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História Do crepúsculo ao amanhecer - Aquele sobre Santorini


Escrita por: holyserquel

Notas do Autor


o aniversário é meu mas o presente é de vocês, espero que gostem.

quero dedica-lo a todas as minhas amigas e pessoas queridas que me ajudaram na luta que foi isso: gabi, suelle, lais, dudinha, todas as dindas do santi e principalmente a mari querida que se dispôs a corrigir tudinho!!! eu amo vcs 💜

obs: amanhã prometo responder um por um, cada comentário do capítulo anterior.

boa leitura, beijinhos estrelados da angel

Capítulo 12 - Aquele sobre Santorini


Fanfic / Fanfiction Do crepúsculo ao amanhecer - Aquele sobre Santorini

Há mais perigo em teus olhos do que em vinte espadas!

William Shakespeare

(5 o'clock – t-pain ft. wiz khalifa, lily allen)

A estrada em direção à Fira estava tranquila, sem um grande volume de carros e bem diferente do que eu esperava. A temperatura, ao lado de fora, havia caído de maneira considerável; o céu estava escuro e as nuvens pareciam carregadas, indicando que uma tempestade se aproximava. Olhei de soslaio para o banco do passageiro ao meu lado recordando que Raquel estava desprotegida e que certamente passaria frio.

“Você trouxe algum casaco? O tempo fechou, e é muito provável que chova.”

“Acho que sim, devo ter algum na mala.” Com um leve aceno positivo, dispensei a névoa de preocupação sentindo-me um pouco mais tranquilo.

“Isso é uma pena.” Brinquei, parando no semáforo vermelho e virando meus olhos em sua direção. Confusa, Raquel encarou-me com o cenho franzido graciosamente. “Se não trouxesse o casaco, eu poderia te aquecer com o meu paletó... Ou calor humano talvez ...Você decide.”

Com a sobrancelha arqueada e o lábio inferior preso entre os dentes, Raquel encarou-me com aquela sombra de desejo e luxúria em seus olhos. Apesar de todos os meus inúmeros esforços em nome da moral e bons costumes, eu não conseguia ficar longe dela. Havia uma espécie de imã que me atraia em sua direção e eu me via incapaz de resistir a um simples gesto.

Não pude conter a ansiedade de tocá-la novamente, e, aproveitando o intervalo de tempo aguardando o sinal abrir, inclinei-me rapidamente em sua direção para deixar um casto beijo em seu pescoço. Arrastar minha barba por sua pele macia e observar o eriçar dos pelos de seu braço estavam se tornando meu passatempo favorito.

“Bom, pra falar a verdade, talvez eu tenha esquecido.”

Preciso confessar que passar esses dias, de uma maneira nada profissional, ao lado de Raquel tem sido uma agradável surpresa. É claro, sempre tive um certo encanto por minha secretária e isso era incontestável… Mas querer não é poder. Apesar de nutrir um desejo escondido as sete chaves, jamais cogitei a ideia de que algum dia aquilo se tornasse realidade. Mas ela estava ali, ao meu lado, com a coxa perfeitamente torneada à mostra, fazendo com que minhas mãos formigassem por querer tocá-la.

Tínhamos mais alguns dias pela frente, mas eu já sofria por antecipação pensando em quando retornássemos para Madrid e nossa mágica bolha de liberdade fosse brutalmente estourada pelo peso da vida real.

“E Santiago? Como ele está?” Questionei, preocupado, mudando completamente o foco do assunto. Havia perdido o garoto de vista desde o momento em que nos separamos para que cada um pudesse se aprontar para o evento.

“Ele está bem, não teve mais febre. Quando saímos ele estava dormindo, quando acordar vai tomar um banho, mamar, brincar um pouco e depois volta a dormir. E assim vai, num looping infinito.” Deu de ombros, levantando os lábios para cima num sorriso contido.

Foi então que algo ocorreu...

“Como funciona isso?” A adorável face de Raquel se converteu numa expressão de pura confusão, então precisei reformular a pergunta com melhor clareza. “Digo, hoje de manhã você estava o amamentando e se está longe ele usa a mamadeira? Pode fazer os dois ao mesmo tempo?” Aparentemente, havia algo de engraçado em minha pergunta, o que fez Raquel rir levemente.

“Mas é claro que sim, Sérgio.” Esclareceu, tombando a cabeça graciosamente para o lado. “Ele está crescendo, é um homenzinho quase. Se alimenta de maneira correta, com frutas e comidas sólidas, ele não é 100% dependente do leite materno.” Esclareceu, suspirando levemente.

“E você o amamenta quantas vezes ao dia?” Não consigo sequer entender como surgiu o súbito interesse e a curiosidade por qualquer coisa relacionada aos dois. Não estava nos meus planos um envolvimento emocional daquela magnitude, mas evitar aquilo era como tentar contar as estrelas numa noite de verão.

“Uma vez, no período da manhã ou quando volto do serviço...” Divagou, pensativa. “Santiago tem um ano e seis meses, estou respeitando o tempo dele em relação à amamentação porque é um vínculo natural, um momento de conexão entre nós dois, então não quero acelerar o processo; quando ele estiver pronto vai largar sozinho... E creio que muito em breve.” O volume de sua voz foi gradativamente diminuindo, enquanto um sorriso triste se formava em seus lábios.

“E por que está triste?”

“Meu bebezinho está crescendo, uma hora não estará dependente de meus cuidados e não sei se estou preparada para isso. Sou um pouco apegada a ele.” Ao ouvir sua afirmação, que mais soou como um lamento, precisei conter a vontade de abraçá-la. A maternidade era algo encantador em Raquel Murillo. Aquele era um detalhe que ficava nítido em cada toque, olhar ou fala. Cada mínimo gesto em relação a Santiago era carregado de amor e devoção… Era apaixonante.

“Não fique triste, você sabe, Santiago será um ótimo menino graças a você.” Tentei soar o mais convicto possível; sem sombra de dúvidas Raquel Murillo é uma mãe dedicada e seu filho havia sido agraciado por tê-la. “As crianças crescem rápido, e, quando menos esperar, ele fará com que se sinta a pessoa mais orgulhosa do mundo...”. A imagem de Tokio surgiu em minha mente, e restou impossível conter o sorriso ao pensar em sua evolução. Ainda ontem minha filha obrigava-me a contar-lhe estórias de princesas antes de dormir, e hoje era uma mulher responsável por uma das mais importantes repartições da editora. “Você é uma mãe incrível, Raquel, e seu filho, apesar de pequeno, sabe disso. Santiago nunca será 100% independente, ele sempre correrá para debaixo da sua cama numa tempestade, ou quando cair pelo quintal e machucar o joelho, então, fique tranquila, pois ele sempre precisará de você.” Desviando os olhos brevemente da estrada, a encarei por alguns segundos, apenas para vislumbrar as íris castanhas esperançosas e brilhantes.

Raquel não me respondeu, se contentando em apenas sorrir ternamente. Um confortável silêncio pairou sobre nós como uma nuvem, enquanto a voz sussurrada de Lily Allen reverberava pelo alto-falante numa bonita espécie de trilha sonora. Minutos mais tarde, distraído e com os olhos fixos na estrada, fui surpreendido por uma delicada mão cheia de anéis e com as unhas pintadas de preto surgindo sobre minha coxa, acariciando o local com o polegar. Encarei Raquel de soslaio, vendo-a suspirar, como se estivesse confortável, e sorri com o gesto espontâneo. Realmente... estávamos atravessando a linha.

“Muito obrigada.” Murmurou num fio de voz. Tentei recordar o que teria feito para ser agraciado com o súbito carinho, mas não encontrei respostas.

“E por que está me agradecendo?” Virando a cabeça em minha direção, Raquel abandonou o toque em minha coxa e levou a mão em minha nuca, acariciando meus cabelos num singelo cafuné.

“Por se preocupar comigo e com Santiago.”

“Vocês dois merecem que alguém se importe com vocês.” 

 

 

 

~*~

(i was made for loving you – tori kelly feat. ed sheeran)

Apesar de praticamente trabalhar ao lado do cérebro que comanda a Fashion Reputation, meu contato com os desfiles, designers e coleções era mínimo, sempre estritamente focada no âmbito administrativo, o que incluía cuidar da agenda de Sérgio e manter tudo em ordem para que a presidência não se tornasse um pandemônio. Pode ser prepotência da minha parte, mas a verdade é que Sérgio era 60% dependente de mim, e, ciente dessa realidade, sempre me esforcei para fazer o trabalho da melhor maneira possível. Nada passava despercebido por meus olhos, cada mínima linha dos contratos ou propostas de negociação. De certa maneira, aquele não era meu trabalho, eu poderia deixar Sérgio se virar sozinho, mas com o tempo criamos um vínculo e um ritmo de trabalho baseado na confiança. Conseguíamos nos comunicar com um mínimo olhar ou arquear de sobrancelhas, e aquele era um dos motivos pelos quais eu amava estar ao lado dele. Não, eu nunca fui apenas uma secretária. Eu conhecia meu chefe e sabia como funcionava aquela editora como a palma de minhas mãos.

Como profissional, aquela premiação era tão importante para mim quanto para ele. Me soava surreal estar vivendo e presenciando aquele momento importante.

Por ser uma premiação internacional entre os mais renomados editoriais de moda do mundo, cada ano a cerimônia do Zane Awards ocorria em um país diferente, sendo cada tema diferente. Esse ano, o evento girava em torno da história e evolução da moda grega.

A inspiração seguia desde os efeitos atuais da moda contemporânea até os antepassados da Grécia antiga, o que incluía os deuses mitologia.

De acordo com Miranda, meu vestido havia sido inspirado em Afrodite. A deusa do amor, beleza corporal e do sexo. Para os gregos, ela tinha uma forte influência no desenvolvimento e prazer sexual das pessoas. Isso explica um bocado sobre a fenda enorme em minha coxa, o que deixava bem pouco para imaginação.

Eu estava tranquila, aproveitando o passeio e observando ao redor. Santorini era tão surpreendente à noite quanto à luz do dia; tudo naquela ilha possuía uma aura mística e sedutora.

A cerimônia de entrega dos prêmios aconteceria no Museu Cultural Village, assim como o after party. A construção era imponente, de tirar o fôlego. Dividida em 4 andares, poderíamos ver o edifício de longe, todo pintado de branco, como a característica arquitetura de Santorini. Ele estava bem iluminado, enquanto canhões de luz dançavam numa bonita valsa pelo céu noturno. Quando notei que uma multidão interminável de pessoas se aglomerava na entrada, automaticamente fui tomada pela tensão. Passei o dia inteiro me beliscando e me preparando para aquele momento, buscando a certeza de que não estava sonhando, mas só me dei conta da magnitude dos acontecimentos e confirmei que o que acontecia era mesmo real ali dentro do carro. Naquele momento. Minutos antes de dar as caras.

Quando entramos no local indicado, Sérgio foi diminuindo a velocidade, até parar atrás de um carro que estava à nossa frente. Meu chefe parecia muito tranquilo... Bom, pelo menos, se estivesse nervoso, conseguia esconder perfeitamente.

“Está pronta?” Sua voz soou convicta, e perguntei-me silenciosamente como ele era capaz de manter a tranquilidade. “Você parece nervosa.” As palavras serenas me fizeram engolir em seco.

“Estou apavorada.” Admiti, envergonhada. “Não tenho a mínima ideia do que fazer.”

“Apenas cinco minutos num tapete vermelho, Raquel, não se preocupe!” Sérgio apertou minha perna, e eu me forcei a relaxar momentaneamente. “Vamos agir da maneira que te deixar confortável. Se optar por algo impessoal, pode enganchar o braço no meu, mas-” Antes que pudesse terminar sua fala, me vi interrompendo-o da maneira menos educada possível.

“Pode segurar minha mão?” Como mágica, as palavras simplesmente saíram, numa espontaneidade impressionou até mesmo a mim . “Digo, você se importa?” Incerta, questionei, um pouco envergonhada. Obviamente, se Sérgio quisesse algum contato mais próximo, ele mesmo teria dito e... Inferno, onde eu estou com a cabeça?

Ignorando minha pergunta e completamente atônito, Sérgio desviou os olhos para frente e acelerou o carro. Era a nossa vez de descer, e ante seu silêncio ensurdecedor, senti minhas bochechas queimarem de tanta vergonha. Um rapaz muito educado aproximou-se da porta, na intenção de abri-la para que eu pudesse sair... Porém, Sérgio tinha outros planos.

Ainda dentro do carro, com um leve maneio de cabeça, dispensou o homem que havia se aproximado. Encarei-o, sem entender, e observei o momento em que ele saiu graciosamente e deu a volta no carro até estar ao meu lado, puxando a maçaneta e abrindo minha porta.  Incrédula, encarei-o com um tímido sorriso, incapaz de acreditar o quão fofo ele podia ser.

“Me deixe segurar sua mão.”

Eu juro que seria capaz de beijá-lo ali mesmo, se não fosse pelo mar de fotógrafos à nossa frente, e só percebi que o encarava com uma cara de boba apaixonada quando senti minhas bochechas latejarem por conta do sorriso estampado.

Aceitando o gesto, peguei a bolsa em meu colo antes de pousar minha mão na sua, vendo-o leva-la até os lábios e depositar um casto beijo em seu dorso. Após usá-lo como apoio, saí do carro e me posicionei ao seu lado. Entretanto, antes de seguirmos, Sérgio soltou minha mão e andou até estar a minhas costas, surpreendendo-me ao vê-lo arrumando a calda do meu vestido.

“Pronto, agora podemos ir.” Afirmou, posicionando-se ao meu lado novamente e entrelaçando nossos dedos. Um manobrista entrou no carro e deu partida, abrindo o caminho e deixando-nos a mercê dos flashs. Porém, antes de caminharmos pelo longo corredor que nos aguardava, sussurrei em seu ouvido:

“Esse salto é um pouco maior do que eu uso habitualmente.” Informei, endireitando minha postura. Embora eu soubesse como andar de salto alto, a atenção que estávamos a ponto de receber me fez sentir como uma adolescente de 15 anos que não sabia se portar. “Então, se caso eu tropeçar, por favor não me deixe cair.”

“Isso jamais, Raquel. Jamais”

~*~

 

 

 

(madrid vacio – najwa nimri)

Eu não conseguia pensar. Minha mente estava oca, enquanto a única coisa que a sobrevoava era a imagem da mulher um pouco a minha frente.

Quando pisamos no corredor do red carpet, as luzes piscavam. Vários fotógrafos começaram a gritar pelo meu nome, enquanto éramos cegos por um imenso clarão proveniente dos flashs. Com Raquel ao meu enlaço, caminhamos lentamente até um ponto “x” indicado por uma assessora que nos instruiu brevemente sobre tudo o que aconteceria dali por diante.

Assim que nos posicionamos no local indicado, levei minhas mãos à lombar de Raquel e puxei seu corpo junto ao meu. O espaço entre nós dois era mínimo, mas ela parecia não se importar com aquele detalhe. No dia-a-dia, era um suplício resistir ao natural encanto de Raquel, mas aquela situação estava se tornando insuportável. Era impossível não se deixar envolver pelo ar de luxúria e desejo que ela exalava.

“Esqueci de te dizer algo importante.” Sussurrei baixinho, apenas para que ela pudesse ouvir. E, apesar de estar distraída por estar acompanhando meu olhar, alternado entre as câmeras, rebateu:

“O que?”

Inclinando-me em sua direção, escondido dos fotógrafos para evitar qualquer leitura labial ou inconveniência, arranhei minha barba em sua pele e sussurrei no pé de seu ouvido.

“Você está linda.”  Numa troca de olhares em nossa tão conhecida cumplicidade, vi seus olhos adquirirem um brilho diferente. Um sorriso tímido surgiu em seus lábios, enquanto franzia graciosamente seu nariz.

Foi impossível não sorrir de seu jeito apaixonante, ainda mais quando Raquel olhou para trás e escondeu a cabeça em meu ombro, envergonhada.

“Pare!” Pediu, acanhada, estapeado levemente meu antebraço por trás.

Quando voltou a encarar os fotógrafos com um ar de elegância e sofisticação, me permiti contempla-la por alguns segundos.

De repente, um fotógrafo gritou que eu me afastasse, pois queriam fotografá-la. Sorri para o pedido inesperado e arregalei os olhos em sua direção. Raquel parecia tão chocada quanto eu, e riu quando levantei as mãos em rendição para me afastar.  Com três passos para o lado, coloquei as mãos no bolso da calça e me permiti contemplá-la, com toda a devoção que merecia.

Ela parecia estar à vontade, mexendo a cabeça de um lado para o outro num delicado maneio, alternando o olhar entre cada um dos fotógrafos que gritavam em sua direção. Pousando as mãos na cintura e com uma postura impecável, ela parecia uma estrela de cinema, como se tivesse familiaridade com as câmeras. Não imaginei que Raquel pudesse ser um tanto desinibida, logo ela que sempre se mostrou uma mulher tímida e recatada… Eu estava absolutamente embasbacado e perplexo pela beleza transcendente dela. Disposta a me tirar do sério, observei o momento em que se virou propositalmente de costas para mim. A silhueta de seu corpo era algo sublime; metade de suas costas ficava exposta pelo vestido, mostrando cada pintinha desenhada em sua pele. A cintura fina, num contraste com a suntuosidade curva de seu quadril... Ok, eu nunca tinha reparado o quão gostosa ela era.

Num só passo, ela se virou mais uma vez e ficou de costas para os fotógrafos. Com o rosto para o lado, Raquel olhou em minha direção e pegou-me no ato, secando-a, devorando-a com os olhos enquanto um sorriso cheio de segundas intenções brilhava em meu rosto.

“Quer um babador? Santiago tem vários, posso te emprestar um.” Insinuou, piscando sedutoramente em minha direção.

“Não, eu só quero você!” Rebati, encantado pelo som de sua risada ao compreender minhas palavras.

Ela se aproximou timidamente, e murmurou discreta.

“Já podemos sair?” Sim Raquel, vamos sair logo antes que eu te beije aqui mesmo.

“Venha.” Num suspiro de felicidade, Raquel sorriu agradecida enquanto eu buscava sua mão e enlaçava nossos dedos.

Com um leve aceno em agradecimento, nos despedimos dos fotógrafos e caminhamos juntos em direção à entrada principal de acesso do Museu. A noite estava apenas começando e eu não fazia ideia das inúmeras reviravoltas que teríamos dali pra frente.

 

 

~*~

 

(imagine – ariana grande)

Dizer que eu estava nervosa seria um mero eufemismo. O lindo salão todo escuro e iluminado apenas por velas, com os convidados bem-vestidos e a atmosfera de alta classe, assumiu uma qualidade quase pesada quando o penúltimo vencedor saiu do palco. O folheto com a programação já estava amassado de tanto que eu o havia torcido de nervoso. A mão de Sérgio estava estrategicamente pousada em minha coxa descoberta, acariciando minha pele preguiçosamente com o polegar espesso; mesmo assim não consegui me acalmar. 

O maço estava em minha bolsa, mas havia esquecido o isqueiro no hotel em Oia. Miranda já estava no quinto cigarro, seu isqueiro estava sobre a mesa, numa cruel tentação para que eu terminasse logo com aquilo. Apesar de várias pessoas estarem fumando, eu não queria fumar na frente de Sérgio, mas o nervosismo estava me consumindo por completo. Meu organismo praticamente gritava pela nicotina. Pode parecer idiotice da minha parte, mas eu sabia que um discurso de preocupação estava pronto para me receber.

“Miranda, pode me emprestar o isqueiro?” Foi mais forte que eu.

Com um aceno positivo, Miranda, que estava sentado ao outro lado de Sérgio, jogou o objeto, que deslizou pela mesa até chegar em minhas mãos.

Abri minha bolsa e peguei rapidamente um cigarro, para posteriormente riscar o isqueiro algumas vezes, tentando acendê-lo. Quando, por fim, consegui, pendurei o cigarro entre meus dedos e traguei uma boa quantidade de nicotina, sentindo-me um pouco melhor. Eu podia sentir o peso do olhar de Sérgio sobre mim, mas o ignorei. Sabia que cedo ou tarde ele iria se pronunciar

“Eu não sabia que você fumava.” É, foi mais rápido do que eu imaginava. Suspirei ao ouvir sua voz alguns timbres mais graves enquanto eu soltava a fumaça, vendo-a dissipar-se pelo ar.

“Só quando estou nervosa.” Incapaz de encará-lo diretamente nos olhos, continuei fingindo prestar atenção no homem, responsável pela cerimônia, em pé sobre o palanque. “Isso é um problema pra você?”

“Claro que n-não, eu só... estou surpreso.” Gaguejou, visivelmente incomodado. Sua expressão contradizia seu argumento e, de certo, se eu o cutucasse, tiraria o que realmente se passava em sua cabeça.

“Fale.”

“O que?” Confuso, Sérgio encarou-me com o cenho franzido.

“Eu sei que quer dizer algo, então diga.” Como se algo tivesse iluminado sua mente, Sérgio tombou a cabeça para trás, envergonhado, como se fosse uma criança flagrada roubando doce na geladeira durante a madrugada. “A essa altura do campeonato já deveria saber que eu te conheço, sei que não está apenas surpreso. Vamos, diga...” Incentivei, batendo levemente a bituca no cinzeiro antes de o levar novamente aos lábios. Um sorriso tímido pintou em seu rosto, daqueles que deixam suas covinhas em evidência e fazem minhas mãos pinicarem pela desenfreada vontade de apertá-lo.

“Não posso negar que você com um cigarro na boca é definitivamente uma das imagens mais sexies do mundo... Principalmente quando solta essa fumaça cancerígena.” Ok, eu não estava esperando por isso. “Mas você sabe que isso é perigoso, certo?”

“Sim, eu sei.” Ele tinha razão... Mas aquilo era mais forte do que eu. Não fumo o mesmo como há alguns anos; mesmo assim sabia o quanto era prejudicial à minha saúde continuar com aquele vício. Eu não deveria ter comprado cigarro naquele dia, não deveria voltar a fumar. Obviamente, foi impossível conter minhas emoções e um sorriso triste formou-se em meus lábios contra minha vontade.

“Ei.” Sua voz soou tão terna que quase sorri antes de soltar a fumaça pela última vez. Endireitando-se na cadeira, Sérgio levou a mão até o encosto da minha cadeira e inclinou-se levemente em minha direção para sussurrar em meu ouvido. “Não quero que pense que estou tentando te dizer o que fazer ou não fazer, você é uma mulher madura e sabe o que fazer com a sua vida.” Foi impossível não rir de sua afirmação; aquele era o jeito Sérgio Marquina de ser. Tentando consertar tudo. Largando o que sobrou da bituca dentro do cinzeiro, virei minha cabeça em sua direção e alinhei meu olhar com o seu, percebendo suas íris castanhas brilharem apesar da pouca luz. “Por favor, não me interprete mal. Foi apenas uma súbita onda de preocupação.” Aproximando-se ainda mais e, colando minha testa com a sua, fechei os olhos ao sentir seus dedos roçarem meu rosto com carinho num delicioso afago, antes de prender uma mecha fujona atrás da minha orelha. Enquanto uma mão estava em meu rosto, a outra acariciava minhas costas de maneira delicada, e tudo o que eu mais queria era beijá-lo ali mesmo. “Sabe o quanto me importo com a sua saúde e tudo o que diz respeito a você.” Estava tão conectada com Sérgio que sequer percebi o momento em que ele rapidamente me surpreendeu com um casto beijo nos lábios. Cética, arregalei os olhos e encarei meu chefe como se ele fosse um bicho de sete cabeças. O cheiro do cigarro estava impregnado em mim, assim como o gosto amargo em minha boca, mas Sérgio não se importou com esse detalhe e acabou me roubando um beijo mesmo assim. Um sorriso bobo apaixonado iluminava seu rosto, deixando-o extremamente meigo e fazendo com que eu me sentisse derretida por dentro. “Não fica brava comigo, estou tentando cuidar de você.”

Sérgio parecia um adolescente, enquanto eu me contentava em rir de seu jeito besta. Seria gentileza da minha parte dizer que eu estava me encantando por meu chefe. A cada minuto que passávamos juntos eu tinha mais certeza de que ele era um homem incrível, muito além do chefe caprichoso que aparentava ser.

Antes que eu tivesse a oportunidade de respondê-lo, fui interrompida pela voz do cerimonialista anunciando a última categoria da noite. A premiação estava chegando ao final e aquela era a única chance de Sérgio subir ao palco para receber o reconhecimento em forma de recompensa  por todo seu esforço e dedicação em manter a editora de pé nos últimos 05 anos... Havíamos perdido o prêmio nas outras duas indicação, e talvez eu nunca tenha torcido tanto para que algo desse certo como agora.

Enquanto os indicados eram anunciados, notei Sérgio apreensivo e visivelmente nervoso, como se, pela primeira vez na noite, ele tivesse caído em si sobre a magnitude de tudo o que acontecia ao seu redor. Buscando sua mão, entrelacei nossos dedos e o mantive próximo a mim.

“Vai dar tudo certo.” Sussurrei, apenas para que ele pudesse ouvir.

“E se não der?” O brilho que anteriormente iluminava seus olhos foi ligeiramente apagado por uma sombra de insegurança e ansiedade. Antes do resultado, ele precisava saber que era muito além de um prêmio e que, independente do resultado, tudo ficaria bem. Sua insegurança era palpável e eu só queria abraçá-lo.

“Eu continuarei aqui.” Conclui, apoiando minha cabeça sobre seu ombro. “Eu sempre estarei aqui.”

Com toda a pureza e companheirismo do mundo, trocamos um sorriso cheio de ternura e promessas silenciosas. Tive o estranho e preocupante sentimento de paz interior, como há muito não sentia. Eu só queria continuar ao seu lado, segurar em suas mãos e lhe assegurar que tudo ficaria bem independentemente do resultado.

Independentemente de qualquer coisa.

“E o Zane de melhor editorial de 2020 vai para...”

~*~

 

 

 

(she – harry styles)

“Um Cosmopolitan, por favor.” Com apenas um aceno positivo, o bartender deu-me as costas e começou a preparar o drinque que havia pedido.

Encostando meu corpo no balcão, voltei meus olhos ao salão, procurando-a entre a massa de pessoas que continuavam ali. Ao longe, e com certa dificuldade, pude vislumbrar-la numa conversa entretida com Miranda, fazendo com que meu coração se acalmasse.  Eu não tinha palavras o suficiente para descrever a intensidade e magnitude de tudo aquilo que estávamos vivendo, parecia surreal. Ficar perto dela sem poder tocá-la estava praticamente impossível; eu fiquei tão atordoado que precisei sair para respirar. Aquele sentimento era desesperador, e eu tinha convicção de que estava perdendo aquela batalha. “Ela está confusa, deixe-a em paz” era a mensagem que eu tentava enviar ao meu subconsciente, mas suas ações causavam um incômodo bloqueio. Era irracional. Eu não queria, eu não podia... Principalmente depois do que aconteceu e daqueles malditos papéis que ela havia assinado. Nós não deveríamos nos envolver ainda mais. Raquel e eu estávamos semeando um vínculo perigoso e arriscado, porém era muito além do nosso controle.

Depois de alguns minutos com as mãos apoiadas na bancada, respirei fundo, sentindo o ar invadir meus pulmões numa falha tentativa de aliviar o rebuliço que havia em meu peito.

“Olha ele aí!” Levei um susto ao ouvir aquele tão conhecido timbre e virei-me rapidamente para certificar-me de que aquilo não era uma alucinação.

“Fábio?”

“Em carne e osso.” Com aquele ar charmoso e misterioso de sempre, meu acionista surgiu ao meu lado como mágica. Os cabelos grisalhos, a barba aparada, um discreto brinco pendurado em sua orelha e um smoking preto. Foi um verdadeiro choque encontrá-lo ali. Primeiro Carolina, agora ele… Só faltava Tóquio para completar a surpresa e tudo o sair exatamente o contrário do que programei.

“O que você está fazendo aqui?” Questionei, com um sorriso meio desconcertado enquanto nos cumprimentávamos com um breve abraço.

“Carolina decidiu vir de última hora e me pediu para acompanhá-la.” É claro. Carolina.

“Ela está aí?”

“Sim, estamos com a Vanity Fair, ela decidiu ficar na mesa de uma amiga.” Tentei não me importar muito com o fato de Carolina, de certa forma, menosprezar a própria editora. Nos últimos meses, ela havia dado indícios o suficiente de que só se importava com o lucro depositado em sua conta. “Estamos sentados do outro lado do salão, mas quando percebi que estava vindo aqui precisei vir te cumprimentar. Escute, quem é aquela mulher do seu lado?”

Senti meu sangue gelar ao ouvir suas palavras. Fábio conhecia Miranda, inclusive tiveram um relacionamento amoroso durante um tempo, então ele só poderia estar falando sobre a...

“Raquel?”

“Esse é o nome dela?” Com as sobrancelhas arqueadas, Fábio deu-me as costas e virou-se brevemente em direção a Raquel, como se estivesse estudando-a de longe. “Sua nova namorada?” Gostaria de dizer que sim, claro, com certeza... Mas isso seria errado da minha parte.

“Não, é apenas minha acompanhante.”

“Ela é uma mulher muito bonita, e me parece familiar. Trabalha na editora?” Voltando sua atenção para mim, não pude deixar de notar um sorriso irônico em seus lábios, e revirei os olhos com a silenciosa pretensão. Ok, eu entendo plenamente o efeito Raquel Murillo sobre os homens, e jamais o julgaria por se permitir enfeitiçar pelos encantos dela.

“Sim, ela...”

“Ela é o que?” Parei, refletindo sobre minha resposta. É ou era?

“Minha secretária.” As palavras soaram extremamente amargas, fazendo-me engolir em seco, tentando manter a atenção na conversa. Tocar nesse assunto a essa altura do campeonato era como um grande outdoor me chamando de filho da puta.

“Ela não era morena?”

“Era, ficou loira tem pouco tempo.”

“E... ela é comprometida?” Sim, comigo. 

“O que quer Fábio?” Rebati, ríspido, e sem o mínimo de paciência.

“Opa, acho que temos um chefe ciumento por aqui.” Ao ver o sorriso cínico e sugestivo em seus lábios, revirei os olhos em desdém. “Vamos direto ao ponto. Vim aqui para dizer que sinto muito. Você merecia o prêmio.” Com um leve maneio, acenei positivamente e dei o assunto por encerrado. Deus é testemunha que eu não merecia segurar esse prêmio, pelo menos não por ora.

“Teremos outras oportunidades.”

“Tem razão, um brinde ao fracasso. Dois martinis, por favor.” Pediu, sentando-se ao meu lado. Fábio e eu somos amigos desde quando me conheço por gente, crescemos juntos, e hoje compartimos a sociedade da Fashion Reputation como um presente deixado por meu pai. “Vamos beber, Marquina. Em nome dos velhos tempos.”

~*~

“Não se preocupe, Raquel.”

Ele teve febre ou chorou de dor? Estou um pouco preocupada com ele, não sei se voltaremos ainda hoje para Oia.” Meu coração apertou-se  com a possibilidade de acontecer algo de ruim a Santiago.

“Não, de jeito nenhum! Medi a temperatura de uma em uma hora e ele está ótimo, dormiu há 20 minutos.”

“Muito obrigada por cuidá-lo, Macarena. Não sabe o quanto me sinto aliviada.”

“Aproveite a festa, seu filho está bem. Estou te mandando as fotos que tirei para que comprove.”

Quando nos despedimos e encerrei a ligação, meu celular vibrou com a quantidade de mensagens recebidas. Santiago estava bem, e isso me deixava um pouco mais calma para relaxar o resto da noite. As fotos encaminhadas por Macarena aqueceram meu coração de tal forma que pude sentir minhas bochechas doerem pelo largo sorriso formado em meus lábios. Quanto mais se passava o tempo, mais eu me apaixonava por aquele pinguinho de gente. Em uma das fotos, não pude deixar de suspirar. Ele estava sentadinho na cama tampando o rosto com sua mantinha azul, provavelmente brincando com a babá.

“Está mais tranquila?”

“Sim! Falei com Macarena, e Santiago está bem.”

“Agora alguém aproveita a noite sem culpa, eh?” Numa insinuação descarada, Miranda sorriu enquanto acenava na direção de Sérgio . Acompanhando o gesto, meus olhos automaticamente voaram aonde ele estava.

“Acha que está triste por ter perdido?”

“Ele parece triste pra você?”

Sérgio estava em bar no piso superior gargalhando com um homem qualquer. Seu sorriso exibia uma fileira impecável de dentes brancos, e senti-me levemente melhor por vê-lo tão descontraído e solto, como se o fato de ter perdido os prêmios indicados não tivesse tanta importância.

“Parece feliz até demais.”

“Se não estivesse aqui, ele já teria ido embora.” Deu de ombros, como se aquilo não fosse grande coisa. Havia perdido as contas de qual era o número daquele cigarro apenas naquele curto período em que estávamos ali. Se meu pulmão estava ruim, o dela provavelmente já havia apodrecido.

(paper hearts – tori kelly)

A premiação havia sido encerrada há cerca de duas horas, quando o cerimonialista consagrou Vanity Fair como a última vencedora da noite. Sim, perdemos. Quando o salão explodiu em aplausos para receber o CEO responsável pela revista, Sérgio desfez nosso contato e acompanhou a salva de palmas. Perguntei se ele estava bem, mas tudo o que fez foi afirmar com um lindo sorriso no rosto, depositar um casto em minha bochecha e sussurrar um inaudível “obrigado” em meu ouvido.

Pouco tempo depois, ele parecia ter voltado ao normal, como se nada tivesse acontecido. Durante o jantar ele estava completamente relaxado, conversou e se acabou de rir com as várias pérolas de Miranda. Não pude deixar de perceber o quanto ele era resistente ao álcool, uma vez que havia perdido a conta da quantidade de copos de whisky que havia ingerido.

Sérgio estava para whisky assim como Miranda está para o tabaco. Cada Marquina com sua válvula de escape.

O que me chamou a atenção foi que ele estava incomodado com algo, mais especificamente em relação a mim. Depois da premiação, mal olhava em minha direção, evitava qualquer tipo de contato. Estranhei a mudança repentina de seu comportamento, uma vez que, poucas horas, antes parecíamos recém-casados. Quando saiu e foi em direção ao bar, imaginei que quisesse ficar sozinho, ou tirar um tempo para espairecer a cabeça.

“Acha que eu fiz alguma coisa errada?” Com as sobrancelhas arqueadas em confusão, percebi que Miranda não havia entendido minhas palavras. “Tentarei ser um pouco mais clara: depois da premiação ele ficou estranho, você acha que tem alguma coisa errada? Que eu fiz algo?”

“Raquel, querida, ele é estranho.” Revirando os olhos como se aquilo fosse óbvio, Miranda tombou a cabeça para trás, a fim de expelir a fumaça do cigarro. “Não leve isso para o lado pessoal, acho que você está mexendo com a cabeça dele mais do que ele gostaria.”

“Como assim?”

“Raquel... Sabe muito bem do que estou falando. Sérgio está de quatro por você, se é que não tenha se dado conta.” Sorri, envergonhada com suas palavras. “Inclusive, fiquei impressionada pelo empenho dos dois. Achei que desistiriam da premiação e ficariam por lá.” Quando notei a implícita referência ao episódio do quarto, senti minhas bochechas esquentarem e tampei o rosto de vergonha. Eu estava a ponto de explodir, ainda mais quando ela começou a rir, divertida.

“Miranda!” Ralhei, levemente constrangida, acompanhando-a e rindo do meu próprio embaraço.

“Mas agora é sério, Raquel. Somos duas mulheres, velhas e adultas. Sejamos francas e sinceras, você sabe muito bem sobre o que estou falando. Você ainda é discreta e consegue esconder, mas ele não.” A sutil insinuação de que o desejo era recíproco por minha parte fez com que um suspiro escapasse por entre meus lábios. Tudo o que estava acontecendo era tão claro, que até mesmo as pessoas ao nosso redor conseguiam enxergar. “Precisa entender que para o Sérgio é difícil lidar com isso, ele é muito intenso, sempre entregou tudo de si em tudo o que faz, todos os relacionamentos...” Surpresa, arregalei os olhos em sua direção, incrédula por suas palavras.

“Nunca imaginei… Ele sempre pareceu muito quieto, reservado, tímido...” De fato, o Sérgio dos últimos dias se parecia muito pouco com o Sérgio com o qual convivi por alguns anos. Eu, que jurei conhecê-lo tão bem, aparentemente estava equivocada.

“Ele é assim quando não se tem muita intimidade ou liberdade, mas se conviver mais alguns dias vai descobrir que na verdade Sérgio tem o coração mais lindo e carinhoso do mundo.” A afeição em sua voz deixou-me um tanto emocionada; ela tinha os olhos distantes, observando algum ponto qualquer. “Uma vez, quando éramos crianças, na casa dos sete ou oito anos, em uma determinada ocasião, ele bateu no irmão para me defender!”

“Em Berlin?” Não pude conter meu choque ao ouvir suas palavras. Os dois sempre foram próximos, ou pelo menos era o que parecia pelos corredores da editora, então nunca imaginei que tivessem divergências, principalmente por uma prima.

“O próprio! Berlim pegou minha boneca favorita de pano e saiu correndo . Lembro-me de me sentar debaixo da árvore no quintal da casa da vovó e ficar chorando. Tentei persegui-lo por um tempo, mas não consegui alcançá-lo.” Um sorriso lindo brotou em seus lábios, como se as memórias de infância ainda estivessem vivas em sua mente. “Eu era a mais nova e dramática entre eles, então pode imaginar o que aconteceu... Alguns minutos mais tarde, ele voltou todo sujo de terra, mas com a boneca em mãos pra me devolver.” A imagem de um pequeno Sérgio todo meigo e cavalheiro iluminou minha mente, enquanto meu coração se aquecia de ternura. Os olhos pequenos, o sorriso lindo no rosto, as covinhas na bochecha...

“Que fofo!”

“Sim, sempre foi um amor desde criança. Fico orgulhosa de ver o homem incrível que ele se tornou. Ele é uma boa pessoa, um homem decente, bom pai... Mas não se engane por favor, Sérgio também não é um Don Juan, tem lá seus defeitos como todos nós. Bom, você convive com ele, sabe muito bem do que estou falando, é um chefe extremamente burocrático, sistemático e irritantemente correto.” Como uma espécie de magnetismo, suas palavras automaticamente fizeram meus olhos voarem na direção dele. Por mais que eu tentasse, jamais conseguiria explicar o quanto sou encantada por Sérgio. “Ele gosta de você Raquel, e talvez isso seja algo que o assuste...”

Incapaz de respondê-la, me vi perdida em Sérgio Marquina. Tudo ao meu redor parecia não existir ou não ter importância. Como numa espécie de filme, eu olhava em sua direção e minha mente era inundada por uma série de flashbacks e lembranças compartilhadas.

A primeira vez em que nos conhecemos, quando descobrimos juntos que eu estava grávida em pleno expediente, quando chorei em seu ombro pelo medo, quando me deu um buquê de girassóis e uma caixinha de música em meu aniversário do ano passado. Uma pequena faísca de admiração havia se tornado uma fogueira. Era mais forte que eu, fora da minha zona de controle. Um lapso de coragem se apossou do meu corpo e comecei a refletir sobre como Sérgio era diferente de todos os homens que passaram pela minha vida. Não, ele não era perfeito. Nenhum era. Mas ele era o Sérgio. O homem que me respeitava como mulher e como profissional, o homem que me elogiou e reconheceu minha conduta como mãe. Eu estava em cima de um penhasco, pronta para descer pelo desfiladeiro e deixar-me levar por aquilo que nós já sabíamos. Eu o queria, e o desejo era correspondido. Só havia um último e pequeno detalhe...

“Miranda, eu sou a secretária do Sérgio.” Afirmei o óbvio. Aquilo sempre seria um empecilho entre nós dois. Me parecia um tanto absurdo e relativamente proibido tudo o que já havia acontecido desde quando chegamos em Santorini. Não me farei a rogada e dizer que nunca fantasiei uma cavalgada em seu colo naquele tão confortável sofá de sua sala... Mas existe um abismo entre a imaginação e a realidade. “Profissionalismo e prazer não andam juntos.”

“Você está na Grécia, querida. Deixe sua cabeça dura lá em Madri, por favor. Além do mais, ele não está pedindo que se case com ele, só quer tirar a sua roupa.”

~*~

 

 

 

(screwed – janelle monáe)

Conversar com Fábio por alguns minutos fez-me lembrar do porquê éramos amigos. As piadas horríveis sobre a época da faculdade, as reuniões e festas em família. Sobretudo, admirei sua maturidade e compreensão quando resolvi trazer o assunto do problema que estávamos enfrentando na editora. Como ele era apenas acionista e parte do Conselho, só nos encontrávamos nas assembleias trimestrais.

“O que vamos fazer para resolver isso?” Questionou, preocupado.

“Não faço ideia.” Menti, dando de ombros.

“Os outros acionistas sabem disso?”

“Não, pretendo revelar o problema na próxima reunião.”

Fábio começou uma série de discursos, mas perdi completamente o foco quando vislumbrei o ponto alaranjado por trás dele. Raquel caminhava elegantemente em nossa direção, com a postura impecável, a coluna ereta e um sorrisinho sugestivo nos lábios. Ela sabia o quanto mexia comigo, e adorava usar sua magia contra mim. Engoli em seco quando puxou com vontade a fenda do vestido, deixando sua perna torneada completamente à mostra de acordo com seus passos enquanto subia os quatro degraus de escada para chegar até o bar. Com a sobrancelhas arqueadas, prendendo o lábio inferior entre os dentes, eu sabia muito bem o que ela queria e agradeci aos céus pois finalmente sairíamos dali.

Aproximando-se sutilmente e com certo receio, fiz um gesto com a mão para que chegasse mais perto. Fábio, que falava sem parar, se deteve no exato momento em que a impecável figura de Murillo surgiu em seu campo de visão. Observei meu amigo perder um pouco da compostura, ficando subitamente mudo de um minuto para o outro.

“Por favor, me perdoem por interromper os dois.” Pediu, inocente, alternando o olhar entre Fábio e eu. “Mas preciso trocar uma palavrinha com você, Sérgio. É sobre Santiago.” Ao ouvir o nome do menino, automaticamente me coloquei em alerta, sentindo todos os meus músculos tencionarem.

“O que aconteceu? Ele está bem?”

“Fiquem à vontade, preciso voltar à mesa.” Anunciou Fábio, levantando-se da banqueta. Os olhos dele estavam fixos nela, deixando-me levemente incomodado. Realmente... ninguém estava imune ao efeito Raquel Murillo. “Prazer, Fábio.” Atrevido, Fábio se adiantou e fez a própria apresentação, sem sequer esperar que eu me encarregasse disso.

“Raquel Murillo.” Tombando a cabeça para o lado num tímido sorriso educado, minha secretária espelhou o gesto e o cumprimentou devidamente. “Não quero mesmo incomodar, mas é um pouco urgente.”

Com a sobrancelhas arqueadas, observei a breve interação e não pude evitar pensar que, talvez, se ela não estivesse comigo... Fábio já teria flertado com ela. Se bem que qualquer palavra naquele momento era dispensável, uma vez que seus olhos gritavam lascívia e desejo. Tentei não me incomodar com aquilo, mas era praticamente impossível.

“Não se preocupe, Raquel. Ele já estava indo embora.”  Soltei de uma vez, sem me importar em ser delicado. Com um sorriso sacana nos lábios, Fábio encarou-me desconfiado alternando o olhar entre Raquel e eu. Ele sabia que algo estava acontecendo, pelo menos da minha parte. E tudo bem, não me importo. Eu só queria que ele nos deixasse a sós naquele momento.

“Sim, não se preocupe. Já estou de saída, mas foi um prazer conhecê-la... Espero que nos encontremos mais vezes.” Sem um pingo de vergonha na cara, Fábio tomou-lhe a mão e levou aos lábios, depositando um casto beijo no dorso. Ele era um autêntico galanteador e estava se portando de modo um pouco mais pessoal do que eu gostaria que fosse. Seus olhos se prenderam nos dela e seus lábios demoraram um pouco mais do que deveriam. Senti um incômodo com aquele gesto, mas continuei agindo como se nada estivesse acontecendo. Fábio estava fazendo de propósito. Por outro lado, Raquel o encarava com uma ruga na testa, arqueando a sobrancelhas para o cavalheirismo exagerado, e não pude conter minha vontade de rir.

“Obrigada.” Rebateu, seca, sorrindo forçadamente.

“Até mais, Marquina, foi bom colocar o papo em dia. Nos encontramos na próxima reunião?” Aparentemente, lembrando-se de minha presença, Fábio finalmente se dirigiu a mim com um breve aceno.

“Pode ter certeza. Boa noite, Fábio.”

Assim que nos deu as costas, voltei minha total atenção a Raquel, sentindo-me um pouco tonto por tê-la tão próxima. Lembrando do foco do assunto, levantei-me rapidamente, colocando-me a postos e à disposição de Raquel. Era muito provável que algo tinha acontecido com o bebê, e só de pensar nisso minha mente já cogitava a pior das hipóteses.

“O que aconteceu com Santiago? Ele está bem? Voltou a febre?” Não pude evitar minha série de questionamentos; ela deixou claro que os dentinhos dele estavam nascendo e que a qualquer momento poderia se sentir mal.

“Meu filho está bem.” Com um olhar nada inocente, enquanto prendia o lábio inferior entre os dentes, Raquel encostou a mão em meu peito e empurrou levemente. No ato, acabei dando um passo para trás e voltei a me sentar na banqueta. “Precisava de uma desculpa.”

Em dois curtos passos, Raquel começou a se aproximar vagarosamente e, de maneira nada despretensiosa, minha secretária encaixou-se no vão das minhas pernas, fazendo com que eu precisasse abri-las um pouco mais para abrigar toda a largura do seu fenomenal quadril. Quando jogou os braços em volta do meu pescoço, praticamente me deixando preso a ela, sorri, entendendo qual era sua intenção.

“Hm...Precisava de uma desculpa...” Pontuei numa falsa desconfiança, enquanto enlaçava sua cintura e a puxava contra mim, anulando a distância entre nossos corpos. “Por que?”

“Porque eu queria... Hm, não sei... Um tempo a sós com o meu chefe.” Ergueu os ombros com suposto desinteresse, como se aquilo não tivesse muita importância. Eu amava a sensação da tímida carícia de seus dedos em meus cabelos.

“Acho que o seu chefe é um homem de muita sorte.” Sussurrei contra seus lábios, ansioso por roubar o beijo que tanto desejei quando estávamos no quarto.

“Concordo, mas... Ele não está merecendo.”

“E posso saber o motivo?” Sem querer soar preocupado com suas palavras, perguntei no mesmo tom provocativo.

“Porque ele me evitou quase que a noite toda.” A pontada do sentimento de culpa foi tão forte que eu sequer tive forças para encará-la diretamente nos olhos. Envergonhado, desviei minha atenção para o colo parcialmente desnudo, observando o colar de ouro reluzir em contato com a fraca luz do bar sobre nossas cabeças. Com calma e carinho, senti o toque de seu indicador em meu queixo, erguendo meu rosto e alinhando meu olhar com o seu. “O que aconteceu?”

Como diria a Raquel que eu estava submerso em meus sentimentos por ela? Toda aquela intensidade estava mexendo com a minha cabeça e. apesar de todos os meus esforços. estava cada vez mais difícil resistir a ela.

“Estou perdendo o controle.” Confessei, sentindo um terno afago em minha bochecha. Não havia necessidade de mais explicações; ela sabia muito bem o que eu queria dizer. Havia um letreiro em neon e em letras garrafais em minha testa dizendo o quanto eu estava rendido por ela.

“E o que você quer?” Ela estava visivelmente ofegante e, pelo subir e descer de seu peito, eu podia jurar que seu coração estava acelerado. Quando umedeceu os lábios brevemente com a própria língua, percebi que estava realmente fodido.

“Eu quero você.”

“Então o que está esperando?” Suas palavras foram a dose de coragem para jogar tudo pelo ar e dar um fim àquilo.

Sem o mínimo de delicadeza, encaixei minha mão em sua mandíbula e a puxei ao meu encontro. Minha língua invadiu sua boca com uma considerável quantidade de agressividade, e suspirei ao ouvi-la soltar um gemido em deleite. A suavidade de seus lábios me tirou completamente dos trilhos, apesar do beijo caracterizado por pura volúpia e desejo, o que era um perfeito retrato do que se passava entre nós. Fogo, luxúria e um descontrolado tesão. Enquanto massageava a língua dela com a minha própria em prazerosas lambidas e investidas, senti, em sua boca um pouco gelada, um refrescante hálito de hortelã numa sutil mistura de álcool. Uma delícia. Senti suas unhas cravadas em minhas costas, buscando apoio enquanto ela gemia entre um beijo e outro. Beirando o obsceno, comecei a sentir os efeitos daquele beijo enquanto imaginava a maestria de sua língua em outro lugar. Eu precisava terminar aquele beijo da mesma maneira que havia começado, ou, então, não responderia por meus atos. Então, cessando o contato brevemente e diminuindo a velocidade, um pouco menos abrupto, me contentei em apenas sugar seus lábios e prendê-lo em meus dentes, mordiscando-os antes de me afastar.

“Isso deveria ser crime.” Murmurou, um tanto atordoada.

“O que?”

“Deixar uma mulher morrendo de tesão.” Sorri, completamente hipnotizado. Deliberadamente disposto a provocá-la ainda mais, aproximei-me pela lateral do seu rosto, arranhando sua pele com minha barba, aproveitando a sensação de seu delicioso cheiro inebriar e acender meu corpo ainda mais.

“Passei os últimos dois dias pensando em como seria sensação de estar por dentro de você, ou... qual seria o seu gosto...” Sussurrei no pé de seu ouvido, observando a veia de seu pescoço saltar em expectativa. “Ansioso pela sua imagem descendo e subindo, quente e apertada.” Levando a provocação ao limite, mordisquei o lóbulo de sua orelha enquanto descia minha mão até sua bunda e a puxava ainda mais contra mim. “Espero que esteja muito certa disso, Raquel, porque quando eu começar vai ser tão forte que todos vão te ouvir gritar e amanhã de manhã não vai sentir um mínimo músculo do seu corpo.”  Um gemido sofrido escapou de seus lábios ao sentir a nada sutil ereção presente em minha calça quando nossos corpos se chocaram numa gostosa ficção. Por fim, chupei levemente a pele exposta em seu pescoço antes de me afastar completamente e encarar o rosto nada inocente dela, retorcido numa feição de puro prazer.

“Muito bem, garanhão. Eu quero ver se você dá conta.” Rebateu, com os lábios inchados e uma carinha de atrevida.

“Me responda você depois que eu te fizer tremer e perder as forças.”  Arregalando os olhos em surpresa, Raquel mordeu o lábio inferior e arqueou as sobrancelhas como num silencioso desafio.

“Não sabia que era um homem tão convencido assim...” Respondeu, apoiando-se em meus ombros. Não satisfeita com a série de provocações verbais, Raquel começou a roçar minha panturrilha com o salto fino de sua sandália. Senti uma onda de eletricidade subir desde minha perna até o alto da nuca, arrepiando meu corpo inteiro. “Seu ego inflado está criando muita expectativa, e expectativa gera decepção.” Numa sensual arqueada de sobrancelhas, levei suas palavras como um desafio e prometi a mim mesmo que a faria gozar de prazer no mínimo 3 vezes. A atmosfera entre nós chegava a ser pesada de tão insuportavelmente erótica, até que algo me ocorreu.

“Tira a calcinha.” Ordenei sem cerimônia.

“Que calcinha?”

Engoli em seco, com o coração quase saltando para fora do peito. Aquela mulher só podia ser uma doce alucinação da minha mente. Um calafrio percorreu minha espinha e precisei respirar fundo para não a arrancar dali naquele momento mesmo. Meus batimentos cardíacos estavam acelerados, e desconfiava que muito em breve seria capaz de ter uma síncope pelo pico nervoso. Respirei fundo, tentando pensar em qualquer coisa que não fosse o fato de Raquel estar sem calcinha e extremamente convidativa. Olhei para baixo e notei sua coxa torneada e desnuda, praticamente implorando pelo toque... mas eu sabia que não podia. Aquela lascívia estava fritando meu bom senso, e deixando-me no mesmo estado de erupção. Eu tinha plena ciência que não iria conseguir me segurar.

“Você não perde por esperar, Murillo.” Enquanto eu estava agoniado, quase morrendo por dentro, Raquel parecia se divertir. Com aquela cara de falsa puritana, ela encarou a visível protuberância em minha calça e riu do meu estado, concluindo sua gracinha com uma mordida quase indecente no lábio inferior. Suspirei em deleite, aquela mulher era coisa de outro mundo.

(bad together – dua lipa)

“É, vamos ver se você pode mesmo isso tudo... Mas ei, olha pra mim. Preciso te dizer uma coisa.” De repente, seu rosto ficou sério e a súbita mudança no tom de sua voz chamou-me a atenção. Com as mãos em minha nuca, ela vagarosamente iniciou um carinho ali, penteando meus fios com seus delicados dedos.

“Pois não?”

“Agora é sério mesmo, sem brincadeira. Foi por isso que vim atrás de você.” Começou, um tanto acanhada. “Não sei se minhas palavras valem alguma coisa, mas independentemente do resultado de hoje na premiação, quero que saiba o quanto eu estou orgulhosa de você.” As bochechas de Raquel começaram a assumir um gracioso tom avermelhado, enquanto um sorriso contido pintava em seus lábios. Ela tinha a capacidade encantadora de ser uma adolescente tímida ao mesmo tempo em que conseguia ser a mulher mais sensual e madura do mundo. “O sucesso da revista não deve ser medido por um prêmio. Você tem feito um ótimo trabalho mantendo a editora em pé e não é por ser meu chefe, mas preciso admitir que...” As palavras morreram em sua boca, instigando minha curiosidade.

“Que?”

“Você é um CEO incrível.” Tombando a cabeça para o lado, ela desceu as mãos até meus braços, parando sobre meus bíceps. Eu era incapaz de desviar os olhos de seu rosto, estava irrevogavelmente hipnotizado por ela.

A verdade é que tudo aquilo era demasiado supérfluo. Onde estávamos, a premiação em si. Desde quando chegamos eu sequer havia pensado nisso, não havia importância. O fato de ter sua companhia por perto fez com que minha ansiedade sobre o evento diminuísse consideravelmente, como se, de fato, ela fosse tudo o que eu precisava para estar bem. Ela invadiu minha mente por completo, deixando-a nublada, fazendo com que nada além dela tivesse algum sentido. Apesar de aparentemente estar acomodado, passei anos mergulhado numa interminável melancolia, contentando-me com migalhas e futilidades. Um verdadeiro vazio. Minha vida poderia ser resumida entre a editora e meu apartamento, e jamais imaginei que a única coisa que poderia preencher essa lacuna era a dona dos cachos dourados com o andar de modelo que me trazia o café todos os dias.

“Ganhando ou perdendo, o que eu queria era dançar com você essa noite.” Arregalando os olhos e sorrindo genuinamente, minha secretária tombou para frente para esconder o rosto na curvatura do meu pescoço.

“Sérgio!” Sorri ao sentir seus braços envolvendo meu corpo, como se estivesse buscando apoio. Fechando os olhos, enlacei sua cintura com relativa força e suspirei ao ser invadido por uma imensa paz interior por tê-la comigo.

Aquele, com certeza, era um dos melhores abraços que havia recebido em toda minha vida. Senti uma pequena pontada de tristeza em minha alma ao me dar conta de toda a realidade a qual estávamos submetidos; eu não queria que ela fosse embora. Eu não queria que ela me deixasse. Poderia ser egoísmo da minha parte, mas eu não conseguia enxergar um futuro o qual ela não esteja presente.

Eu queria sentir o cheiro de seu cabelo, aproveitar a maciez de sua pele com meus próprios lábios, vislumbrar seu rosto sonolento e os olhos inchados pela manhã. Eu queria saber sobre sua família, sua infância. Sua cor favorita, seu chocolate favorito.

Santorini tirou uma venda dos meus olhos, mostrou-me uma Raquel que eu desconhecia e pela qual estava cada vez me encantando mais.

“Em Madri, eu não tinha desculpa nenhuma pra te chamar, ou me aproximar.” Sussurrei, enquanto minhas mãos passeavam vagarosamente pela sua lombar, num preguiçoso carinho. “Eu estou feliz que esteja aqui.”

Quebrando o enlace de nossos corpos, Raquel se desvencilhou de meus braços, e apoiou as mãos em meus ombros. Ela se conteve em apenas encarar-me com atenção. Parecia séria, como se estivesse estudando minhas feições. Não ousei interrompê-la, na verdade era um deleite para meus olhos tê-la tão próxima. Mesmo que não trocássemos uma só palavra, nossos olhos gritavam. Os corpos queimavam por dentro.

“Vem.” Decidida, entrelaçou os dedos nos meus e me puxou para fora da banqueta.

“Pra onde?”

“Pra sua sorte, hoje eu acordei com vontade de dançar.”

(voulez - vous - abba)

Conforme Raquel seguia em direção à escada, puxando-me pela mão, tudo parecia uma alucinação. Enquanto subíamos os degraus em direção ao segundo andar, os acordes finais da música agitada já se faziam presentes, enviando comandos involuntários para todo meu corpo, aumentando aquela pequena fibra de excitação e ansiedade pelos próximos acontecimentos.

Assim que chegamos no último degrau, aparentemente fui teletransportado para minha adolescência nas discotecas e nos bares em Madri. O local iluminado somente por alguns globos de luz e lanternas coloridas. Tinha a leve impressão de estar em outra atmosfera, fazendo com que fosse quase impossível chutar o número exato de pessoas naquele mar de corpos presentes na pista de dança.

Quando os primeiros acordes de voulez-vous ressoaram no ambiente, uma onda de pessoas festejou a música escolhida. Senti o aperto de Raquel em minhas mãos, puxando-me para o meio da multidão. Sem pensar duas vezes, fui em seu enlaço e nos misturamos em meio aos corpos ali presentes. Como numa câmera lenta, fui pouco a pouco inundado por toda a euforia presente, uma excitação crepitava por todas as minhas terminações nervosas, fazendo com que o sangue corresse mais depressa.

And here we go again, we know the start, we know the end

Não sei ao certo se era culpa do álcool que havia subido para a cabeça, ou se minha mente já anestesiada pela presença de Raquel, mas enquanto ela estava em minha frente dançando como se não houvesse um amanhã tive a deliciosa sensação de que tudo ao redor haviam sumido.

Voulez-vous (a-ha!)

Take it now or leave it (a-ha!)

Now is all we get (a-ha!)

Nothing promised, no regrets

Eu era incapaz de desviar os olhos de sua imagem. Era como um colírio. Completamente entregue, Raquel levantou as mãos para cima, com os olhos fechados e moveu o corpo graciosamente, concentrando-se no embalo com o ritmo da música. Transmitindo uma envolvente aura da liberdade, ela balançava a cabeça requebrando o corpo num gingado sensual e fascinante.

 

I'm really glad you came, you know the rules, you know the game

Master of the scene

We've done it all before and now we're back to get some more

You know what I mean

Pegando-me de surpresa e desprevenido, Raquel deu um passo em minha direção puxando-me em sua direção pela gravata. Sem perder tempo, dei meia volta e colei meu peito em suas costas, como se fosse capaz de guiá-la em seus movimentos. Entretanto, naquele momento, ela estava no comando enquanto eu me encontrava perdidamente hipnotizado por cada passo. Envolvi sua cintura com minhas mãos, acompanhando o vaivém ali presente. Seu rebolado causava-me alucinações, a fricção intencional sua bunda contra minha ereção era como brasa enviando uma onda calorosa que percorria meu corpo inteiro.

Eu estava chegando ao meu limite, meu corpo queimava enquanto dançávamos numa sintonia surreal. Tudo pareceu piorar quando ela deitou em meu peito e mergulhou a mão em meus cabelos, bagunçando os fios e me puxando contra si. Estávamos repetindo o que aconteceu no quarto, mas, dessa vez, nada e nem ninguém poderia nos atrapalhar. Enquanto beijava seu pescoço e arranhava sua pele com minha barba, sentia-a quente e macia, vibrando sob meu toque. Um gemido inaudível escapou de seus lábios, e percebi que não era o único que borbulhava por dentro. Minha libido havia excedido toda e qualquer racionalidade imposta pela compostura.

Eu estava a ponto de enlouquecer quando Raquel abruptamente cessou os movimentos. Virando-se dentro de meus braços, minha secretária encarou-me com uma feição indecifrável. Apesar da fumaça branca que nos embalava, seus olhos brilhavam feito estrelas. Havia uma faísca de cobiça e lubricidade em suas pupilas dilatadas; a boca entreaberta e o arfar de seu peito denunciavam sua dificuldade para respirar. Toquei em seus cabelos, traçando um caminho com minhas próprias mãos até seu maxilar, e com uma lentidão quase insuportável, contornei o desenho de seus lábios com meus próprios dedos. Eu estava a ponto de beijá-la, mas assim que me inclinei em sua direção Raquel me impediu. Com a mão sobre meus lábios, minha secretária me encarava com um sorriso atrevido.

E foi então que eu entendi. Era hora de ir embora.

 

 

~*~

 

 

(crazy in love remix - beyoncé)

“Último andar, quarto A.”

Ela estava flertando com ele, e não fazia a mínima questão de esconder. Parecia não se incomodar com a minha presença ao seu lado, e aproveitava qualquer oportunidade para lançar olhares sugestivos. Porém, apesar das sutis investidas, ele não lhe dava a mínima.

Quem seria eu para julgar a pobre mulher? Sérgio era um poço de testosterona, ainda mais dentro daquele smoking de três peças.

“O casal do quarto B está hospedado?”

“Em nome de Miranda Marquina?” Em silêncio, Sérgio se contentou em apenas manear a cabeça num aceno positivo. Ele parecia calmo. Irritantemente tranquilo para alguém que havia prometido me fazer gritar a noite inteira. “Ela ainda não chegou.”

“Por favor, quando ela chegar passe o recado de que não gostaríamos de ser incomodados, nem hoje e nem amanhã.” Pediu com gentileza, enquanto dirigia o olhar em minha direção. Pela primeira vez desde quando chegamos, a recepcionista pareceu se dar conta de que ele não estava sozinho. “Uma última coisa, por gentileza, cancele a reserva feita em nome de Raquel Fuentes Murillo.” Minha respiração ficou um pouco pesada após ouvi-lo dizer meu nome num tom que beirava o erótico. Sentia minha pele queimar sob seu olhar, ele nem sequer precisava me tocar.

“Sim senhor.” Respondeu, depois de arranhar a voz e recuperar a compostura.

“Obrigado, boa noite.” Educado e decidido, Sérgio a cumprimentou brevemente antes de dar-lhe as costas.

Com meu chefe ao meu enlaço caminhamos vagarosamente em direção ao elevador, nossa proximidade estava fazendo com que um arrepio percorresse minha espinha dorsal, mas eu precisava manter a cabeça no lugar.

Os números do elevador demoravam uma eternidade para mudar.

5

4

Pelo meu campo de visão, tive o vislumbre da tentadora imagem de Sérgio mordendo o lábio inferior numa tentativa de conter um sorriso. Uma voz em minha cabeça praticamente gritava, dizendo o quanto aquilo era arriscado, errado de todas as maneiras possíveis. Mas era difícil manter a voz da racionalidade perto de um homem como aquele. Os nós dos meus dedos estavam dormentes, minhas mãos suavam em expectativa.

3

Respirando com calma, contei até 10 e tentei colocar minha cabeça de volta no lugar.

Falta pouco Raquel.

2

 

Antes que o elevador chegasse ao térreo, para minha tristeza e desprazer, dois casais se juntaram a nós numa pequena fila. Não estaríamos sozinhos. E aquilo frustrava todos os meus planos de agarrá-lo dentro daquele metro quadrado.

1

Assim que as portas se abriram, Sérgio e eu entramos primeiro e ficamos no fundo do elevador. Quando todos estavam em seus devidos lugares, ficaram em silêncio enquanto uma música antiga ecoava pelo alto-falante. O último andar parecia demorar uma eternidade para chegar.

Apesar da ansiedade, tudo parecia tranquilo. Foi então que aconteceu...

Posicionado ao meu lado, Sérgio vagarosamente se abaixou até o chão, recebendo um olhar curioso do casal a nossa frente. De maneira inocente, ele ignorou a atenção recebida e passou a mexer em algum detalhe em seu sapato.

Eu estava distraída, precisava encarar qualquer ponto que não fosse em meu chefe agachado numa posição quase estratégica, mas, apesar de todos os meus esforços para não pensar naquilo, ele parecia empenhado em me tirar do sério.

Levei um susto quando, sem um pingo de vergonha na cara ou medo de ser pego no pulo, Sérgio tocou em meu calcanhar e com toda calma do mundo começou a se levantar. Meus lábios se separaram por conta do choque, e minha respiração passou a ficar mais complicada quando ele continuou a esfregar sua mão em meu corpo, traçando um caminho desde a panturrilha e subindo em direção à coxa, apertando com ímpeto e enviando comandos involuntários que reverberavam em todo meu corpo. Eu estava em combustão, a ponto de desfalecer pelo tesão insuportável que se apoderava de cada uma de minhas células. Ele era plenamente ciente do efeito que causava sobre mim, e adorava brincar com o fogo.

Precisei conter o breve espasmo, e cerrei meus lábios na tentativa de conter um gemido ao sentir sua mão subindo cada vez mais, até chegar em minha intimidade. O desgraçado queria se certificar de que eu realmente estava sem calcinha e agradeci aos céus por resolver me depilar um dia antes da viagem.

Como tudo o que é ruim pode piorar, precisei levar minha bolsa até os lábios para mordê-la levemente, na intenção de conter o gemido involuntário que escapou quando Sérgio pressionou o dedo sobre meu clitóris já inchado. Minha respiração travou, enquanto um uma gostosa vibração em expectativa se fazia presente em meu estômago. Sérgio começou a acariciar-me com uma lentidão sofrida, causando um delicioso estímulo e aumentando ainda mais minha excitação. Eu já estava molhada desde nosso momento no bar, mas o fato de estar em público, cercada num metro quadrado com 4 pessoas ao nosso redor com o iminente risco de sermos flagrados pareceu elevar a adrenalina às alturas enquanto eu borbulhava por dentro.

Fechei os olhos e tombei a cabeça para trás, sentindo meus pés vacilarem quando ele manteve o polegar naquele ponto específico e começou a serpentear com os dedos em toda a extensão de minha carne, encharcando sua mão com meu próprio fluído. Engoli em seco quando um dedo espesso mergulhou dentro de mim. Depois mais um. Entrando e saindo… Com toda calma e tranquilidade do mundo enquanto continuava esfregando meu clitóris.

Eu não podia acreditar que Sérgio estava me masturbando. Ele era meu puto chefe. Abri os olhos e, mesmo com a visão turva, pude notar que seu rosto estava completamente sereno, num contraste perfeito com o verdadeiro caos em meu corpo causado por seus dedos ágeis. Ele aumentou o ritmo, e minhas pernas fraquejaram brevemente. Eu queria gemer e gritar aos quatro ventos pela audácia de Sérgio e precisei agarrar seu terno com força para buscar um pouco de apoio. Respirar era uma atividade difícil, e meu peito doía enquanto meu coração parecia querer sair pela boca. Eu iria gozar, faltava muito pouco. Mas eu não queria dar aquele gostinho a ele tão facilmente.

Quando o elevador finalmente chegou no último andar, depois que todos os casais saíram, choraminguei quando Sérgio abandonou minha intimidade e levou os dedos até os lábios, chupando com vontade e sentindo meu sabor com se fosse seu pirulito favorito. Sua mandíbula estava travada, enquanto nos encarávamos duramente. A luxúria em seus olhos era como brasa queimando minha pele. Havia me esquecido como era aquela gostosa aquela sensação de ser desejada por um homem. Mas Sérgio possuía um agravante, porque ele não era um homem como qualquer outro… Era o protagonista de todos os meus sonhos eróticos dos últimos meses. 

Após aquela silenciosa provocação, bufei e sai rebolando propositalmente em sua frente. Eu não queria mais sentir seu toque enquanto estivéssemos fora do quarto, seria incapaz de conter o tesão em meu corpo e poderia agarrá-lo ali mesmo naquele inferno de corredor.

Quando paramos na porta, meus olhos voaram até a fechadura em expectativa... Ele só precisava destrancá-la e entrar no maldito quarto. O cartão estava quase lá, numa lentidão agonizante que me fazia querer chorar.

“Raquel...” Quase bufei quando ouvi meu nome. Ele não poderia simplesmente abrir esse inferno? “Olhe pra mim.” Pediu, hesitante, e eu juro que poderia matá-lo ali mesmo. Segurando o cartão no ar, ele se deteve e encarou-me como se eu fosse uma criança sedenta por comer um doce antes do almoço e ele precisava explicar o quanto aquilo era errado. “Se entramos nesse quarto, sabemos o que vai acontecer, e assim que passarmos por essa porta não tem volta.” Advertiu completamente sério, numa clara ameaça de que não adiantava querer parar e tentar escapar. Nem se eu quisesse. “Você tem certeza disso?”

Encarei seus olhos com atenção. Eu pensei. Pensei muito e por muito tempo. Mas eu não queria mais pensar.

“O que acontece em Santorini, fica em Santorini.”

Pegando o cartão de suas mãos e encarando-o diretamente nos olhos, destravei a porta. Dando-lhe as costas, entrei no quarto sem o esperar. Quando cheguei no meio da sala, ouvi bipe anunciando que a porta havia sido trancada novamente.

Mas o que aconteceu naquela noite, é história pra outro dia. 

 

 

 


Notas Finais


no aguardo pelo feedback de vcs querendo colocar minha cabeça numa estaca.


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