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História Cursed Lovers - Ato V - Espelho


Escrita por: UchihaKonan

Notas do Autor


Olá! Olá!
Acredito que eu não cheguei a mencionar, mas a fanfic toda se passa no ano de 1141. Um ano aleatório que escolhi, mas apenas para ilustrar e pra poderem entender algo futuramente. De qualquer forma, boa leitura e dúvidas, sugestões e críticas, sinta-se em casa.
Um beijo e até mais.

Capítulo 5 - Ato V - Espelho


  / ESPELHO                                        

Sasuke prendeu o manto com um botão dourado esculpido o brasão de sua família. A espessa capa rubra caiu-lhe até a altura das botas de couro enegrecido. Com rapidez espiou pela fresta das cortinas o céu cinzento da manhã. Não desejava chuva, apesar da época  ser conhecida por longas e duradouras torrentes de água a qualquer momento do dia. Mas hoje não podia chover. 

Raramente ia à vila, apenas para resolver problemas em que ele próprio tivesse de estar presente, mas se fosse possível evitava visitar o lugar. Entretanto, o que iria buscar em Konoha não era necessariamente algo que demandasse dele companhia, nem mesmo dos guardas. Confiara em Kakashi para tudo durante sua vida e regência, mas há sempre um segredo ou outro que pretendia ocultar da vista de todos. Mas para o Lorde Uchiha, em específico, alguém

Atou a espada ao cinto e a deixou ser escondida pelo manto, seria bom que não o vissem armado na estrada. Com o verão também vinha a grande colheita de salteadores e homens das montanhas, quais adoravam saquear e causar o caos. Algo que o título de Sasuke forçava-o a defender seu povo.

— Traga-me mel — virou-se na direção da voz de Karin —, e um pouco de cravo-da-índia — a ruiva aproximou-se, sorrindo de canto e mantendo as mãos unidas sobre o vestido escarlate que se fundia ao rubro de seus cabelos. — Se lhe aprouver, meu senhor.

— Peça a Suigetsu — o Uchiha respondeu e tornou a arrumar suas vestes.

— Ele esteve aqui dia desses — não se permitiu hesitar diante da menção dela —, por isso vai para a vila hoje.

— O que quer, Karin?

Encarou os olhos da mulher, brilhantes e sugestivos em diversos aspectos. A conhecia tempo o suficiente para reconhecer os seus pequenos jogos de adivinhação, não cairia em nenhum destes. Não mais. 

— Mel e cravo-da-índia — ela sorriu —, e saber se ele perguntou de mim.

— Não — Sasuke caminhou até a porta —, veio pelo ouro, como antes. Agora saia.

Abriu a porta para que a criada passasse, mas esta estava presa à visão da janela. Karin olhava por entre as cortinas, parecia surpresa com o que via. Ela suspirou e virou-se sorrindo para o Uchiha.

— Arrancaria a minha mão se tivesse feito o que Sakura está a fazer — ela disse. — Por que a deixou arrumar o jardim?

— Para ficar longe e ocupada — gesticulou a saída para a mulher. — Prevejo que terei de fazer o mesmo a você, se não sair agora.

Viu-a engolir em seco as palavras frias dele, forçando-a sair com sua honra e silêncio. Karin desconhecia limites e por vezes isso o obrigava a sonhar com trancá-la nas celas das masmorras, mas tinha prometido que não faria nada a ela. E Sasuke mantinha suas promessas sendo cumpridas, mesmo que seu desejo fosse outro.

Cruzou o salão principal do castelo e este estava vazio, com sua decoração antiquada e quadros encobertos, impedindo que qualquer visitante visse suas pinturas antigas. Por vezes nem mesmo o Uchiha recordava-se das figuras ali pintadas, o que lhe era preferível. Ao romper a grande porta de saída, deparou-se com o jardim capinado e inúmeros montes de plantas secas e mortas recolhidas.

Vasos de flores e buracos com sementes surgiam a cada dia que se passava. Pelo menos está longe, pensou ao se dirigir até o estábulo.

Seu corcel estava pronto para partir, tinha pedido a Suigetsu que o deixasse pronto, tinha intenções de sair ainda durante a madrugada, mas pegara-se dormindo até mais do que lhe era comum. 

Montou, puxou o capuz do manto para a face e trotou em direção aos portões. Um par de guardas jogava dados e outros se mantinham em seus postos ao lado das grandes e largas grades de ferro, qual se corroía com o tempo. Ao vê-lo se aproximar, os homens abriram os portões e ficaram apenas com a poeira que o Lorde Sasuke deixara com seus galopes.

A estrada que ligava até o vilarejo de Konoha se bifurcava em diversos ramos ao longo do caminho. Trilhas de caça, estradinhas de rocha e de terra batida que levavam a lagos, casas de pescadores e matas mais além iam e vinham durante todo o percurso. Mais a frente teria de passar por um penhasco, até finalmente chegar ao vilarejo. Ao redor árvores altas e com copas volumosas formavam um túnel de folhas, impedindo de se ver o céu. E os raios de sol invadiam sempre e jorravam-se em feixes claros, iluminando todo o lugar. Mas não hoje. Hoje com o céu cinzento era ali também escuro, algo que facilitava a vida dos bárbaros vindos de outras cidadelas em seus saques.

O cavalo resfolegava e isso forçou o Uchiha a diminuir a velocidade, agora guiando o corcel vagarosamente pela estrada, se olhasse para trás já não mais veria o castelo se debruçar sobre a colina. As árvores o impediam dessa visão. 

Além do som de cascos, os pássaros piavam e asas batiam. Aquelas florestas eram conhecidas por serem ricamente cheias de cervos e lobos, na vila poderia comprar peles de cor branca, negra e marrom, todas provindas dos animais da mata. Vez ou outra também se ouvia o uivar distante. 

Um par de boiadeiros surgiu, trazendo o carro de bois repleto de suprimentos. Com toda certeza um dos fazendeiros que encontraria seu caminho nos ramos da estrada. Estes baixaram a cabeça ao ver o senhor bem vestido e montado num garanhão puro-sangue. Sasuke não lançou-os um olhar que levantasse suspeitas, conhecia bem a reação das pessoas para com ele. E entendia bem o motivo.

Sentiu-se sedento e tateou o cinto pelo odre de água que trouxera. Soltou as mãos da rédea e rompeu o lacre do vasilhame, deixando o líquido escorrer por entre seus lábios. Calmo demais, Sasuke pensou. Mas era cedo para dizer isso. Um som de cascos batendo ligeiros contra a terra o forçaram a olhar para trás e a segurar sua montaria.

Pássaros deixavam os lugares nos galhos e voavam desesperados por todos os lados possíveis. Fechou o odre e levou a mão livre instintivamente para a espada. Se fosse um ladrão e este quisesse luta, seria bom estar pronto. O relinchar e som de cavalgar vinham cada vez mais intensos e altos, quebrando o silêncio de outrora. 

Esperou, olhando para a estrada, observando a poeira erguer-se com a proximidade do cavaleiro apressado.

E, quando finalmente viu o cavalo vir com velocidade em excesso, soltou do punho da espada. Sendo agarrados pelo vento os cabelos róseos da Haruno se sacudiam brutamente, e a face dela encontrava-se vermelha e os olhos verdes arregalados. Esperou que esta parasse o cavalo ao lado dele, mas ao encontrá-lo o animal continuou em seu ritmo, entretanto, ela gritou por ajuda.

Uchiha Sasuke bateu os pés com força no próprio cavalo, incitando-o a ganhar velocidade para acompanhá-la. Ia atrás dela, qual se segurava tão firme às rédeas para não cair. Notou que ela ainda batia os pés para forçar o cavalo a ir rápido.

— Pare esses pés no lugar! — ele gritou, se curvando no seu corcel para atingir mais velocidade.
— Faça-o parar! — Sakura berrou. — Por favor! Faça-o parar!

Pretendia fazer. Trotou e trotou, cada vez mais ligeiro e desviando de galhos e obstáculos com dificuldade. Teria de se pôr ao lado da Haruno e puxá-la para junto dele. Não teria opção.

Instigava a montaria a correr além do que o animal talvez suportasse, mas Sakura não havia diminuído a sua velocidade. Teria de alcançá-la antes das curvas surgirem, ou esta poderia cair, ou então ficar presa em algum galho e acabar por quebrar o pescoço. A esta altura o caminho tornava-se estreito, o tempo e espaço estavam contra ambos, aparentemente. Sacudiu a cabeça desviando dos pensamentos e cavalgou ligeiro, tinha que dar tempo.

A essa altura o capuz já o tinha revelado o rosto, que devia estar tão ou mais rubro que o da moça à sua frente. Podia sentir o vento puxar seu manto com brusquidão, alguns galhos se partiam ao se prender na capa. Mas nada o fez diminuir o ritmo. Quando a estrada finalmente se tornou larga, pôde pôr o próprio cavalo ao lado do da Haruno. Pressionou as pernas ao redor do animal, para levantar o corpo devagar e esticar os braços na direção dela. Os dedos roçavam o tecido do vestido, mas não os capturava para que se pudesse pegá-la.

Tentou uma vez, outra e outra...

— Venha para o meu lado — Sasuke gritou a ela.

Sakura o olhou, desconfiada e mantendo os dedos tensos presos nas rédeas. O Uchiha olhou para a frente e viu a curva surgir, mortal e os aguardando. Ela teria de vir, e rápido, a menos que quisesse ser lançada pela colina abaixo, até cair ao rio. Seria uma queda longa e tanto.

— Rápido — ele disse.

— Tenho medo — ela gritou de volta —, pode acabar me soltando.

— Sakura — chamou-a —, rápido! Não vou derrubá-la.

A Haruno olhou uma última vez para a estrada e seu fim brutal, até fechar os olhos e se lançar aos braços do homem. Preciso e ligeiro, Sasuke a segurou firme em seus braços. Abandonou as batidas para fazerem o cavalo ganhar velocidade e curvou o corpo para se livrar da grande queda. O animal que a jovem montava desapareceu de vista, se perdendo nas matas.

Colocou-a no chão quando finalmente pararam. 

O manto azul e bordado de Sakura encontrava-se completamente desalinhado, assim como os cabelos e o vestido de cetim verde que ela usava. A moça parecia mais pálida que o comum e se manteve escorada ao tronco de um grande carvalho, ofegante e tremendo.
O Uchiha desceu rápido do cavalo, batendo os pés no solo com força e irritado.

— Está louca ou pretende ficar? — perguntou a ela, que se encolheu. — O que deu em você?

— Eu sinto...

— Não — ele berrou, forçando os pássaros empoleirado nas árvores a alçarem voo —, não comece a se desculpar. Não me importo com o que sente ou com as suas lágrimas. Cumpra seu dever e fiquei longe! Será pedir demais?

A jovem Sakura o encarava surpresa, o rosto de um branco que permitia um destaque ainda maior às bochechas vermelhas e aos olhos verdes. Sasuke pensou que ela logo começaria a chorar, ou então a suplicar, por esta razão se virou para a direção do cavalo e a deixou sozinha. Quase não suportava os pedidos de perdão que vinham dos lábios rosados da Haruno, lágrimas serviriam para tirá-lo do controle. 

Abriu o odre com água e bebeu, o Uchiha sentia-se sedento e suficientemente irritado. A moça parecia sempre tentada a criar uma proximidade que não deveria existir em forma alguma. Ela era apenas a criada, ele um alguém que não permitiria outra vez perder tudo por meros laços. 

Mas, enquanto se mantinha de costas a ela, aguardando os resmungos lamuriosos que viriam, o farfalhar das copas e o bater dos cascos do corcel eram ouvidos unicamente. Nenhum som veio da Haruno. Olhou-a por sobre o ombro. Sakura ajeitava os cabelos róseos, trançando os fios calmamente e mordendo o lábio inferior da sua maneira, repreendendo algo no interior. Ele não sabia exatamente o que deveria sentir, as chamas da ira já haviam se extinguido, entretanto, era incapaz de articular um movimento menos intenso ou agressivo. 

— Tome — estendeu o odre a Sakura, qual fitou-o curiosa —, é apenas água.

Ainda que hesitante, ela aceitou e ao beber, água escorreu-lhe pelos lábios e queixo, umedecendo o tecido de sua roupa. Notou que esta corou ao tê-lo olhando tão avidamente.

— Onde estava indo? — ele questionou-a.

— Ah — a Haruno girou no próprio eixo, buscando por algo no manto. Enquanto se movia, um pacote embrulhado caiu de suas vestes. Sasuke se aproximou e pegou o pacote —, pensei que tivesse perdido... — ele movimentou as cartas, sem remetente e num papel ricamente lustrado. Reconhecia aquilo. — Chegou logo que saiu, o entregador disse que devia ser lido com urgência. Então tomei a liberdade de vir atrás, pensei que não fosse estar tão distante.

— Como ele se parecia?

— Quem? — Sasuke suspirou e movimentou as cartas na direção dela. — Ah. Parecia comum.

— Comum...

— Tinha um cabelo prateado, bem, e era acompanhado por um jovem com marcas no braço — ela levou os dedos aos lábios, pensativa. — Fora isso, comum.

Lorde Uchiha enfiou o pacote de cartas no interior do manto. Já pressentia o assunto destas, mas as leria com calma no castelo. Agora, tinha um lugar para ir.

Guiou-se até o cavalo, preparando para desamarrá-lo, quando um zunido sou próximo dele. Olhou para a direção do som e viu uma flecha cravada no tronco da árvore. Segurou ao cabo da espada, buscando pelo atirador. Sakura também notara e procurava por algo. Um breve silêncio os dominou, até que gritos vindos da mata ganharam força com som de passos apressados. Homens correndo. Sasuke desembainhou a espada e olhou por todos os lados.

Um par de homens armados em machados de batalha surgiram. Seus rostos eram pintados em cores cruas, suas vestes surradas e totalmente esguios. Típicos homens das montanhas, selvagens que se achavam donos de tudo e assíduos salteadores.Não demorou para que estes viessem na direção do Uchiha, com o machado pronto para o ataque e gritando. Um instante depois e aço ressoava contra aço, batendo numa luta. Por serem magros e com pouca força, era fácil empurrar um e se manter em duelo com o outro. O mais pequeno do par foi o primeiro a cair, tropeçando num tronco e se atrapalhando. O segundo saltou sobre Sasuke, se segurando às costas dele, berrando qualquer selvageria e tentando atacá-lo ao pescoço. Mas num empurrão em direção ao tronco de um carvalho, Lorde Uchiha o pressionou contra a madeira com força. Ouviu o estalar das costas desse ao bater com força. As mãos que se agarravam a ele foram soltando aos poucos.

Ofegante, Lorde Sasuke inspirou profundamente. Passou a mão pela testa e pensou que teria acabado. Até ouvir os gritos de Sakura, procurou por ela e a viu se arrastar pelo chão, atirando pedras no homem que se aproximava dela. Este agarrava-se num punhal, movimentando-o vagarosamente na direção da jovem. Ele tentava desviar das pedras, mas algumas o acertavam no ombro, peito e uma passou de raspão pela cabeça. 

Ao que deu um passo para ir ajudá-la, o Uchiha ouviu outros passos. Um salteador veio, jogando o arco no chão e tirando do cinto uma espada longa. Diferente dos outros, este tinha um corpo maior e músculos mais definidos. Seus olhos como duas castanhas e a pele bronzeada, marcada por diversos riscos na carne. O selvagem rugiu qualquer coisa e correu em direção de Sasuke, sacudindo a espada na direção dele. 

Conteve o primeiro ataque com a espada, o que forçou o aço a deslizar e causar um som estridente ao se chocar na arma do inimigo. Foram para um lado e outro, lutando. O metal tilintava a cada encontro. O homem era duas vezes maior que o Uchiha, e com uma força maior também. Cada investida e vez que segurava o ataque, sentia seu braço doer e dava sempre um passo hesitante, fazendo com que a perna equilibrasse o restante do corpo. Estava em desvantagem ali.

Mesmo assim, diante de toda a força e brutalidade do selvagem, a sua vantagem surgiu. Por ser maior, os movimentos eram lentos e demoravam para se restaurar. Sem contar no fato de a espada também ser longa. Bateu com a lateral da espada no braço do inimigo, obrigando-o a soltar um guincho de dor. Olhou para a direção da Haruno e correu até ela, agora o outro selvagem já se aproximava dela e estava prestes a agarrá-la. Num suave movimento, Sasuke cortou o ar e a cabeça do homem. Sakura fechou os olhos, para então tornar a abri-los e gritar, apontando na direção do outro.

Lorde Uchiha girou rapidamente, mirando a ponta da espada na direção do brutamontes, que vinha correndo e com a espada grande ao alto, preparada para atingi-lo.Desviou para o lado, para não ser atingido, ainda assim, o homem o atacou outra vez. Segurou mais um ataque, travando as espadas. Com o pé, empurrou-o pelo torso, mas este era forte demais. Sasuke se esforçou ao limite de sua força. Mas não aguentaria por muito tempo prender a arma dele e também se esforçar para  atirá-lo para longe. 

Foi quando Sakura surgiu, pulando e se atrelando ao pescoço do selvagem. Ela tinha a adaga em mãos e deslizou-a ligeira ao pescoço do inimigo, qual gritou e caiu como uma rocha aos pés do Uchiha. Olhou para ela, que respirava fora de ritmo e, assustada, largou a arma e deu um passo para trás.

— Acabou — a Haruno murmurou —, deuses...

— Precisamos ir — Sasuke disse e foi para junto do cavalo —, pode haver outros. Virão atrás destes.

— Onde iremos? 

— Tenho de ir a Konoha — Lorde Uchiha declarou e montou —, não posso mandá-la a pé de volta ao castelo. Virá comigo.

— Tem certeza? — ela perguntou —, quero dizer...

— Deuses — ele revirou os olhos —, como pode ser tão irritante? 

Haruno Sakura saltou do cavalo antes de chegarem aos portões do vilarejo de Konoha. Lorde Uchiha Sasuke não tinha sido de um todo cruel, haviam perdido um tempo buscando pelo cavalo que quase a lançara precipício abaixo. Acabaram encontrando o animal entre as árvores, comendo a grama rente à estrada. Dessa forma, depois dele explicar a ela com seu tom frívolo que não deveria bater os pés rapidamente, cavalgou devagar ao lado do seu senhor. Ambos em silêncio. Uma vez outra ele ia à frente, rápido, mas então retornava ou a esperava. Até chegarem ao vilarejo.

Os altos portões de aço enegrecido pelo tempo tomavam formas de espirais, rosas e dobraduras que Sakura não compreendia. Ainda que tivesse vivido ali boa parte de sua jovem vida, os limites da vila não lhe eram permitidos. Hikaru costumava dizer que se ela colocasse os pés para fora, Lorde Sasuke a cortaria a cabeça e daria aos corvos. Nunca se atreveu a passar dos portões. Ino rira disso quando a confessou seu medo, para provar que nada ocorreria, ela mesma ultrapassou os limites e retornou sorrindo vitoriosa. Mas a Haruno sequer tentara.

— Leve os cavalos aos cavalariços para que os dê água e aveia — Lorde Uchiha disse ao descer do seu corcel. — Possuo assuntos por tratar, estarei de volta em uma hora. Esteja pronta ou a deixo para trás.

— Sim, meu senhor.

Apressado, Lorde Sasuke Uchiha se misturou à multidão. Ficou parada, olhando-o receber olhares cobiçados dos outros. Mas, na maioria, era de desprezo fundido ao terror. Algumas pessoas desviaram os olhos, outras baixaram a cabeça e, teve ainda quem o praguejasse num latim arrastado. Algum religioso disposto a descobrir se ele era mesmo um demônio. Sakura sentiu-se angustiada diante da reação dos moradores da vila em relação ao Uchiha. Era como se ele realmente fosse um visitante indesejado.

Entretanto, Sasuke passava por eles sem se importar com as ofensas baixas, ou pelos olhares de desprezo. Quase como se não os notasse.

A jovem suspirou ao notar que ele sumira entre a multidão do mercado. Guiou os cavalos para os estábulos, onde encontraria Sai. O rapaz adorava animas e tinha uma mania de desenhar as criaturas em seu tempo vago. Certa vez ele fizera um retrato de Hikaru em forma de rinoceronte, alegara que o irmão dela se assemelhava a um quando usava o manto acinzentado. Jamais contara a ele o que o rapaz a confidenciara.

Como presumiu, lá estava Sai, escovando um castrado malhado, que devorava uma maçã. Ao vê-la puxando as rédeas de um par de cavalos, assoviou e abandonou a escova ao chão.

— Um puro-sangue — ele disse, com as orbes brilhantes. Acariciou o pelo curto e negro —, conheço este garanhão.

— Lorde Sasuke os quer alimentado para a viagem de retorno — a Haruno disse e entregou a Sai as rédeas.

— Agora entendo porque não a vi na vila recentemente — ele comentou, ainda encantado pelo cavalo —, tornou-se a criada de um Uchiha.

— Sim — ela concordou. — Volto para pegá-los logo, se apresse.

Ao deixar os estábulos, a jovem Sakura lançou os olhos para a sombra que o sol encoberto por nuvens cinzas jorrava à cidade. Tinha tempo de vasculhar o mercado, enquanto aguardava o seu senhor resolver seus assuntos.

Sempre adorara o distrito mercante. Vendedores vindos de todas as regiões do país traziam mercadorias diferentes e algumas importadas de terras longínquas para além do mar. Joias, objetos de decoração, vestidos de seda e rendas, tecidos feitos de ouro e prata. Sapatos em couro e sandálias com tranças, até de peles tinha visto. Temperos vindo das Índias sempre possuíam um cheiro e sabor forte, alguns mercadores deixavam os clientes provarem dos doces. Armas em aço cravejado por pedras coloridas, armaduras de vidro e até mesmo arcos feitos de ossos.

Os preferidos de Sakura eram os vendedores de livros. Histórias do mundo todo, sobre lugares e viagens feitas até os limites do mundo. Ah, adorava as canções feitas por trovadores para suas damas.

Havia também sempre uma barraca cheia de artigos misturados. Estes sempre vendiam mais caro, mas as peças eram compradas dos moradores da vila por um preço ínfimo, mesmo que a peça fosse de raridade. Tinha visto Hikaru vender muito a esses homens, algo comum aos outros também, especialmente em tempos de necessidade.

Foi forçada a parar diante da loja montada por um homem, que chamava os clientes com a voz embargada de um sotaque engraçado. Ali, apinhado num canto, próximo de joias e tecidos, encontrou o seu item de maior valor. Reconheceria-o mesmo em um quarto lotado por espelhos. Se aproximou e tomou o espelho de prata nas mãos. 

Girou-o e notou as inscrições feitas com a caligrafia delicada de sua mãe, qual já ia se apagando devido ao tempo. As bordas eram repletas de desenhos e havia um trincado mínimo na borda em direção da haste usada para segurá-lo nas mãos. 

— Vejo que a senhorita gosta do espelho — o vendedor aproximou-se —, eu, Kakuzu das Ilhas do Verão, posso vendê-lo à jovenzinha por cinco moedas douradas — ele a olho de cima a baixo —, se esta as possuir...

Sakura sentiu as lágrimas virem aos olhos, não podia acreditar que seu irmão tinha vendido algo que pertencera à mãe de ambos. Algo tão íntimo e deixado a ela. Talvez ele não me veja mais como sua irmã. Agora que fui embora e ele me vendeu. Pensou e encarou-se no espelho. 

Na imagem refletida, observou a si mesma, mas, ao encontrar Lorde Sasuke caminhando em sua direção, não baixou o objeto. Permaneceu seguindo-o, até que este se colocou ao seu lado. Os olhares encontraram-se no reflexo, se costurando um ao outro. A Haruno sorriu minimamente, a última vez em que tocara em seu espelho de prata fora no dia em que se mudara para o castelo do Uchiha. E, outra vez, ali estavam ambos, refletidos no mais precioso tesouro que esta costumava possuir.

— Pertenceu à minha mãe — Sakura disse, olhando para Sasuke e ninguém mais. Ele franziu a testa, intrigado —, o espelho. A única lembrança que possuía dela. E meu irmão o vendeu...

— Temos de ir — Lorde Uchiha murmurou. 

— Eu sei... — ela não queria se despedir da peça. Mas não possuía o ouro para comprá-lo de volta.

Ainda que os olhos se enchessem de lágrimas, pousou-o junto da pilha de objetos com lentidão, como se cada centímetro em direção ao ter de deixá-lo fosse uma flecha enfiada em seu peito. Acariciou-o uma vez mais.

— Meu senhor — o vendedor caiu num joelho —, não tinha notado-o.

Sakura olhou para Sasuke que olhava para Kakuzu ajoelhado.

— Senhor Uchiha, Lorde Fugaku foi um grande aliado de meu avó — disse o mercador —, permitiu-o tanto para que tornasse suas vendas o negócio da família — o Uchiha o indicou para que se levantasse. — Por favor, não sabia que esta era a sua senhora, por favor, fique com o espelho minha jovem. 

Desconfiada, a Haruno olhou para o homem ao seu lado. Ele apenas movimentou os ombros em indiferença ao que ela o perguntava com os olhos, pedindo autorização para aceitar o espelho. Com um sorriso vitorioso aos lábios, colheu o espelho da pilha de objetos.

— Agradeço-o — Sakura disse.

— Oh, não precisa — o vendedor falou sorridente e com seu sotaque ainda mais arrastado —, este sente-se feliz por ter presenteado uma dama.

— Vamos, Sakura — Sasuke disse, autoritário. 

Outra vez retornaram à estrada.

Lorde Uchiha ia à frente, em silêncio e ignorando-a desde que deixaram a vila. A Haruno por outro lado segurava-se firme ao espelho, mantendo-o a salvo em seu manto. Sentiu-se ligeiramente má por ter pensado que o Uchiha se tratava de um monstro, quando ele a tinha conseguido o seu maior tesouro de volta.

Trotou para mais perto dele, colocando o cavalo ao seu lado.

— Obrigada por ter conseguido meu espelho de volta — disse a ele que a olhou de canto. — Ainda mais quando o vendedor pensou que eu fosse a sua...

— Não fiz nada — Sasuke a interrompeu. — Não há motivos para me agradecer.

— Mas foi graças ao seu título e...

— Nada que precise agradecer — ele tornou a dizer —, não há nenhuma ação minha com isto. Ele a deu o espelho, agradeça-o. Não a mim. 

Lorde Uchiha Sasuke não esperou que ela o contestasse, apenas esporeou o cavalo rapidamente pela estrada. Sakura viu-o sumir na curva e então voltou-se ao espelho, mirando-se na prata. Que ele negue o quanto quiser, pensou, me ajudou a ter isto de volta.



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