— Te peguei quatro vezes dando uma de enxerido no meu quarto. Quatro vezes, Jungkook? É melhor você cortar esse hábito ou vai se ver comigo.
Antes mesmo da garota engolir a cantada romântica, Yoongi, com as mãos cruzadas, dava uma bronca no maknae.
— Posso pegar emprestado? — mostra os instrumentos de pintura.
— Vai... Pega e cai fora. Aproveita e troca essa blusa.
Nem contesta, saindo rápido feito o rato ligeirinho.
— 아이고 (aigo=céus)… O que eu faço com esse moleque? — Enquanto ponderava, S/n se dirigia à saída sem ser percebida, ou quase. — Volta aqui. Você também é uma invasora de quartos.
— Foi ele que me trouxe aqui. Como que ia saber que era seu? — Parecia a irmã acusando o irmão mais velho de a ter metido numa encrenca.
— É só olhar em volta que você percebe.
E o faz literalmente, vendo móveis cinzentos, chiques porém sem muitos detalhes, uma escrivaninha enorme e entupida de pautas, prateleiras com prêmios e discos de vários artistas de hip-hop dos anos 2000 pra baixo. A cara cuspida e escarrada do garoto na sua frente.
Yoongi dá um tapa na própria testa. Como ela era ingênua.
— Já que está aqui, preciso que faça algo por mim.
Embora a intérprete negasse de leve com a cabeça, uma resma foi entregue a ela.
— Corrija para mim as partes em inglês. Já as grifei por cima do lápis, mas falta conferir a ortografia. A Hybe exigiu que fizesse isso para mandar àquela tal de Genius que distribui as letras para plataformas musicais.
Aquele jeito mandão, S/n não curtia. Diria poucas e boas pra ele e deveria mesmo, só que ele era o famoso Min Yoongi, o seu aluno, seu chefe. Aqueles títulos significavam que ela devia respeito a ele. Ainda era um ser humano? Sim. Para S/n, por o considerar uma entidade, a axiologia funcionava de outra forma. Ele estava e sempre estaria acima dela.
— Okay — concordou sem mais nem menos.
O garoto descruzou os braços, pendeu a boca para baixo chateado, como se quisesse que ela tivesse o refutado. Estava olhando fixamente para o rosto da jovem, tentando entender o que ali estava diferente. Quando percebeu, juntou os polegares e deslizou na própria língua, aproximando dela e indo na direção das bochechas. S/n esquivou, ele fez careta e a encorajou a se aproximar dele. Limpou a tinta, pressionando com firmeza do nariz para as orelhas, deixando a pele queimada, ou seria alergia da tinta? Independente, foi a pia, lavou e secou as mãos.
— Faz mal passar na pele. Não deixe o Jeon nem ninguém fazer isso novamente.
— E-está bem.
Voltou para ela, para as bochechas e concluiu que devia arrumar uma pomada antes que a irritação se espalhasse e tomasse conta do rostinho mais lindo que ele já tocou. S/n afastou levemente o toque demorado dele e Yoongi foi para a porta do quarto na sequência.
— Tenho que fazer algo e já volto. — E sai.
Sem ninguém, fora aquele tanto de papel, S/n procurou um lugar para se sentar. Perambulou o olhar pelo quarto mais uma vez, conhecendo o ambiente inóspito. Eles, a casa, tudo era novo. Ajudar com uma coisinha aqui e acolá não era nada demais. O contato, os olhares, as palavras é que estavam mexendo com a intérprete e ela não entendia o porquê.
Arrumou uma caneta naquela bagunça de escrivaninha, lendo os versos em amarelo, empenhada a realizar a tarefa designada ao invés de refletir sobre o que sua cabeça inventava para o coração. Seria mais saudável se não pensasse demais.
Yoongi voltou minutos mais tarde, colocou a pomada na frente dela e explicou como se usava para então sumir nos corredores sem dar tempo dela perguntar se estava fazendo certo a correção e se ele voltaria algum dia para o próprio quarto.
— Gostaria de te entender — ela admite, não fazendo ideia de que ele ainda estava por perto, segurando o peito colado na parede exterior, tentando conter um sentimento que malmente compreendia.
ಌ사랑ಌ
No final das contas era pouca coisa. Terminou e ficou ali o esperando voltar, rodopiando na cadeira e olhando pro teto em completo tédio.
— O Yoongi não te acorrentou à mesa dele ou algo assim, não é?
— J-Jin!? — Ela se segura firme para não cair da cadeira.
— O próprio! Feliz em ver um rosto bonito? — Encaixa o queixo entre o polegar e o indicador.
— Bastante para falar a verdade.
— Maravilha! Deixa pra lá o que aquele mini Eminem te pediu pra fazer e vem comigo. Estou precisando, necessitando de uma opinião sobre minhas roupas. Comprei tantas que nem cabem no armário e, não sei se notou, mas meus ombros são largos e não é qualquer camiseta que fica boa em mim. Seria bom um novo olhar, porque esses caras aqui tem estilos muito distintos do meu e nem sempre nós concordamos. E aí, topa?
Anestesiada com o texto que Jin acabou de recitar, S/n se levanta e diz:
— 가자 (kaja=vamos)?
ಌ사랑ಌ
As paredes eram clarinhas, os enfeites bem posicionados e extremamente frágeis. Uma cama ginórmica com cobertores fofos num canto. Havia também duas poltronas bege viradas uma de frente para a outra com uma mesinha no meio e, atrás delas, um closet com luzes.
Jin pegou uma das poltronas e virou de costas para os armários, dando batidas no encosto.
— Fica aqui e, quando eu disser que estou pronto, você vira. Preparada para o desfile?
— Estou!
Jin experimentou algumas muitas blusas sociais e outras poucas camisetas formais. O que S/n aprovava ele guardava de volta, o que não ele jogava no chão, fazendo um montinho que seria doado. Divertiram-se bastante, principalmente quando ele vestiu aquela de listras brancas e vermelhas. S/n, respeitosamente, zombou, dizendo que era o vaqueiro mais brega que já vira.
Teve um probleminha. O que aconteceu foi que uma das blusas estava tão apertada que se ele levantasse o braço a rasgaria. Conseguiu vestir, só que para tirar eram outros quinhentos. Tentou encolher os braços na frente e retirar por cima, mas assim os músculos das costas estavam fazendo força. Desistindo, mordeu os lábios, pois não queria pedir “esse” tipo de ajuda. Sem escolhas, apareceu na frente de S/n, que ergueu a cabeça lentamente.
— Estou preso… Desabotoa pra mim? 재발 (jebal=por favor)?
— Oh! Sim!
S/n, ainda sentada, abre os botões inferiores. A visão lá de cima o agradou e ele se forçou a olhar para o lado quando ela chegou nos superiores, tendo que ficar de pé para alcançar. Assim que terminou, Jin tratou de voltar ao closet e vestir a roupa que estava antes. Para S/n não significou nada, até porque ele vestia uma fina regata branca por baixo. Jin é que ficou pensativo.
— Pelo visto eu sou beeem gastador — sibila quando volta com a roupa que sairiam mais tarde.
— Esse monte nem se compara com o Everest que fiz ano passado.
— Gosta de renovar o guarda-roupa?
— Se eu pudesse, ia repor todo ano.
— Você é das minhas — sorri pra ela, que devolve ainda mais radiante.
O sorriso durou o mesmo tanto do silêncio constrangedor. A culpa não era de nenhum dos dois, até porque eles haviam forçado a barra o suficiente para tentarem desenvolver uma relação um pouco melhor do que professora/aluno. Se essa tentativa os aproximou, só mais à frente saberiam.
Um grito cortou o clima, fazendo com que saíssem juntos do quarto e fossem procurar o responsável. Do andar de cima se podia ver Jimin no sofá lá embaixo, resmungando para o aparelho na sua frente.
— Devo ir ver o que ele tem?
— Nem benzer esse daí resolve. Acho que você só irá perder tempo. Melhor ir se acostumando com esses escândalos.
— Ele me ajudou uma vez, não custa devolver o favor.
Jin apertou fraquinho o ombro dela, agradecendo a ajuda e dando uma certa permissão para ir atrás do escandaloso.
Lá vai ela, descendo as escadas fazendo um barulho para Jimin saber que estava chegando.
— O que foi que te irritou tanto?
— S/n! — se anima ao vê-la se sentar perto dele. — Minhas selcas estão todas feias e prometi à empresa postar alguma no Twitter hoje.
— Posso ver?
Ele a entrega o celular aberto na galeria e fica vigiando enquanto a garota avalia as últimas fotos. Uma ou outra ele sorria e foi a que suas bochechas cobriam os olhos puxados de que ela mais gostou.
— Essa daí? Puts, a que eu mais detestei? Ah… Eu não sei.
— Você está ótimo! Super alegre! Se passar a imagem de que está feliz para suas fãs, elas ficarão mais tranquilas.
— É… Você está certa.
De volta com seu celular, ele faz a postagem e escreve na legenda:
“Você me faz feliz!”
— Vão amar — S/n comenta.
Jimin sorri antes de a puxar para mais perto, tomando-a pelo braço.
— Tem outras fotos que eu pretendia postar algum dia para trazer polêmicas e chamar atenção para nosso grupo.
— Essa estratégia realmente funciona? Pensei que fosse um mito.
— Depende da publicação...
Jimin pondera antes de entregar de novo o celular, observando o tempo todo para ver que cara ela faria. A boca descolou e as pupilas quadruplicaram de tamanho. Nelas o idol levantava a blusa ou com a boca, ou nem usava uma, revelando seu corpo sarado. Ao ver aquilo, quis devolver, no entanto Jimin passou uma a uma, forçando-a a olhar.
— Nessas eu estou tão horrível assim?
Não tendo como saber se ele brincava ou fala à sério, S/n tomou ar e disse segura:
— Você não devia mostrar essas fotos nem à mim, nem à mídia.
— 왜 (wea=por quê)?
— Tenho mesmo que te dizer?
De repente ele começa a rir. Jimin guarda o celular e sorri feito um idiota. Qual é a sua?, ela se coçou para não perguntar, mas, por enquanto, assim como Yoongi, ela não o questionaria.
— Você é tão fofinha, sabia? Ficou toda impressionada quando viu minhas fotos.
— E o que você queria que acontecesse? Q-que em lambesse a tela?
Quando se está irritado, falar besteira é o mais comum. O garoto com uma personalidade duvidável passou a língua no céu da boca, criando expectativas inusitadas com aquela fala de S/n. O objetivo real era saber se ela seria maligna e o tentaria convencer a publicar o quase nude. A surpresa foi que ela deixou bem claro que era má ideia. Aquilo, por mais louco que pareça, fez sua confiança na garota aumentar 100%.
— Posso participar da reunião dos dois?
Por trás do sofá, Taehyung dá uma cambalhota em câmera lenta e vai parar sentado ao lado de S/n.
— Chega mais. Deixei a S/n escolher minha postagem no Twitter. Deveria deixar ela escolher a sua também, porque ela tem bom gosto.
— Hum! Era o que estavam fazendo?
— Sim — Jimin responde pelos dois.
— Era, S/n?
— S-sim.
Taehyung, aquele garoto esperto, tiraria S/n da enrascada do amigo.
— Você curte que tipo de música, S/n?
— De tudo um pouco, Taehyung, por quê?
Ele saca o celular e os fones sem fio. Oferece um lado a ela e depois coloca sua playlist. Jimin fica de fora e, se sentindo excluído, da no pé.
A playlist de Kim era repleta de músicas que tinham só o instrumental de piano ou violino e Frank Sinatra junto a seus semelhantes. O gosto dele, para os padrões, é o mesmo de um idoso nascido nos anos 40. S/n achou aquilo lindo, único e exclusivo. Ninguém era como ele. Nem no gosto e nem no jeito.
Do nada ele pulou do estofado, remexeu os quadris e dançou sozinho de olhos fechados ali no meio da sala. Para ela, aquele hábito da dança, cujo cada um tinha, continha imensa beleza.
— Dança comigo? — faz a pergunta que toda garota de baile espera. Detalhe que não era um baile e que a música não era lenta.
— Passo.
— Sem essa. Vai dançar sim!
Animado, pega nos pulsos da garota e a gira, revira, pira. S/n ria. O que mais podia fazer?
— E um, dois, um, dois, três!!!
Que menino vivo!, ela pensava.
No fim da música ela voltou para o sofá e ele deitou no colo dela. Na hora estavam ofegantes, rindo sem parar. Quando ela olhou para as coxas e encontrou uma das criaturas mais belas da existência, sua irritação das bochechas ficou irada. Taehyung nem se moveu, jogou um sorriso quadrado, piorando a situação. Levantou quando ela estava prestes a explodir e os dois olharam para a figura impactante do líder que surgiu bem diante deles.
— Chame os outros, V. Está na hora.
S/n devolve o fone e Tae vai buscar o resto dos garotos.
— E aí? Como está sendo seu dia? Espero que eles tenham se comportado — vira-se pra ela.
— Foi tranquilo, Namjoon. Eles são uns amores.
De fato eram, a questão é que tiveram momentos que S/n se sentiu desconfortável — na sua mente a palavra teria o significado de ser energizada por um elétron e quase entrar em colapso. A química talvez explicasse. Uma pena S/n detestar essas aulas e ter esquecido a maioria dos ensinamentos.
— Nervosa?
S/n nega veementemente.
— É que é meu primeiro emprego.
— Linhyog disse que era uma ótima profissional. Como pode ser uma se não tem experiência?
— Meu primeiro emprego com gente famosa — corrige-se rapidamente.
Ele faz um movimento de cabeça. Foi por pouco. Descobrir que estavam abrigando uma ex army na sua casa seria controverso.
— Escuta, S/n, sei que tenho cara de bonzinho, mas não sou idiota.
S/n empalideceu. A ciência, essa autora tem certeza, não faz ideia de que o tom de pele pode ter tantas variantes.
— Se eles fizeram alguma coisa que te deixou constrangida, vou descobrir.
A cor volta.
O líder conhece o grupo que lidera. Sabe exatamente o que cada membro faria em qualquer situação. Eram como peças de xadrez para ele, os via como um bispo, um peão, uma torre, um cavalo, um rei e uma rainha. Namjoon não entrava no jogo, pois era o próprio tabuleiro.
Ouviram a correria. Eles estavam vindo.
Ofereceu a mão e a levantou, acabando colados um no outro. Com a mão livre, pegou a liga que prendia o cabelo dela e desceu até soltar todos os fios. Colocou a liga no próprio pulso e a encarou de cima para baixo. Pegou a manga embolada da esquerda e ajeitou, repetiu o mesmo processo lento na da direita, as íris na dela.
— Bem melhor agora — as covinhas aparentes, o rosto inexpressivo.
Os hábitos deles levavam o coração da coitada a mil por hora. E isso porque este foi seu primeiro dia. Quantos mais ela vai aguentar? Ainda lhe resta dois e meio para decidir.
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