Escrita por: anacsiilvaa
- O que foi tão mau assim?
Suspiro, virando o rosto para encarar o Josh. Os seus olhos fixam-se nos meus como se não percebesse o propósito da pergunta.
- Tudo. Os balões, o tema, as... tangas.
- É apenas um ambiente diferente, para variar um pouco. - Pressionando os lábios, viro-me preguiçosamente para ficar de frente para ele. - As pessoas gostaram. Não é isso que importa?
- O que eu sinto não importa?
- Gostas de dinheiro, o tema gera mais dinheiro. Combinação perfeita. - Encolho ligeiramente os ombros. - E é apenas por uma semana.
Ele prepara-se para rebater quando a campainha soa alto no apartamento silencioso, fazendo com que a Cookie solte um latido na outra divisão e consecutivamente faça a minha cabeça latejar ainda mais.
Eventualmente teria que me levantar e reunir forças para mais um dia de trabalho. Eu só não precisava da campainha. .
- Estás à espera de alguém?
- Parece-te que estou? - Afasto o lençol e saio da cama.
Pego no robe pendurado atrás da porta do quarto e visto-o no caminho até à porta para poder receber quem quer que esteja aqui a esta hora.
A campainha soa novamente.
- Já vai!
- Bom dia. Acordei-te?
Ergo o olhar, sendo completamente apanhada de surpresa com a presença dele aqui. Agora.
- Não, eu já estava acordada. O que fazes aqui? - Pergunto sem rodeios.
- Vim entregar uma coisa ao Enzo. Ele disse-me que podia passar por aqui a qualquer hora mas aparentemente não está em casa. - Explica apontando para a porta atrás de si. - Tentei ligar-lhe mas não...
- Posso tomar um banho?
Os seus olhos desviam-se dos meus quando a voz do Josh interrompe a nossa conversa e eu sigo a sua atenção até ao homem de roupa interior que atravessa a sala sem mesmo se importar com quem possa estar à porta.
Ele apenas entra na casa de banho e segue a sua vida, deixando-me com a tarefa de resolver este momento um tanto constrangedor.
- Desculpa. Não sabia que tinhas companhia. - O Harry dá um passo atrás quando percebe que interrompeu algo.
Tento encara-lo mas, por alguma razão não consigo, então foco-me na porta do apartamento do Enzo.
- Ele deve estar a dormir mas se fores barulhento o suficiente, acaba por acordar.
- Ok. Obrigado.
No momento em que vira as costas, fecho a porta sem dizer mais nada e esboço uma careta para mim mesma.
Isto foi estranho.
Muito, muito estranho.
É como se sentisse culpa por deixa-lo saber que estou com alguém, o que não faz qualquer sentido. Eu não tenho que sentir qualquer culpa por seguir em frente assim como ele fez com a Beatrice.
É o que as pessoas que já não estão juntas fazem. Seguem em frente.
Aproximo-me da bancada e preparo o café antes de sentar-me para o tomar enquanto espero que o Josh termine o banho.
Logo após o Josh sair de casa, o Enzo invade-a com novidades sobre o planeamento do seu dia dos namorados.
Aparentemente, o Harry conseguiu uma reserva no restaurante favorito da Verónica e onde, surpreendentemente, o Enzo não conhece ninguém que o pudesse ajudar com isso.
Embora ainda com a cabeça a latejar, ouço-o com toda a atenção, mesmo quando na maior parte da conversa elogia o Harry por tê-lo ajudado.
Graças a isso, cheguei bastante atrasada ao trabalho, justamente no dia do regresso do Wally.
Não que isso tenha sido um problema para ele. No momento em que me sentei na cadeira, começou a mostrar-me os portefólios dos artistas que mais gostou para que possamos tomar uma decisão sobre a próxima exposição.
- Ela é muito boa. Muito, muito boa. - Enfatiza focando-se no trabalho de uma pintora que usa aquarela como técnica principal.
Todos os seus trabalhos envolvem cor, flores, pássaros e arquitetura. Não faço a menor ideia se é o efeito do álcool que ainda viaja pelas minhas veias mas quase me sinto em outro mundo.
- Sim, é espantosa. - Concordo sem conseguir desviar o olhar.
- Então, é um sim?
- Claro que é um sim.
- Estás de ressaca, Anna? - O seu tom é curioso, assim como o sorriso que esboça quando levanto o olhar.
- Um pouco.
- Queres uma água? Uma aspirina?
- Não, obrigada. Estou bem. Lenta mas bem. - Assinto ao mesmo tempo que ele antes de ambos sorrir-mos um para o outro. - Podemos continuar.
- Então, este aqui... - Tirando outro dossier da pilha ao seu lado, está prestes a abri-la quando o telefone toca.
Pego no telefone quando faz sinal para que atenda e atendo a chamada da Leah.
- Sim?
- Têm uma visita.
- De quem?
- O vosso pai. - Informa. - Posso mandar subir?
- Sim. - Respondo antes da chamada terminar. - O James está lá em baixo. - Informo-o porque presumo que tenham combinado algo, no entanto, pela sua expressão, não é o caso.
- Porquê?
- Pensei que tu soubesses.
- Eu não sei de nada. - Largando o dossier, levanta-se e abre a porta para poder recebê-lo.
O James leva algum tempo até conseguir terminar de subir as escadas mas, embora exausto com o esforço que acabou de fazer, entra no gabinete com boa disposição.
- Bom dia. Espero não estar a incomodar.
- Bom dia. - Digo, colocando o telefone no suporte.
- Vieste até aqui sozinho? - O Wally segue-o e prontamente arrasta uma cadeira para que possa sentar-se.
- Claro.
- De carro?
- Sim. - Confirma erguendo o olhar. - A pé seria difícil.
- Não é seguro pegares no carro, pai. - Resmunga punindo-o com o olhar.
- O pior que pode acontecer é morrer e isso já estou a fazer, mais lentamente. - Brinca para frustração do Wally.
- Podes matar outras pessoas também. - Constata colocando as mãos na cintura. - Vou ter que te prender a uma cadeira lá de casa? O que fazes aqui?
- Se achasse que não estou bem o suficiente para pegar no carro e vir até aqui, não o faria. - Diz, agora num tom mais sério. - Não sou irresponsável ao ponto de colocar outras vidas em perigo. E vim até aqui porque preciso conversar com a Anna.
Comigo?
- Não tenho o número dela então, só a podia encontrar aqui. - Conclui.
- Ok. - Com um aceno de cabeça, o Wally olha-me com incerteza. - Eu posso ficar ou queres conversar a sós com ela?
- A sós.
- Ok. - Repete. - Eu vou beber um café e ver se algum deles precisa de ajuda. Chamem-me quando tiverem terminado.
Endireito-me na cadeira enquanto o Wally deixa o gabinete e tento imaginar o que raios quer conversar em privado. Não encontro qualquer razão.
Franzo as sobrancelhas assim que desvia o olhar para mim. Parece nervoso, desconfortável em muitos sentidos.
- Não tenho outro irmão, tenho?
- Não. - Responde prontamente, erguendo as mãos. - Da minha parte, não. - Acrescenta e não sei se está a tentar melhorar a sua resposta mas falha redondamente.
Quem sabe o que a Kate fez antes e depois dele... não ficaria surpresa.
- O assunto que me trouxe aqui não está relacionado connosco. É sobre o teu irmão.
- O Wally?
- Não. O Grant.
- O que se passa com ele? - Suporto os cotovelos na secretária e tento não expressar qualquer emoção que possa entregar o que quer que seja.
- Estava à espera que me pudesses dizer o que se passa.
- Como assim? - Humedeço os lábios, continuando firme e aparentemente confusa.
Interiormente, estou a tremer.
- O Grant tem um namorado? - Questiona lentamente, de forma serena.
O meu rosto não se move e eu não digo nada por longos segundos. Não vou dar-lhe uma resposta, mesmo sabendo que não necessita realmente dela.
É óbvio que sabe da verdade e está aqui porque eu também a sei.
A questão é como descobriu.
- Sem comentários. Entendi. - Inspirando, desvia o olhar por um segundo para depois voltar a encarar-me. - Eu ouvi-o conversar com alguém no telemóvel, alguém que supus ser a sua namorada. O Grant disse-lhe que não ias sair com eles desta vez. - Explica para que eu perceba onde me encaixo. - Eu não quis fazer-lhe perguntas porque sei o quanto é reservado mas a curiosidade de pai fez-me esperar para ver quem era ela. Para minha surpresa, entrou no carro de um homem e beijo-o.
Merda.
- Eu sei que sabes a verdade e que não queres entrega-lo...
- Por favor, pensa bem no que vais dizer a seguir. - Peço antes de qualquer coisa.
Eu entendo que possa ser um choque, entendo que vivemos em tempos diferentes, com pensamentos e ideias completamente distintas e que os pais têm este estranho hábito de idealizar um caminho que muitas vezes os filhos não percorrem mas isso não é uma boa desculpa para invalidar quem o Grant é.
Posso tolerar a confusão, o choque, até a dificuldade em digerir a informação mas nada mais.
Especialmente vindo dele.
- Se estás à espera de ouvir-me dizer que o vou deserdar ou expulsar de casa, podes respirar fundo. Em primeiro lugar, não sou estúpido o suficiente para vir dize-lo justamente a ti e em segundo lugar, não me importa quem ele ama. Estou aqui porque descobri que o meu filho está a viver uma mentira por medo do que iremos pensar e tu és a única pessoa com quem posso conversar sobre isto. Se contar a verdade à Candice, ela vai querer conversar com ele e eu sei que não é suposto ser assim. Temos que respeitar o tempo dele, deixa-lo decidir, como fez contigo.
Respiro fundo de puro alívio. Eu realmente não queria discutir com ele, novamente.
Esta é a primeira vez, em toda a minha vida, que este homem me surpreende pela positiva. Não tenho sequer palavras para descrever.
- Acho que ele está com medo da minha reação. - Confidencia num tom triste.
- Ele está com medo da reação de todos. - Digo numa tentativa de fazer com que se sinta melhor.
Eu realmente não sei o que se passa comigo hoje. De repente, decidi preocupar-me com os sentimentos de toda a gente.
- Ele ficou em pânico quando eu descobri. Não acho que o problema sejas apenas tu mas toda a situação. Ninguém gosta de ser confrontando com algo que esconde, especialmente quando não espera ser compreendido.
E essa lição sabemos de trás para a frente, eu e ele.
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Harry
- Continuamos na próxima...
A Doutora Cecília é completamente apanhada de surpresa quando me vê entrar no gabinete sem bater.
Paro, deixando a porta aberta para que a paciente nos deixe a sós assim que decidir parar de me encarar como se fosse doido.
A Doutora pede desculpa pela interrupção, que tecnicamente não aconteceu e ambos esperamos até que o caminho fique livre.
- Preciso conversar consigo. - Fecho a porta e dirijo-me para o sofá.
- O meu expediente terminou, Harry.
- Eu pago o dobro. - Ofereço aborrecido por vê-la recolher as suas coisas e guarda-las na pasta. - Fiz algo muito estúpido.
- Posso ver isso. - Acusa continuando a organizar os seus documentos. - E cheirar o álcool daqui.
- Então pare o que está a fazer e ouça-me. - Ordeno sendo alvo de um olhar severo.
- Queres que pare e perca parte do meu tempo livre para estar com a minha família para ouvir mais uma desculpa para outra recaída?
- Não tenho uma desculpa desta vez. - Balanço a cabeça negativamente. - Eu estava furioso, bebi e parti o nariz a um imbecil porque não consigo lidar com a verdade.
- Que verdade?
- A de que dorme com a minha ex namorada.
A Doutora encara-me sem qualquer expressão por breves segundos até decidir que sou merecedor da sua atenção.
- Agredis-te um homem porque descobris-te que dormiu com a tua ex namorada?
Aproximando-se, deixa-me ler na sua expressão o quanto está impressionada pela negativa com o meu comportamento.
A pior parte é que também estou. Ou talvez seja um bom sinal.
Nunca tive o hábito de rever as minhas atitudes negativas. Se fiz algo, é porque sentia que devia ser feito. Desta vez, sei que não era o meu lugar. Não tive um motivo, uma justificação ou uma boa desculpa.
Estava furioso, cego pelo ciúme. Queria arrancar-lhe as mãos fora por toca-la e isso é simplesmente doentio.
- Eu vi-o em casa dela esta manhã. Não gosto daquele idiota. - Balanço a cabeça negativamente. - E a pior parte é que também não tenho uma justificação para isso. Ele nem sequer revidou.
- Então como conseguis-te esse olho negro?
- Foi o Enzo. - Balanço a mão em desdém. - Trabalha para ele. É uma longa história.
- Que vais contar-me, presumo.
- Eu tentei não pensar no assunto.
Eu realmente tentei.
- Mas não conseguia parar. Estava furioso, com ciúmes e fui até ao bar dele para saber o que raios quer dela. E eu sei que não é o meu lugar mas não confio nele. - Fecho as mãos em punhos e levanto o olhar quando se senta à minha frente. - Ele tentou acalmar-me, disse-me que não tinha que me dar explicações e que a respeita. Na verdade, foi bastante coerente. - Admito humedecendo os lábios.
Tão coerente que me fez repensar o que eu estava ali a fazer por breves momentos.
- Mas isso só me deixou ainda mais fora de mim.
- Perdeste a cabeça porque ele a respeita?
- Não! Perdi a cabeça porque ele está lá, com ela, nesta relação sem compromissos que... - Baixo o olhar e respiro fundo. - Ela é mais do que apenas sexo. E de alguma forma, eu sei que ele sente isso.
- Agrediste-o porque está a ocupar o lugar que assumes ser teu.
- Não é mais meu. - Baixo o olhar, sentindo a adrenalina deixar lentamente o meu corpo.
- Não, não é.
- Ele preocupa-se, é óbvio.
- E respeita-a.
- E respeita-a. - Assinto percebendo que estamos prestes a chegar a um ponto importante da conversa.
- Não é isso que queres para ela? Alguém que se preocupe e que a respeite?
- Sim.
- É exatamente o que não estás a fazer.
- Eu só preciso de mais uma oportunidade para mostrar-lhe que...
- Mostrar-lhe o quê? Que aparentemente não mudaste? Que não aprendes-te com os teus erros? Começo a achar que até eu mesma falhei para contigo. Todas aquelas horas de conversa para voltarmos ao início. Estás bêbedo, com o mesmo padrão de violência e possessividade por causa da mulher por quem decidiste mudar. Vai para casa, toma um banho e descansa. - Levantando-se, dirige-se para a sua mesa. - Podes voltar amanhã. Conversar contigo neste momento é uma perda de tempo para os dois.
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