Sentei no chão, observando as fotografias espalhadas pelo carpete. A maioria são dos meus lugares favoritos de Madrid, mas há algumas especiais. O Elyaz treinando em um canto do jardim. A minha mãe sorrindo enquanto observa as gotas de chuva que descem pela janela da cozinha. Nanda pulando em uma montanha de folhas secas. As mãos de Analu percorrendo o papel com lápis para fazer um vestido lindo. Laura de fones de ouvido, parecendo estar em outro lugar.
Sinto paz ao ver esses momentos que capturei com a minha câmera. Nenhum deles sabia que estavam sendo fotografado e provavelmente nunca verão essas fotos, mas sei que vou guardar para sempre. São pessoas que amo, fazendo o que gostam.
Sei que está faltando o meu pai, os meus outros irmãos, o Marco, mas não os vi durante as últimas semanas. Obviamente, Enzo, Luca e Théo estão fora do país. O meu pai está cada vez mais ocupado com o Real Madrid. Os treinos, viagens, jogos, reuniões e coletivas de imprensa o impedem de ficar muito tempo em casa. E Marco, bem, nós continuamos juntos.
Depois do vídeo ter sido vazado, ele precisou enfrentar toda a diretoria do Real Madrid, os seus patrocinadores e a imprensa que estava faminta por novidades. Felizmente, nada afetou o contrato dele e a briga foi esclarecida como um desentendimento entre amigos, já que reconheceram o Gabriel como o outro homem.
O meu pai pensa que Marco o atacou por ciúmes da nossa amizade. Eu quis desmentir, contar a verdade, mas Analu me aconselhou a não fazer isso. Poderia piorar a minha relação com ele e ainda revelar que saímos naquela noite.
A única coisa boa em toda essa confusão é que não preciso ver o Gabriel. Ele pediu demissão e deve estar em um avião de volta para Sevilha.
-Querida? -Véronique bate na porta. -Está aí?
Junto as fotos com rapidez e escondo embaixo da cama.
-Sim. -levanto-me para abrir a porta.
-Trouxe um chá. -ela estende uma bandeja com uma xícara, um bule e biscoitos. -Você parece estressada.
Sentei na cama enquanto ela serve o chá.
-Conversei com o seu pai hoje de manhã. -ela me entrega a xícara. -Contei a ele que o Gabriel te assediou, por isso o Marco foi atrás dele.
-Mãe! -exclamei surpresa.
-Não se preocupe, ele acreditou. -ela sorri culpada. -Não posso deixar o Marco levar a culpa por ter te defendido. Ele é um bom rapaz.
-Pena que o papai não enxergue isso. -suspiro cansada.
-Acho que está na hora de vocês conversarem. -Véronique se levanta. -Estou cansada de ver vocês se tratando como estranhos, precisam ser sinceros.
-Não sei mais o que falar para convencê-lo de que o Marco é bom pra mim.
-Sei que vai pensar em alguma coisa. -ela sorri antes de fechar a porta.
Termino o chá e desço para a sala de estar para esperar o meu pai. Ele prometeu que estaria aqui para o jantar e é uma boa oportunidade de conversarmos. Não faço ideia do que dizer, mas estou cansada dessa situação.
-Querida? -Zidane chamou ao entrar em casa.
-Pai! -corri até o hall.
Ele parece surpreso com a recepção.
-Precisamos conversar.
-Vamos para o meu escritório. -ele faz um sinal.
Sigo pelo corredor até o cômodo que sempre está trancado. Sento-me de frente para a mesa e espero Zidane se acomodar. Ficamos um tempo em silêncio. Organizo os meus pensamentos, tentando iniciar a conversa.
-Sua mãe me contou sobre o Gabriel. -ele começa. -Gostaria que você tivesse falado comigo.
-Você não teria acreditado em mim. -sorri sem graça.
-Sinto muito que pense assim. -ele entrelaça os dedos. -Sempre deixei claro que estaria ao seu lado.
-Acho que o senhor deixou isso de lado nas últimas semanas.
-Catarina não vamos entrar nesse assunto de novo. -ele se recosta na cadeira.
-Pai, eu te amo. -disse da forma mais sincera que consegui. -E eu sempre vou te amar e respeitar e quero que faça o mesmo por mim. Eu gosto do Marco. -ele se mexe de maneira desconfortável. -E ele nunca deu motivo para te deixar preocupado. Muito pelo contrário, ele esteve comigo, me defendendo de qualquer coisa que pudesse me fazer mal.
-Querida, ele é mais velho, tem outra cabeça. Não quero que você se machuque.
-Por favor pai. -pedi baixo e com o desespero crescendo na voz. -Eu não quero mais viver nessa situação. Eu amo o Marco.
Ele fica branco.
-Você...o que?
Sinto o coração batendo mais rápido, quase saltando meu peito. Não acredito que estou me expondo desse jeito para o meu pai. Nem Analu ou a minha mãe sabem disso. É algo que estava guardando até ver o Marco e dizer pessoalmente.
Não sei em qual momento percebi que o amava. Eu simplesmente soube que faria de tudo por ele. Aguentaria o meu pai, os dias sem o ver, críticas e o que mais vier para atrapalhar a nossa relação. A felicidade e o bem estar dele é o que me importa.
E o melhor é que acho que ele sente o mesmo sobre mim.
-Eu amo o Marco. -repeti com convicção.
-Catarina, isso não pode ser real. -ele balança a cabeça como se não acredita-se. -Você é muito jovem, mal o conhece.
-Pai, eu tenho certeza do que sinto. -falei.
Ele permanece em silêncio pelo que parece uma eternidade.
-Não posso aceitar isso. -Zidane aperta as mãos. -Querida, não consigo aceitar isso. Sei que tem dezoito anos, mas preciso te proteger. Marco é um bom jogador, no campo e fora dele. A minha decisão não irá mudar. Eu sinto muito.
O choro ficou preso na minha garganta. Essa foi a minha última tentativa, o resto de esperança que eu possuía. A verdade me atinge no peito. O meu pai nunca vai aceitar o Marco. Não importa o que eu diga, o que faça ou o que sinta. Para ele, Marco está se aproveitando da minha “inocência”.
Levanto-me da cadeira e sai da sala sem dizer nada. Zidane gritou o meu nome, mas ignorei o chamado. Passei pelo hall e saí de casa, batendo a porta com um pouco mais de força do que o necessário.
-Senhorita Catarina? -Vitto, o motorista da família me chama.
Passo reto como se não o visse. Preciso ficar sozinha, longe daquela casa e do meu pai.
Minhas pernas me guiam pelas ruas, fazendo um caminho que está gravado na minha mente a anos. Em vinte minutos, cheguei ao Parque de Buen Retiro, o mais importante de Madrid. Quando pequena, vinha aqui com os meus pais e os meus irmãos para andar de pedalinho, fazer piqueniques e brincar de bola. Por um tempo, desisti desses passeios. Pensei que estava crescida demais para sanduíches e momentos em família. Mas agora, esse é o lugar em que gosto de vir para pensar. De certa forma, sinto-me feliz por estar aqui. Traz um sentimento de nostalgia.
Caminho por alguns minutos até chegar a escadaria de pedra em frente ao lago. Está cheio de turistas, distraídos com suas câmeras ou passeando nos barquinhos. Sento-me em um dos degraus, tentando ignorar alguns olhares de reconhecimento que caem sobre mim. Eu não preciso de ninguém me lembrando de que sou Catarina Zidane.
Apoio a cabeça nas mãos e solto um suspiro longo e audível.
O que eu faço agora?
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