Dulce
Meu coração batia apressadamente dentro do meu peito. As mãos suavam como se aquele fosse um grande acontecimento. Mas de fato, era.
A última vez que me lembro de ter tido um encontro com alguém eu ainda estava na faculdade. Talvez tivesse perdido o jeito e estragasse tudo, ou talvez eu só estivesse me alto sabotando com esses pensamentos negativos.
Como o jantar ia ser em casa, eu vesti algo que vestia no meu dia a dia, deixei meu rosto sem nenhuma maquiagem e não me preocupei muito com meu cabelo. Apenas o lavei, penteei e deixei secar naturalmente.
Dispensei meus empregados pelo resto do fim de semana, assim me sentiria mais à vontade em casa.
Sentei no sofá enquanto aguardava a chegada dele. E como sempre muito pontual, a campainha tocou às 19:00 em ponto.
Dei uma olhada no espelho antes de ir abrir a porta e depois de respirar fundo, eu destranquei e lá estava ele, com algumas sacolas de compras, um buquê de rosas e um sorriso singelo no rosto.
— Olá. — eu disse sorrindo.
— Olá.
— Pode entrar. — dei espaço e ele entrou na sala. — Vamos até a cozinha colocar essas coisas lá. E aí você vai poder começar a cozinhar, porque eu tô faminta! — cantarolei.
— Também tô. — riu. — Vai ser a primeira vez que eu vou experimentar um prato totalmente vegano.
— Não vou prometer nada, afinal, quem vai cozinhar é você. — deixamos as coisas sobre o balcão.
— E isso é pra você. — ele me entregou o buquê.
— Obrigada. — respirei fundo com as flores contra o meu nariz. — Eu adorei.
— Ótimo. Estava com medo que você pudesse ser alérgica.
— Não tenho nenhuma alergia. Bom, que eu saiba. — ri. — E então, o que você vai preparar?
— Isso, minha cara, é uma supresa. Onde você deixa as panelas?
— Não faço ideia.
— Como não? — ele riu.
— Christopher, eu não sei nem fritar um ovo! — meio dramático, mas era verdade.
— Sendo assim, hoje você me ajudará e aprenderá como sobreviver sozinha. — brincou.
— Isso vai ser desastroso.
— Bom... — ele ficou atrás de mim, abraçou minha cintura e aproximou seus lábios da minha orelha. — Desastroso, mas muito divertido. — sussurrou me causando arrepios.
— Então me ensine. — fiquei de frente pra ele e enlacei meus braços em seu pescoço.
— Mãos à obra, senhorita Saviñon! — me deu um selinho rápido e logo se afastou até os armários.
Fiquei ali em pé, o observando enquanto ele pegava as panelas que iria precisar e depois desembrulhava os ingredientes. Cada gesto dele prendia a minha atenção e eu não conseguia desviar o olhar nem pensar em mais nada. Era quase angelical.
Me libertei dos meus pensamentos quando ele me ofereceu algumas verduras e uma faca, para que eu picasse tudo.
Desengonçada e sentindo uma dificuldade tremenda, eu consegui, mesmo que devagar, cortar as verduras em cubinhos.
Enquanto cozinhávamos, a gente conversava sobre os hobby’s que tínhamos, incluindo o único em comum, o videogame. Foi a conversa mais leve e mais sincera que eu já tive com alguém e eu simplesmente não queria parar de falar sobre como eu adorava o fato de não precisar ser tão formal com ele.
Ver ele cozinhar era algo um tanto quanto charmoso e me deixava arrepiada ver aquele homem de aparência bruta fazendo uma coisa tão delicada como aquela. Me peguei distraída o olhando em diversos momentos.
Finalmente a comida ficou pronta e nós organizamos a sala de jantar. Ele fez uma macarronada vegana, acompanhada com carne de caju que foi devidamente temperada por mim, sob a supervisão dele.
— Ok, vamos ver. — falei antes de garfar um pouco de comida. — Hum... — murmurei sentindo minhas papilas gustativas dançarem com o sabor. — Divino!
— Minha vez. — ele provou e pela expressão, havia ficado tão maravilhado quanto eu. — Comida vegana até que é legal.
— Não imagina o quanto. — falei convencida.
— Por que você se tornou vegana?
— Seres humanos não precisam explorar animais pra sobreviver. O único motivo pelo qual fazemos isso é o prazer. Mas, há como provar uma boa comida sem precisar matar um animal. As pessoas só precisam se desconstruir e claro, serem mais empáticas com os animais.
— Não sei se eu conseguiria, eu adoro carne.
— Eu também adorava. E aí eu descobri que podia substituir por carne de soja, ou de caju. — falei apontando para o prato.
— Não é a mesma coisa.
— Claro que não, mas quem se importa? Não sou vegana pelo sabor e sim pela causa.
— Admiro isso, de verdade. Mas... — ele desviou o olhar.
— O que?
— A empresa cria propagandas pra diversas outras empresas que usam produtos de origem animal. E tá tudo bem pra você?
— Esse tipo de política está na empresa desde a época do meu pai e bem, meu pai não era vegano, nem os diretores que estão na empresa bem antes de mim. Sou responsável pelo sustento de muitas pessoas e extinguir marcas que exploram animais prejudicaria não só à mim, mas as pessoas que trabalham pra mim. Seria como ter que escolher entre pessoas inocentes e animais inocentes.
— Você tem mais coração do que eu pensei. — sorriu.
— Ninguém disse pra me subestimar. — falei orgulhosa. — Me fala sobre você. Sei que você sabe tudo sobre mim, mas eu não sei nada de você.
— Cresci no estado do Maine com a minha avó. Depois que ela faleceu, terminei meus estudos aqui em Los Angeles e comecei a morar com o pessoal.
— Como os conheceu?
— Annie também morava no Maine e a gente meio que cresceu juntos, ela veio pra cá com a família antes de mim. Quando precisei me mudar ela me deu uma força. Christian e Maitê já moravam com ela na época.
— E os seus pais? — ele ficou alguns segundos em silêncio.
— Morreram. — foi a única coisa que ele disse.
— Posso perguntar como aconteceu?
— Sim, claro. Eles precisaram fazer uma viagem à negócios e aconteceu um acidente. Eu tinha uns 10 anos.
— Deve ter sido muito difícil pra você. — coloquei minha mão sobre a sua. Ele ergueu minha mão e depositou um beijo.
— O passado deve ficar no passado. Estou muito bem agora, gosto da vida que tenho e das pessoas que conheço. — ele parecia animado.
— Isso é ótimo. — suspirei. — Já eu gostaria de viver o meu passado de novo. Sinto falta de me sentir completa, sinto falta dessa casa cheia e principalmente, sinto falta do meu pai.
— Faz muito tempo que ele se foi?
— Assim que eu terminei a faculdade, à seis anos atrás. Foi uma barra ter que assumir a empresa sem tanta experiência e com todo mundo desacreditando da minha capacidade.
— Mas você mostrou pra eles quem é a melhor. — me encorajou e eu sorri.
— A que preço?
— Manter o legado do seu pai. Isso não é importante pra você?
— Por um bom tempo essa foi a coisa mais importante. E agora eu vejo que por causa disso eu perdi a minha vida toda. Depois que meu pai morreu, a minha vida só foi ladeira abaixo. Tem dias que eu só quero sumir. — fitei o chão.
— Ei. — ele levantou meu queixo. — Você é uma pessoa maravilhosa e talvez todos esses problemas tenham servido pra te tornar mais forte e mostrar que não precisa mudar pra ser boa no que faz, ou pra ser respeitada. E eu vejo a sua mudança, todo mundo vê. É uma mulher incrível, Dulce.
— Olha, você já me disse muitas coisas e essa foi a mais gentil de todas. — rimos.
— Deve ser porque agora eu tô louquinho por você. — deu de ombros. O analisei enquanto ele continuava comendo, como se sua fala fosse totalmente natural. — O que?
— Está mesmo apaixonado por mim?
— Sim. — disse com convicção.
— E a Maitê?
— Se quer saber, tive uma boa discussão com ela antes de vir pra cá. Me disse coisas horríveis, mas pelo menos colocamos um ponto final.
— Ok... — tornei a comer.
— Não tem nada pra me dizer? — arqueou a sobrancelha.
— Tenho. Depois do jantar.
— Isso é tortura. — reclamou. Dei de ombros e ri.
Eu estaria louca se não o aceitasse na minha vida. Claro que também estava apaixonada e logo ele saberia disso, mas eu não perderia a chance de vê-lo ansiar por isso.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.