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História Change Of Time - Confused silhouette


Escrita por: SheniaSoilho

Notas do Autor


Hey, meu povo!!! Bom, eu sei que demorei, mas em minha defesa eu tinha postado um capítulo duplo da ultima vez e trago boas notícias em meio a esse mar de coisa ruim acontecendo no mundo: esse capítulo também é duplo \o/\o/\o/
Change of Time foi citada numa thread de fics que “mereciam mais reconhecimento” no twitter e eu fiquei mto soft com isso *---* E inspirada pra escrever mais. Então muito obrigada a todos os envolvidos
ESSE CAPÍTULO NÃO TEM NADA DEMAIS MAS EU GOSTO DELE ENTÃO GOSTEM TAMBÉM POR FAVOOOR. Demorei pra postar hoje porque procurei esse gif até o inferno e minha namorada linda achou o video e fez o gif pra mim <3 TE AMO GOSTOSA LINDA DONA DA PORRA TODA
TEM TRÊS MUSICAS NESSE CAPITULO GENTE, já separa, coloca na Playlist da fic no spotfy ou Youtube sei lá:
-> Fallen - Gert Taberner
-> Thinking about you - Jessie Ware
-> Most of Us Are Strangers - Seafret
Eu não revisei, se estiver uma boa merda, vai ficar assim. E se tiver erros, não vou mentir, não vou consertar hahahahah AMO VOCÊS DE QUALQUER FORMA e os vejo no final!!! \o/

Capítulo 20 - Confused silhouette


Fanfic / Fanfiction Change Of Time - Confused silhouette

Girassóis possuem constatações demasiadamente clichês e injustamente banalizadas com o tempo. Mas isso não significa que seu teor poético tenha desaparecido, não mesmo. Ainda é bonito pensar que eles possuem esse nome porque acompanham a luz solar, apontando pela manhã a direção leste e à tarde o caminho do oeste, girando à noite em sua dança de volta ao leste para o nascer de um novo dia. É lindo pensar que fazem isso para produzir mais calor, já que assim atraem mais insetos para a polinização. A natureza é detentora da beleza mais genuína desse universo.

Mas, e quando não há sol? E nos dias em que o frio cortante é o único suspiro de calor?

Um fato curioso sobre essa flor é que, em dias nublados, os girassóis se atraem naturalmente uns para os outros, virando-se quase involuntariamente em suas próprias direções, numa tentativa de se aquecerem, juntos, na ausência da luz.

Às vezes, uma força com potência considerável leva pessoas à redenção da atração que sentem entre si, tornando quase impossível não se corresponderem na tentativa de aquecer seus corações.

Seria, então, plausível dizer que alguns seres humanos são como girassóis?

Março de 2019

— Desculpa ter te chamado assim do nada. Você estava ocupada no trabalho e te atrapalhei… — declarou receosa após alguns segundos de um silêncio constrangedor ter sido instalado novamente. Estava quase se acostumando com a frequência daquilo, mas ela sempre conseguia inserir um novo assunto rapidamente, talvez fosse algum tipo de dom ou quem sabe uma habilidade desenvolvida por escritores.

— Não, claro que não. Eu só estava… — Sua mente vagueou pela reflexão sobre minutos antes de ter chegado àquele café e tido uma conversa agradável com a mulher à sua frente. — Mudando um quadro de lugar. Você só ajudou, eu não queria ficar lá. — Confessou, sorrindo sem vontade e bicando mais um pouco do chocolate quente que já mostrava o fundo da caneca de vidro. Foi domada pelo desconforto das memórias que aquele quadro carregavam, era óbvio, mas o jeito como ela a encarava parecendo venerar cada palavra que saía de sua boca entregava um sentimento aprazível e gostoso. A jogadora teve vontade de pedir mais um chocolate, apenas para prolongar seu tempo ali e sentir-se querida daquela forma. A Terra girara tantas vezes desde a última vez que qualquer sensação assim a alcançasse. Ela parecia fora de alcance para ser alvo do querer de alguém, há muito tempo.

Quando possuímos algo bom e o perdemos, a sensação que aquilo nos trazia vem fortemente em qualquer momento minimamente análogo. Ainda que não seja igual, ainda que não chegue aos pés, a menor esmola daquele sentimento é passível de toda tentativa de permanência, ainda que seja inconsciente.

Estavam ali há quarenta minutos, se perdendo entre sorrisos, cafeína, uma música ambiente e mais todas as coisas que englobam conhecer alguém novo em um encontro casual. Lauren sentia o estômago incomodado com aquela ansiedade, era estranho e gostoso ao mesmo tempo, algo raro.

Às vezes não sabia o que falar, não estava acostumada àquilo, mas Halsey a deixava tão a vontade que se sentia confortável na maior parte do tempo.

— Mas e então? Ficou bom? — perguntou Halsey, explicando em seguida, ao ver que Lauren não entendeu sobre o que estava se referindo. — O quadro, disse que mudou de lugar, quero saber se ficou bom no novo lugar.

 Na verdade eu não consegui ainda, não dá pra fazer sem ajuda. É muito pesado. — Nem ela mesma entendia completamente a ambiguidade daquela frase.

— Eu posso te ajudar. — disse solícita com um sorriso estampado nos lábios rosados. Entendeu aquilo como um convite implícito mas mesmo que não fosse, Halsey era um poço de bom humor e prestatividade, era de si, não sabia ser diferente.

— Será que pode? — Fuzilou-a com seus olhos intensos, questionando muito além do que Halsey pudesse compreender. Já existiu alguém em sua vida que entenderia todas as questões exprimidas com aquele olhar, por trás dele, nadando sobre ele.

Mas essa pessoa não era a que deu um sorriso diante de si.

— Por que não? Olha como eu sou forte! — arregaçou a manga de sua blusa, mostrando o bíceps quase inexistente. Fazendo Lauren quase cuspir o último gole de café querendo rir. — Eu costumo escrever que basta apenas uma de nós para mover o mundo, unidas então somos capazes de tudo. O que é pendurar um simples quadro?

— Bom, sendo assim, já que terminamos o café. Quer me ajudar com esse quadro agora? — indagou levantando-se e estendendo a mão para ela. — Aproveito e te mostro o Pub antes da inauguração, o que acha?

Halsey aceitou seu pedido, unindo sua mão fria a dela, ela suava frio… Lauren logo se teletransportou para cenas de seu passado, sacudindo a cabeça para afastá-las.

Sorriu para ela da forma mais terna que poderia e a levou para entrar em seu mundo pela pequena brecha que forçou até conseguir abrir em seu coração.

Julho de 2014

— É a primeira vez que eu não quero pegar seu bife, come por favor, Laur. A gente não tem aula a tarde mas tem treino daqui a pouco, você precisa de energia. — Normani insistiu pela terceira vez naquele almoço.

— To sem fome, Mani. — E era a quarta vez que os verdes vacilantes acima de bolsas visíveis de Lauren a traíam, olhando de canto em direção a garota que estava perturbando seus sentidos e havia pisado em seus sentimentos que nem puderam ser ditos. Ela conversava alguma coisa com Dinah em uma mesa separada. Quando foi que aquele cenário voltou a ser assim? Elas, em mesas separadas, se encarando. Mas dessa vez, os sentimentos eram inversos, não cabia à jogadora levantar-se e convidá-las para sentarem-se juntas como da primeira vez. Sentir aquilo era mais uma peça em um quebra-cabeças de dor que estava sendo obrigada a montar.

Dinah tagarelava algum sermão direcionado a amiga por ter que se sentar separada das meninas por causa de uma suposta “briga boba” dela com Lauren. Camila não havia entrado em detalhes: “brigamos, uma hora a gente volta a se falar. Mas por enquanto, fica comigo? Não quero sentar sozinha”, foi tudo o que disse. Dinah ficaria, sempre, óbvio, mais até do que ela achava, mas nada a impedia de reclamar do início até o fim, ainda mais por todos os desvios daquele assunto quando Dinah tentava se aprofundar.

E Camila, desviando o olhar assim que era pega encarando aqueles orbes sugadores de volta, não ouvia uma só palavra da reclamação da loira. Tentava disfarçar, mexia no cabelo e voltava a olhar, capturando aquele olhar que desviava no mesmo instante que ela o fazia também. Estava se achando ridícula, podia desviar milhões de vezes, mas Lauren estava em todos os lugares, aparecendo na sua mente, à sua frente em forma de alucinação, antes mesmo de conseguir efetivamente enxergar alguma coisa e principalmente toda vez que fechava os olhos.

Expurgou, momentaneamente naquela manhã, seus demônios na sala de dança, mas nem lá parecia ter paz, já que seus olhos corriam fracos pelo espelho de minuto em minuto em direção a porta, inutilmente. Nada, não havia nem resquício de qualquer aparição de Lauren e por mais que por um lado ficasse aliviada e agradecida por ter seu pedido respeitado, lá no fundo morava a esperança de que a morena aparecesse e lhe sugasse com os olhos fissurados.

Não direcionar seus pensamentos a ela era como nadar contra uma correnteza forte demais para seus braços débeis e fracos.

— Bunduda, você tá me escutando?? — Jogou uma batata frita nela, que voltou à realidade por um segundo.

— Tô, claro. — E voltou seus olhar para o nada. Para um nada onde havia uma silhueta que não conseguia evitar correr seus olhos por cada partezinha enquanto era tomada pela sensação das mãos dela em sua cintura, apertando… A simples lembrança a fez suspirar.

— Então tudo bem se eu enterrar o corpo do cara que eu matei no seu quintal? — lançou torcendo a boca, para testar a veracidade de sua atenção.

— Claro, tudo ótimo. — Deu de ombros.

Agora três batatas atingiam em cheio a cara de Camila.

— Dinah!

— Não adianta nada vocês estarem brigadas se ignorando se tudo o que você faz é olhar pra lá. Parem com essa palhaçada e se acertem logo, vocês não sabem ficar brigadas, não é assim que se ignora alguém. — Revirou os olhos.

— Eu não to olhando, Dinah. — esticou as sobrancelhas por um momento olhando em direção a amiga.

— Ah, não, sou eu que tô, né? — questionou, vendo Camila nem se dar ao trabalho de responder enquanto olhava para a outra mesa novamente, fazendo a mais alta rolar os olhos em puro tédio novamente. E por estar prestando atenção exatamente naquele momento, notou quando a latina teve os olhos e rosto preenchidos com fúria assim que Sara apareceu dando um beijo no rosto da jogadora. — Desde quando você tem ciúmes de amigas? Tô me sentindo ofendida, nunca sentiu ciúmes de mim.

— Eu não tô com ciúmes! — Disse um pouco mais alto do que deveria. Nervosismo demais. Assim que Dinah arregalou os olhos fazendo um rendimento com as mãos ao ar, ela se recompôs e baixou o tom. — Não sei do que está falando.

Dinah soltou o ar pela boca com força, arqueando a cabeça para trás e de saco cheio. — Ok, então enquanto vocês competem pra ver quem falha mais miseravelmente em ignorar a outra, me responde: nem vai assistir o treino, né?

— Não, pedi pro Ale vir me buscar mais cedo. — disse, sem conseguir desfazer a cara de poucos amigos. “Sara, Sara… O que você quer com ela?”, pensou.

— Oolha, finalmente respondeu da primeira vez que eu perguntei. Temos um avanço aqui.

— Cala a boca. — Jogou uma batata de volta, tentando manter o humor estável, ainda que estivesse realmente difícil.

Sara enrolava com o dedo uma mecha de cabelo da capitã do time, já havia sentado a seu lado. Normani de certa forma agradecia o fato de Keana não estar ali com seus ciúmes e a morena finalmente estar parecendo distraída com alguma coisa que poderia ajudar, ou ao menos aliviar aquela agonia.

Normani comeu normalmente e Lauren continuou deixando o prato intacto, distraindo-se entre um comentário e outro entre as três. Explicavam a Sara algumas coisas de basquete que perguntava, mesmo que achassem que a garota não quisesse realmente saber e só estivesse perguntando para estender o assunto. De qualquer forma era louvável seu esforço, ao menos era uma companhia agradável.

Mas assim como uma onda se forma, quebra e se vai, aquele momento de esperança por calmaria acabou quando Lauren presenciou não muito longe de si as mãos dele envolvendo a cintura que quase podia sentir ainda em suas mãos, sem nem precisar fechar os olhos. Não tinha o menor direito, sabia, e isso a golpeava com um misto de raiva e tristeza ainda maior. Alessandro apertando seu mundo inteiro nos braços era um pouco demais com os últimos acontecimentos.

— Mani, vamos pro treino? — Quase implorou a morena, cortando Sara, que elogiava pela terceira vez seu desempenho no último jogo, virou-se para ela e completou. — Desculpa, a gente tá atrasada.

— Na verdade ainda temos tem… — Normani também foi interrompida pela amiga antes de concluir.

— Ainda temos que nos vestir, nos preparar, né? — Suplicava com os olhos, fazendo Normani olhar em direção a Camila e entrar no disfarce dela. Entendeu enfim que ela devia estar péssima, e nem precisaria ter visto Alessandro beijando Camila de forma desnecessária no meio do refeitório para perceber, bastava apenas olhar as duas esferas já vermelhas à sua frente.

Se despediram rapidamente de Sara e Lauren já sentia os olhos ardendo e o estômago queimando. Seria sempre assim? Talvez fosse porque estava recente. É, tinha que ser isso.

Camila tentava encerrar aquele beijo, tão carinhoso mas ao mesmo tempo tão desconfortável para a situação. — Amor, para, a gente tá no meio do refeitório. — arregalou os olhos disfarçando, não queria chamar atenção realmente.

Ele estreitou os olhos mas deu um pequeno sorriso concordando e se rendeu, ainda que Camila nunca tivesse se incomodado com aquela demonstração de afeto, respeitava sua posição, principalmente devido ao estranhamento que estavam tendo aquela semana. Abraçou-a de lado e beijou sua testa com carinho ainda sorrindo.

E a latina, que fazia força descomunal para não olhar mais naquela direção, deixou seus olhos vacilarem por última vez, se repreendendo ao encontrar a mesa vazia. O aperto dele em sua cintura, em um sinal típico de posse, a trouxe para uma realidade dolorida. Suas sobrancelhas contraídas exprimiam todo o descontentamento consigo mesma enquanto suspirava tentando expulsar aquela sensação completamente. Finalmente desviou a atenção para ele novamente.

Ela esqueceria seus errôneos desejos, só estava tudo muito recente.

E com esse pensamento, distraiu-se por toda a volta para casa, deixando que o silêncio se instalasse com sucesso no carro.

— Então — ele começou, deitado ao lado dela na cama apertada, começando a se ajeitar para que a deixasse abaixo de si —, temos ainda um tempinho antes de eu ir pra faculdade, que tal se a gente aproveitasse um pouco? — A beijou com ternura, Camila sentiu um nó em sua garganta enquanto ele continuava distribuindo beijos por seu pescoço e rosto. — Eu estou com tanta saudade, faz um tempinho que a gente não faz nada, né… — Mordeu o lóbulo de sua orelha, fazendo-a apertar os olhos, mas diferente do que ele pensava, não era por tesão.

— Ale, eu… — Ele alcançou seus lábios, impedindo sua fala, devagar. Ela correspondeu o beijo, numa tentativa falha de continuar todo aquele carinho. Havia tanto tempo que realmente não faziam nada, o que nunca aconteceu já que a busca por sexo sempre foi muito forte da parte dos dois, ainda que Alessandro sobressaísse naquele sentido.

Play Fallen - Gert Taberner

Ela não parecia estar ali, mesmo que só ela soubesse. Em alguns segundos que ele a beijava, Camila rompeu contato e sua cabeça — tão machucada por lembranças “indesejadas” — viu à sua frente outros lábios, olhos femininos e capazes de sugar sua alma. Seu delírio momentâneo aumentava a circulação em suas veias, quando puxou a cabeça dele de encontro a sua, degustando com vontade, maltratando sua boca.

Mas, assim que ele desceu sua boca para o pescoço fino e agitado dela, a ilusão se perdeu e ela voltava a realidade, manchando sua pele com rastros brilhosos que chegaram até a boca sedenta dele. Assim que Alessandro sentiu o salgado das lágrimas, olhou para ela, vendo os olhos cerrados e molhados.

Tell me things you never said out loud

Just try and go there if you can

(Me diga coisas que você nunca disse em voz alta

Apenas tente, vá lá se puder)

— O que houve, amor? Tá passando mal? Eu fiz algo errado? — assustou-se, começou a verificar sua temperatura, seus batimentos, ao que ela simplesmente pediu para que parasse.

Show me the parts of you

you're not that proud of

I want to know I'm just a man

(Mostre-me as partes de você

das quais você não se orgulha

Eu quero saber que sou apenas um homem)

— Só… Não estou me sentindo bem com isso. Ultimamente eu não tenho estado bem. Muita coisa e minha cabeça dói. — declarou enquanto limpava o rosto.

— Tudo bem. Me desculpa sempre insistir tanto, não perceber essas coisas. — disse um pouco frustrado, afastando-se para acalmar seu estado e deixar que Camila se recuperasse. Deitou a seu lado de barriga para cima, não podia negar que queria aquilo e nem se lembrava a última vez que fizeram sexo, mas não queria fazer nada com Camila estando mal. Ele apenas sabia que não era nada físico, o que não seria nenhum problema para si como quase médico. Mas o que fazer para resolver algo psicológico?

I'll have you know that I have good and bad days

Come on, now, love, don't be naive

Lay out our cards

and you'll see all my mistakes

(Quero que você saiba que tenho dias bons e ruins

Vamos agora, amor, não seja ingênuo

Coloque nossas cartas na mesa

e você verá todos os meus erros)

E com a dúvida em sua cabeça, ele foi embora quando decidiram que era melhor ela descansar e ele deixá-la sozinha por um tempo. Saiu de lá, como já estava virando costume nas últimas semanas, com todas as suas expectativas quebradas.

Horas mais tarde, o brilho lunar invadia a janela quase chutando Lauren nos olhos. Seu quarto ganhava o tipo de clima perfeito com aquela luz, ideal para relaxar e acalmar seu coração. Tomou um banho revigorante após o treino e como sempre caminhou com Keana até uma parte do caminho para casa, enquanto conversavam sobre o preconceito injusto e desmedido que Lucy e Verônica estavam sofrendo no colégio, mas claramente eram mais fortes que isso.

Ao chegar em casa, rumou para seu quarto a fim de não ter que escutar Mike reclamando outra vez sobre qualquer coisa, quando a imagem assombrosa do almoço já era torpor suficiente para um dia.

Entretanto, relaxar e tranquilizar-se foi tudo o que não conseguiu fazer quando já passava das nove da noite e ouviu aquele toque curto do celular. Seu coração disparou e igualmente deu um salto da cama segurando o aparelho nas mãos ao ler a notificação.

Camz te enviou uma mensagem: Você está aí? Eu só qu...”

Não conseguia nem ver a mensagem por completo e sua respiração descompassada a travou mirando o celular, logo jogou-o na cama sem saber o que fazer. Por que mandar uma mensagem quando ela mesma disse que queria se afastar, não ter contato nenhum?

When have I fallen

Am I crawling on my knees

(Quando eu caí?

Eu estou rastejando de joelhos?)

E ao mesmo tempo, a jogadora havia dito a si mesma que se afastaria, que Camila não merecia atenção já que foi o mesmo que fizera consigo. Mas faltava-lhe a coragem para se negar abrir aquela mensagem, para se negar saber o que a dona dos seus pensamentos poderia querer dizer àquela altura.

Here I'm calling

In the hope that you'll see me

(Aqui estou eu chamando

Na esperança de você me ver)

Mordeu os lábios com força, a ansiedade preenchendo até suas cutículas, o pulmão se tornava pequeno quando, tremendo, clicou temerosa naquela parte da tela permitindo que aparecesse o restante da mensagem.

Você está aí? Eu só queria saber se teve febre outra vez. Vi que você continuou treinando, não deve treinar se estiver se sentindo mal. Sei que seu pai praticamente te obriga, mas ele não está no colégio o tempo todo, você também precisa descansar”.

Apertou os olhos, com o coração pegando fogo e sendo banhado por indagações. O que ela queria afinal? O que era aquela tentativa de contato? Um jogo? Já estava sendo torturante o suficiente ter que aceitar tudo o que ela a impôs calada. E estava conseguindo. Estava. O que ela pretendia mandando mensagens? A cabeça dava nós e com o coração ainda magoado, respondeu mais do que julgou que ela merecia.

“Foi só aquele dia. Obrigada pelo remédio.”

Camila estava na esquina de sua casa após pegar um táxi num acesso de loucura, dando o endereço da morena e gastando um dinheiro que não tinha. Apenas ao chegar perto do casarão se deu conta daquela loucura e resolveu mandar uma mensagem, queria se certificar em que pé estavam.

This voice inside of me has lost its breath

It's far too tired to sing at ease

(Essa voz dentro de mim tem perdido o fôlego

Está muito cansada para cantar facilmente)

Não havia desgrudado os olhos da tela desde que mandara a mensagem, deu um forte suspiro fechando os olhos ao receber a resposta.

Ok, a jogadora estava magoada, já via o número para chamar outro taxi e voltar. Poderia ser obviamente uma resposta fria para qualquer pessoa. Mas era Lauren. Já sabia que aquilo era ainda pior vindo dela, se conheciam ao ponto de conversarem por entrelinhas, ainda que um assunto principal fosse a única coisa vista pelos demais. Engoliu em seco, refletindo toda a secura daquela resposta.

Arrependeu-se de ter cedido àquela vontade que reprimiu até que não pudesse mais. Tinha alguma força nela, que surgia de dentro para fora, que contaminava as coisas ao redor e gritava para que pudesse ter qualquer pedacinho de Lauren. Seus móveis, suas paredes, seus eletrônicos, o taxista, o caminho e agora a casa de Lauren, tudo parecia tomado por aquele desejo de incentivá-la.

Poderia pagar três viagens de ida e volta para lá novamente se recebesse um centavo por cada vez que abriu e fechou aquela janela de conversa até decidir finalmente deixar seus dedos correrem pelo telefone. Sua respiração sufocando.

Era assim que estava se sentindo com a ausência dela, mesmo em tão pouco tempo: sufocada por mil mãos invisíveis.

Abriu a boca um pouco mais buscando por ar, na trigésima vez que sentia os lábios dela nos seus com a simples e pura lembrança de um pecado seu. Ardia. Seus dedos praticamente ganharam vida própria e digitavam sozinhos: “sinto sua falta, Lauren”.

Não apertou o botão de “enviar”, ficou encarando a tela do celular como quem reúne forças para enfrentar o próprio discernimento. O canto de seus olhos derramando uma lágrima solitária por sabe-se lá qual vez só naquele dia.

All of the things I never said out loud

They will remain inside of me

(Todas as coisas que eu nunca disse em voz alta

Elas permanecerão dentro de mim)

Quando ela se sentia mal, Lauren era quem a fazia companhia, quem a distraía, quem, na mesma hora, largava tudo e se voltava para ela. E tudo que Camila precisava agora era daquele girassol, se voltando para ela novamente e lhe entregando calor em meio ao frio daquela tempestade que acontecia em seu interior.

A pele ardendo em brasa, lembrando de cada toque naquela praia, cada aperto e marca que aquelas mãos deixaram, com um simples beijo, em seu corpo. A respiração cortante que desejava estar de novo sentindo o ar que saía dela. Não, ela não queria, mas seu corpo, sua mente e sua alma não a davam alternativas.

Yeah and I've fallen

Yes, I'm crawling on my knees

(Sim e eu caí

Sim, eu estou rastejando de joelhos)

Lauren enviou uma mensagem entre sua covardia e inércia.

Lauren: Vou dormir, realmente preciso descansar. Até.

iceberg do Titanic congelaria menos. Teve certeza. Apagou o que havia escrito e aceitou que merecia toda aquela frieza. Afinal, diferente dela, Lauren só estava fazendo o que ela havia pedido.

Mais uma vez a errada na situação não era a outra. Ao menos ela admitia seus erros, mesmo que apenas para si. Porque reconhecer estar errado é o que nos torna mais fortes, ao mesmo tempo que tentar justificar nossos erros, nos enfraquece. Ela não se justificou, mas a fraqueza ainda morava dentro dela.

E, como todas as noites mais difíceis, ao chegar em casa e deitar em sua cama, colocou o álbum que havia ganhado de presente dela em um dia feliz, um dia que parecia tão distante do sofrimento que tinha hoje. Com aquela melodia do The 1975, conseguiu relaxar, até o momento no qual começou a sonhar com ela. Mas ao menos em seus sonhos, a realidade e os fatos não existiam, era o único lugar onde ela podia, sem receios, ser livre.

Yeah and I'm calling

Out in search of who we'll be

(Sim e eu estou chamando

Em busca de quem seremos)

Lauren não esperou por uma resposta. Estava magoada, principalmente quando a ânsia de vômito por recordar-se dela nos braços dele a atingia o estômago. Deixou o celular de lado, se cobrindo e deitando em cima daquele casaco envolto em seu travesseiro. Oh sim, ela podia estar sendo forte, mas não podia com tudo. Ninguém é totalmente forte. Ninguém é forte o tempo todo. E ela, com certeza, não era uma exceção a essa regra. Ainda mais sabendo que não tinha o menor direito de se sentir assim.

A cada folha tirada do calendário, os dias pareciam cada vez mais quentes, ainda que esfriasse a noite. Temperaturas essas inversamente proporcionais à relação de Camila e Alessandro. Ela tinha suas ardências internas ocultas cada vez mais latentes e ele, nos momentos em que coisas simples como pegar em sua mão já não estava sendo do mesmo jeito, martelava em sua cabeça o que poderia estar fazendo de errado, sentindo a distância entre os dois em uma crescente acelerada.

Ela vivia avoada, parecia chateada, em qualquer mundo menos ali, com ele. Enquanto ele estudava para as provas, vira e mexe a caneta em sua mão desenhava um ponto de interrogação na folha, queria saber o que fazer, algum caminho. De todas as vezes que tentava conversar descobria ainda mais que Camila era uma mestre das esquivas quando não estava dizendo que estava tudo bem. Talvez o problema fosse ele, talvez não. Talvez pudesse ter algo que a animasse. Mas mesmo a conhecendo por significativos anos, era difícil para si saber o que poderia transformar o humor da namorada. E por mais que a culpa caísse sobre si, ela não se abria com ele.

Tell me things you never said out loud

(Me diga coisas que você nunca disse em voz alta)

Desenhou mais uma interrogação antes de largar a caneta com certa força desmedida, esfregou o rosto com ambas as mãos e bufou, a matérias e as perguntas embaralhando sua cabeça. Nunca havia tido problemas assim no relacionamento antes. Não sabia mais o que fazer. Precisava de respostas, mas como as encontraria?

'Cause I want to know I'm just a man

(Porque eu quero saber que sou apenas um homem)

Fim da música

~

O grupinho conversava tão animadamente quanto um horário matinal permitia naquela cantina aconchegante do jeitinho que Sinu fazia questão de preparar todos os dias. Distribuía os pedidos de café tão necessários para expulsar o sono.

Ally dava uma rosquinha na boca do namorado recebendo um selinho carinhoso como agradecimento, enquanto Dinah e Normani imitavam os dois debochando do quanto eram grudentos, colocando a mão na boca para imitar um beijo exagerado, ao que os dois nem ligavam, adoravam ser exatamente como eram: uma bomba açucarada de amor.

Brad discutia com Keana sobre os preparativos do aniversário de Lauren mais como um monólogo no qual o garoto parecia falar sozinho, mesmo que animado. Keana olhava para a outra mesa onde Lucy e Vero sentavam há quilômetros de distância uma da outra, não por estarem brigadas, mas por haverem sido repreendidas duas vezes pelo inspetor a mando do diretor. “Estavam próximas demais, não toleramos um comportamento desviado desses”, disse o homem cuja função era cuidar dos interesses de seu superior. Os dois homens eram farinha do mesmo saco no final, dois preconceituosos que usavam do cargo de estagiária da enfermeira como pretexto para proibí-la de um contato romântico com uma aluna. Claro, fazia parte das regras do lugar, mas não eram as regras que os incentivava a fazerem isso e todos sabiam, já que um simples toque de mãos as colocava injustamente em apuros. A líder de torcida tomava suas dores, não apenas por ser lésbica, mas porque odiava injustiças e por todo o carinho que nutria por Lucy.

Camila havia chegado junto com a mãe, as bolsas enormes embaixo dos olhos — consequência de mais uma noite mal dormida — eram ocultadas pelos óculos escuros que, diga-se de passagem, não combinavam em nada com o rosto dela. Nunca tivera muito bom gosto para escolher óculos.

— Tia Sinu! — Ally chamou-a, gesticulando para a mulher que chegou sorrindo. — Traz um chocolate quente pra Lauren, por favor, daqui a pouco ela chega.

O coração de Camila tremeu só de ouvir aquele nome. Como se não bastasse sua cabeça repetindo aquela imagem a todo momento, sua pele arrepiava com o som do nome dela. Ela era mestre nisso mas admitia que nunca foi tão difícil ignorar alguma coisa.

Lauren estava em todo lugar, antes literalmente nas fotos pelos murais da escola recebendo prêmios, nos folhetos dos anúncios dos jogos e até em alguns recados anônimos românticos nas mesas das salas de aula. Até então, pontos de “fácil” esquiva. Mas a partir do momento que aquela voz rouca entrou por seus ouvidos, parecia ter impregnado seu interior, fazendo aquela cascata de cabelos negros, a pele alva e o perfume inebriante a perseguirem e moldarem todo seu sistema interno para lembrar a todo instante.

Sem que as outras pessoas pudessem ver, seus olhos não desgrudaram da entrada do lugar que dava acesso às primeiras mesas, mas para todos ela ainda permanecia na mesma posição largada, os braços cruzados em cima da mesa e a cabeça apoiada nos mesmos, facilmente diriam que ela dormia.

— Olha aí, ela chegou! — Brad anunciou ao ver a jogadora chegando em passos lentos. Os olhos fundos não a deixariam mentir, parecia que não era apenas Camila quem teve problemas para pregar os olhos, afinal. — Senta aqui do meu ladinho, minha princesa do basquete. Estamos falando sobre seu aniversário.

Lauren deu um bom dia juntando toda a pouca energia que nutria a todos, recebendo em uníssono um bom dia coletivo de volta.

Assim que tirou sua mochila do ombro, mal a pôs em cima da mesa e foi direto para perto do balcão abraçando Sinu com todas as forças, um gesto que já se tornara um hábito, não porque já estivessem no automático, mas porque faziam questão de cumprir. Haviam se aproximado tanto que a mais velha, principalmente por conhecer Mike e Clara do colégio, se pudesse, a adotaria. Camila, sorrateira, acompanhava seus movimentos minuciosamente, sentindo na pele como ardia não ter por perto aquele abraço ao se encontrarem, que também era um comum entre elas.

Fazia tanta falta. Engoliu a secura daquele pensamento frio, mordendo a bochecha por dentro.

Seria mentira dizer que a morena também não correu com seu canto dos olhos, astuta, para checar a figura de Camila. “Fica tão linda de óculos escuros.”, pensou, talvez fosse a única daquele lugar a pensar assim. Mas era verdade que estava cumprindo a risca o que concordou fazer, estava mantendo a distância. Abaixou os olhos soltando o ar.

Sem toques, sem olhares, sem conversas. Mas os pensamentos dela eram uma terra onde só ela poderia andar, poderia ser ou ter o que quisesse.

Em partes, isso ajudava Camila, afinal era o que disse que precisava. Mas o problema é que haviam outras partes dela, ignoradas, que desmentiam o esforço tamanho que fazia para se manter longe.

O jeito como as coisas sucederam fazia Lauren estar tão magoada que já até tinha obtido suas próprias motivações banhadas em lamentos para não pisar naquele paraíso particular chamado Camila Cabello.

A morena se preparava para se juntar aos amigos ao passo que Camila preferia fingir que estava dormindo, enquanto reparava em cada mínimo gesto da pele branca dela que parecia fundir-se à luz do sol. Tudo nela era tão lindo... E tão errado.

Brad levantou-se, com seu jeito descolado e malandro de sempre, puxando a cadeira a seu lado. — Senta aqui do meu ladinho, minha deusa do basquete. Vamos resolver os pontos finais da sua festa de aniversário. — Lauren apenas sentou-se sem se incomodar, era o jeito dele e já havia se acostumado. Já do outro lado da mesa, olhos castanhos por trás das lentes escuras reviraram, apesar de saber que ele era inofensivo. — Já está quase tudo pronto, chamei só a galera, como você queria, meu amigo DJ junto com a Dinah vão cuidar do som e as bebidas eu vou pegar no dia que meus pais viajarem. — Contou tudo com uma animação extra, gesticulando bizarramente como um personagem animado do jeito engraçado que sempre fazia.

— Isso, aí, branquela, DJ e DJ vão fazer a melhor seleção de músicas que os perdedores de Miami Sun School já viram. — Dinah contou vantagem, fazendo uma pose convencida e engraçada.

Brad levantou um dedo como quem indica que esqueceu de dizer algo. — E as gatinhas que quiserem entrar na piscina levem seus biquínis porque essa festa vai pegar fogooo! — Elevou o tom em excitação no final, batendo na mesa rápido com as mãos como se fosse um tambor, recebendo um esporro de Sinu e parando imediatamente. A mulher o fulminou com o olhos, os que Lauren conhecia bem por Camila haver herdado. O DNA de intimidação com um simples olhar foi transferido com sucesso.

— Ai, não fala em fogo, tô com trauma disso desde aquele Luau. — Todos riram, mas com a mão na consciência. Já sabiam que não tinha levado a nada demais, ninguém tinha se ferido gravemente. Keana não estava lá mas soube através de Ally o que havia acontecido com o menino que pegou fogo.

— Não só isso, aquela noite inteira foi traumática, vamos esquecer isso, pelo amor de nosso Senhor. — pediu Ally, recebendo um selinho de Troy em concordância.

Naquele momento, uma brecha nas lembranças sequestraram Lauren para os flashes daquela noite que recuperara conforme o tempo foi passando. E com a força de um ímã, Camila viu, ainda que a outra não soubesse, os verdes lascivos que encontrariam seus castanhos diretamente se não fossem pelas lentes escuras. Lauren, achando que Camila dormia, se deixou percorrer pelo rosto dela que parecia tão sereno, se afundando cada vez mais nos detalhes daquela pele que ficava tão macia entre seus dedos, na curva da boca que havia provado, no nariz tão bem feito que parecia um dos desenhos dela e os fios de cabelo espalhados pela mesa. Não, sua perfeição não poderia ser retratada com precisão em desenhos.

Camila fazia um esforço absurdo para não esboçar nenhuma reação, estava quase impossível controlar seu corpo já que aquele olhar acelerava sua respiração a cada movimento exploratório sobre si, impulsionando seu corpo a subir e descer freneticamente. Como podia ser tão profundamente forte? Ela estava a um passo de levantar dali e fazer uma besteira. Mais especificamente repetir uma “certa besteira”. E aquilo não parava de passar em sua cabeça. Observou a boca entreaberta da garota que fazia seu coração liberar explosões dentro do peito, os dentinhos da frente quase aparecendo completamente.

“Por que tinha que me olhar assim? Por que tinha que ser tão linda?”, pensou sentindo seus nervos quase cedendo.

— Lolo, bom dia! Bom dia, gente! — Sara surgiu de repente dando um beijo na bochecha de Lauren, deixando-a sem reação. Era inesperado, seus músculos congelaram.

Foi impossível Camila conter sua indignação com aquele apelido. “Como assim ‘Lolo’? Que intimidade era aquela?”. Aquele apelido era seu. Levantou-se de supetão, uma sobrancelha levantando por trás do óculos apertando o maxilar.

— Ué, não estava dormindo, bunduda? — Dinah perguntou. Ally, que observava Lauren há um tempo continuava calada apenas olhando.

— Parece que eu tive um pesadelo. — Um fio de voz, pigarreou tentando disfarçar, acompanhando a mão de Sara pousada no ombro da jogadora, da “sua Lolo”.

Não ter direito algum sobre a aquele sentimento a preenchia com um outro: a raiva. Poderia destilar a raiva sobre a situação ou sobre elas? Com certeza. Mas o que poderia ser maior que a raiva nutrida e direcionada a si mesma?

Queria não sentir, não desejar, praguejava-se a cada segundo, seus olhos acompanhando aquela interação que roubou a atenção de Lauren de si, fazendo seu estômago dar um nó e seu cérebro soltar faíscas quando Sara se aproximou um pouco mais da outra e disse que falaria com ela a noite para saber mais sobre o convite de sua festa. Bufou em busca de sanidade, pensar racionalmente estava fora de cogitação.

Ao passo que Sara preparava-se para levantar da cadeira, levando consigo seu recém chegado café, Camila sibilou uma desculpa qualquer para levantar-se e ir para a aula mais cedo. A simples presença de Lauren a desconfortava nas atuais conjecturas, podia não entender bem todos os seus próprios limites mas sabia que estava quase chegando a beira de um.

Ao contornar a mesa esbarrou no líquido quente intacto que a integrante do teatro do colégio segurava com delicadeza e o derrubou completamente. Completamente em cima dela.

Sara deu um grito de nervoso pelo susto e pela quentura, enquanto Camila colocou as mãos na boca e arregalou os olhos enquanto Ally estreitava os seus. Dinah riu escandalosamente e todos os outros ficaram sem reação com exceção de Normani, que suprimiu um riso e, colocando a mão na testa, abaixou a cabeça vendo que Lauren tinha a mesma reação que ela.

— Oh, meu Deus, eu sou muito desastrada, vou pedir outro pra você. Deixa eu te ajudar. — desculpou-se Camila, pegando um guardanapo e passando na mancha em sua calça, deixando o jeans cheio de pontinhos de papel rasgados e molhados.

— Não, para, tá ficando pior. Eu já estava indo, resolvo isso sozinha. Presta atenção da próxima vez. — Bufou irritadíssima e saiu pisando firme.

Camila tinha os lábios comprimidos em uma única linha, olhou uma última vez para todos e evitou Lauren, que também fazia força descomunal pra que seus músculos não a traíssem, não persistissem com aquela mania insuportável de se voltar única e exclusivamente para ela. Um instinto quase involuntário. — “Quase” porque a vontade existia, e como existia! — As duas quase se atraíram de novo a se encararem, mas à metade do caminho, algum sentimento que Camila não soube definir, como talvez o orgulho, falou mais alto, impedindo a completude daquele giro de cabeça. Apenas o dela.

Ally viu quando os verdes quase queimaram as costas da latina que no momento se distanciava cada vez mais.

A madeira da mesa ganhava novas marquinhas das unhas nervosas de Lauren que logo despediu-se também, deu um abraço apertado em Sinu, recebendo um beijo na testa e rumou para sua aula, não tinha mais clima para socializar. Acordou a noite inteira e seu maior desejo naquele momento era que o tempo passasse mais rápido para que pudesse descansar. Mal sabia que aquele dia ainda traria muitas emoções.

Só eu tô achando isso ridículo? — Dinah sussurrou baixo com Normani, revirando os olhos e surpreendendo por não ser ela mesma, em sua essência, e gritar aquilo aos quatro ventos. Fidelidade, principalmente a Camila, era para si inegociável. Normani olhou para os lados, já sabia que a loira falava sobre o afastamento de Camila e Lauren sem precisar de muitos detalhes.

— Eu espero que elas se acertem, mas nem ficam no mesmo ambiente. Complicado. — Normani deu de ombros olhando Lauren no canto dos olhos saindo dali, não entraria em detalhes porque jamais revelaria nenhum segredo de uma amiga, mesmo que fosse para outra. Também era uma das pessoas mais confiáveis que alguém poderia conhecer.

Mas aquela fala ficou rodando pela mente de Dinah, “nem ficam no mesmo ambiente”. Era isso, elas precisavam estar presentes no mesmo ambiente, sabia que eram como unha e carne e logo voltariam a se falar, só precisavam de uma oportunidade de se verem e conversarem. Sua cabeça começava a maquinar várias ideias quando as pessoas começaram a levantar e se despedirem, dirigindo-se às suas respectivas salas para aturar aulas que começariam em poucos minutos.

— Lauren? — Ela já estava no meio do caminho do portal que dava acesso aos corredores quando a voz masculina e familiar atingiu seus ouvidos. Virou-se e encontrou Alessandro terminando de correr até si. — Posso falar com você? — Se existisse qualquer possibilidade de ela gelar tudo ao redor com seu nervosismo, o prédio escolar já estaria em meio a uma nevasca.

— C-comigo? Não tá me confundindo? — gaguejou ainda que tentasse não aparentar preocupação. Será que Camila tinha contado sobre tudo? Ou sobre partes? Ou sobre algo? Nunca foi disso, mas naquele momento ela pensou seriamente em correr. Não tinha medo dele, mas não sabia nem ao menos em que pé estaria aquele assunto.

— Então, é sobre a Camila… — começou enquanto todos os músculos dela tensionavam. Estava diante do cara que era tudo o que ela gostaria de ser: o verdadeiro amor de Camila.

— Olha, não tenho nada pra te dizer sobre isso.

— Eu queria sua ajuda. — Arriscou, ignorando-a.

— Minha o que? — Elevou as sobrancelhas grossas. — Não tô entendendo.

— É que ela tem estado estranha comigo, distante, eu não sei o que fazer. Sempre nos demos bem mas ultimamente ela tem estado diferente e eu pensei que como vocês se aproximaram tanto e tão rápido, talvez você pudesse me dizer algo, alguma dica, não sei… Ela te contou algo recentemente? — Lauren deu um suspiro fechando os olhos e olhando para qualquer outra direção ao abrir. Aquilo não podia estar acontecendo. — Eu vejo o quanto vocês são amigas, por isso achei que pudesse me ajudar.

Aquilo estava acontecendo. E diferente de como já chegou algum dia imaginar que fosse, o sentimento real nunca seria o previsto.

Ela até podia ver um pouco do sofrimento de Camila agora através dos olhos desesperados dele. A culpa devia estar corroendo-a. Talvez não estivesse vendo o lado dela tanto quanto imaginou. E por um segundo se viu ali, naquele desespero, naquela dor. Mas já bastavam as suas. Já bastava ele ser quem era. Ela, de longe, não era a melhor pessoa para aquele pedido de ajuda. O que ela faria? Não fazia idéia do que estava acontecendo no relacionamento de “amor verdadeiro” deles e nem queria saber. Não podia nem ao menos se obrigar a ajudá-lo, porque de fato não queria e não conseguiria se obrigar a querer. Viu-se como Kate Nash cantando sua versão de “I’m not gonna teach your boyfriend how to dance with you”.

— Não posso fazer nada por você. — Direta e com o coração na mão, por dentro uma espécie de desespero. Não era por culpa, afinal eles não se conheciam o suficiente para tal sentimento, ela só não queria ter que dar conselhos para ajudar o namorado da garota por quem estava perdidamente apaixonada.

— Lauren, espera! — Gritou pegando seu pulso, ao que ela rapidamente puxou a mão de volta. Nunca havia dado aquela abertura.

— Eu não sou a pessoa pra te ajudar com Camila. Me deixa em paz. — E saiu novamente desaparecendo na porta da entrada. Aquilo já estava doendo o suficiente, não precisava de mais uma dor.

— Será que eu falei algo de errado? — sussurrou Alessandro consigo mesmo.

— Falando sozinho, nerd? — Dinah chegou, como sempre, zoando o universitário.

— Ultimamente, até acompanhado. — Falou sem vontade um pouco baixo demais. — O que você quer, Dinah? — Já estava chateado por não conseguir executar única ideia que lhe passou pela cabeça: falar com Lauren. Dinah não era uma opção porque estava sempre alheia a tudo, não o levava a sério e nunca o contava nada, talvez com Lauren tivesse mais chances mas percebeu que se enganou.

— Ih, nem vem com esse mal humor, parece a tua mulher.

— Como assim? Ela também está estranha com você? — A esperança nele havia brotado, o medo de ele mesmo ser o problema dela estava a um passo de sanado.

— Bom… — Suspirou fechando os olhos. — Deus sabe que eu estou contando por uma causa maior. — desculpou-se consigo mesma por comentar sobre aquilo, mesmo que não visse necessidade, não era “oh lá um grande segredo”, até porque as duas deixavam a situação bem clara para qualquer bom entendedor que estivesse no mesmo ambiente, ela só devia evitar ficar falando sobre por aí. — Desde que ela e Lauren brigaram ela tem estado insuportável! Aliás, todas as duas. Você não tem comparecido não, nerd? Porque tá difícil!

Alessandro ignorou sua piada totalmente, mesmo que lá em seu interior tivesse sido atingido por aquela constatação. Não, há um tempo eles não faziam nada que pudesse chegar perto de sexo.

— Não sabia que elas tinham brigado. — Coçou o queixo, a barba ralinha quase em tempo de refazer. — Nossa, Camila deve estar mal e preocupada com isso. Lauren não quis me ajudar e eu achei que tivesse feito algo de errado, quando na verdade é porque não estão se falando. Agora tudo faz sentido! — disse, mais para si mesmo que para ela.

— Bom, o fato é que elas estão nessa cólica anal e não vão se resolver enquanto não forem obrigadas a se falar. Então, eu, maravilhosa Dinah Jane — Apontou para si com um sorriso largo convencido. —, vou precisar de você para levá-la à festa da Lauren, o que ela já disse que não vai, mas ao menos é um lugar onde vão ser obrigadas a trocarem ao menos um cumprimento, Camila é muito legal pra não falar com a aniversariante.

— Mas e se ela só a cumprimentar mesmo?

— Ah, aquelas duas são unha e carne, é só elas dizerem um “oi” que voltam a se falar.

— Não sei se quero ir nessa festa. Você sabe que socializar não é pra mim. — disse entortando a boca e a loira rolou os olhos.

— Nerd, para de ser cólica anal igual a elas. E socializar é pra todos, você é que não pratica e daí vira esse bicho do mato tracinha de livro.

— Me insultar não vai te fazer ganhar carona pra festa, Dinah Jane. — A face debochada agora acompanhava os braços cruzados em seu peito, na camisa social. Era um milagre quando não usava aquele tipo de roupa. Dinah levou a mão ao peito e fez uma cara de indignação que o fez rir.

— Você está insinuando que eu estou me aproveitando desse plano inteiro pra ganhar uma carona pra festa?? — Ele assentiu com tédio. — Olha, sua capacidade de percepção está aumentando, parabéns à sua terapeuta. — Riu arteira.

Por fim, os dois entraram em um consenso, não era um plano mirabolante mas era uma tentativa. E dentre mais algumas zoações, Dinah despediu-se já atrasada, ao passo que Alessandro decidiu voltar para casa e começar a estudar, suas interrogações agora pareciam estar em processo de mudança para possíveis exclamações.

As aulas passaram como se fossem dias infinitos naquela manhã em Miami Sun School. O ponteiro do relógio parecia finalmente atender às expectativas na hora de todos se encontrarem para assistir ao treino das meninas, tanto do basquete, quanto da torcida.

Os pompons giravam no ar enquanto keana mostrava as mudanças na coreografia daquela temporada, o espaço ao fundo da quadra contava com toda a equipe de torcida, inclusive Ally, que acenava para Troy sentado no lugar de sempre da arquibancada.

Simon estava incrivelmente de bom humor, as meninas se olhavam estranhando, tendo um diálogo de perguntas silenciosas sobre o porquê daquele fator. A resposta veio para Lauren enquanto saía do vestiário, como sempre por último, com seus cabelos úmidos pós banho exalando um aroma tão característico seu que era reconhecível a metros de distância, mesmo naquela quadra vazia. Ou quase vazia.

— Preciso falar com você. — chamou-a, a voz conhecida por fazer seus pelos se arrepiarem sendo bem sucedida naquela missão, travando-a no meio da quadra. Observou Camila guardar seus materiais de desenho e ir até ela parando a uma distância segura.

— Ah, agora você quer falar? — bufou, fazendo Camila notar aquela mágoa ali presente não só naqueles olhos que evitava encarar, mas em seu tom de voz comumente rouco. — Vai direto ao assunto que eu tô com pressa.

Suspirou e não se conteve. — Por quê? Vai encontrar com a sua nova amiguinha? — Quando viu, já tinha dito e Lauren estreitou os olhos.

— E se for? Não lembro de ser da sua conta. — A latina engoliu em seco, mereceu aquela resposta. Não tinha o direito de saber se Lauren não quisesse contar. — Fala o que tem pra dizer. — Estava irredutível, construindo muros para que os castanhos dela não a derrubasse.

— Olha… — Comprimiu a boca, fazia muito isso quando estava nervosa. — Minha mãe te convidou pra um jantar lá em casa.

— Quer saber qual desculpa inventar pra ela? Sei lá, diz qualquer coisa, que eu to passando mal, não sei. Não vai precisar ver minha cara, não se preocupa.

A mais nova enxergou que a chateação naquela voz tinha uma cobertura de razão. Encheu seu peito se preparando para aquela conversa. Havia pensado tanto, tentado tanto, se esforçado tanto para se manter afastada. Mas isso tudo a troco de que? Se sentia cada vez mais machucada e agora, diante daqueles olhos verdes que desmanchavam mágoa, via que a dor só aumentava sua proporção. Tinha que haver um jeito de elas ao menos se falarem e estarem em paz, seguras, mesmo que Camila não acreditasse muito nisso.

— Lauren…Eu sei que fui um pouco dura com você. — Lauren a olhou indignada. “Um pouco?”, pensou. E como se Camila pudesse lê-la, o que realmente acontecia de forma natural, continuou. — Ok, eu fui muito dura. Desnecessária. Eu admito que não sei o que fazer, eu tô muito confusa, chateada. Chateada com tudo.

E como se voltassem a uma linha egoísta onde apenas Camila expressava seus sentimentos, anulando completamente os de Lauren, a jogadora havia armado algumas barreiras.

— Eu não estou com tempo pra isso de novo, Camila. — Engoliu a parte de si que se alegrava vergonhosamente com a chance de poder ao menos trocar algumas frases com ela. Como podia trair-se dentro de si mesma o tempo todo daquela forma?

Play Thinking about you - Jessie Ware

Virou-se para caminhar em direção a saída quando seus músculos travaram, da forma como quando estava prestes a fazer um crossover, por aquele calor atingir seu pulso com delicadeza intensa. Olhou para mão macia da latina circulando sua mão como uma raiz crescida ao redor dela, prendendo sua respiração antes de tornar a olhá-la. Uma disputa interna entre a sensação eletrizante de adrenalina em seu corpo e sua mente lhe dizendo para ser rude e sair dali antes que se magoasse ainda mais.

You won't see me crying

Crying over you

And you don't see me falling

Even baby when I'm falling for two

(Você não vai me ver chorando

Chorando por você

E você não me vê caindo

Até quando estou caindo por dois)

Ela temia aquele olhar castanho que encarava à sua frente, capaz de lhe sugar as forças, fizesse exatamente o que frequentemente ele conseguia: tudo. Suas pernas bambas iguais a gelatina diet que comeu no café da manhã lhe fizeram aplicar um pouco mais de atenção a elas para que permanecessem firmes na tarefa de sustentar seus corpo de pé.

A mão dela não abandonou seu pulso enquanto dava mais um passo à frente, encurtando sua distância um pouco mais. As duas esferas cor de gota de água em madeira não desgrudavam daquele mar cor de ágata polida, encarando o silêncio que as rondava, confortável até, em detrimento da tensão que sentiam por si só.

Sometimes it's hard to see you're not watching me

When I want you to

And don't you know I'm dying

Just to spend a little more time with you

(Às vezes é difícil ver que você não está me observando

Quando eu quero que você observe

E você não sabe que estou morrendo

Apenas para passar um pouco mais de tempo com você?)

Camila com certeza tomaria bomba se as provas contivessem matérias apenas das aula daquele dia. Passou o tempo inteiro pensando na desculpa que daria à mãe quando a mesma pediu para que convidasse Lauren para o jantar especial que daria para Simon. Sua mente, ao invés de desculpas, viajou em atos de rebeldia para todas as possíveis cenas da jogadora ao seu lado.

Baby I'm yours, all of the time

I know that you'll never see

I'm thinking 'bout you

(Baby, eu sou sua, o tempo todo

Eu sei que você nunca verá

Estou pensando em você)

— Quero que vá ao jantar. — Camila sibilou em um fio de voz, não por ter dúvidas sobre aquela afirmativa, oh, não, ela estava sendo sincera como em poucas vezes naqueles últimos dias, mas algo dentro dela tinha medo de encarar o borbulho que seu estômago começava a criar quando estavam próximas. Lauren mal podia acreditar naquela mudança de estado e, novamente, como se tivesse seus pensamentos completamente lidos, Camila tentou esconder-se novamente atrás de constatações verdadeiras, porém não pertinentes. — Minha mãe quer muito que você vá, esse jantar é importante pra ela, você é importante pra ela. — “E ainda mais para mim”, ocultou.

Seria mentira dizer que Lauren conseguiria negar alguma coisa àquele rosto parecendo porcelana bronzeada, mas preferiu convencer-se que sim. Já Sinu, era outra história. Não poderia negar um pedido àquela mulher, não se sentia nem no direito e, se parasse para pensar, não haveria motivo suficiente para não ir. Mas ainda não estava convencida, perdia-se nos pensamentos mirando o nada de forma tão profunda que não notou que Camila estava cada vez mais perto e sua sanidade mais longe.

Just can't give you up

I don't wanna sleep, I don't wanna leave, I don't want a way out

(Simplesmente não posso desistir de você

Eu não quero dormir, não quero ir embora, não quero uma saída)

O ar começava a parecer rarefeito quando seus olhos já não encontravam tanta distância ao travarem uma batalha silenciosa e o peito de ambas arfava em movimentos contidos por um esforço descomunal a fim de não demonstrar fraquezas. Mas, pobres almas, aquelas “fraquezas” percorriam seus corpos como choques eletrizando todo o interior. Tem coisas que simplesmente não podem ser escondidas, não se pode tapar o Sol com um só dedo.

Camila iniciou uma carícia com o polegar no braço da mais velha enquanto sua outra mão subia inconsciente até o rosto dela. O coração acelerava e a pele de ambas parecia queimar.

I just wanna feel every little beat when I'm thinking 'bout you

(Eu só quero sentir cada pequena batida quando penso em você)

Lauren juntou as sobrancelhas em uma expressão de quase dor ao toque daquela mão quente acariciando sua bochecha devagar. Viajou no tempo e espaço enquanto um calafrio interno tomava conta de seu estômago e ia subindo devagar. Os olhos descendo de sua íris para sua boca num gesto reflexivo ao que ela mesma fazia agora, a fez errar uma batida. Suas bocas quase podiam sentir que se reconheceriam a qualquer momento. Por Deus, o que estava acontecendo?

— Por favor. — sussurrou baixinho, se afastando minimamente devido a proximidade que estavam, era o suficiente para ser ouvida. Mas Lauren não entendeu, já estava fora de órbita e se não fosse por ela ter continuado, poderia levar aquele pedido como qualquer coisa. E àquela altura ela diria sim a qualquer coisa. “Trouxa”, pensaria sobre si mesma se pudesse raciocinar. — Por favor, vá ao jantar.

Camila precisou engolir em seco duas vezes e usar tudo de si para conseguir afastar-se um pouco mais dela devagar, fazendo-a pensar com seu próprio cérebro e talvez pronunciar uma ou duas palavras de forma conexa, mesmo que lamentasse a ausência de sua mão que poderia facilmente morar em sua bochecha.

Maybe I get lost sometimes

You're the only thing on my mind

(Talvez eu tenha me perdido às vezes

Você é a única em minha mente)

— Tá bom... Eu vou. — A latina ouviu aquilo e transformou sua expressão ainda levemente aérea para um crescente sorriso. — Pela sua mãe, eu vou. — Lauren quis deixar claro.

Camila acenou positivamente, entendia que não era de uma hora para outra que ficariam bem, mas qualquer meia forma de estarem em um clima mais pacífico já seria melhor que aquela tortura a qual as submeteu.

Após Camila informar o horário do tão importante jantar que Sinu faria para introduzir — em um âmbito mais pessoal — Simon na vida das duas meninas que chamava de filhas, a despedida não aconteceu convencionalmente, apesar de Lauren estar completamente balançada e não poderia negar, apenas virou-se e saiu andando, não queria passar dos limites, não queria perder o controle e mostrar o que um sorriso de Camila era capaz de fazer.

Fim da música

Horas mais tarde, Camila terminou de colocar o último prato na mesa, estava impecável, apesar de estarem um pouco atrasadas e não ter dado tempo de prepararem as bebidas, que ficariam para depois. O cheiro da comida maravilhosa de Sinu já dominava toda a cozinha e a pequena sala da casa Cabello, a matriarca comentou o fato enquanto a filha concordava e pensava em uma morena de olhos verdes que também ficaria louca ao senti-lo.

E como sempre, aquela conexão entre as duas indicou no visor do telefone que a morena também estava pensando nela, ao menos era o que gostava de imaginar. Deu um suspiro e mordeu o lábio inferior antes de atender. A voz de Lauren parecia um pouco afobada, como quem deu uma leve corrida. O que era verdade, Camila ainda só não entendia o porquê.

— Camila — resfolegou. —, preciso da sua ajuda.

E ela ajudaria, não importa o que fosse, ela seria como os girassóis na ausência da luz.

Março de 2019

        

Play Most of Us Are Strangers - Seafret

Aquela pilha de papéis agora distribuídos à sua frente se assemelhavam no conteúdo da tinta que os manchava artisticamente. Em cada um, diversos pontos diferentes da mesma praia, o mesmo céu, o mesmo mar e a mesma silhueta feminina pintada como uma sombra em meio ao paraíso, uma recompensa divina em um único tom, se destacando do colorido ao redor, como um inalcançável vazio sem cor banhado por um cenário de esperança policromática.

Camila os uniu em uma só pilha novamente e guardou naquela gaveta do antigo armário na lavanderia, trancando como sempre. Suspirou aquela nostalgia e foi preparar-se para sair. Deixou todos aqueles pensamentos descansarem no lugar pra onde já estavam acostumados a serem lançados.

Acts tough but she's struggling

Camouflage but it's wearing thin

I think she's going under

(Finge ser forte, mas ela está sofrendo

Camufla, mas está se esgotando

Eu acho que ela está afundando)

Há poucos quilômetros dali, Lauren abria a porta do que seria seu novo empreendimento e dava espaço para que Halsey pudesse entrar. Gostava do jeito que a mulher parecia super à vontade com a sua companhia, era fácil gostar dela, muito fácil.

Ligou as luzes do salão principal e acompanhou a loira com os olhos, mantendo uma distância suficiente para não invadir seu espaço pessoal enquanto ela vasculhava e elogiava a vibe do lugar. E no terceiro elogio sobre o bom gosto de Lauren para a decoração e iluminação, Halsey estava perto. Perto o suficiente para olhá-la sob aquela luz que a deixava tão linda.

Lauren sabia o que aconteceria e, de certa forma ela esperava por isso, se deixou tentar ser merecedora daquilo que há tanto tempo se privava. A loira colocou uma das mãos em sua nuca e a beijou calmamente, ao que Lauren correspondeu levando suas mãos à cintura dela, aprofundando o beijo um pouco mais. Se perderam alguns minutos assim, até pararem e Halsey puxá-la para que mostrasse o restante do lugar, deixando claro que aquela área ali já era sua favorita.

Dancing through the night in electric light

Wishing it could be this way forever

(Dançando à noite através da luz elétrica

Desejando que isso pudesse ser assim pra sempre)

— E aquele é o quadro? — A escritora apontou para o quadro no chão depois que Lauren a apresentou seu escritório.

— Sim… Mas não quero mexer nisso agora, tudo bem? — questionou Lauren, tentando fugir daquilo, estava tudo indo tão bem finalmente, não queria que aquele indício de paz acabasse.

— Então, parece que eu vou ter que vir aqui de novo outro dia, né. — Disse brincalhona elevando os braços, insinuando um novo encontro. — Isso, se você quiser. — Lauren sorria sobre o quanto ela deixava as coisas mais leves com seu bom humor. — Claro, só pra ajudar, claro. — Lauren riu alto dessa vez com o falso cinismo dela e a olhou com esperança. Esperança de que algo pudesse começar, de que algo pudesse dar certo.

Era ansiosa, não podia negar e culpava seu signo por estar pensando em tudo o que poderia acontecer em um relacionamento entre as duas quando ainda só tinham dado o primeiro beijo. Seu coração estava calmo, algo tão raro ultimamente.

— Claro, claro. Você só ajudar, sem segundas intenções, né? — brincou em ironia e Halsey fez a expressão mais inocente que pôde, fechando olhos para concordar. Quando os abriu, Lauren já estava perto o suficiente novamente. — Então pode me ajudar com uma outra coisinha agora? — disse e não precisou de uma resposta verbal quando encostou sua boca à dela novamente.

Most of us are strangers

Who want someone to save us

We're looking out for angels

And something we can hold on

(A maioria de nós somos estranhos

Que querem ter alguém para os salvar

Estamos procurando por anjos

E algo no qual podemos nos apoiar)

A noite estava particularmente fria para um típico morador de Miami que aos 17º já encontrava um motivo para se agasalhar. E era assim que andavam pela avenida, Alessandro e Camila, como todo mês. Combinavam que ao menos uma noite por mês sairiam juntos, mesmo que nem sempre conseguissem cumprir aquela meta já que o trabalho de Alessandro o tomava mais horas e energias do que Camila gostaria.

De mãos dadas, em uma rua menos movimentada agora, a baixa iluminação permitia a visão parcial das pessoas que passavam apressadas, alguns mais, outros menos. Estavam a caminho da praça onde havia o restaurante que comumente iam jantar nas vezes que saíam. Alessandro via algo em seu celular e Camila começava a divagar sobre o que estavam sentindo cada um ali, o que estariam pensando, para onde estariam indo.

I see you start to move and then I watch you freeze

(Eu vejo você começar a se mexer e depois, congelar)

E foi assim que seus olhos, num relance que precisou de uma segunda olhada, viu aquela silhueta tão familiar, tão conhecida por suas mãos num passado distante e num presente tão recente em seus desenhos. Acompanhou com o olhar até perder aquele rosto tão injustamente mal iluminado na calçada do outro lado da rua. Lauren caminhava com as mãos no bolso, provavelmente pelo frio. Ela sorria de algo que a pessoa a seu lado havia dito, a qual Camila não conseguiu enxergar pela penumbra.

We hear sirens and suffer in the silence

Getting tired of trying and tired of being alone, oh

(Nós ouvimos sirenes e sofremos no silêncio

Ficando cansados de tentar e cansados de estar sozinhos, oh)

— Você está bem? — Camila se virou para ele e assentiu devagar. — Parece que viu um fantasma. — O tranquilizou com um meio sorriso apertando sua mão de leve.

Assim que Alessandro recuperou o olhar da noiva para si com aquela pergunta, Lauren, ainda andando, parecia ter sido atingida por uma descarga elétrica que rompeu sua caminhada.

I don't wanna lose you, I need you with me

I don't want to sit and watch history repeat

(Eu não quero te perder, eu preciso de você comigo

E não quero sentar e ver a história se repetir)

Um sentimento, confuso e conhecido ao mesmo tempo, a tomava. Uma força inexplicável a puxava para virar-se. Quando o fez, encontrou a rua vazia naquela área, apenas um casal acabava de dobrar a esquina saindo rapidamente de seu campo de visão. Balançou a cabeça afastando o que quer que fosse aquilo e deu uma pequena corridinha para alcançar Halsey que havia parado para esperá-la.

Halsey estendeu a mão esquerda e buscou a direita de Lauren em seu bolso, retirando-a de lá e apertando com a dela. — Pronto, agora se você parar pra devanear de novo, paramos juntas. — Sorriu gentil, fazendo a estranheza recente no interior de Lauren dar um espacinho para aquela sensação gostosa que o carinho da loira lhe trazia.

Dancing through the night in electric light

Wishing it could be this way forever

You don't have to hide, I'll be by your side

Always better when we do it together

(Dançando à noite através da luz elétrica

Desejando que isso fosse assim pra sempre

Você não precisa esconder, eu estarei ao seu lado

É sempre melhor quando fazemos isso juntos)

Horas mais tarde, Camila saiu do quarto, deixando para trás os roncos leves de Alessandro e foi até a lavanderia. Ficou lá desenhando por um tempo, era o que fazia algumas vezes quando não conseguia dormir, nunca havia deixado aquele costume. E realmente não havia conseguido pregar os olhos por mais que tentasse, mas precisava voltar antes que sua inseparável taça de vinho continuasse crescendo seu efeito.

Colocou o desenho finalizado junto aos outros, observando uma última vez, os mesmo elementos, mas dessa vez o cenário era uma rua quase deserta, à meia luz. E a silhueta permanecia vazia, com a exceção de um sorriso, um que sabia ser capaz de iluminar todo o quarteirão, se quisesse.

I want to see you smiling

Come on tell me how it really is

I'm sick of keeping up appearances

Don't tell me you've stopped fighting

(Eu quero te ver sorrindo

Vamos, me diga como realmente é

Estou cansando de manter as aparências

Não me diga que você parou de lutar)

Suspirou uma última vez, o cansaço finalmente a alcançando quando guardou seu mais recente desenho junto aos outros. Aquela cena havia ficado repetindo em sua memória, em looping. Começou a pensar que talvez Alessandro tivesse razão, talvez tivesse realmente visto um fantasma. E por mais que pudesse ser assustador, era o fantasma com o sorriso mais lindo do mundo.


Notas Finais


Eaí, o que acharam? ME DIGAM PORQUE EU ADORO SABER!! Lavem as mãos, não saiam de casa, só pra reforçar. Quero agradecer ao meu amigo Gui, botânico maravilhoso que me deu a info sobre os girassóis na ausência do sol
Se vcs quiserem dar uma força para fics que estão começando agora, como sempre, eu indico algumas aqui e agora é essa minha one shot:
• Rewrite History, que tá no meu perfil aqui
Me procurem la no Tt ou no Ig: @shegayaqui e @sheniasoilho


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