História Cursed - "Vas Happenin"

Aquilo poderia parecer estranho, mas Zayn começava a sentir-se mais a vontade na companhia de Harry e Carmina. Poderia até dizer que naquele momento, eram seus únicos amigos. Pessoas que realmente se importavam com ele.

Carmina o tratava como se fosse um filho. Cuidava de suas coisas, cozinhava seus pratos favoritos, conversava com ele. Claro que sabia que ela era paga para tomar conta dele e de suas coisas naquela casa, mas ele podia reconhecer o carinho verdadeiro no olhar da mulher. E gostava disso.

Harry era diferente de tudo o que ele esperaria em um tutor. Pra começar parecia ser jovem demais para ter conhecimento suficiente para ensinar outras pessoas. Isso sem mencionar o fato de ser cego. Não que sua cegueira fosse algo que o impedisse de fazer qualquer coisa, porque não fazia. Harry era capaz de fazer coisas que Zayn não conseguia, mesmo tendo a visão perfeita. E ele contava piadas realmente ruins, mas tinha senso de humor e era capaz de arrancar gargalhadas do moreno com as coisas que contava. E Harry era lindo! Zayn estava aprendendo a ver a beleza por trás das aparências. Harry tinha a aparência de um anjo, com direito a cachinhos e olhos bondosos. E aquelas malditas covinhas quando ele sorria!!! Era um conjunto devastador. Mas Zayn o achava lindo de outras formas agora. Havia um homem muito especial por trás daquela aparência toda. Os dois se tornaram bons amigos.

Além desses dois malucos em sua vida, ele gostava de pensar que tinha Liam também. Mesmo que o garoto nem desconfiasse que estava sendo stalkeado noite após noite. Eram os melhores momentos do dia de Zayn. Andava se esgueirando pelas ruas, seguindo os passos de Liam. Não havia muita mudança na rotina de seus passos, na verdade, mas para Zayn era sempre algo novo. Sempre notava algo diferente na maneira como Liam sorria para as pessoas nas ruas, como era abraçado algumas vezes e se demorava no abraço. Zayn desejava ser uma dessas pessoas e poder abraça-lo também, poder sentir o calor de seu corpo contra o seu. Desejava compartilhar as musicas de sua playlist e dançar pelas ruas como Liam sempre fazia quando estava distraído. Desejava tomar aquele cappuccino quentinho, misturado com o cupcake de morango e jujubas. Imaginava se o beijo dele teria o sabor de todas as jujubas que ele comia quase que diariamente. Desejava um dia poder provar aqueles lábios...

Nunca ia se perdoar por não ter prestado mais atenção naquele garoto quando estavam na escola. Não teria medo de se aproximar se não fosse aquela sua aparência assustadora. Mas pensando por outro lado, o antigo Zayn não veria a mesma beleza em Liam e provavelmente acabaria magoando o garoto, por não se prender a nada e nem ninguém.

Naquela manhã, quando se sentou a mesa para tomar café com seus parceiros de cárcere ( porque ele ainda achava que os dois estavam presos ali com ele!!!), observava inquieto enquanto Harry colocava suco em seu copo. Precisava se segurar para não arrancar a jarra de suco da mão do tutor, apenas para evitar o desespero de ver o outro encher demais o copo e acabar derramando. Mas Harry sabia bem o que estava fazendo, o que não o impediu de provocar o moreno, que finalmente percebeu o sorrisinho sapeca.

- Idiota! – Zayn resmungou rindo.

- Você não tem senso de humor? – Harry tomou um gole do suco e voltou a despejar mais, fazendo Zayn se inquietar novamente – relaxa, não vou derramar nada. Sou cego e não estúpido.

Camina colocou um bolo na mesa, que era o preferido de Zayn. Sorriu para os dois provocando um ao outro e então sentou-se para tomar o café da manhã com eles.

- Advinha quem eu vi chegando de mansinho ontem a noite? – Harry disse se dirigindo a mulher.

- Você não viu nada. – Zayn resmungou, pegando um pedaço generoso do bolo – e eu não sabia que tinha espiões nessa casa.

- E onde o mocinho foi?

- Sabe qual a vantagem de não ter pais? – Zayn disse debochado – não ter que dar satisfações de seus atos. Então me deixe em paz.

Harry riu alto e os outros dois na mesa o acompanharam na risada.

- Olha Harry, eu estive pensando muito depois da nossa última conversa... – Zayn agora estava sério e parecia escolher as palavras com cuidado – existe algum tipo de operação para seus olhos?

Harry o olhou surpreso. Não podia vê-lo de verdade, claro, mas podia ouvir sua respiração e o tom de sua voz. Parecia mesmo preocupado com sua falta de visão. Na verdade aquilo parecia incomodar mais a Zayn do que o próprio Harry, que convivia com sua cegueira havia 10 anos.

- Por que isso agora, Zayn? – perguntou devagar – minha cegueira te incomoda tanto assim?

- Não, não é isso! – disse rápido – mas é que você é jovem e poderia fazer muitas coisas se não fosse...cego!

- E eu faço muitas coisas, mesmo sendo...cego!

- Droga, eu não quis ofender nem nada... – disse agora frustrado  e vendo um leve sorriso se formando nos lábios de seu tutor – é que andei pesquisando, com vários médicos do pais e não encontrei nada...

- Apenas um milagre poderia devolver minha visão, mas obrigado por ter tentado. – Harry disse, verdadeiramente comovido – isso foi muito generoso de sua parte.

- Então, estamos nós dois presos a nossas deficiências. – resmungou.

- Eu não colocaria as coisas dessa forma. – Harry apoiou o rosto nas mãos – não me sinto preso pela minha cegueira. E você não deveria sentir-se preso por sua...atual condição.

- Claro que não. – disse irônico – eu poderia me juntar ao circo!

- Não tem senso de humor suficiente pra isso! Seria um péssimo palhaço! – Harry disse tentando ficar sério e Zayn riu , sem poder evitar. – vamos ficar bem, garoto.

- Acabo de perceber que não disse onde foi ontem a noite. – Carmina interrompeu a conversa dos dois.

- Fui ver uma...pessoa. – disse meio sem jeito.

- Isso é uma novidade. – Carmina se animou – fico muito feliz por você. Já estava mais que na hora de parar de se esconder e ver outros rostos que não sejam o meu e o de Harry.

- Eu nem falei com el...com a pessoa. – Zayn disse baixinho – nem sabe que eu estive lá e não quero que veja...isso que me tornei.

- Que tal pequenos passos, Zayn? – Harry se meteu na conversa – pode se aproximar devagar. Começar uma conversa ou apenas dizer um “como vai?”

- A vantagem de você ser cego é que não pode ver o motivo pelo qual eu jamais poderei me aproximar e apenas dizer “como vai”, pra alguém. – Zayn disse amargo.

Harry ficou um tempo olhando pra ele e aquilo era algo que sempre o incomodava, porque o fato de seu tutor ser totalmente cego, não afastava aquela sensação de ele podia enxergar até sua alma, quando o olhava daquela forma. Causava arrepios.

- Como eu disse...pequenos passos! – ele levantou-se animado – precisamos comemorar!

Zayn o olhou de maneira estranha e depois riu quando trocou um olhar com Carmina. Harry as vezes parecia maluco. E foi assim que os dois acabaram na cobertura, jogando golfe. A cada tacada, uma bola era lançada sobre a cidade e os dois gritavam “Vas happenin” a plenos pulmões e depois se acabavam de tanto rir.

Naquela noite, Zayn saiu mais uma vez para ver Liam. Ficou escondido em uma escada de incêndio enquanto o garoto lia por horas a fio, sentado na janela de seu apartamento. Mais tarde, como de costume, foi até a cafeteria e fez o mesmo pedido de sempre. Cappuccino, cupcake de morango e jujubas. Zayn sorriu, vendo o lindo menino ganhar as ruas, mastigando as guloseimas como se fosse a coisa mais gostosa do mundo.

Houve uma mudança naquela noite. Zayn seguiu seu garoto e mais algumas pessoas que foram a um lugar diferente, carregando bolsas, que ele descobriu mais tarde, conterem alimentos. Foram distribuídos para pessoas que estavam pelas ruas e não cansavam de agradecer aos garotos pelo alimento que estavam recebendo.

Liam pareceu dar atenção especial a um deles e Zayn quis saber o motivo, se aproximando o máximo que pode para tentar ouvir a conversa.

- Ei Ben, eu trouxe um sanduiche. – disse ao homem que parecia mesmo faminto – é seu favorito.

- Obrigado Liam. Você é um anjo, menino.

Zayn concordava com isso!

- Como está seu pai? – o homem perguntou.

Definitivamente era alguém que Liam conhecia bem.

- Papai está bem. – aquilo pareceu entristecer o garoto – está tentando se manter longe de encrencas. Mas sabe como ele é, não sabe?

- Geoff é um bom homem e tem muita sorte por ter você!

- Eu devia ser o filho e ele o pai. Não o contrário. – Liam desabafou e o homem lhe ofereceu um sorriso desdentado – mas eu o amo, Ben. Não consigo virar-lhe as costas.

- Como eu disse, você é um anjo na vida dele.

- Se cuida, Ben. – Liam se afastou.

Zayn se perguntou o que poderia haver de errado com o pai de Liam. Se considerar a situação do homem ali, podia imaginar uma coisa ou outra. Acabou se dando conta que nada sabia sobre Liam Payne.

Seguiu novamente o garoto quando ele voltou pra casa. Observou-o entrar em casa e estava pronto para ir embora quando teve certeza de que ele estava em segurança. Já era bem tarde. Mas quando virou-se para ir embora, viu Liam saindo da casa novamente e tinha uma expressão preocupada enquanto chamava pelo pai.

Seus instintos diziam que algo de errado estava acontecendo, então continuou seguindo. Liam entrou em um portão lateral ao prédio em que morava. Zayn atravessou a rua correndo e quase sendo atropelado pelos carros. Não queria perder seu garoto de vista. Se escondeu quando ouviu a discussão que acontecia na escada de incêndio. Dois homens encurralavam um senhor, que Zayn logo descobriu ser o pai de Liam. Falavam algo sobre uma divida. Drogas. O pai de Liam era um viciado em drogas?

- Eu preciso de mais tempo. – o homem  implorava.

- Acha que estou de brincadeira, seu viciado de merda! – disse empurrando o homem – eu quero minha grana e seu prazo acabou.

- Pai, não acredito que está metido com esses caras de novo! – a voz de Liam entrou na conversa.

- Eu sinto muito Liam. – o homem agora chorava.

- Calem a boca e você saia daqui garoto! – o bandido gritou – isso é entre mim e seu velho.

- Nós conseguiremos a grana, Victor. – Liam disse sem hesitar – eu vou dar um jeito nisso, mas deixe meu pai em paz.

- O tempo de seu pai acabou. Eu e meu irmão queremos nosso dinheiro essa noite ou isso vai custar mais caro pra ele.

O homem apontava a arma para o rosto do pai de Liam, que começava a se apavorar. Seu pai fazia essas merdas o tempo todo, se metendo com esse tipo de gente por alguns momentos de alivio que a droga lhe proporcionava e era sempre Liam quem pagava por isso. Mas nessa noite, parecia que Victor tinha usado seu próprio bagulho e parecia instável demais, impossível de negociar com alguém assim. Aquela arma balançando entre ele e seu pai o estava deixando assustado, porque o bandido parecia não ter nada a perder.

Não sabe bem quando aconteceu, mas assustou-se quando um vulto pulou sobre Victor e o desarmou. Liam gritou por seu pai e tentou ir em seu socorro, mas o irmão de Victor o empurrou na escada e ele caiu rolando pelos degraus até tudo ficar escuro e seu corpo parar de se mover.

Dessa vez foi Zayn quem se apavorou ao ver o corpo de Liam caído no chão, de uma maneira que não parecia certa. Correu até ele, acertando um doa bandidos no caminho. Checou sua respiração. Graças a Deus estava vivo, mas precisava tirá-lo dali. Com certa dificuldade e muito cuidado, ergueu seu corpo e carregou até a escada de entrada do apartamento que ele morava. Ele ficaria bem. Correu de volta ao local para ver o que havia acontecido com o pai de seu garoto. Se apavorou quando ouviu os tiros. Escalou as escadas com rapidez e parou surpreso ao ver Geoff Payne empunhando a arma e um dos bandidos morto no chão.

- Você vai pagar por isso Geoff! – Victor ameaçou – eu sempre deixei seu filho fora de suas confusões. O garoto é boa pessoa, mas eu tirarei a vida dele pela do meu irmão. Um dia eu o encontrarei e acertaremos nossas contas.

Geoff quis gritar de tão apavorado que estava e quando se virou, viu Zayn que havia abaixado o capuz. Aquele garoto todo marcado o assustou.

- Quem é você? – apontou a arma para o peito de Zayn – o que fez com meu filho?

- Liam está seguro!

- Eu preciso ir atrás do Victor...ele vai matar meu filho...

- Eu não faria isso. – Zayn o desarmou – já teve problemas demais por hoje. Você acaba de matar um homem.

- O que você quer? – olhava assustado para Zayn – não me ajudou de graça. Me diz o que você quer de mim?

E foi quando Zayn teve a mais louca e talvez mais estupida de suas ideias. Aquele homem  a sua frente estava desesperado e descontrolado. E Liam estava na mira dos bandidos. Zayn poderia proteger seu garoto.

- Eu quero Liam! – disse decidido.

- O que? – o homem arregalou os olhos de medo.

- Eu quero apenas protege-lo! – o moreno explicou – aqui não é mais seguro pra ele.

- Eu posso proteger meu filho! – Geoff se negou.

- Por favor. – Zayn disse mais brando – prestou atenção no que o cara disse? Ele vai vir atrás de seu filho e não poderá protegê-lo. Eu posso fazer isso! Se ele ficar comigo, ninguém vai encontra-lo e estará a salvo.

- Você é louco? Não vou deixar que leve meu filho! – o homem gritou – eu nem sei quem você é!

- Se fugir, vou mostrar as provas de seu crime! – Zayn não sentiu nenhum remorso em chantagear o homem, tirou fotos do corpo e da arma, assim como do próprio Geoff – a policia vai adorar receber isso.

- Não! Não!!! – Geoff andava de um lado pro outro, repuxando os cabelos – meu Liam é inocente...não! Não!!! Ele é um bom garoto! Não posso permitir isso...é muito confuso...não!

- Matar um homem também é muito confuso, Geoff! – disse friamente e o homem o encarou, sentindo-se acuado.

Pareceu pensar e Zayn sentia seu coração pulando no peito de ansiedade. Sabia que o que estava fazendo era errado. Chantagear um pai em um momento de desespero era covardia. Mas ele não via outra maneira de ter Liam por perto e mantê-lo a salvo.

- Mas o que ele vai pensar sobre você? – o homem o olhou com atenção e ele sabia que sua aparência não era mesmo das melhores – como explico isso ao meu filho? Liam tem 18 anos, é um menino adulto e não posso força-lo a ir pra sua casa, seja lá onde isso for. Não posso fazer isso. Ele é inteligente demais para acreditar em uma história qualquer.

- Diga a verdade sobre o que aconteceu aqui. – Zayn decidiu – conte sobre a morte e sobre a ameaça do tal Victor. Pode dizer a ele que sou filho de um velho amigo seu e que ele ficará comigo por um tempo, até as coisas se acalmarem por aqui. Liam vai aceitar isso, eu tenho certeza.

Mesmo relutante, Geoff aceitou. No fundo ele sabia que era o melhor a ser feito naquele momento, mas também sabia que Liam o odiaria por isso. Seu único desejo era que aquele estranho realmente pudesse proteger seu garoto de toda aquela sujeira na qual ele estava metido.

E naquela noite, Zayn correu feliz para casa. Precisava ajeitar todas as coisas para a chegada de seu garoto. Não haveria mais suas noites seguindo Liam pelas ruas, porque seu lindo menino estaria em sua casa, debaixo do mesmo teto, respirando o mesmo ar que ele respirava. Era sua chance de conhecer realmente Liam Payne...

E talvez mostrar um pouco dele...talvez!