
– Russos, comunistas... – o baixinho completou, e seu amigo concordou com a cabeça.
– Então você tem uma vaca no palco? – Hyunjin disse, focando em uma das coisas mais seguras que eles mencionaram.
– Não, não é uma vaca de verdade. É um ator vestido de vaca.
– Eu sou a vaca. – disse o homem esguio, gesticulando para si mesmo. – E a vaca é um pouco estranha. Ela age como um cachorro. Se alguém joga um graveto, ela vai pegar e traz de volta. E ela fuma com as patas e tudo mais. – o homem acenou com a mão, como se fumasse com os cascos da vaca.
Hyunjin assentiu enquanto o homem explicava seu papel, sentindo uma onda de medo na boca do estômago. Lá estava ela, no meio de uma ponte em algum lugar de Viena, ao lado de uma garota com um braço em voltada cintura dela enquanto conversavam sobre uma vaca que podia fumar com as patas. Ela não queria nada mais do que bater a cabeça no corrimão, esperando que de alguma forma seduzisse Heejin a perdoá-la por desperdiçar seu tempo assim.
Hyunjin olhou para Heejin para ver como ela estava lidando com essa reviravolta e, surpreendentemente, ela estava sorrindo. Ela ouvia atentamente a explicação do homem, como se não fosse um monte de bobagens sem sentido. Hyunjin brevemente se perguntou se era assim que ela soava antes, explicando o show estúpido que ela inventou no trem.
– Como podem ver, aí tem o endereço. – disse o baixinho, apontando para o bilhete que Heejin estava segurando. – Fica no 2ºDistrito, perto do Prater. Conhecem o Prater?
– A grande roda-gigante? – Heejin perguntou animadamente.
Os dois homens assentiram.
– Precisamos ir lá. – disse Heejin, removendo a mão da cintura de Hyunjin e segurando seu braço.
Graças a Deus ela estava com a jaqueta.
– Talvez possam ir ao Prater antes da peça. Começa às 21h30. – disse o baixinho.
Hyunjin olhou para Heejin para perguntar o que ela pensava, e Heejin respondeu com um aceno de cabeça.
– Ok, vamos tentar estar lá. – disse Hyunjin. – Qual é o nome da peça?
– A tradução seria ''Traga-me os chifres''. – começou o baixinho, então eles continuaram em uníssono: – ''Da vaca de Wilmington.''
– Ótimo! – Heejin disse, soltando o braço de Hyunjin, mas o calor ainda estava lá. – Vamos tentar estar lá.
– Sim, nós iremos. – Hyunjin concordou.
– Eu sou a vaca. – o homem magro apontou para si mesmo.
– Sim, você é a vaca. – Hyunjin ria, arrastando Heejin para longe dos dois homens.
– Tchau!
16h04 – 14 DE ABRIL
Depois de se separarem dos dois atores, elas decidiram andar de bonde no The Ring Boulevard, com Heejin dizendo que seria a melhor maneira de passear sem se cansar muito.
Com toda a honestidade, ela só queria um espaço onde pudesse ter Hyunjin só para ela.
Hyunjin começou a agir um pouco diferente quando chegaram em Viena, impaciente e ansiosa por uma razão desconhecida. Heejin se perguntou se era assim que ela realmente era normalmente, ou se ela estava apenas nervosa, estando em um lugar desconhecido com uma completa estranha que conheceu no trem.
Imaginar não era suficiente, no entanto, e Heejin queria chegar ao fundo disso. Ela imaginou que estar juntas no bonde lhe daria a chance de fazer isso.
Surpreendentemente, uma vez que elas se acomodaram em seus assentos no pequeno bonde, Hyunjin foi quem quebrou o silêncio.
– Tenho uma ideia. Está preparada?
Ela cantarolou em resposta.
– É hora de perguntas e respostas! – Hyunjin disse alegremente. – Já nos conhecemos um pouco, então acho que é hora de fazer algumas perguntas diretas uma à outra.
Heejin contemplou a ideia e decidiu que gostava dela.
– Parece bom. Temos que responder cem por cento honestamente, caso contrário, o jogo seria inútil.
– Claro! Vou perguntar primeiro. – disse Hyunjin.
Ela se mexeu um pouco para tirar a jaqueta, e Heejin fez o possível para não se sentir afetada pela pele nua roçando uma na outra. Ela estava começando a achar que aquele bonde não era feito para duas pessoas.
– Hmmm.. aha! Descreva para mim, seus primeiros sentimentos sexuais por uma pessoa.
Heejin não pôde deixar de rir.
– Meus primeiros sentimentos sexuais?
– Sim. – disse Hyunjin, dando-lhe um sorriso malicioso.
Heejin vasculhou seu cérebro em busca de uma resposta que não a deixasse muito envergonhada. Mas, o que é o pior que poderia acontecer? Hyunjin pensaria que ela é estranha? Ela percebeu que não importaria muito, já que nunca mais se veriam depois de hoje.
– Bem, tinha uma garota no acampamento de verão. Jung Jinsoul. Ela era nadadora. – disse Heejin.
– Ah, então o spandex fez isso com você?
Heejin revirou os olhos.
– Eu tinha dezessete anos. De qualquer forma, ela havia descolorido o cabelo. E para melhorar seu tempo, ela raspava os pelos das pernas e dos braços.
– Parece bastante promissor até agora. – Hyunjin disse pensativa.
– Ela era como um lindo golfinho. E minha amiga Jungeun tinha uma grande, grande queda por ela.
– Ah, um triângulo amoroso? – Hyunjin perguntou ansiosa, virando-se para encarar Heejin melhor.
Ela levantou o braço para deitar em cima do encosto, logo atrás dos ombros de Heejin. Ela sentiu a temperatura de seu corpo aumentar com a proximidade.
– Não é bem assim. – ela respondeu, sua voz felizmente não deixando transparecer o quão nervosa ela se sentia. – Então, um dia eu estava atravessando o campo e Jinsoul veio andando atrás de mim. E eu disse a ela: ''você deveria sair com a Jungeun. Ela é doida por você.'' E ela se virou para mim e disse: ''Bom, que pena, porque eu tenho uma grande queda por você.''
Hyunjin soltou um suspiro exagerado, fazendo Heejin rir.
– Sim, realmente me assustou pra caramba, porque eu achava ela tão legal. E então ela oficialmente me chamou pra sair. Fingi que não gostava dela. É que eu morria de medo do que eu tinha que fazer, sabe.
– Como eu disse a você. – Hyunjin disse em um tom grave. – Maiôs devem ser ilegais.
Heejin revirou os olhos, mas não conseguiu conter o riso.
– Eu fui vê-la nadar algumas vezes na competição, e ela era tão sexy. Sério. Digo, realmente muito sexy. Também escrevemos aquelas declarações de amor no final do verão, e prometemos continuar nos escrevendo para sempre, e que nos encontraríamos novamente em breve...
– Você fez? – Hyunjin perguntou baixinho, contrastando com seu tom de brincadeira anterior.
– Claro que não. – disse Heejin com naturalidade. – Ela provavelmente já se esqueceu de mim.
Heejin observou uma carranca se formar no rosto de Hyunjin, mas ela foi rápida em substituí-la por um sorriso.
– Bem, acho que este é um momento certo de te contar que sou uma nadadora fantástica. – disse Hyunjin presunçosamente.
– Vou manter isso em mente. – disse Heejin sem compromisso, já pensando em qual pergunta ela queria fazer. – É a minha vez agora, não?
– Sim, sua vez. Manda ver.
– Ok. – Heejin respirou profundamente. – Você já se apaixonou?
Com elas tão próximas uma da outra, Heejin jurou que ouviu a respiração de Hyunjin engatar, mesmo que sua expressão não revelasse nada. Então houve silêncio, e é como se não pudessem nem ouvir o bonde se movendo ao redor delas.
– Sim. – Hyunjin disse sem emoção. – Próxima pergunta. Qual foi o primeiro-
– Espera aí, espera, espera. – Heejin interrompeu, confusa. – Então posso responder com uma palavra?
– Por que não? – Hyunjin deu de ombros.
– Depois de entrar em tantos detalhes sobre meus primeiros sentimentos sexuais?
Hyunjin riu disso, o que fez Heejin fazer beicinho.
– São perguntas diferentes! O amor é... olha, eu poderia ter respondido à questão dos sentimentos sexuais, sem problemas. Mas amor? – Hyunjin olhou para cima por um instante - um hábito dela, Heejin notou - então encarou Heejin novamente. – O que você diria se eu perguntasse sobre o amor?
– Eu teria mentido, mas ao menos teria inventado uma boa história!
– Viu? Você mentiria. – Hyunjin disse, soando vingada. – Não devemos mentir. Além disso, o amor é um assunto complexo, sabe? Quer dizer, já disse a alguém que a amava antes? Sim.– Ela começou a listar as perguntas com os dedos, uma a uma. – Eu quis dizer isso? Eu realmente não sei. Será que eu sei o que é amor? É algo que você dá, você recebe? É essa coisa linda ou é essa coisa que te assombra no meio da noite? Entende?
A voz de Hyunjin caiu no silêncio. Ela estava olhando para Heejin em busca de algum tipo de garantia, e ela foi rápida em dar.
– Sim, eu te entendo.
Heejin pensou em seu próprio relacionamento ambíguo com o amor e em todas as coisas complicadas que isso implicava. Ela não pôde deixar de se perguntar se realmente conseguiria uma resposta direta para isso.
– Mas quanto aos sentimentos sexuais, saiba que começou comum notável relacionamento parassocial com uma cantora pop. – disse Hyunjin, e deu-lhe uma piscadela exagerada. Heejin bufou. – Ok, é a minha vez. Me conte algo que realmente te tira do sério. Algo que realmente te enlouquece?
Você, Heejin quis responder, mordendo a língua. Descobrindo que Kim Hyunjin realmente a deixava louca, de uma forma que ter uma coceira incontrolável deixava uma pessoa louca. É impossível ignorar e você só quer coçar até acabar. Ou no caso de Heejin, quanto mais ela descobria sobre Hyunjin, mais ela queria conhecê-la como a palma da mão. Ela toma café pela manhã? Que lado da cama ela prefere? Quanto tempo demora para ela pegar no sono? O que mais a assusta?
Perguntas que certamente não poderiam ser respondidas em um simples jogo durante um passeio de bonde.
– Eu odeio pássaros. – disse Heejin, optando por algo menos intenso. – Só... não sei, tenho medo.
– Ok. – Hyunjin concordou com a cabeça. – O que mais?
Heejin quebrou seu cérebro por algo, eventualmente se surpreendendo com o quanto ela realmente tinha a dizer.
– Eu odeio... eu odeio que a trezentos quilômetros daqui, haja uma guerra acontecendo. Você sabe, as pessoas estão morrendo, e ninguém sabe o que fazer sobre isso, ou eles não dão a mínima. Eu odeio governos, toda a sua existência é um oximoro. Eles são tão duvidosos, e todo mundo finge não saber disso, porque é assim que as coisas são. Eu odeio a forma como fingimos ignorância para manter o status igual. É estúpido e eu também faço isso, mas eu odeio isso.
Heejin sentiu suas bochechas esquentarem um pouco quando terminou, sentindo-se envergonhada por se deixar levar por sua empolgação. Hyunjin, por outro lado, simplesmente olhou para ela com um olhar que Heejin não conseguia entender. Tardiamente, ela colocou isso na lista de coisas que ela odiava - ela odiava não poder saber o que Hyunjin estava pensando.
– Isso é tudo?
– Bem, tem muitas coisas, mas é a minha vez agora. – disse Heejin humildemente. – E você? O que é um problema para você?
Hyunjin murmurou algo que soou como ''você, provavelmente'', mas não poderia ser isso, então Heejin pediu que ela repetisse.
– Desculpe?
– Tive um pensamento outro dia no trem... – Hyunjin disse, a voz ainda baixa. – Você acredita em reencarnação?
– Acho interessante. Por que?
– Bem, este é o meu pensamento. – Ela tinha um olhar em seu rosto então, uma concentração que Heejin não pôde deixar de achar absolutamente adorável. – 50 mil anos atrás, não havia nem 1 milhão de pessoas no planeta. Há mil anos, haviam 2 milhões de pessoas. Agora, há entre sete e oito bilhões de pessoas no planeta, certo?
Heejin assentiu, embora um pouco insegura sobre onde isso estava indo.
– Se todos temos nossa própria, individual e única alma...de onde vieram todas as outras? As almas modernas são só uma fração das almas originais? Se são, representa uma divisão de 5 mil para 1 de cada alma nos últimos 50 mil anos, o que não é nada comparado à idade da Terra. Na melhor das hipóteses, somos pequenas frações de pessoas...
Hyunjin se interrompeu e se mexeu novamente, seu braço caindo completamente sobre os ombros de Heejin. Heejin se perguntou se ela notou, mas Hyunjin parecia muito extasiada. De qualquer maneira, não importava - Heejin sabia, e sua frequência cardíaca era ainda pior por causa disso.
– O que quero dizer é, é por isso que estamos tão afastados? Por isso que somos tão limitados?
Heejin tentou entender as coisas que Hyunjin acabou de dizer, o processo parecendo desembaraçar fios de lã. Quando sua resposta demorou um pouco demais, Hyunjin correu para consertar o silêncio.
– Eu sei que é um pensamento totalmente confuso...
– É por isso que meio que faz sentido. – disse Heejin, rindo da expressão de pânico de Hyunjin. – Não tenho certeza se concordo com você, ou mesmo se entendi completamente o que você estava dizendo, mas entendo.
Hyunjin exalou alto e, antes que Heejin pudesse dizer mais alguma coisa, o bonde parou. Aproveitando a oportunidade, Heejin segurou a mão apoiada em seu ombro e fez um movimento para se levantar.
Ela sentiu Hyunjin ficar tensa ao lado dela, respondendo a sua pergunta anterior. Ela não tinha notado. Depois de uma ou duas batidas, ela relaxou e segurou Heejin mais perto.
– Vamos sair dessa droga de bonde.
17:00 - 14 DE ABRIL
Após o passeio de bonde, Hyunjin levou Heejin para comer comida de rua. Algo sobre nunca experimentar verdadeiramente a gastronomia de um lugar sem provar sua comida de rua.
Durante a excursão, Hyunjin terminou tudo o que Heejin não conseguiu comer, limpou o molho no canto dos lábios e tentou não colocar fios de cabelo atrás da orelha por um total de seis vezes.
(De alguma forma, tocar Heejin era como ter chamas lambendo sua pele. Apesar de saber que não traria nada de bom para ela, há algo dentro de Hyunjin que a fazia querer tentar.)
– Tem uma cabine de audição ali, quero dar uma olhada. – disse Heejin, agarrando a mão de Hyunjin e simplesmente não se importando com seu bem-estar geral. Ela não sabia que não devia tocar nas pessoas de forma tão descuidada? Para tocar Hyunjin tão descuidadamente? No entanto, ela se viu seguindo Heejin enquanto conduzia as duas para a loja de discos.
Elas encontraram uma boa loja de discos perto do Primeiro Distrito, e Heejin, anunciando seu caso de amor com os discos, basicamente a coagiu a vir. Hyunjin não se importava. A loja era um lugar agradável e acolhedor com prateleiras quase cheias de discos de vinil e várias bugigangas feitas à mão adornando as paredes de madeira. Ela gostou.
Uma vez lá dentro, Hyunjin percebeu que cabines como essas provavelmente foram feitas para apenas uma pessoa, se a maneira como ela foi pressionada contra Heejin fosse uma indicação. Felizmente, sua companhia estava muito preocupada em colocar a agulha em cima do disco que ela escolheu para notar.
– Então, nós apenas...?
Heejin a interrompeu com um shh e, no mesmo momento, o disco começou a tocar. Começou com o som de uma guitarra solitária, que eventualmente deu lugar a uma voz de mulher – meio áspera, sombria e rica.
I waited 'til I saw the sun
(Eu esperei até o sol raiar)
I don't know why I didn't come
(Não sei por que eu não vim)
I left you by the house of fun
(Te deixei perto da casa de diversão)
Don't know why I didn't come
(Não sei por que eu não vim)
Don't know why I didn't come
(Não sei por que eu não vim)
Sem muito o que fazer na sala apertada, Hyunjin observou o disco preto girar várias vezes, cerca de três vezes antes de perder o interesse. Ela tinha sido cautelosa em olhar para Heejin no começo, já que não queria ser estranha tão próxima. Mas como uma mariposa para uma chama, Hyunjin não resistiu. Então ela olhou.
When I saw the break of day
(Quando eu vi o raiar do dia)
I wished that I could fly away
(desejei poder voar para longe)
Instead of kneeling in the sand
(Em vez de ficar ajoelhada na areia)
Catching tear-drops in my hand
(Juntando gotas de lágrimas em minhas mãos)
Heejin estava com os olhos fechados, ouvindo o disco. Presenteada com a oportunidade perfeita, Hyunjin aproveitou o momento para memorizar as feições de Heejin, calma e em paz. Enquanto ela olhava, três coisas surgiram em sua mente ao mesmo tempo.
My heart is drenched in wine
(Meu coração está encharcado de vinho)
But you'll be on my mind forever
(Mas você estará em minha mente para sempre)
Um: Heejin tinha aquele tipo de rosto que quanto mais você olhava para ela, mais coisas encontrava para amar. É bem ridículo, sério. Desde quando Hyunjin achava as pintinhas das pessoas encantadoras? No entanto, ela colecionou todas essas pequenas coisas, guardando-as em seu coração por segurança.
Out across the endless sea
(Em meio a um mar sem fim)
I would die in ecstasy
(Eu morreria em êxtase)
But I'll be a bag of bones
(Mas serei um saco de ossos)
Driving down the road alone
(Dirigindo pela estrada sozinha)
Dois: mais cedo esta manhã, ela tinha certeza de onde estaria amanhã – sentada em um avião, voltando para casa. Desde que conheceu Heejin, Hyunjin não sabia onde ela estaria, quem ela seria de um momento para o outro. Ela se sentia como um caleidoscópio, as cores dentro dela mudando e se transformando toda vez que Heejin a pegava pela mão e a arrastava para algum lugar novo. Isso a deixou inquieta, a incerteza de tudo isso.
My heart is drenched in wine
(Meu coração está encharcado de vinho)
But you'll be on my mind forever
(Mas você estará em minha mente para sempre)
Três: esqueça a incerteza. De novo e de novo – mesmo que seja só por hoje – ela ainda pegaria a mão de Heejin de qualquer maneira.
Something has to make you run
(Algo tem que te fazer correr)
I don't know why I didn't come
(Não sei porque eu não vim)
I feel as empty as a drum
(Me sinto vazio quanto um tambor)
I don't know why I didn't come
(Não sei porque eu não vim)
Don't know why I didn't come
(Não sei porque eu não vim)
I don't know why I didn't come
(Não sei por que eu não vim)
19h02 – 14 DE ABRIL
Após a visita à loja de discos, Hyunjin se viu caminhando para um cemitério por insistência de Heejin.
À primeira vista, não parecia um cemitério – era muito pequeno, coberto de arbustos, flores e árvores. A única coisa que revelava sua identidade era a variedade de lápides próximas umas das outras, projetando-se da grama.
– Visitei este lugar quando eu era criança. – disse Heejin, conduzindo Hyunjin até a entrada. –De todos os museus que visitamos, este é o que mais me lembro
Enquanto caminhavam para dentro, Hyunjin tentou ler as inscrições de uma das lápides, apenas para descobrir que todas estavam escritas em um idioma que ela não entendia. Ela olhou para Heejin pedindo ajuda, mas estava muito ocupada verificando cada lápide, já alguns passos à frente de Hyunjin.
– Você conhece alguém aqui? É por isso que você se lembra mais?
Heejin riu.
– Não conheço ninguém aqui. A maioria das pessoas enterradas aqui são as que deram à costa no fundo do Danúbio – ninguém as conhece, por isso é chamado de cemitério dos sem nome.
– Por que os corpos estavam no rio? – Hyunjin perguntou.
– Acho que alguns eram de acidentes de barco e coisas assim. Mas a maioria foram suicídios. – disse Heejin, ainda preocupado em procurar por algo. – Sempre gostei de pensar que todos aqueles desconhecidos ainda estão aqui, perdidos no mundo. Quando eu era uma garotinha, pensava que se ninguém da sua família ou amigos soubessem que você estava morto, então era como se você não tivesse morrido de verdade. As pessoas ainda podem inventar o melhor e o pior para você.
Hyunjin olhou para Heejin por um momento, observando-a avaliar cada lápide e passar para a próxima. Resumidamente, Hyunjin se lembrou de Heejin no trem, falando sobre seu medo da morte e das viagens aéreas. Ela andou por aqui quando era uma garotinha, olhos arregalados e inocentes, acreditando que todas as pessoas aqui ainda estavam vivas em espírito?
Voltando a si, Hyunjin correu para alcançar sua companhia.
– Então o que você está procurando? – ela perguntou, ficando curiosa.
– É... – Heejin fez uma pausa para ler o texto na lápide à sua frente. Deve ter sido o que ela estava procurando, porque ela apontou e chamou Hyunjin. – Aqui está ela, eu acho. Sim, é desta que me lembro mais.
Hyunjin caminhou ao lado dela.
– Elizabete? Porquê?
– Ela tinha apenas 13 anos quando morreu. Eu tinha essa idade quando vim aqui pela primeira vez, então acho que isso significou algo para mim. – Ela fez uma pausa, como se estivesse pensando. – Agora estou 10 anos mais velha e ela ainda tem 13. Engraçado, não é?
Engraçado não seria exatamente a palavra que Hyunjin teria escolhido, mas como ela falhou em procurar adjetivos mais adequados, ela admitiu que provavelmente é a melhor palavra para isso no momento.
– O tempo funciona assim, eu acho.
18:00 - 14 DE ABRIL
– Aquele ali é o Danúbio. – disse Heejin do outro lado da carruagem, olhando para o Prater abaixo delas.
– É um rio, certo?
– Sim.
O silêncio caiu sobre elas, mas Hyunjin realmente não se importava. A vista diante dela era absolutamente deslumbrante - o céu era uma mistura de tons de roxo e laranja, todos refletidos na massa de água que se encontrava por baixo. Hyunjin nunca tinha andado em uma roda-gigante com cabines tão grandes como esta, facilmente do tamanho de três elevadores juntos, mas ela descobriu que gostava muito. Certamente é menos restritivo em comparação com ser amarrado a um assento.
– Isso é lindo, não é?
Hyunjin virou-se para olhar para Heejin então, assustada ao encontrá-la mais perto, a cerca de três passos de distância. Ela estava encostada no corrimão com o rosto iluminado pelo pôr do sol e, como um relâmpago, Hyunjin se lembrou do motivo pelo qual elas ocupavam lados opostos da cabine em primeiro lugar.
Com o passar do dia, Hyunjin começou a ter esses pensamentos ridículos.
Ela queria beijar Heejin.
E aqui, sozinha com ela no topo de uma roda-gigante na porra de Viena, Hyunjin não tinha certeza se ela poderia se conter por mais tempo. Não aqui, não agora, não quando Heejin está parecendo muito com tudo que Hyunjin sempre quis.
Se ela pulasse no Danúbio agora, eles a enterrariam no mesmo cemitério que visitaram antes?
– Absolutamente lindo. – disse Hyunjin, um pouco tarde demais para ser natural. Não era culpa dela que sua língua estava mais pesada do que o normal. – Você não vê isso todos os dias, certo?
– Não, a menos que você trabalhe aqui. – Heejin concordou.
Hyunjin riu nervosamente da piada, o que fez Heejin se virar para ela com curiosidade.
– Tudo certo?
Não.
– Bem, eu só estava pensando. – Hyunjin começou, sua boca tendo vontade própria. É algo que ela descobriu que acontece com bastante frequência sempre que ela está perto de Heejin.
– Pensando sobre...?
Hyunjin se aproximou dela, o olhar vagando pela carruagem, recusando-se a encontrar os olhos de Heejin.
– Quero dizer, temos um pôr do sol aqui, um muito bom... temos a roda-gigante...
Hyunjin fechou os olhos e suspirou. Então, ela enfrentou Heejin usando toda a força de vontade que ela não tinha.
– Você está dizendo que quer me beijar? – Heejin perguntou rindo, seu sorriso fazendo parecer que ela achou a coisa toda divertida. Hyunjin estava prestes a fazer beicinho e reclamar - esse tipo de coisa exigia muita coragem, caramba - mas Heejin a surpreendeu ao dar um passo à frente, as mãos unidas atrás do pescoço de Hyunjin.
Lembrando que ela ainda tinha que responder à pergunta, Hyunjin assentiu enfaticamente.
– Sim, por favor. – ela respondeu, sua voz fraca.
Hyunjin mal teve tempo de processar qualquer coisa antes que os lábios de Heejin estivessem nos dela - lentos, macios e doces.
Heejin a beijou com um cuidado estranho ao qual ela não estava acostumada - como se ela fosse alguém preciosa, alguém sem as arestas e imperfeições que ela trabalhava duro para esconder. Na verdade, Heejin a beijou gentilmente o suficiente para que, apesar do crânio de Hyunjin ameaçar estourar, ela ainda tivesse a inteligência para se concentrar em cada coisa por sua vez.
O cabelo de Heejin caindo em sua bochecha, seus narizes batendo um no outro. A pressão fria das mãos de Heejin em sua nuca, puxando-a mais fundo. O calor do corpo de Heejin contra o dela, mais perto, enquanto ela a abraçava com força.
Mil centelhas de luz das estrelas que, juntas, poderiam ofuscar todo o universo.
Muito cedo, Heejin se afastou e separou seus rostos. Hyunjin levou um milhão de segundos antes que ela pudesse respirar corretamente, seu coração se expandindo para ocupar todo o peito.
Tocar em Heejin parecia ter chamas lambendo sua pele.
Beijá-la? Bem.
Parecia que cada célula do corpo de Hyunjin havia se tornado uma supernova.
Apesar de saber que não traria nada de bom para ela, Hyunjin se soltou.
Hoje à noite, talvez queimar não seja tão ruim.
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