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História Como Conheci Sua Mãe - Anavitória - Prólogo - Ana Caetano


Escrita por: passarinhando

Capítulo 1 - Prólogo - Ana Caetano


Cheguei no aeroporto de Araguaína ainda sem processar direito o que estava acontecendo. Luana, minha irmã, já estava lá pra me buscar, mas além do abraço apertado, nenhuma das duas falou nada. De certa forma o silêncio era um pouco reconfortante, ou talvez fosse só uma tentativa desesperada de mascarar a realidade. Se a gente não falasse sobre isso, talvez parecesse menos real por mais um tempinho.

Foi só quando entrei no carro que me reservei o direito de chorar pelo que estava acontecendo. Acho que a ficha foi caindo aos poucos. Luana apertou minha mão, com os olhos marejados, mas se segurou e deu partida no carro pra sair do aeroporto.

"Ana, a bebê tá bem." Luana falou, num fio de voz, tentando disfarçar aquele ar pesado. "Parece que vai ter que ficar uns dias no hospital... Mas só por precaução mesmo." Eu assenti. Não tive forças pra elaborar uma resposta.

"E a Vi?" Perguntei. Já tinham 3 anos que tínhamos nos separado... Eu só sabia dela por redes sociais e amigos em comum. Sabia que Sabra estava grávida e a família toda estava muito feliz com a chegada da criança, mesmo com a ausência do pai e tudo mais. Desde que soube que a irmã dela não tinha resistido ao parto, não consegui parar de pensar nela.

Era um momento triste pra todo mundo, sem dúvida. Mas eu só queria estar junto da minha bichinha, dizer quantas vezes fosse preciso que iria ficar tudo bem, mesmo sem ter certeza nenhuma disso. Era o mínimo que eu podia fazer, já bastava ter que lidar com a culpa de ter permitido que a vida nos afastasse naqueles últimos 3 anos.

Na época, parecia que era o que devia ser feito. Foi a própria Vitória que aos pouquinhos foi me ensinando que um amor não precisa durar pra sempre, que as pessoas não pertencem umas as outras e que o fim de um relacionamento não é um fracasso. Outro fator do nosso amadurecimento foi ter percebido que a indústria da música brasileira não comportava mais o formato do duo que a gente tinha.

A partir daí passamos a querer coisas diferentes e concluímos que o melhor era tomar caminhos separados. Não foi fácil: nós duas sabíamos que o amor que a gente tinha e tudo que a gente viveu seria só nosso. Mesmo prometendo que estaríamos sempre ali uma pela outra, tivemos que aprender a viver por nossa conta.

Ela foi pro Rio, atrás da carreira de atriz. E eu me dediquei totalmente à minha carreira solo. No começo a gente até se falava, mas fomos perdendo contato com o tempo. Agenda cheia, incompatibilidade de horários, novos planos, outras prioridades... Depois de um tempo a única coisa que eu ainda tinha da Vi eram as músicas que eu ainda escrevia pra ela.

Descansei de olhos fechados o caminho todo, e só percebi quando já tínhamos estacionado na entrada do cemitério. Eu e Luana saímos do carro ainda em silêncio, e ela passou o braço sob meus ombros me segurando firme enquanto andávamos em direção à capela.

Vitória foi a primeira pessoa que eu avistei, de longe, de costas. Antes que ela me visse, todos os outros parentes e conhecidos já vieram me cumprimentar. Cumprimentei a todos, meio apática. Não sei bem como lidar e reagir nessas horas. Acho que ninguém sabe.

Acho que ela não percebeu que eu tinha chegado, então me aproximei por trás dela e toquei em seu ombro devagar. Ela se virou e parece que desmontou assim que me viu. Em um movimento brusco, ela me abraçou e começou a chorar. Eu a segurei firme e não fiz mais nada, deixei que ela se expressasse e escorresse toda mágoa dela.

Dei um sorriso fraco quando ela me olhou, mas continuei segurando em seus braços. Ela sibilou um "obrigada", sem som, e eu só assenti e a abracei de novo. Não tive coragem de soltá-la, nem ela permitiu que eu o fizesse. Fiquei entrelaçada nela o tempo inteiro, até aquilo tudo acabar e aos poucos as pessoas começarem a ir embora.

"Ninha, por favor, não vai embora" Ela sussurrou no meu ouvido. Eu ficaria mesmo se ela não tivesse pedido, mas aquele pedido me deixou ainda mais abalada.

"Lu" chamei a minha irmã. "Pode ir pra casa. Eu vou ficar. Obrigada"

"Qualquer coisa me liga" ela disse, e depois se despediu. E então só restou nós duas, Felipe, o primo da Vi, tia Isabel, a mãe dela, e Aninha, a irmã mais nova. Logo depois que Luana foi embora, Feli levou todas nós em casa.

A Vi não soltou a minha mão. Como se tivesse medo de tudo que ela ainda tinha, se soltasse. Eu a apoiei da melhor maneira que eu consegui, oferecendo segurança e companhia, mesmo que não fosse grande coisa.

A gente quase não conversou, só o básico, trivial. O luto é muito doloroso, mas precisa ser sentido. Não tem como passar intacto por ele. Lá pelas tantas da noite, eu adormeci, exausta física e emocionalmente. Não sei se ela dormiu, mas ficou deitada comigo o tempo inteiro.

"Eu não fui ao hospital ainda..." ela disse, quando percebeu que eu tinha acordado.

"Vamos lá. Eu vou com tu." Falei, e ela esboçou um sorriso fraco. Depositei um beijinho na testa dela antes de me levantar.

Ainda trocando poucas palavras, saímos da casa dela rumo ao hospital assim que nos aprontamos e tomamos café da manhã. Ela pareceu alheia durante o caminho todo, o que me deu espaço para que várias perguntas passassem pela minha cabeça.

Quem iria cuidar da bebê? O pai biológico não quis nem saber desde o começo da gravidez, duvido muito que isso tenha mudado. E seria uma mudança bem grande na vida de uma senhora como a mãe da Vi, e de uma jovem de 20 anos como Aninha, a irmã dela.

Eu sempre quis ser mãe aos 30 anos. Calculei que seria uma idade em que eu teria uma vida estável e condições boas pra sustentar e criar uma outra pessoa. Eu só tinha parado de pensar nisso ultimamente porque não havia nenhuma outra pessoa com quem eu pensaria em dividir uma responsabilidade dessas.

Assim que entrei na maternidade do hospital, todo aquele instinto maternal me atingiu. A vida era mesmo incrível. Como que seres humaninhos tão pequenos eram capazes de serem tão fortes pra se manter vivos? Em meio a tantos bebês, famílias e histórias diferentes, o meu coração foi completamente esmagado no momento em que olhei pro rostinho dela.

De relance pude ver que a expressão de Vitória também mudou quando encontrou aquela bebêzinha identificada apenas com o nome da mãe: Sabra Falcão. Em meio à tristeza e dor da perda de alguém, aquele serzinho já tinha nos salvado de tudo isso.

Mesmo com nossos rostos cheios de lágrimas, era impossível não sorrir. Quando nos aproximamos, Vitória tocou a mãozinha dela com todo cuidado do mundo, e ela reagiu abrindo os olhos pra gente. A única reação que eu tive foi abraçar a Vitória pela cintura, ao olhar para aqueles olhinhos que já nasceram com a mesma cor de marte que eu amava tanto.

"Olá, bom dia!" Tivemos que engolir o choro quando uma enfermeira falou com a gente. Ela sorriu, provavelmente em solidariedade e empatia aos nossos sentimentos. "Está na hora de mamar, vocês querem ajudar?"

Eu e Vitória nos entreolhamos sem saber direito o que dizer. E se a gente fizesse alguma coisa errada? Caramba! Aparentemente nossas caras de pânico eram bem evidentes, porque a moça deu uma risada e foi logo nos dando instruções.

Seguindo o que ela dizia, eu segurei a mamadeira em miniatura (sério, era minúscula!), e muito cuidadosamente levei até a boca da neném, bem aos pouquinhos. Ao meu lado, Vitória a assistia e nós duas reagimos com um sorriso enorme quando a bebê segurou o dedo de Vivi enquanto mamava. Foi a primeira vez nos últimos dois dias em que eu vi os olhos da Vi brilharem do jeito que eu conhecia.

(...)

"Eu já dei um nome pra ela." Vitória falou, e aquele simples comentário espontâneo já me deu um calorzinho no coração. Pra ela ter falado isso, só podia estar pensando a mesma coisa que eu, mas ainda não soubemos colocar nas palavras certas.

"Ah, é?" Me fiz de desentendida. "Qual?" E beberiquei o suco sem graça do hospital.

"Sol." Ela falou simplesmente. "Clarissol." Ela falou, ao mesmo tempo que parecia estudar a minha reação. Eu sorri instantaneamente.

"Achei bem lindo, viu?" Falei, sorrindo mais ainda ao ver um meio sorriso brotar no canto da boca dela.

"Que bom, Naclara" Ela disse, de um jeito que me fez rir. "Eu já sabia, mas tu leva jeito mesmo pra ser mãe viu?"

"Era esse o plano, né? Tô na idade certinha." Falei, como quem não quer nada.

"Ninha..." Ela começou, mas todas as dúvidas e medos pairaram no ar.

"Vi, não é o que a gente esperava, mas pensa bem." Falei, com calma, tentando pôr os meus próprios pensamentos em ordem. "É o melhor pra ela, pra sua mãe e pra Aninha. Eu sei que é uma puta responsabilidade, mas eu tenho certeza que a gente consegue. Eu não me vejo fazendo isso em nenhum outro momento senão agora, e com tu." Apesar da distância dos últimos anos, eu conhecia a Vitória como ninguém. Sabia que era exatamente daquela chacoalhada de realidade que ela precisava.

"Ana, você tem certeza?" Me levantei da mesinha da cantina do hospital e me agachei ao lado dela, que ainda estava sentada na cadeira. Segurei e beijei suas mãos, depois a olhei nos olhos.

"Absoluta. Eu nem ia te fazer pensar nisso se não tivesse." Apesar de tudo, eu tive certeza que a última coisa que ela se questionou foi sobre o nosso relacionamento. O status era o que menos importava. O nosso amor e agora aquele serzinho eram a coisa mais importante do mundo pra gente.

"Vi, eu também to morrendo de medo." Continuei, tentando tranquilizá-la. "A gente vai ter que mudar muita coisa. A gente vai, com calma, conversar sobre a gente. Mas a gente tem a vida todinha, não tem?"

"Sim." O som da palavra e o leve assentir de cabeça foram quase imperceptíveis, e então me levantei e a beijei. Um beijo misto de saudade e amor, como se transmitisse tudo que eu tinha dito antes. 

Passamos aquele dia todo no hospital. Sabíamos que dali pra frente teríamos muito trabalho com tudo: papéis de adoção, mudanças na casa... Mas por ora só pensamos em ficar o tempo todo com a Solzinha, nossa filha. 

 



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