História Como (NÃO) Conquistar sua Crush. -Jungkook. - Chapter One

“...Então a bela moça correu ao chegar do terceiro badalar do relógio, deixando para trás o sapatinho de cristal que escapou de seus pés.”

Uma amizade duradoura se dá pelo o que se tem em comum. Seria o núcleo da amizade, de onde se vem o assunto, os planos e programas. Talvez seja o básico da primeira conversa. De repente você se lembra de algo que viu na televisão, questiona se a pessoa mantém gostos por aquilo sem pensar e Boom... Ela confirma animada. Sempre que você ver mais sobre ou algo relacionado à, você se lembra dela.

-Cara, lançou um novo jogo de realidade virtual no Sr. Choi? 'To contando os segundos pra dar um pulo lá.

-Ele não é conhecido por roubar das "crianças"?

-Ele só cobra um pouquinho mais da conta, mas vale a pena. Da última vez que fui lá, ele me deu um pacote de Skittles de graça.

-Pelo menos não foram drogas.

Eu arrastava o lápis cuidadosamente pelo papel, desenhando linhas fracas em sua estrutura levada a um tom madeira. Um rabisco, um esboço, um desenho ou só mais um futuro papel amassado? Minha criatividade vem se limitando a repetições ou a famosa insegurança que me faz desistir de prosseguir. Quando sinto que está para ficar bom... Simplesmente desisto.

Desenhos talvez sejam a segunda maneira que o ser humano obteve para se expressar sem o uso da palavra. A primeira caracterizo como a escrita. Particularmente não me identifico o suficiente e não me autodenomino um bom escritor a nível Shakespeare, se bem que minha vida seria um ótimo drama que serviria como uma inspiração ao autor se estivesse vivo. Quem sabe eu poderia ser reconhecido?

-Aliás, já sabe em qual clube vai entrar no ano que vem? –O líder do grêmio estudantil me perguntou, enquanto organizava a imensa quantidade de papéis soltos em seu fichário. Havia papéis soltos sobre a mesa que ameaçavam cair toda vez que a brisa escapava pelas janelas abertas. –Quase todos já decidiram. Preciso entregar logo a coordenação o balancete com todos os nomes.

-Há algum clube pra quem consegue maratonar 400 episódios de anime em uma semana, sobrevivendo apenas com pipoca e refrigerante?

-Se tivesse eu seria o primeiro a me inscrever. Pode ter certeza. –Ditou divertido com seu sorriso maroto. –Sinto muito desapontá-lo, Jungkook-ah.

- Não posso ficar só no basquete?

-Basquete exige notas boas e não dá nota alguma e... Você precisa de nota. Gostei dessa frase, acho que vou adotar como frase do dia pro Jungkook. -Estalei a língua no céu da boca, enquanto tamborilava' o lápis sobre a madeira clara. 

-Só foi uma nota baixa, não é o fim do mundo, cara. Todo mundo já tirou uma nota baixa em algum momento, vai me dizer que você não? –Eu o encarei e ele ergueu uma sobrancelha contrariado. –'Tá, esse não é o caso. Vou pensar em algum depois.

-Difícil é achar vaga.

-Você é meu amigo, vai dar um jeito.

-Ah, vou. Vai nessa. 

-Eu dou um jeito nisso depois, ainda tem tempo. Se eu estudar consigo passar de ano. Fora que a coordenação espera até depois das férias.

-Você? Estudando? Conta outra. – Revirei os olhos. Ele parecia analisar algo que não me esforcei em perguntar. Estava entediado o suficiente para não me importar com nada. –Voltando aos clubes. Música, literatura avançada, culinária, arte e teatro ainda estão com vagas abertas. Os outros estão completos e... Temos uma vaga no time de Lacrosse.

-Ainda temos teatro? –Fiz uma careta. A senhora Strommy, professora de artes do segundo ano e responsável pelo clube, sempre reproduz a mesma peça para os alunos. O clássico, Romeu e Julieta que conquista a todos com sua melancolia. Entretanto, enquanto nos esforçamos para aprender as malditas falas, ela toma seu café, enquanto conversa com alguns alunos para ficar a par de todas as fofocas do ensino médio. Segundo ela se sente mais jovem interagindo com adolescentes com seus hormônios e juventude a flor da pele.

-Sempre tivemos. A propósito você daria um ótimo Romeu com essa sua cara de 'engomadinho.

-Tem algum personagem que seja mudo? Você poderia tentar o papel.

-Eu e teatro não rola. –Ele deu uma pausa para conferir algo e logo levantou o olhar nervoso. Seus ombros se mantiveram tensos, suas bochechas inflaram engolindo o ar e ele suspirou parecendo tomar coragem. –______! Ainda não entregou sua ficha. Mesmo que mantenha ótimas notas é obrigatório participar de pelo menos duas das tarefas extracurriculares. Vai ser bom pro seu currículo. 

Ela não moveu um músculo por longos minutos. Taehyung havia mudado sua expressão sorridente para envergonhada, havia ficado no que chamam de "vácuo". Decidi então largar o lápis sobre a mesa e repousar o rosto sobre a palma, analisando a situação. Em outras ocasiões eu estaria rindo do garoto, mas queria poupá-lo de um vexame maior.

-Uow, Vácuo.

-Cala a boca.

Irritar Taehyung nunca fora difícil, apelar para seu ego era seu ponto fraco, o seu calcanhar de Aquiles, a folha nas costas de Siegfried e o reflexo no espelho de Medusa. 

Me surpreendi quando ela se levantou e parou em frente a mesa do garoto, deixando o papel livre de qualquer dobra ou mancha em suas mãos. 

-Obrigado! –Ele sorriu e ela apenas moveu os lábios delicadamente, enquanto o rapaz analisava o papel respondido com uma letra muito bem caprichada. Foi o mais próximo de um sorriso que já a vi dar. –Uow, você toca? –Ela apenas assentiu com a cabeça. –O quê?

-Violino, mas estou tentando aprender piano. -Sua voz era baixa.

-Tenho um amigo que toca muito bem, ele me deu algumas aulas uma vez até eu descobrir que música não era o meu forte. Se quiser posso te indicar a ele, ele não cobra muito. Imagino que faria um preço bacana pra você.

-Não, obrigada. Esperarei pelo começo das aulas nos clubes.

-Tem certeza? –Ele perguntou adicionando o papel aos demais, prendendo-os com um clipe dourado.

-Sim, muito obrigada. –Ela se curvou e voltou a cruzar as mãos em frente ao colo. Ela não dirigiu o seu olhar em momento algum a mim, era novamente... Como se eu não existisse. –Posso ir? Ou precisa de mais alguma coisa?

-Não! Obrigado por entregar hoje.

Ela assentiu e voltou para o seu lugar. Seu cabelo parecia maior em relação à primeira vez que a vi e suas bochechas mantinham-se mais coradas hoje. Ela estava muito linda, ela sempre está. Gostaria de poder ouvir mais a sua voz. Descobri que o garoto que a veio buscar naquele dia estuda em uma das melhores faculdades da cidade, mas ainda não sei qual relação os dois mantêm. Observá-la se tornou um passatempo constante, talvez torço pelo dia que ela virá tirar satisfação do por que e eu finalmente poder comemorar que ela dirigiu a palavra a mim.

-E ela uma boa Julieta!

Suspirei e afundei a cabeça na mesa, batendo minha testa na madeira cinza. Queria poder dormir e acordar somente quando a próxima segunda já tivesse chegado. Não quero ir para casa, não quero ouvir a Yujin reclamar, não quero voltar à realidade. Quero apenas sonhar, controlar meus pensamentos e imaginar que está tudo certo.

O professor havia entrado na sala, junto com o resto dos alunos que conversavam do lado de fora, colocando sua pasta sobre a mesa, com um sorriso de orelha a orelha. Biologia. Era... legal, não era obrigado a participar da aula dele e ele passava poucos exercícios sem se importar com a conversa.

-A propósito, a Yujin está olhando pra cá nesse exato momento. –Comentou.

-Deixa ela olhar.

Encarei-a de soslaio. Ela me encarava fixamente, tão pouco disfarçava. Pareceu sussurrar algo que não compreendi por inteiro e não perderia tempo tentando desvendar sua leitura labial. Voltei minha atenção para o professor na frente. Sei que ela queria conversar, sei que ela arranjaria uma forma de me encurralar na hora da saída.

-Até quando vão ficar assim? Vocês eram bem unidos. –Encarei meu melhor amigo. -Estou só comentando.

-Quando ela era minha melhor amiga era legal, agora nem tanto.

-Deveriam se resolver logo. –Ele deu de ombros, simplista. Não é tão fácil, nada é tão fácil com Kim Yujin. -Ou então terminar.

-Você não a conhece. Não dá pra terminar o que não começou.

Após a última aula, os alunos foram liberados. Fugi. Fugi para a sala de artes. Não me despedi de ninguém, nem mesmo esperei que a professora ultrapassasse a porta por completo. Não esperei a chance de uma conversa que sei que resultaria em uma nova discussão. Éramos melhores amigos, crescemos juntos, sabíamos quase tudo em relação ao outro, mas talvez não nos conhecêssemos totalmente, ou as influências do colegial, de uma nova etapa que deu um fim ao fundamental, nos transformou em seres completamente estranhos um para o outro.

Não acho que mudei muito. Não consigo ser tão superficial como ela, muito menos tenho a vontade de agradar os outros entrando em um padrão imposto pela sociedade. Não tenho um ideal certo ou uma personalidade muito bem pensada.

O treino de basquetebol começaria mais cedo hoje. Na próxima semana seria o jogo contra a Hogsmead e isso está estampado em todos os lugares, desde o mural da escola até no Twitter. Com esforço ainda mantenho o título de co-capitão do time, por mais que já tenha desejado muitas vezes desistir de tudo e mergulhar em uma vida de sedentarismo. Esportes nunca foram o meu lance. Sempre foi mais o lance do Yugyeom e do meu pai. Eles compartilham dos mesmos gostos, então não é surpresa para ninguém que o meu irmão mais velho seja o preferido.

 O treinador Jung enviou um SMS alertando-me de que era para estar lá as duas da tarde. Ainda era uma e meia, então não me preocupei em me apressar. Chegando na hora acertada por ele talvez só ouvisse sermões de como devemos ser pontuais e agressivos no dia tão aguardado. Meu pai me encheu de mensagens sobre como eu estava me portando completamente de forma errada e deveria ser mais gentil com a Yujin. Afinal, não disse que ela conseguiria pensar em uma forma de me encurralar?

De fato em minha fuga, esqueci a mochila com o uniforme do time no armário da sala. Não me recordo o porquê do mesmo estar guardado ali, talvez tenha sido guardado em um momento de preguiça.

Os carros já haviam partido do estacionamento e poucas pessoas ainda andavam pelos corredores. Alunos que ficavam para estudar ou procrastinar nos corredores e salas escassas. Ainda não havia me decidido, não sabia qual clube entrar. Talvez investisse em música, meu vocal é aceitável, ou em literatura avançada apesar de odiar intensamente essa matéria. É tudo superficial e na maioria das vezes voltado ao repetitivo, ao amor, ao fracasso no amor ou ao drama do amor. Um drama desnecessário, alguém de fato conhece esse sentimento?

Surpreendi-me quando ultrapassei a porta. Ela ainda estava lá, com a cabeça apoiada sobre os braços e os olhos fechados. Parecia repousar e aparentava estar exausta. Sua pele era tão “fofa” e pálida, poderia vislumbrar as olheiras profundas que marcavam abaixo de seus olhos e a coloração rosada que toma suas bochechas; os sinais que pintam a pele e dão um ar divertido. A sua boca estava entreaberta e ela babava sobre o livro que devia de estar lendo antes de adormecer.

 Me encostei na carteira à frente, onde me disponibilizei em velar seu sono sereno. Nesse momento poderia observá-la tendo total certeza de que não fugiria assim que me visse o que me fazia sentir vitorioso em ter atravessado uma barreira invisível. Não desconhecia sua antipatia por mim, apenas não me importava, era até divertido. Talvez quando acordasse me lançaria um olhar mortal e sairia correndo. Sua franja caia sobre os olhos, estava longa de mais para continuar usando daquela maneira. Afastei-a delicadamente de seu rosto e ela murmurou baixo. Quase inaudível.

-Só mais cinco minutinhos, omma. –Ela fechou o punho e o trouxe consigo até a altura do tórax.

Constatei então que ela realmente estava exausta. Sua respiração era tão calma, a forma que seu peito subia e descia e que movia a cabeça uma hora ou outra, era adorável. Era uma cena ainda melhor que a ver passar pelos corredores cheios no intervalo, fechar a cara quando nossos olhares se encontram, vê-la levantar e caminhar tímida até o quadro, ou ver como seus olhos semelhantes à duas luas cheias brilham quando vai abocanhar seu onigiri.

-Jungkook? O treinador está chamando! Você não vem? –Virei para a porta e levei o indicador aos lábios. O garoto pareceu entender e logo levou as mãos à boca e um sorriso cúmplice nasceu em seus lábios ressecados. Andei lentamente até o limiar escancarado.

-Que horas são aí?

-Quase duas! Já almoçou?

-Não! Depois eu como alguma coisa. Estou sem fome agora. –Ele se esgueirou dirigindo o olhar a garota.

-Posso perguntar?

-Não pode!

Ele não demorou muito para sair, apenas o necessário para que eu pudesse me atrasar ainda mais. Virei-me com expectativas de que voltaria a fazer o que estava fazendo antes. Então encarei a garota novamente, ela parecia estar despertando. Os olhos inchados, uma mecha de cabelo colada aos lábios molhados e as bochechas avermelhadas marcadas com algumas listras do espiral do caderno.

Quando ela me viu pareceu se assustar. Ela logo levantou apressada, começou a guardar suas coisas e saiu rapidamente, com alguns livros ainda em mãos e a bolsa semi-aberta. Seu blazer está amarrotado e os cabelos bagunçados.Em sua fulga um dos livros alcançou o chão.

Talvez já tenha visto essa cena... Sim, vi. Muitas vezes. Que clichê, que repetitivo, que previsível. Mas... Que necessário.

-Ei! –Ela não parou, apenas apressou os passos, tropeçando em seus próprios pés e logo sumiu pelos corredores vazios da escola.

O vento que escapava pelas janelas tocara meus cabelos. Pisquei atônito, eu fui ignorado. Meus lábios se contraíram em um sorriso soprado e abaixei o olhar, encarando o livro caído. Suas páginas balançavam com a brisa e o mesmo abrira-se com a queda repentina.  

-Jungkook?

-Já vou!