História Boyfriend Material - tendery - Ternura

Ten não havia se dado conta da exata hora em que caiu no sono. Ele passara a noite toda trocando as mais diversas experiências sobre ser humano com Hendery.

“Eu sou ótimo em jogos.” Hendery poderia até não ser o namorado perfeito, ou colega de quarto, como Ten fazia questão de chamá-lo, tendo possivelmente evoluído para “amigo” na noite anterior, mas ainda era uma máquina. Quase não se vence de máquinas em jogos. Você precisa ser muito bom para isso. E, aparentemente, Hendery estava vencendo um jogo muito importante. Um que humano nenhum havia ganhado de Ten anteriormente.

Quando percebe Hendery sentado na beirada da cama olhando para o céu da janela ele tenta não fazer movimentos bruscos para não distrair a atenção do companheiro, que parecia muito concentrado em algo. O que se passava na cabeça de Hendery ainda era um mistério. Um mistério que talvez Ten jamais desvendasse.

– Bom dia. – Hendery diz ainda encarando o céu.

Ten não responde.

– Eu estou falando com você. – Hendery sorri agora com os olhos voltados para Ten.

– Ah. Bom dia. Achei que estivesse falando com o céu, ou seja lá o que estivesse encarando.

Hendery sorri novamente.

– Como se o céu fosse responder.

– Talvez ele respondesse se fosse você.

Mais um sorriso surge no rosto do robô.

– Isso seria incrível.

Ten fica o encarando por um tempo antes de comentar:

– Você sorri bastante. 

– É porque eu estou com você.

Pausa.

– Você vai ficar deitado aí? – Hendery pergunta.

Ten nega com a cabeça e ameaça levantar, mas no mesmo instante retorna rapidamente para a cama fechando os olhos.

– Acho que sim. Não quero levantar hoje.

– Vamos, levante. O dia está maravilhoso lá fora. – Hendery suplica fazendo cara de cachorrinho pidão.

Ten abre apenas um dos olhos e observa Hendery. Ele resmunga alguma coisa e faz um esforço para levantar. Hendery dá a volta ao redor da cama e tenta ajudá-lo fazendo careta enquanto finge uma certa dificuldade.

Quando chegam na sala ambos ficam em silêncio. Ten, completamente paralisado tenta dizer algumas palavras, mas nada sai de sua boca. Hendery, por sua vez, apenas espera alguma reação de Ten, qualquer que fosse.

Hendery começa então a ficar preocupado com a falta de ação do companheiro e se posiciona em sua frente franzindo as sobrancelhas.

– Ten?

O tailandês pisca várias vezes antes de responder um “sim?” quase inaudível.

– E então? Você gostou?

– Eu não sei nem o que dizer. O que... O que é tudo isso?

– Você não sabe? São lobélias. Você mesmo me apresentou.

– Eu sei que são lobélias. Perguntei o que todas elas estão fazendo aqui. 

O espanto de Ten era totalmente compreensível uma vez que vasos e vasos de lobélias azuis estavam espalhados por toda a sala.

– Por causa do trigo. 

Ten franze as sobrancelhas.

– A dona raposa disse que antes o trigo não tinha nenhum valor para ela, mas que depois de conhecer o pequeno príncipe o veria de outra forma porque agora o trigo lembraria seus cabelos dourados, certo? Lobélias azuis me lembram você. 

– O que-

– É engraçado porque… você sabe o que flores azuis representam? – Hendery deixa escapar um sorriso, mas Ten não sabia dizer que tipo de emoção estava por trás do mesmo uma vez que a expressão de Hendery era um tanto vazia, especificamente naquele momento.

– O quê? – Ten pergunta de fato bastante interessado na resposta.

– Representam a utopia e estão associadas à conquista de algo impossível.  Exatamente como nossa relação é. – Hendery força um sorriso. – Eu compreendo que você não queira se apegar a mim, por isso sempre mantenho uma certa distância, apesar de ser difícil pois não fui criado para ser apenas um amigo, Ten. Ser um namorado é o que eu sei fazer de melhor. É para isso que eu existo. No começo eu achava que não conseguiria satisfazer você pois ser apenas um amigo é realmente difícil, mas depois comecei a perceber que talvez fosse o melhor a ser feito. Nós não somos iguais. Quando eu partir… bem, você sofreria muito se tivesse se apegado a mim. Eu jamais poderei suprir todas as suas necessidades. Eu te amo, mas mesmo que você me retribuísse tal sentimento, essa relação não poderia acontecer. É isso que as lobélias azuis representam. E é por isso que elas me lembram você.

Ten fica longos segundos em silêncio fitando o chão.

– Me desculpe se o clima ficou tenso, era um presente afinal porque são flores realmente lindas. Ten? Você acha que eu fiz besteira? O que eu deveria fazer? Realmente sou péssimo nisso. Li que surpresas como essas eram boas, mas que nem todos os humanos gostavam. Você é um desses humanos?

Ten continuava a encarar o chão não reagindo a nada que o companheiro dissesse.

– Ten? 

– O-Oi? – ele desperta se seu transe.

– Você não gostou, não é? – Hendery apresentava um semblante triste.

– Eu gostei, mesmo. Só que… – ele decide trocar de assunto pois não gostava do rumo que aquela conversa estava tomando – ...o apartamento é suficiente para nós dois. Onde eu vou colocar todas essas lobélias? – Ten pergunta sorrindo.

– A vizinha ao lado disse que poderia ficar com elas se você não gostasse. Eu disse que você gostaria, mas que se não fosse o caso as daria para ela. – Hendery dá de ombros.

– Dona Maria das Flores? – Ten começa a sorrir. 

Maria das Flores era uma vizinha famosa por colecionar todo tipo de flor. Ela devia ter ficado encantada ao ver a quantidade de lobélias que Hendery transportava. Certamente saberia o que fazer com elas.

Ten coloca ambas as mãos no rosto e cai em uma gargalhada contínua. Hendery o acompanha sem nem ao menos saber o motivo. 

– Por que estamos sorrindo? – ele pergunta enfim.

Ten tenta se controlar, com dificuldade.

– Você não existe, Hendery. Ou melhor, existe. – Ten se aproxima de Hendery e acaricia levemente seu rosto fazendo com que o robô feche os olhos por um breve segundo, como se de fato estivesse sentindo aquele toque. – E eu sou muito grato por isso.