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História De rascunhos e pétalas - Aisatsu


Escrita por: bleedingrainbow

Capítulo 2 - Aisatsu


A manhã seguinte estava quente como Kirishima gostava, mas dentro da Deadly Nightshade estava ainda mais, ainda que um estranho frescor acompanhasse, com seu cheiro de plantas. Quando Kirishima abriu a porta da frente, a primeira coisa que ouviu de dentro de um ambiente que parecia demandar ser bucólico foi “eu vou matar esse sininho idiota,” numa voz rosnada. Ergueu o olhar para a pequena sineta que tocava quando alguém entrava na floricultura.

“Eu tinha uma dessas no meu estúdio antes, não durou dois dias até que eu não aguentasse mais. Se isso ficou aqui desde sempre é porque você não deve receber muitas visitas.” Ele deu uma risada, as mãos na cintura, e soltou a porta, atravessando por um corredor entre estantes de flores.

Bakugou permanecia detrás de sua mesa. Era o tatuador de cabelo vermelho de ontem. O que diabos ele estava fazendo ali, com aquela cara de bobo e o penteado imbecil agora apontando pra cima? Ele conseguia estar mais ridículo do que no dia anterior, mas pelo menos estava usando uma camiseta, por mais horrorosa que fosse.

“O que você quer?” Bakugou latiu lá do fundo, vários metros adiante do então potencial cliente. Mas Kirishima estava ainda olhando ao redor, olhos escrutinando os arranjos e flores ao seu redor, levemente boquiaberto. A falta de resposta fez Bakugou rosnar baixo, mas contra todos seus ímpetos resolveu ignorar. Tirou as luvas e jogou-as sobre sua mesa de arranjos, dando a volta, olhos fixos e atentivos no visitante. O tatuador tinha a maior cara de otário do mundo enquanto olhava ao redor, como se nunca tivesse visto algo mais interessante na sua vida inteira.

E, embora fosse uma hipérbole de Bakugou, era fato que Kirishima estava mesmo estarrecido. Jamais imaginaria que uma floricultura podia ser tão intensa e viril; era na verdade o oposto do que ele podia imaginar, sendo bizarro até de considerar que um dia utilizaria tal definição pra esse tipo de estabelecimento. A agressividade dos cactos e as rosas cujos espinhos não eram sempre arrancados, mas cultivados e entremeados. E de repente uma delicadeza pontuava a cena toda, alguma coisa tipo um inocente amor-perfeito, como se exatamente para trazer à tona a intensidade, a qual parecia dinâmica mesmo em um local tão estático. Respirava aquele calor úmido característico de estufa e aquilo tudo só o encheu de entusiasmo.

“Caralho, esse lugar é muito foda!” Kirishima disse enfim, enquanto se aproximava do dono da floricultura, abrindo um sorriso amplo, fechando os punhos.

“Sim.” Foi tudo o que recebeu em resposta de Bakugou, que enfiava as mãos nos bolsos. “O que você quer?”

“Eu preciso de umas dessas suas peças pro meu estúdio.”

“Espero que possa pagar e não esteja só gastando meu tempo."

“Não sei se consigo pagar tudo o que elas valem, mas agora eu acho que tô apaixonado.” Ele deu uma risada nervosa e coçou a cabeça, sorrindo de soslaio. “De verdade, eu tô com vontade é de passar o dia todo aqui, só desenhando todos esses seus arranjos.”

“Você repete uma merda dessa e eu te tiro da minha loja na base da bicuda.”

Kirishima não aguentou sem dar mais uma risada. Estava até se sentindo bobo, mas a situação era tão inusitada e aquele rapaz era tão curiosamente único em sua raiva descabida (ou humor descompensado) que ele estava realmente entretido.

“Parece por acaso que eu estou brincando?” Bakugou vituperou, mais alto, pegando Kirishima de surpresa o suficiente para que o sorriso se desfizesse.

“Não, não. Eu também não estou." Ele olhou ao redor, um pouco perdido. "Vem cá, você pode me mostrar algumas flores? Algo que dure, que eu possa botar no meu estúdio e ficar cuidando?”

“Até quanto você quer gastar?”

“Eu estou disposto a gastar mais se for por algo foda que nem esses arranjos.”

Bakugou rolou os olhos.

“Acorda, cabelo de dracena. Arranjo assim não é feito pra durar. Eles estão sem as raízes, estão arquitetados e esculpidos de forma artificial. Eles servem para decoração, por no máximo duas semanas.”

Com aquilo, Kirishima olhou ao redor. Era arranjo pra cacete.

“Tudo isso é encomenda?”

“Nem tudo.”

“Então o que você faz com o que não sai?”

“O que dá vira adubo, o resto vai pro lixo.”

Aquilo horrorizou Kirishima por um momento.

“Você pelo menos tira foto do que fez?”

Bakugou franziu o cenho. Que encheção de saco aquele moleque era.

“Você é da polícia? Tá fazendo a porra de uma matéria? Óbvio que não, cada arranjo é diferente do outro. Eu não sou a porra de uma fábrica e é isso que me faz especial.”

Aquilo foi um baque que Kirishima não imaginou vindo. Ele pareceu iluminar por um momento com uma admiração que não o constrangia mostrar. Seus olhos brilhavam. E, de fato, ele chegou a sentir seu coração expandir no peito.

“Isso é uma das coisas mais poderosas que eu já ouvi!”

Bakugou largou os braços ao longo do corpo.

“Mas que porra você tá sequer falando?”

Um passo colocou Kirishima mais perto, escarlate buscando escarlate.

“Eu estou acostumado ao meu trabalho ser perpétuo. Mesmo quando é só desenho, eu posso guardar. Essa sabedoria de que as coisas têm seu prazo de validade, e que a nossa arte continua sendo válida se for por alguns momentos perfeitos-“

Quando percebeu que a lengalenga iria continuar, Bakugou deu as costas e saiu dali, sem prestar atenção realmente. Caralho, que porra mais chata. Como o mesmo cachorro bobo e entusiasmado que ele se mostrara desde o início, Kirishima o seguiu, interrompendo o discurso, mas insistindo em perguntar.

“Eu posso tatuar seus arranjos?”

“Qual parte do ‘único’ você não entendeu?” Disse ainda sem se virar de volta, atravessando rumo à sua mesa de arranjos novamente. Estava incomodado, mas algo no interesse genuíno do rapaz não o irritava tão profundamente.

“Então quanto fica pra fazer um pra mim?”

Quando Bakugou falou o valor, foi o momento em que imaginou que teria mais uma cena banal como a do fim da tarde anterior. Uma surpresa ridícula iria fazê-lo demonstrar a falta de tato, experiência, bom gosto e senso dele e enfim daria todo o motivo pra só ser expulso dali de uma vez por todas. Quando Kirishima disse “ok!” e botou a mão no bolso pra pegar sua carteira, Bakugou parou e olhou de volta para ele, estreitando os olhos.

“Você quer encomendar?”

“Sim! É uma arte máscula e bonita pra cacete, uma parada rara e exclusiva. Mas mais que isso, eu fiquei realmente de cara com o seu conceito e o jeito que você pensa. Eu to sentindo que eu quero muito entender isso tudo. Tá muito bem investido! Passa cartão, né?”

Bakugou levou um par de segundos para responder.

“Só dinheiro.”

Kirishima fez uma careta e guardou a carteira de volta.

“Ixe. Tá, então eu vou buscar a grana e venho depois, ok?”

“Como você vai querer o arranjo, mais ou menos?”

“Não tenho nem ideia! Faz como você quiser fazer!”

Trincando os dentes e cerrando os punhos, Bakugou mais uma vez rosnou.

“Como assim, porra?”

Kirishima sorriu de novo, bem aberto.

“Faz como você gostaria de ganhar! Se você tivesse uma sala, um escritório, ou mesmo um estúdio que nem o meu, o que você gostaria de botar nele?”

Imaginar? Faz de conta? Qual o problema daquele cara? Tava achando que era um teatrinho idiota, que ele fazia arte de miçanga e caricatura pra turista? Ele iria protestar e deixar claro que não começava nenhum trabalho antes do pagamento integral em dinheiro, mas foi naquele momento em que um latejar tomou sua cabeça e todos seus músculos se retesaram enquanto ele trancava a respiração.

“Tá, tá, só vaza então.” Bakugou virou-se, fechando os olhos com força. “Amanhã no final da tarde vai estar pronto.”

Kirishima não pareceu perceber nada de anormal na atitude dele - que já não era normal, para começar.

“Tem alguma-”

“Vaza!” Bakugou o interrompeu, dando as costas e se afastando para as salas do interior da floricultura. Era mais uma crise de enxaqueca, ou o que diabo aquilo fosse, e ele não poderia ter aquilo na frente dos outros. “Eu levo lá no teu estúdio e você me paga na entrega!” Ele se afastou até deixar Kirishima sozinho entre as plantas.

Com um suspiro e uma risada para si mesmo, Kirishima sorriu. Ele era realmente uma figura. Personalidade péssima, mas uma figura. Olhou mais um pouco ao redor, e, uma vez sozinho ali, ele não poderia negar que cogitou fotografar algumas das plantas para desenhar mais tarde. Chegou a alcançar seu celular no bolso da calça, mas refreou-se antes de qualquer coisa. Aquilo seria extremamente desonrado e desrespeitoso. Depois que o florista deixou claro que nenhum registro de suas plantas devia ser feito, a não ser por quem já a havia encomendado, ele não poderia se valer do fato de estar sozinho ali para fazer isso. Chegou a se sentir envergonhado por cogitar, e nisso girou nos calcanhares e deixou o estabelecimento.

Com o celular na mão, então, ao invés, preferiu jogar na internet o que era uma “Dracena” e se achou engraçado descobrir que era uma planta de folhas vermelhas e grandes. Só quando saiu para a calçada, menos quente e com um vento agradável, que pensou direito na encomenda que fez; mas, ao invés de se arrepender, estava mais entusiasmado ainda. Com certeza foi um excelente investimento!



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