Point of view Emma
Era início de agosto, mais um semestre começaria dentro de alguns minutos. Eu estava sentada numa mureta com um grupo de colegas de classe e olhava para os carros passando apressados pelas ruas, os faróis altos e rostos concentrados na estrada à frente. As pessoas a minha volta conversavam sobre quais matérias teriam, com quais professores, entusiasmadas com tudo de novo que o semestre traria. Eu não sentia esse entusiasmo, não participava das conversas, era sempre alheia a tudo, mas naquele dia, Deus eu estava tão cansada. Essas férias definitivamente não foram suficientes. Olho para a entrada da faculdade e dou meia volta, sem chance que eu aguentaria essas aulas sem um café.
- Boa noite, o que deseja? – A atendente tatuada da cafeteria em frente à universidade disse cordialmente.
- Ah, hm... um moka swiss grande, por favor. - Minha voz sai hesitante, olho para a mulher à minha frente e dou um meio sorriso. Eu estava entrando no quarto período da faculdade de medicina. Teria duas professoras que conhecia, e que por sinal, gostava muito. Não me leve a mal, eu adorava meu curso... Só não estava muito empolgada hoje.
Pago o café e vou para dentro da faculdade. Subindo as escadas, vejo que estava uns minutos atrasada, droga. Olho para dentro da minha sala e vejo que a professora já está lá falando. Entro na sala enquanto aceno com cabeça para meus amigos, Ruby tira a mochila dela da carteira a sua frente e eu me sento, ofereço meu café e ela toma um gole bem exagerado.
- Graças a Deus você comprou café. - Ela comenta como se eu tivesse comprado o elixir da longa vida.
- Graças a Deus você guardou meu lugar. – Comentei igualmente exagerada, nós tínhamos essa tendência a ser dramáticas. Eu gostava de sentar na primeira carteira perto da porta, assim eu poderia sair com mais facilidade.
Ela me devolve o café, e o coloco no canto da mesa, tiro meus óculos, meu caderno e uma caneta preta da mochila. Só então percebo que não faço ideia de que aula era essa. Olho para frente prestando atenção à mulher que caminhava em cima do tablado, procurando alguma pista sobre qual aula ela dava. Eu conhecia essa mulher...
Flashback
Semestre passado, era sábado de manhã e eu estava subindo as escadas rumo a minha sala com dificuldade, cansada e segurando meu habitual copo de café, sábados eram muito esgotantes para mim. Mas sabe quando um barulhinho constante que parece vir do fundo da sua cabeça começa a incomodar? Era um toque toque de saltos logo atrás de mim.
Quando me virei, vi uma mulher muito elegante, com uma saia justa preta e uma blusa social. Quem se veste assim num sábado de manhã?? Seus olhos castanhos muito profundos me olhavam como quem estava com pressa e eu atrapalhando o caminho. Dei espaço para ela passar e ela me deu um meio sorriso.
- Hey Ruby, conhece aquela mulher? – Disse ao alcançar meus amigos na porta da sala.
- Não, ela parece metida. Mas é linda.
- Vestida assim aposto que é advogada. – August deu seu palpite de especialista em moda.
A observei passando pela minha sala indo em direção às salas do direito, mas ela entrou numa porta antes, na sala do quarto período do meu curso. Meu queixo caiu.
- Ahaha você errou gatinho, semestre que vem vamos conhecê-la.
Flashback off
Ela realmente tinha uma elegância que não era de pessoas da saúde. Meus professores costumavam ser simples, usavam roupas normais, calças jeans e camisas. Ela não. Ela usava hoje uma calça justa preta, saltos da mesma cor e uma blusa social branca. Seus cabelos lisos batiam na altura dos ombros. Seu andar era elegante. Ela exalava poder e autoritarismo. O que contrastava com o modo descontraído com o qual ela falava com a turma. Ela dizia que já esteve no nosso lugar e dizia para aproveitarmos, irmos para festas e nos divertir enquanto havia tempo. Eu parei de prestar atenção ao que ela falava, enquanto apreciava suas curvas e o timbre rouco de sua voz. Quem era essa mulher? Que diabo de aula ela dá?
- Ruby, qual aula é essa mesmo?
- Imunologia, Emma em que mundo você tá?
- Qual é o nome dela? - Ignorei a pergunta dela.
- Regina Mills. – Rubs já estava irritada.
É definitivamente um nome impactante.
- Um fato sobre mim gente, eu não consigo dar aula de porta aberta. - A Mills veio andando em minha direção e meu coração disparou tanto que meu peito doeu. - Alguém aqui é claustrofóbico?
Ela olhou para mim e eu olhei para minha mão no ar e depois de volta para ela. Tá que eu tinha claustrofobia, mas ela não precisava saber disso, por que diabos eu levantei a mão??
Aqueles olhos castanhos olharam fundo nos meus enquanto ela dizia com uma preocupação sincera no rosto.
- Se você se sentir mal pode abrir a porta, okay?
Eu derreti ouvindo aquelas palavras. Tenho certeza que meus olhos lacrimejaram na hora. Cara que fofa. Eu tinha vontade de levantar e abraçar ela. Ninguém nunca se importou com essas coisas, com esse meu problema. Meus pais, por exemplo, sempre deixavam a casa toda fechada e várias vezes eu acordei tendo uma crise de falta de ar.
Ela seguiu com a aula apenas introduzindo o conteúdo, que por sinal, parecia muito complicado. O currículo dela era impressionante. Ela era nova, não parecia ter mais de 30 anos, e ainda assim tinha um pós-doutorado. A especialidade dela? Neuropsiquiatria. A área que, sem dúvida mais me atraía. Definitivamente, a especialização não era a única coisa que me atraía nela.
Espera um minuto, imunologia? Deus, vou ver essa mulher quase todos os dias da semana, e vamos ter laboratório também.
A aula se passou com a seguinte batalha. Minha mente lutando pra prestar atenção nas células de defesa que nosso corpo possui e constantemente se perdendo naquelas curvas da professora. Deus, como eu iria passar se não prestasse atenção? Vamos lá, Emma, é só uma mulher. Afinal, eu preciso ir bem na matéria pra causar uma boa impressão.
Mas sentia que isso não seria nada fácil. Mills falava tão rápido, passando os slides mais rápido ainda e eu não sabia se anotava o que ela dizia ou olhava pros slides. É, eu teria que estudar muito. Finalmente, depois de uma enxurrada de informações, a aula chegou ao fim. Olhei pros lados e todos pareciam perdidos, como se um furacão tivesse passado na sala e tivessem deixado todos desorientados. Eu não sabia se estava daquele jeito pelo furacão chamado Mills ou pela matéria.
- Gente que cara é essa? Não fiquem assustados com a matéria, eu postarei as aulas no sistema para que tenham acesso. Meu conselho é: estudem e vão conseguir, a matéria é complicada, mas é linda. - Mills disse empolgada.
A única coisa linda aqui é você, professora.
Meus colegas de classe começaram a sair da sala, alguns indo para as famosas lanchonetes, outros pros bares em frente à faculdade. Eu enrolei para guardar os materiais, cada minuto ali contava, vendo aquela mulher, sentindo aquele perfume e tentando guarda-lo na memória. Espera, isso é maçã? Por fim, ela saiu andando, não. Saiu desfilando porta a fora.
Eu e meus amigos, Ruby e August fomos pro nosso cantinho. Atrás da biblioteca tinha um terraço grande e aberto à luz do luar. Quase ninguém ficava ali, e era por isso que nós gostávamos tanto daquele lugar. Chamávamos de “O telhado” porque ficava no último andar e não tinha mais nada por ali. Aquele era, sem sombra de dúvida, meu lugar favorito.
Fomos até lá e eu me sentei num pequeno muro que existia pra evitar que caíssemos lá embaixo e tivéssemos, dependendo da posição, um traumatismo craniano.
- O que acharam aula? E da Mills? A matéria parece bem puxada. - August disse rápido e ansiosamente. Ele era, sem dúvida, o mais empolgado entre nós.
- Ela parece ser muito filha da puta com regras. - Ruby sempre tão delicada.
- O que achou Em? – August disse, porém eu já estava no mundo da lua. - Hey Emma??
- Aii – Ruby me deu um tapa. - O-oi desculpa, o que foi?
- O que achou da professora?
Ainda bem que estava escuro, porque tenho certeza que meu rosto estava vermelho. A mera menção daquela mulher me deixava eufórica.
- Ela é... - linda. – Exigente, parece. E a matéria não é fácil. – Isso desvia da pergunta, boa Emma.
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