História Cartas Para Mim Mesma 2 - Milkshakes

      Erik e eu pegamos o ônibus e nos dirigimos para aquele shopping onde ficava a sala 6. Assim que chegamos paramos em frente a ela, que estava em manutenção. Mais uma vez pude ver a expressão entristecida e nostálgica de Erik ao ver outro lugar que já fora diferente, e agora havia perdido um pouco da magia. Após alguns segundos ele perguntou:

-Bem, você disse que a cada lugar que visitassemos haveria algo para me alegrar. O que deve esperar aqui?

-Venha comigo. -Eu disse me dirigindo para uma lanchonete próxima. 

Ele me seguiu e nós entramos. Caminhei até o balcão e disse a atendente:

-Boa tarde, gostaria de um milkshake de creme...

Voltei meu olhar para Erik e ele sorriu, entendendo o que eu estava fazendo. 

-E para mim um de chocolate por favor. A propósito, eu pago.

-Erik, que absurdo. Não precisa pagar! -Disse me fingindo de indignada.

-Sabe Luísa, você deveria parar com esses exageros, me deixe pagar de uma vez, que mal há nisso?

Mas a atendente não era tão calma e bem humorada como o nosso conhecido sorveteiro que já havia presenciado essa cena, e ela apenas pediu impaciente e um pouco irritada que nos apressassemos em fazer nossos pedidos. 

O mau humor da atendente não conseguiu estragar o sorriso que trocamos ao pegarmos nossos milkshakes. Fomos tomando enquanto eu me dirigia novamente para a sala 6. Paramos em frente a ela e eu sussurrei a Erik:

-Esta disposto a quebrar suas regras certinhas?

Ele pareceu intrigado, mas apenas assentiu com a cabeça. 

A porta da sala 6 estava interditada por conta das manutenções, mas havia um fresta suficientemente grande nela. Quando não havia ninguém nos corredores, eu fui nas pontas dos pés até a fresta e fiz sinal para Erik, que compreendeu o que eu iria fazer e me seguiu. Consegui entrar lá sem fazer barulho algum. Realmente, apesar de toda poeira e cheiro de tinta, ela continuava da mesma maneira de antes, quando assistimos "Coração De Fogo". Era uma sala comum de cinema, mas nas últimas fileiras, o local onde eu e Erik nos sentamos naquela vez, parecia diferente aos meus olhos sentimentais, e talvez à Erik também.

Nos sentamos nos degraus com iluminação no escuro da sala e tomamos nossos milkshakes em silêncio, deixando que nossos pensamentos voassem para longe. Após alguns minutos, sussurrei:

-Eu sei que não é tão mágico quanto o cinema abandonado era, e sei que o pó aqui é bem pior, mas é o que posso lhe oferecer por hoje.

-Eu gosto disso aqui mesmo assim. Afinal, mesmo quando tudo muda, você não muda e não desiste de mim, e acho que o importante, no fim das coisas, é estarmos juntos... -Ele disse serenamente.

-Desde quando você é tão meloso? -perguntei rindo baixinho.

-Esse milkshake tão doce deve ter mandado muito açúcar para meus pensamentos. 

-Concordo, isso aqui está doce demais, se metade desse açúcar fosse para o humor daquela atendente nervosa já estaria ótimo.

-De fato, mas, como você mesmo disse, é o que temos pra hoje. -Pude ver seu sorriso discreto no escuro.

Alguns instantes depois escutamos vozes se aproximando. Ficamos paralisados por um momento, suando frio. Se alguém nos visse lá, era capaz de sermos tirados pela polícia, afinal ali era uma área claramente restrita e perigosa por conta das manutenções. Mas, para nosso alívio, notamos que eram apenas as várias vozes das pessoas que saiam de outra sala após o término de algum filme. 

Assim que todas as vozes cessaram, eu e Erik nos esgueiramos novamente pela brecha  na porta de madeira provisória sem emitir som algum. Jogamos nossos copos no lixo e enquanto caminhávamos para saída do shopping eu disse:

-Mais uma pergunta de cada um.

-Certo. Bom... ninguém se deu conta de que me mudei em minha antiga classe certo?

-Sinto informar mas apenas eu e Mikaely...

-Isso não me incomoda. -Ele disse calmamente.

-Bom, minha pergunta. Esta gostando desse primeiro dia?

-Não posso dizer que não. Na realidade, estou ansioso para ver aquela lanchonete maravilhosa, mesmo que fechada...

-É pra lá que nós vamos.