Kang mergulhava num turbilhão de perplexidade, envolta pela efusão de luzes neon que banhavam os corpos em desvario na pista de dança. Aqueles seres humanos, comprimidos como se a própria vida dependesse de tal agitação, ou talvez fosse o álcool que permeava seus sentidos, oferecendo uma névoa de embriaguez que tingia levemente suas bochechas, já coloridas pelas horas ao sol contínuo.
Pela décima quinta vez, perdeu-se, como quem busca algo inatingível, etéreo até mesmo para a atmosfera daquele local. No entanto, os fios vermelhos a perseguiam, uma recordação constante e incessante. Os sonhos assumiam uma tangibilidade quase assombrosa, desafiando sua própria sanidade. Sentia-se como um vazio gélido em meio ao calor humano.
Seu corpo afundava-se pesadamente na poltrona de couro, impregnada de um suor pegajoso e úmido. A respiração parecia desvanecer-se, os pulmões movendo-se com uma letargia inquietante. Deliberadamente, submeteu-se às emoções, mergulhando num álcool de tonalidades profundamente azuladas, cujo sabor desconhecido acariciava sua língua e adormecia os músculos, sem afetar o coração que, inabalável, persistia em suas batidas ansiosas e frenéticas.
"Nós poderíamos durar para sempre.”
"Tenho medo que tudo desapareça.”
"Apenas confie em mim."
Era esta a memória imutável que assolava Kang, o eco embriagado da ruiva, distante, por mais que se conversassem naquela alcova glacial de um motel demasiadamente luxuoso. O dia subsequente despontou, e com ele, a promessa de um "para sempre" desvaneceu-se por completo. Aquelas três semanas de encanto foram abruptamente extintas por uma decisão solitária.
As lágrimas ansiavam por retorno, delineando seus trajetos conhecidos pelas maçãs do rosto. No entanto, conteve-se com uma força maior ao ter coragem suficiente para erguer-se, pondo fim ao seu quinto drinque. Embora detestasse, imiscuiu-se no turbilhão de corpos que remexiam-se com vigor e veemência. As luzes, o ar saturado, o sabor amargo e salino que pairava em seus lábios, tudo convergia para uma sensação de estar imersa em águas desconhecidas.
Os pensamentos estridentes eram abafados pela cacofonia da música frenética. Movia-se com tal intensidade que jamais alguém reconheceria Kang naquele frenesi, despojada de suas máscaras sociais, enclausurada em seu universo de luzes azuladas, rosadas, e uma ruiva que teimava em persistir, apesar das adversidades. Sentia mãos desconhecidas acariciando-a, vozes abafadas ecoando em seus ouvidos. Aquela era a boate de Joohyun, a arquiteta daquele tumulto, que insistia em trazê-la de volta, como uma corda invisível que se enrolava em torno de seu pescoço.
Não soube precisar com exatidão; sentia-se tonta, nauseada, suja. No entanto, a visão de mãos pálidas arrancando-a do meio da multidão fora incontestável. O ar faltava-lhe, jurou que seu coração estagnara junto aos músculos. Tudo tornara-se um borrão desconfortável; andar era uma afronta concreta. No entanto, reconheceria aqueles cabelos, aquelas mãos, mesmo se mergulhada no mais profundo abismo de solidão.
Ansiava por afastar-se enquanto era arrastada e conduzida, subindo escadas até encontrar-se completamente a sós com ela, com quem mais ansiava ver. A proximidade dela evocava um repúdio gelado que já não desejava experimentar. Teve de recostar-se no pequeno sofá macio e limpo; não tinha ideia de quando havia chorado. No entanto, ao vislumbrar seu reflexo nos grandes espelhos em forma de janela, sua maquiagem derretia tristemente. Os cabelos levemente ondulados eram uma confusão; Seulgi percebia o aroma que emanava dela, mesmo que imersa naquela bagunça. Bae estava ciente disso.
Kang precisou de bem mais que cinco minutos para virar-se e simplesmente vomitar tudo numa lata de lixo próxima. Não era apenas o excesso de álcool que a levava a vomitar, mas toda a situação que não deveria ter um desfecho definido. Sentir as mãos de Joohyun segurando-lhe os fios apenas exacerbava sua náusea.
Parou somente quando já não havia mais nada para expelir e desejava ardentemente que todos os seus sentimentos também tivessem se dissipado naquele instante. Queria desesperadamente que sim, almejava isso com fervor. Encará-la tão de perto era perigoso, um aviso evidente de que aqueles cabelos longos, lisos e de um vermelho vibrante, eram uma chama ardente; a queimadura, inevitável.
Conhecia cada detalhe daquela indumentária, a jaqueta de couro pesada jogada displicentemente sobre os ombros magros e pálidos, a blusa elegantemente cortada e as calças jeans escurecidas por rasgos estrategicamente dispostos, além dos saltos altos. Conhecia tudo, por um momento, ao fechar os olhos, sabia que conhecia para além das aparências. Conhecia sua lingerie escura, suas curvas sinuosas, sua pele fria como um inverno impiedoso. E Deus a perdoasse, mas pecar com Irene era uma das experiências mais prazerosas em sua vida tão mundana e comum.
A realidade inundou seus sentidos ao abrir os olhos e vislumbrar o brilho reluzente do anel de ouro em suas mãos delicadas. A realidade desoladora onde Joohyun era casada e Kang não passava de um mero passatempo, deste modo a feição banhada em desconcerto espremia um não conhecimento e uma falta de motivação plausível para estar ali, junto da figura que levara Kang ao abismo, conduzida ao recinto jamais antes contemplado, àquele santuário burocrático que lhe permanecia enigmático.
As palavras, por certo, soavam-lhe distantes, inacessíveis, notadamente estas proferidas pela dona daquele ambiente opressor, que entre os lábios, ainda inerte, sustentava um cigarro. Ambas se observavam em silêncio sepulcral, cada exalação mínima capturada, cada gesto, por mais sutil, meticulosamente percebido.
Consumiam-se reciprocamente, compartilhando segredos nas entrelinhas dos olhares, conhecidos apenas pelo ardor lascivo e um desejo incoercível, entretanto, Kang não permaneceria ali, decerto não poderia permitir-se tal tormento novamente. Decididamente, a mulher ergueu-se, assim que uma parcela da lucidez lhe retornou, amparando-se na janela mais próxima, sem prever, contudo, o ímpeto com que fora lançada contra a parede envidraçada, gerando um som abafado advindo do fundo da garganta.
O peso dos corpos, dos seios que ascendiam e declinavam devido a velocidade dos eventos. Bae fazia questão de se impor sobre o corpo da morena, fundindo as pernas, entrelaçando as peles como uma prisão invisível, aproximando seus rostos, não embriagada pelo álcool, mais sim por tudo o que Kang Seulgi representava. Talvez tivesse sido inteiramente imprudente ao retirá-la daquele tumulto, todavia, parte de si não consentia que todas aquelas mãos, todas aquelas pessoas, a tocassem livremente, como se detivessem tal prerrogativa.
— Eu realmente preciso de ti, Kang e não me importo com o quanto isso possa soar patético.
— Você... Você de forma alguma precisa de mim, do que tenho a te oferecer, sejamos sinceras Bae, você foi embora quando cansou deste conto de fadas, quando sua vida voltou a perfeita normalidade.
As palavras, afiadas e ásperas, embora pronunciadas com menos firmeza do que desejava a morena, buscavam desviar-se, a todo custo, dos olhares da proprietária da boate, ciente de que prolongada contemplação poderia desencadear um rompante inconsequente, sem se preocupar com as consequências ao alvorecer. Não mais lhe restava paz ou dignidade, apenas um orgulho fustigante. Almejava resistir, ao menos fingir que Joohyun já não lhe afetava, mesmo que fosse a maior das mentiras, ansiando por expulsá-la de si à força, embora houvesse algo que não pudesse ser banido tão prontamente.
O corpo reagia, ainda que de forma involuntária, o ardor carnal não era suscitado pelo ambiente, mas sim por um nome sobejamente familiar, ansioso por emergir, explorar o que se ocultava sob as vestes sombrias daquela que se inclinava sobre si, com uma esperança cortante. Os dedos trêmulos alcançavam as mechas vermelhas, e um acesso de raiva abrupto bastou para que perdesse o controle. Sentia-se enlouquecendo, sucumbindo a uma dor que obscurecia todas as emoções, relegando-as ao fundo de uma garrafa de álcool barato.
Empurrou-a em direção à mesa próxima, onde estavam seus pertences, lançando-os ao chão, e ordenou que Bae se assentasse sobre a madeira polida. Incapaz de gritar com a mais velha, encontrava-se impotente, resignada, como se observasse a cena de fora, dissociada de tudo o que guardava em seu peito atormentado. As lágrimas escorriam silenciosas. Afogaria-se naquele relacionar, sem qualquer esperança de recuperação. Joohyun representava um oceano carmesim, uma dualidade que fazia Kang ferver e estremecer, envolvida por um frio cortante. Estava enferma, e o tratamento, incerto, quase impossível.
Beijou-a impulsivamente, pois necessitava daquilo para sentir o ar inundando seus pulmões, como um sopro brusco que a despertava. As coisas se desenrolavam de forma frenética, sem que ambas compreendessem suas próprias posições, até que uma letargia caótica, repleta de morbidez, congelasse o momento. Separaram-se por breves segundos, concedendo outro beijo quase misericordioso, embora banhado pela luxúria infernal.
Kang encontrava-se submersa, incapaz de agir diante de uma situação que, por escolha própria, havia se inserido. A essa altura, morrer nos lábios de seu mais belo inferno não parecia tão terrível assim. Bae Joohyun a destruiria, e Seulgi permitiria, inconsequentemente, que uma paixão de estragos, desprovida de redenção, fosse levada para frente.
“Uma solidão perpétua, mentiras jogadas, qual é exatamente o ponto para continuar te amando?”
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