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História Como (não) agir em um clichê americano [ HIATUS ] - Cinco: Minha namorada é a Regina George


Escrita por: fawktheorbit

Notas do Autor


OI, DE NOVO :D como estão?
tô vendo alguns comentários surgindo aos pouquinhos, e queria muito agradecer pelo apoio e pela compreensão <3

escrever essa fanfic tornou a ser prazeroso e eu tô NAS NUVENS com isso, sério. é meu xodózinho todo.

boa leitura!!

Capítulo 7 - Cinco: Minha namorada é a Regina George


 

 

Pergunta: quando foi que eu concordei em fazer um tour pelo colégio? — Questionei, novamente apressando o passo para chegar aos calcanhares de Jinsol. — Estamos literalmente atravessando o pátio pela segunda vez em quarenta minutos. 

 

Ela me lançou um olhar de desprezo, como se me culpasse silenciosamente pelo meu sedentarismo. Preciso confessar que minha condição física não estava das melhores, o que não deveria ser surpresa, uma vez que eu aparentemente fazia mais o tipo que joga RPG o dia todo ao invés de fazer exercícios. Estava ofegante, minhas pernas doíam e algumas gotas de suor já orvalhavam minha testa. Foi humilhante, porque os pulmões da Jeong certamente estavam mil vezes mais prejudicados e, ainda assim, ela parecia bem o suficiente para correr uma maratona a qualquer instante. 


Revirei os olhos: fui prontamente ignorada. Ela preferiu se ocupar em tirar mais um cigarro dos bolsos, acendendo-o tão rápido que mal pude enxergar suas mãos. 

 

— Que foi? — Indagou, assim que seus olhos encontraram os meus. — Esse já 'tava na metade. Agora anda, vem comigo. 

 

Eu bem que poderia perguntar sobre a possibilidade de algum monitor pegá-la fumando em plenos corredores, mas não havia visto nenhuma figura de autoridade fora das salas até ali e, pensando por esse lado, sua afirmação anterior até que fazia sentido. Deixei passar. Seus passos tornaram a traçar caminho escola afora, dobraram dois ou três corredores e atravessaram o pátio dos fundos, enfim chegando a um grande portão de metal: a quadra. 

 

Ergui as sobrancelhas, tentando entender aonde ela queria chegar me levando até ali. Apurando os ouvidos, pude captar um som distante — música — ultrapassar a estutura e reverberar corredor afora.


 Jinsol tragou fortemente do cigarro e, sustentando-o entre os dedos, sorriu em minha direção. 

 

— Eu faço as honras. — Prosseguiu, tratando de puxar o portão até que fosse aberta uma fresta, grande o suficiente para passarmos por ela. — Vamos para as arquibancadas, não questione e confie em mim. 

 

Foram duas ordens impossíveis de se cumprir, mas optei por me disponibilizar a obedecê-las, ao menos por ora. Ela passou pelo portão e seguiu caminho tranquilamente, já eu olhei para trás por uma última vez antes de me dar por vencida, tratando de fechá-lo para, então, ir adiante. 

 

As arquibancadas estavam vazias, no entanto, o centro da quatra estava bem movimentado. Um grupo com dezenas de garotas uniformizadas aglomerava-se em um círculo, preenchendo o local com burburinhos que, por pouco, não sobressaíam a música que tocava. A imagem era familiar, vi semelhante no filme da noite anterior: cheerleaders. Estávamos invadindo um ensaio. 

 

— Desde quando o colégio tem líderes de torcida? — Perguntei, num sussurro. Jinsol deu de ombros, resmungando um “desde sempre” e, chocada, fixei os olhos sobre o formigueiro de meninas vestidas em uniformes azuis. Não me lembrava de algo assim por lá. — Ei, espere um minuto. Você quer dizer que a Chaewon...? 

 

— Senta aí e aprecia o show, Quatro-olhos. — Jeong interrompeu, jogando-se sobre um dos bancos. O cheiro forte de menta ainda queimava minhas narinas, mas estava curiosa o suficiente para não me importar. Me sentei ao seu lado. — Por sorte não perdemos a melhor parte. 

 

A contragosto, resolvi calar a boca. Grande parte do meu orgulho precisou ser engolida a seguir, porque precisei recolher os óculos do bolso e colocá-los sobre a face — só então o mundo entrou em foco, e Jinsol fez questão de sufocar um risinho às minhas custas. 

 

Seja lá o que quisesse me mostrar, parecia estar divertindo-a imensamente: seu sorriso quase chegava a rasgar o rosto, e os olhos carregavam uma expectativa gritante conforme pairavam pelo grupo. Puxava a fumaça do cigarro como se fosse uma chaminé — supus que era sua forma de conter os próprios impulsos empolgados — e isso, ao meu ver, foi um indicativo gigantesco de que algo estava prestes a dar errado. 

 

Como já deve ter percebido, minha intuição não falha. 

 

De súbito, a ansiedade explodiu em seu olhar: a batida da música tornou-se mais elétrica, o som aumentou e, num gesto veloz e incrivelmente sincronizado, todas as líderes de torcida saltaram. O círculo se dispersou e o grupo passou a executar uma coreografia incrivelmente planejada, do tipo que cativa e prende os olhos de primeira. Admirável, para se dizer o mínimo: as garotas dançavam, saltavam e faziam acrobacias, davam saltos mortais e subiam sobre os ombros umas das outras. Era contagiante — especialmente para Jinsol, que sustentava o restante do cigarro entre os lábios enquanto, com as mãos fechadas em punhos, movia os ombros conforme a batida. Sim, estava se divertindo. Eu bem que queria dizer a mesma coisa. 

 

— Essa aí é a elite daqui da escola — explicou, elevando a voz para sobressair o som. Ajeitou a postura e assoprou outra parcela de fumaça para cima — vejamos... aquela ali é Park Rosé — começou, apontando para uma garota alta, com os cabelos loiros soltos descendo pelas costas — filhinha do prefeito e dona de uma herança que compra todos os seus órgãos, sendo bem modesta. Também temos Kim Minjeong... — indicou, com um aceno, uma menina morena, que recém concluía uma pirueta — ela vai para Paris passar os finais de semana e às vezes para New York, claro, mas só quando está entediada. Hm... Shin Ryujin estrelou no jornal de fofocas da escola umas nove vezes só no mês passado, Jeon Heejin deu um fora colossal no capitão do time de basquete da outra escola e Kim Hyunjin... — fez uma pausa, torcendo o nariz como se aquele nome, em específico, tivesse gosto amargo ou algo assim. Segui seu olhar para avistar a garota em questão, uma vez que não se deu o trabalho de apontar dessa vez: — Kim Hyunjin dá literalmente as maiores festas que esse colégio já viu. Dizem que Park Rosé está tentando bater de frente com ela até hoje. 

 

— Legal, eu acho — resmunguei. — Mas não estou atrás de nenhuma delas.

 

— Está atrás de coisa melhor, sei bem. — Respondeu, e seu tom foi suficiente para me alarmar, como se tudo o que dissera anteriormente não passasse de um mero aviso ou sessão preparatória. — Oh, o refrão vai começar! Relaxa que a sua resposta vem agora. 

 

Hesitei, me sentindo extremamente tentada a perguntar o que, exatamente, ela queria dizer com aquilo — Jinsol era uma versão idiota e juvenil dos mestres do magos: deixava enigmas no ar e partia em seguida —, mas minhas palavras morreram antes mesmo que pudessem escapar. O ritmo mudou, o grupo de cheerleaders separou-se para cantos distintos e, ao centro do que agora era uma formação milimetricamente planejada, outra figura surgiu em manobras e saltos mortais: Park Chaewon, minha namorada. 

 

Não preciso dizer que meu queixo caiu, consequência imediata do choque proveniente daquela cena. Ela movia-se com leveza e confiança ao mesmo instante, exalava energia e comandava as demais integrantes, como um maestro. Era hipnotizante, bonito e, claro, assustador ao mesmo tempo. 

 

— Park Chaewon — Jinsol anunciou, rindo baixinho diante da minha expressão. Pareceu se divertir com minha desgraça, virando meu queixo com os dedos para, então, tomar meus óculos para si. E mesmo quando ela os colocou sobre o rosto, permaneci estática, sem reação. — É o mal em figura de gente. Ela parece uma garotinha egoísta, traiçoeira e descarada, mas na verdade ela é muito, muito mais que isso. Ela é a abelha rainha, e as outras são os zangões dela — apagou o restante do cigarro, jogando-o para um canto qualquer prontamente — Park Chaewon... como é que eu posso começar a explicar Park Chaewon? 

 

— Por favor, não termine esse discurso ou eu- 

 

— Park Chaewon é perfeita! — Prosseguiu, saltando para que pudesse me ignorar melhor, aparentemente. Quando passou a caminhar de um lado para o outro, gesticulando como uma maldita apresentadora de teatro, desejei vestir uma farda e fazer parte da guerra às drogas por um instante. — Ela tem duas bolsas de pele e um carro importado prateado, o cabelo dela está no seguro por US$10.000,00 e... ah! Eu soube que ela faz comerciais de carro… no Japão! O filme que ela gosta mais é Marcação Cerrada, e ela até conheceu o John Stamos no avião. Ele disse que ela era linda, dá 'pra acreditar!? 

 

— Puta merda, Jinsol — supliquei —, isso não é hora para brincadei- 

 

— Um dia ela me socou na cara, Hyeju… — interviu outra vez, colocando-se diante de mim e cobrindo por completo meu campo de visão. Quis chutar seu rosto como nunca antes, mas meus óculos enfeitavam sua face e julguei importantes demais para serem quebrados tão tragicamente — ...e isso foi irado. 

 

— Sai da minha frente — ralhei, empurrando-a para o lado. Ela caiu inofensivamente sobre a arquibancada, gargalhando com gosto. A coreografia ainda prosseguia. — Isso não pode ser real... minha namorada é a porra de uma cheerleader!? 

 

— Melhor ainda, docinho: ela é a capitã das cheerleaders — corrigiu, e confesso que meu desejo de desaparecer nunca foi tão grande quanto naquela hora. — Aliás, acho que vale lembrar: ela provavelmente não é sua namorada aqui. 

 

— Obrigada por adiantar a data do meu surto — sussurrei, apertando os olhos — desgraçada. 

 

— E então, qual é o plano? — Questionou, apoiando as pernas sobre outro banco. — Vai atrás dela, não vai? Buscar viver um final feliz com a sua Julieta, tipo na história original? 

 

Acho que meu olhar acabou exalando uma parcela generosa de ódio, porque sua postura chegou a vacilar por uns instantes. 

 

— Jinsol... — respirei fundo — Romeu e Julieta morreram na história original. 

 

— Sério? Eu não li o livro todo... — e fez uma careta, negando com a cabeça em seguida. — Mas não importa, você entendeu o que eu quis dizer. 

 

— É impossível ela querer falar comigo desse jeito... — foi o que me limitei a dizer, lamentando antecipadamente pelo que eu já sabia muito bem: não seria nada fácil. — Mas que merda. Como foi que isso aconteceu? 

 

— Como aconteceu eu não sei — Jeong respondeu, ainda assistindo ao show que ocorria na quadra (embora parte de mim soubesse que, usando minhas lentes, ela não enxergaria muita coisa. Talvez só não quisesse olhar nos meus olhos e me ver chorar). — Mas, se serve de consolo, sua namorada fica gostosa 'pra cacete com aquele uniforme. 

 

— Como diabos isso me serviria de consolo? 

 

— Tudo depende do jeito que você enxerga. 

 

Bufei. Ela poderia ser uma delinquente maluca, líder de gangue ou qualquer outra merda do gênero, mas nada disso — nem sua aparência, que beirava a assustadora de primeira — foi capaz de retardar minha vontade de agarrá-la pelo pescoço e presenteá-la com dois ou três hematomas ali mesmo. Tente entender: eu estava em pânico. Chaewon era uma versão coreana de Regina George e eu, aparentemente, tinha os mesmos atrativos de uma porta de madeira; conhecia aquela proporção muito bem. Nenhum dos beliscões que dei em mim mesma serviu para me acordar e, claro, uma loira chapada ria da minha desgraça a poucos centímetros de distância. Nem em meus piores pesadelos havia imaginado passar por algo assim. 

 

— Parem! Tempo! — Uma voz dolorosamente familiar ecoou, interrompendo (outra vez) minha (quase inexistente) linha de raciocínio. Pensei estar alucinando por um instante, mas Jinsol também alertou-se e, num movimento veloz, jogou meus óculos em meu colo. Chaewon caminhava para mais perto da arquibancada, estreitando os olhinhos brilhantes em direção à Jeong. — Haja paciência... o que o aspirador de pó faz aqui!? 

 

Hesitei, ponderando por um tempo quem seria o alvo da pergunta — e a resposta, claro, era óbvia: Jinsol ergueu-se, fechando a cara. — Foi assustador, porque uma tensão repentina consumiu o ar e, quando a música parou, somente restaram Chaewon e um exército de cheerleaders aos seus calcanhares, cochichando entre si e dirigindo olhares de julgamento a Jinsol e eu. Especialmente a ela. 


Engoli em seco, voltando os óculos ao rosto para mirar corretamente a feição da Jeong, que não tardou em se retorcer num sorriso sarcástico. Não poderia ser bom sinal. 

 

— Bom te ver também, capitã. — Jeong saudou, as mãos no bolso da jaqueta. Pensei em chamar por Chaewon ou puxar minha nova (nem tão nova) amiga (nem tão amiga) de volta ao terraço onde aparentemente morava, mas meus movimentos perderam-se completamente e, julgando pela forma como os olhos da Park foram a mim e desviaram-se com rapidez, minha importância era equiparável à de uma bactéria. Doeu pensar nisso. — Inovou seu estoque de apelidos, hein? Aspirador de pó é novidade... que garota criativa! 

 

— Achei que tivesse sido avisada quanto à sua proibição de invadir o nosso espaço — Chaewon continuou, áspera como eu nunca havia visto antes. Acabara de fazer uma série de acrobacias, mas seu visual estava impecável: uniforme perfeitamente alinhado, os cabelos loiros intocados num rabo de cavalo alto. Ameaçadoramente linda. — Está impregnando o lugar com cheiro de maconha. 

 

 — Ah, vamos lá... eu só queria assistir ao show!

 

— Não me faça entrar em contato com os superiores — ameaçou, e nunca pensei que Park-meio-metro-Chaewon me traria medo em alguma circunstância. Estremeci. — Se bem que, no seu caso, talvez seja mais vantajoso contatar a polícia, não? 

 

— Você é tão hilária, Wonie. — Jinsol caçoou, mas seu tom era amargo e não tinha humor algum. Uau, pensei, eram rivais. Me perguntei o porquê de ela não ter mencionado isso anteriormente: deveria ser óbvio ao ponto de eu poder concluir por conta própria? — Vejamos... por qual crime quer me acusar? Você devia saber que grande parte da minha clientela está nesse seu time, se é que pensamos a mesma coisa. — E revirou os olhos, passando a andar de um lado para o outro ao longo da arquibancada. — Por sinal, alguns amigos meus fazem preço especial para garotinhas bonitas metidas a barbie girl... você bem que poderia tentar. 

 

Acho que a vi lançar uma piscadela em direção à cheerleader, mas tentei não me atentar àquele detalhe, por ora. 

 

— Dá. Logo. O fora daqui. — Park ditou pausadamente, como quem está acostumada a ter tudo o que quer exatamente quando quer. Me dói dizer isso, mas é exatamente o que ela se tornara: uma garotinha mimada, convicta de que poderia mandar e desmandar naquilo que bem entendesse. 


Jinsol, porém, era uma grandíssima pedra em seu caminho: tinha prazer em quebrar regras e contrariar ordens, e talvez fosse esse o motivo para se odiarem tanto. 

 

— Se não...? — A loira desdenhou, prendendo a língua entre os dentes. — A quem vai recorrer, capitã? Vamos, peça ajuda! Talvez possa contar com o apoio de... vejamos, Jeon Heejin e Kim Hyunjin? Ah, sim, seus bracinhos direito e esquerdo... embora eu prefira chamar de capachos. — Algo em seu tom era mais amargo e ressentido do que o habitual, mas eu certamente não sabia o suficiente para tirar conclusão alguma. Outra série de burburinhos correu o ambiente e, logo ao lado de Chaewon, notei duas garotas igualmente patricinhas fuzilarem Jinsol com os olhos. Supus serem Heejin e Hyunjin. — Não eram elas no terraço ontem? Anteontem também e... quantas vezes na semana passada? Três? Bem, não importa. Só tratem quitar suas dívidas antes de me denunciar, por favor... fazemos bom preço, mas caridade ainda não é nosso forte. 

 

Rezei para que o assunto abordado não envolvesse substâncias ilícitas, mas a resposta era óbvia e, claro, mais uma que eu não gostaria de receber. 

 

Um silêncio ensurdecedor percorreu a quadra, ao passo que as líderes de torcida trocavam olhares expressivos e Jeong permanecia impassível, como se dizendo-se capaz de nomear os podres de todo aquele grupo — mais especificamente, quais delas procuravam-na na intenção de ficarem chapadas para, no fim do dia, apontarem o dedo em sua direção; acusá-la pela mesma coisa. Foi exatamente o que pareceu incomodar as duas morenas, que projetavam-se no encalço de Chaewon: a revelação de sua hipocrisia. 

 

Tensionei, notando o exato momento em que ambas projetaram-se para frente, como se ameaçassem avançar. 

 

Mas Park conteve ambas com um simples gesto de sua mão, antes de qualquer coisa. Ela deu alguns passinhos lentos para a frente, abrindo um sorriso largo e carregado de cinismo, digno de quem acaba de se lembrar de algo importante. 

 

Até Jinsol pareceu perceber: sua expressão mudou de ironia a dúvida em instantes.

 

— Dívidas? — Park sibilou, como se a palavra tivesse sabor doce. Eu conhecia aquele tom: estava prestes a fazer algo perigoso. Meus olhos migraram, alarmados, em direção a Jinsol: o rosto havia se fechado, assumindo traços tensos e rígidos; uma sentença silenciosa de “não se atreva”. — Quem é você para falar de dívidas, Jinsol? — Praguejei, temerosa e quase catatônica: a sensação de que algo terrível aconteceria em segundos me consumiu dos pés a cabeça, intensificada especialmente pelas risadas que correram o grupinho e pela postura (não mais relaxada) da loira mais alta. — Sabe... ouvi dizer que andava em maus bocados. Não era você atrás de empregos de meio-período nos últimos dias? — Os punhos de Jeong cerraram. Claramente havia tocado na ferida. — Lamento muito, querida, mas convenhamos: é impossível arcar com as suas dívidas se continuar criando mais delas com seus vícios. — E suspirou, num falso pesar. — Achei que fosse melhorar depois de sair daquela clínica de reabili- 

 

Oh, bem, a parte a seguir é imaginável... e bem desagradável para mim. Mas vou dizer de qualquer forma. 

 

Chaewon não pôde sequer terminar a frase, claro; antes disso, Jinsol saltou das arquibancadas com tanta rapidez que mal a vi, avançando perigosamente na direção da capitã. 

 

Excelente”, pensei. “Minha amiga é uma nerd maluca, minha outra amiga é uma delinquente maluca e minha namorada é uma patricinha maluca. Ah, e claro, minha amiga delinquente maluca está extremamente disposta a espancar minha namorada patricinha maluca — que, por sinal, é uns dois palmos menor e não tem muito como se defender, tendo em vista que seu excelente exército se dispersou de imediato ao ver a confusão emergir”. 

 

Francamente, Chaewon, poucas pessoas teriam ideias tão ruins quanto a sua foi. 

 

Eu poderia ter corrido. Poderia ter evitado me meter em (mais) confusão. Poderia ter simplesmente assistido aquilo tudo, reconhecendo que Park era na verdade uma grandíssima cuzona e o que o que dissera a Jinsol — seja lá o que fosse e até onde fosse verdade — fora de extrema covardia. Poderia ter feito zilhões de coisas mais inteligentes, mas claramente optei pela alternativa de maior risco. 

 

Veja bem: minha namorada estava prestes a apanhar, e apanhar feio — e você pode até me dizer que não era minha namorada e sim uma versão malvada e mesquinha dela, mas eu ainda enxergava a garota por quem me apaixonei ali e, entre Jinsol e Chaewon, eu nitidamente preferia ver a primeira com um olho roxo, e isso não era nem uma opinião recente —. Quando se ama alguém, você faz coisas idiotas para protegê-la; claro que se enfiar numa briga que não é sua, ainda que você seja um saco de pancadas ainda mais provável, faz parte desse pacote clichê. 


Paciência. Me meti em um relacionamento sabendo das consequências. 

 

Corri atrás de Jinsol, tropeçando e quase perdendo os óculos no caminho. Ela era milhões de vezes mais ágil e pulou  as arquibancadas com uma facilidade disparadamente maior, mas dei o meu melhor para alcançá-la e, ao menos de primeira, consegui chegar ao seu encalço num tempo minimamente favorável — antes que chegasse a Chaewon, também. 

 

Jeong fervilhava de raiva. O rosto estava vermelho e os punhos cerrados, dentes pressionados; completamente tomada por ira. Ela parecia mais uma biruta inofensiva e com senso de humor quebrado nos momentos em que éramos só nós duas, mas agora exalava ameaça, com olhos flamejantes e um visual complementar de perfil de valentona. Existem pessoas que definem a sensação de “céus, vou apanhar”, e aquela loira de farmácia do mundo invertido era literalmente isso, sem tirar nem por. 

 

Nem por isso recuei, claro. Se eu poderia sair de lá numa ambulância, Chaewon iria direto ao cemitério. 


Me perdoe, amorzinho. Talvez tenha subestimado você por conta da altura. 

 

— JINSOL! — Gritei, dando meu melhor para tentar contê-la. Algumas cheerleaders gritavam, outras migraram ao lado de fora da quadra e poucas restantes aglomeravam-se ao redor, tentando prestar alguma ajuda inútil segurando a capitã ou algo assim. 

 

Devo dizer: a desgraçada era mesmo forte. Parecia incrivelmente disposta a esmagar o crânio da mais baixa, de forma que, quanto mais eu a agarrava, mais ela se debatia. Seus braços acertavam o ar, meus pés arrastavam-se no chão e, num intervalo muito curto de tempo, palpito ter levado dez ou doze cotoveladas. Vozes me cercavam e diversos outros empurrões me atingiam, mas procurei focar unicamente em segurá-la como podia, deslizando os dedos sobre a superfície da jaqueta de couro. 

 

E Chaewon, claro, fez questão de permanecer o mais inexpressiva possível. Supus que sua intenção ao não recuar fosse mostrar superioridade ou algo assim, mas enxerguei o medo em seus olhos e a insegurança de não haver alguém para defendê-la de última hora — coisa que, claro, sempre tinha à disposição. Uma pena que minha ajuda não fosse o suficiente para impedir Jeong de aproximar-se. 

 

— ME SOLTA, HYEJU! — A delinquente esbravejou, ainda se debatendo em meus braços. — VOU FAZER ESSA IDIOTA ENGOLIR DENTE POR DENTE! 

 

— SE ACALMA! — Disparei de volta, fazendo o possível para ser ouvida por cima de dezenas de outras vozes. Sabia que era uma questão de tempo até outras pessoas chegarem até ali; certamente haviam partido atrás de reforços. Respirei fundo, tentando transparecer alguma calmaria: — escuta, Jinsol, ela vai fazer um inferno da sua vida se você- 

 

— Eu não me importo. — Ela rebateu, entredentes. Reconheço que era difícil para que se acalmasse naquela circunstância: não entendi o que exatamente Chaewon estaria insinuando, mas a mínima conclusão tirada com base naquilo me despertou certa empatia por ela. 

 

Até despertaria mais, confesso, se não fossem as novas pancadas que ela me dava a cada novo instante. 

 

Mais pessoas chegaram à quadra. Curiosos, câmeras, gritos de incentivo e protestos formaram um coro ao meu redor, em volume cada vez mais elevado — e angustiante —. Lembrei-me do que Jeong havia dito quanto aos superiores irresponsáveis do colégio, mas alguns alunos emergiram pelo portão, dispostos a proteger a capitã a todo o custo. Não soube dizer se ela chegou a levar algum golpe — bem, era provável —, mas dei o meu melhor até o fim e, quando Jinsol me empurrou bruscamente ao caminho contrário, torci para que mais alguém pudesse fazer meu trabalho enquanto me estatelava no chão. 

 

Dito e feito. Após desviar de duas ou três pessoas, evitando ser pisoteada, observei três silhuetas de caras altos formarem uma barreira entre Jeong e a capitã. Chaewon não demorou a ser resgatada — foi sustentada por Heejin e Hyunjin, afastada do conflito e tirada do meu campo de visão. Somente a vi cobrir um dos olhos, o que de certa era um indicativo preocupante. 

 

Jinsol, por outro lado, era raiva em sua mais pura forma. Continuou avançando contra os três rapazes — atletas, concluí, observando as jaquetas que enfeitavam-lhes os ombros largos —, ainda que eles resistissem aos seus golpes e soubessem bem como revidar. Não pareciam tão dispostos a bater numa garota, mas ela estava testando suas paciências tão intensamente que, quando me dei conta, estava observando-a receber um soco em cheio no rosto — coisa que, se possível, irritou-a ainda mais. 

 

Imaginei que a coisa fosse ficar ainda mais feia, portanto, tratei de me erguer em passos cambaleantes e ir de encontro à loira, tomando-a pelos ombros outra vez. Os garotos me encararam com estranheza, mas nada fizeram contra mim (para minha maior alegria), e busquei reunir toda a raiva que sentia pelos murros que levei para puxá-la bruscamente para longe dos três. 

 

Ela bufava, vermelha feito um pimentão. 

 

— Vamos embora, Jinsol. — Falei, quase que em tom de súplica. Ela ainda tentava se desvencilhar do meu aperto, mas sua disposição para lutar foi caindo aos pouquinhos, os movimentos diminuindo e deixando somente os olhos irados como resquício. 

 

Chaewon estava a alguns metros seguros, ainda cercada de seu time de cheerleaders e uma barreira de mauricinhos bombados. Sua expressão era um misto de raiva, medo e desdém; chamavam-na para longe dali, mas continuava encarando Jinsol numa tentativa meio falha de sustentar seu orgulho abalado (coisa que, estando com um olho roxo, era meio impossível. Até para ela).  

 

Jeong me empurrou outra vez, não forte o suficiente para me derrubar (de novo) diante de toda aquela plateia. 

 

— Se eu fosse você... — ela rosnou, aproximando-se de um dos garotos para, por trás dele, apontar o indicador em direção à capitã — passaria a olhar ao redor enquanto anda. — Chaewon riu nasal, e o rapaz em questão precisou empurrar Jeong de volta para conter outro avanço. Ela cambaleou até meus braços, o nariz sangrando e a face retorcida de raiva. — Longe dos seus adoradores, capitã, você não é porra nenhuma — e deu as costas, caminhando em passos firmes para longe da quadra — ainda não acabou. 

 

Me pareceu uma ameaça legítima, mas uma série de risinhos debochados preencheu a quadra logo após. “Quem ela pensa que é?” alguns diziam, “tem gente que não aguenta ouvir verdades”; outros cochichavam palavras indecifráveis e perguntavam pelo estado da capitã, forjando preocupação. 

 

Observei Jeong sair dali, novamente estática por alguns insistentes segundos. Mares de olhos se fixavam sobre mim, mas eu somente encarei a imagem da Park e de seu time — em especial, Heejin e Hyunjin. Algo me trouxe a sensação de que seus olhares sobre mim destilavam rancor, como se me conhecessem de algum lugar. 

 

— Excelentes companhias. — Chaewon disse a mim, desdenhosa. Foi surpreendente que ela estivesse me dirigindo qualquer palavra, mas seus olhos pairaram sobre mim por tão pouco tempo que, quando saiu amparada por atletas, passei a questionar se aquilo de fato acontecera. 

 

Mas bem, eu tinha prioridades diferentes por ora. 

 

Corri em direção a Jinsol. 

 

 

 

(...) 

 

 

 

— Está tudo bem? — Questionei, quando enfim encontrei a loira. Ela dispersou-se como poeira, mas a achei em nosso ponto de encontro (quase) oficial: banheiro feminino. — Você... é... 

 

— Estou ótima — murmurou, secamente. Ela me encarou através do espelho, pressionando um papel toalha contra o nariz, que ainda sangrava. — Mas eu bem que gostaria de ter socado alguém. 

 

— Se serve de consolo... — comecei, imitando seu tom anterior — você até que acertou ela. 

 

— Vá se foder, Hyeju. 

 

— Não me disse que odiava a capitã. 

 

Ela revirou os olhos, enfim virando-se para se apoiar sobre o mármore da pia. Jogou no lixo o papel ensaguentado, esfregando um dos olhos sobre as costas da mão velozmente: 

 

— Odeio cheerleaders, no geral. — Explicou, a voz ainda soando áspera. — Mas a sua namoradinha é o suprassumo de todos os estereótipos merdas associados a elas. Era bem esperado eu odiá-la, na verdade. 

 

— Certo — resmunguei. — Então eu namoro uma grandíssima filha da puta. 

 

— Mais ou menos por aí. — E ergueu-se, hesitando um pouco antes de passar por mim. — Bem, Quatro-olhos, boa sorte com a sua Julieta. Agora que fiz minha parte em mostrar de quem se trata... acho que meu trabalho está feito. 

 

Confesso que uma sensação de sufoco repentina me tomou. Eu sabia bem que, se Jinsol — a única pessoa que de fato poderia me ouvir — partisse, voltaria ao meu estado inicial de desamparo. 

 

A segui com os olhos em direção à porta de saída, sentindo como se o soco que levara tivesse me atingido em seu lugar. 

 

— Você... — resmunguei, como um bichinho amedrontado — disse isso num tom de despedida. 

 

Ela sorriu irônica, subitamente de volta à sua postura de frieza e cinismo anterior. 

 

— Não somos amigas nesse mundo aqui, garota. — Respondeu, sem sequer me olhar nos olhos. — E acabei de perceber que contrariar o meu papel só faz com que eu me foda. Nada disso é da minha conta. 

 

E desapareceu corredor afora, me deixando na única companhia do silêncio e da remota conclusão de que, embora as coisas estivessem indo minimamente bem minutos antes, eu não estava em posição de nutrir tanta esperança. 

 

Sozinha outra vez. E de volta à estaca zero. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Notas Finais


referência adoidado a meninas malvadas pq nossa gowon merece, meus amores

guardem essa richa dela com a soul, risos. vai ser importante (e muuuuito mais explorado dessa vez).

até a próxima! ;)


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