Erik avançou em nossa direção e eu pude ver sua expressão indo gradativamente de assustado para muito irritado, eu arregalei os olhos incapaz de avançar a cadeira por causa daquele maldito degrau.
Ele desviou o olhar da mãe e me encarou.
- Charles, por favor, vá pra casa. A gente conversa amanhã.
Qual o limite entre se importar e ser abusivo? Bem senhor Xavier, por mais que quisesse protegê-lo que direito você tinha de ir até a casa dele e falar com a mãe, mesmo que ele claramente não quisesse isso?
Senti que talvez pudesse estar piorando e não ajudando naquela situação, e meu peito apertou muito, eu respirei fundo pra não chorar, abaixei a cabeça confuso.
Sua mãe respondeu.
- Por Deus, Erik, ajude o menino a entrar, um café não irá atrasa-lo, tenho certeza.
Erik encarou a mãe e respondeu com os dentes cerrados
- Ele vai embora.
Ela sorriu pra mim, e eu abaixei a cabeça ainda mais, envergonhado.
- Erik, seja pelo menos educado, ele tava na porta pronto pra tocar a campainha, ele deve ter algo a dizer também, você pode demonstrar algum tipo de cortesia pro seu amigo?
O rosto de Erik ficou vermelho de ódio.
Eu pensei em dizer que ele tinha esquecido algo no carro, sim eu quis mentir deliberadamente, mas quando ela disse amigo, minha respiração descompassou e meu peito começou a subir e descer muito rápido.
- Não somos amigos.
Eu disse muito rápido, os dois olharam pra mim e eu quis recuar a cadeira, eu nunca havia me sentido tão inseguro e envergonhado. Segurei o braço dela com força me impedindo de ir embora, meu estômago deu uma cambalhota e eu engoli a saliva com gosto de bile. Levantei o rosto e falei de novo.
- Não somos só amigos. Eu sinto muito, Erik, eu não devia ter vindo. Eu vou embora agora, senhora, você tem meu número e pode me ligar quando quiser falar comigo. Mas eu espero não ouvir nada sobre ser errado estarmos juntos. Eu respeito sua religião, mesmo que ela não nos respeite, mas a senhora não pregará isso pra mim, e se quer manter Erik saudável, e bem, não deveria pregar pra ele também.
Ela sorriu de um jeito que me deu um arrepio na espinha, era muito parecido com Erik, mas de um jeito que me causava repulsa.
- Deus existe pra todos, você não pode esquivar da sua ira.
Erik bufou, respondi antes dele.
- Pois lidaremos com a ira dele. Mas não somos obrigados a lidar com sua, você não é ele, É só uma pessoa, tão cheia de falhas e erros como eu ou Erik.
Coloquei a mão no estômago e implorei que meu corpo aguentasse mais alguns segundos antes de desabar.
Ela suspirou
- O demônio sempre ardiloso meu filho, você deveria ouvir sua mãe, eu sei o que melhor pra você.
Erik ficou entre me acolher quando eu apertei ainda mais forte minha barriga e responder a mãe, falei com os olhos razoavelmente marejados de tanta força física que meu corpo exigia de mim pra me manter ali sentado na cadeira. Estiquei a mão porque eu precisava de apoio, Erik avançou pra segura-la, eu agarrei ela com força me sentindo mais amparado, por mais que soubesse que aquilo era só um leve respiro dentro das milhões de sensações terríveis que eu experienciava naquele momento, respondi lentamente tentando não ceder a dor no estômago e pressão de vomitar.
- Se seu deus não nos representa, Por que seu demônio nos representaria? Erik não teme a mim, ele sabe que eu nunca iria impor qualquer coisa a ele.
- Então por que ele está em silêncio?
Pela primeira vez Erik respondeu mais rápido do que eu, mas sua voz saiu baixinha, parecia que sua preocupação com o meu estado tinha vencido sua raiva.
- Porque estou cansado, mãe. Porque tudo que você diz me fere e me mágoa, e eu estou irritado, com raiva e machucado, eu não sei mais o que dizer, eu só não aguento mais.
Afastei um pouco a cadeira e ele permaneceu segurando minha mão. Falei com ele baixinho.
- Erik, Preciso ir no hospital, pode me acompanhar?
Ele tirou o celular do bolso e começou a digitar freneticamente, então brevemente levantou o olhar pra mãe.
- Eu sinto muito, sinto que você esperasse outro tipo de filho, mas eu amo o Charles, e isso não vai mudar porque um livro de milhões de anos diz que não pode.
Intervi na conversa.
- Na verdade tem 4 mil anos.
E essa foi a última coisa que eu lembro antes de desmaiar na cadeira. A última coisa que eu disse foi um comentário aleatório e fora de hora. Senhor Xavier você começou muito bem com a sogra.
Eu acordei bem aéreo, tava escuro dentro do quarto, algo apertava minha mão, a mesma mão que tinha um fio que pingava algum tipo de soro.
Meus olhos foram se habituando ao escuro e eu vi Erik ali, ele estava sentando numa cadeira ao lado da cama, a parte de cima do corpo deitado sobre a cama, e era exatamente sua mão que apertava a minha.
- Erik?
Falei baixinho, não queria que ele se assustasse. Senhor Xavier as vezes você se mete em encrencas, mas dessa vez tinha passado de todos os limites conhecidos.
Ele levantou o rosto pra me encarar, ele também falou no mesmo tom que eu havia usado antes, acho que ele também não queria me assustar.
- Como tá se sentido?
- Um pouco perdido, eu desmaiei, né?
Ele sorriu e beijou o canto da minha mão que ele segurava, evitando a agulha.
- Você teve um colapso. O médico te deu um calmante leve, você tá liberado pra ir pra casa também.
Agora senhor Xavier, você pode sentar em cima daquele discurso sobre proteger Erik, já que na primeira oportunidade você colapsou.
Levantei a mão solta e sequei as lágrimas.
- Desculpa, desculpa mesmo.
Eu não consiga falar mais sem desabar, e eu não queria ter outro colapso.
Erik levantou e me abraçou cuidadosamente, colocou minha cabeça no seu peito e a acariciou meu ombro, eu me senti mais calmo, mais amparado.
- Por que tá pedindo desculpa, meu bem?
- O que adianta eu ser bom com as palavras se eu desmaio quando preciso usá-las?
- Você mandou bem, Charles, você me protegeu. Eu fiquei muito assustado quando te vi lá, eu só travei, mas quando você começou a falar eu me senti encorajado também. E você foi tão espetacular, eu queria poder ter evitado o desmaio, mas eu amo quadrinhos você sabe, né? Todo o herói tem uma algo que serve contrabalancear seus poderes, isso funciona como uma ancora que os mantem humanos, digamos que sua é vomitar, e quando você usa muito seu poder você pode chegar até desmaiar. Eu sei que eu tô falando um monte de porcarias, mas eu realmente fiquei ansioso, você foi incrível, obrigado, Charles.
Ele falava rápido e animado de um jeito muito diferente, eu senti como se ele fosse aquele garotinho que ouviu tantas asneiras quando era criança sobre a sua sexualidade, senti como se tivesse conseguido atingi-lo, e isso me deixou feliz. Ele beijou minha cabeça e continuou mais calmo.
- Nossos psicólogos que lutem essa semana.
Nós rimos juntos daquilo, aquela noite tinha sido um turbilhão, mas estávamos juntos.
O médico passou ali algum tempo depois e me liberou então nós fomos pra minha casa, meu carro tinha ficado na casa dele mas a gente não queria voltar lá ainda, tava de noite e estávamos cansados, então só fomos pra minha casa, tomamos um banho e deitamos.
Eu acordei de madrugada, sentei na cama e deixei minha ansiedade ir lentamente criando algum espaço dentro de mim enquanto minha mente vagava por todas as merdas daquele dia.
Erik estava de costas pra mim, em todas as vezes que compartilhamos a cama a gente sempre dormia abraçado.
Obviamente era só uma coincidência, estávamos muito cansados, mas eu me sentia carente. Suspirei com essa ideia.
Cutuquei o ombro de Erik, sabia que me sentiria culpado, mas me sentia tão sufocado que precisava de apoio.
Erik se virou, me viu sentado e sentou também, o jeito como ele sempre era solicito me fazia querer esmagar as bochechas dele num aperto.
- Tá bem, Charlie?
Abracei ele me joguei no seu peito
- Seria muito ridículo se eu dissesse que tava me sentindo um pouco sozinho e aí eu te acordei?
Ele sorriu e me beijou, joguei os braços entorno dele abraçando sua barriga.
- desculpa te acordar eu...
Ele me beijou de novo antes que eu pudesse concluir, comecei a rir, eu já me sentia mais relaxado.
- Charlie, você pode sempre me acordar você sabe, né? Teve alguém pesadelo?
Eu pensei que se falasse ele me beijaria de novo, então eu respondi
- Não, acho que não consegui dormir tão profundo assim, pra sonhar, é só que você tava dormindo virado pra fora, e eu queria você perto.
Para minha tristeza ele só me respondeu.
- Vem aqui, deita no meu colo, deixa eu fazer um cafuné em você.
Mas receber cafuné era tão bom quando receber uns beijos, então eu deitei no colo dele.
- Erik, quando percebeu que gostava de garotos também?
- De onde veio isso, querido?
- Não sei, eu nunca percebi, de fato, que era gay, quer dizer isso nunca pareceu estranho, então eu fiquei pensando se você teve algum momento que sua ficha caiu.
Ele ficou enrolando meu cabelo no dedo enquanto pensava.
- Bem novo eu acho. Mas, Charlie, essa parte sobre mim é uma bosta. Eu não quero falar sobre isso.
Senti como se tivesse tomado um tapa, Erik raramente me negava algo sobre ele, aquele dia tinha sido pesado, então tentei entender aquilo, e não levar pro pessoal.
Respirei fundo.
- Erik, eu preciso te falar um coisa.
Ele ficou bem atento, e eu respirei fundo mais uma vez. Sr Xavier você pode dizer isso, você vai conseguir.
Eu tava deitado nesse momento sobre o peito dele, enquanto ele acariciava meus cabelos, levantei um pouco o rosto pra encarar seus olhos. Ele continuava em silêncio me encarando mas eu percebi sua respiração irregular, deduzi que ele estava assustado.
- Quando eu fiquei ouvindo sua mãe dizer que éramos amigos, eu fiquei irritado, eu queria esfregar na cara dela o fato de que não somos apenas amigos, desculpa eu sei que ela sua mãe, mas o ponto é que eu percebi que queria gritar pro mundo os meus sentimentos por você, eu sou apaixonado por você, e por mais medo que eu tenha, eu quero nomear o que temos, porque eu quero poder gritar com qualquer um que nós chame de qualquer coisa menos que namorados.
Eu falei tudo correndo, morrendo de medo, então abaixei a cabeça envergonhado e me escondi no seu peito.
Ficou um silêncio quase constrangedor, até que Erik decidiu quebra-lo.
- Pera, Charlie, você me pediu em namoro? É, VOCE ME PEDIU EM NAMORO!
- Shiiiiii, Erik, meus tios vão acordar, pelo amor, não grita.
- Desculpa, desculpa.
Então voltamos pro silêncio, eu tava me sentindo enjoado e assustado, minha ansiedade de repente me bateu muito forte, me afastei um pouquinho dele pra lidar com aquilo.
- Erik, e então? Você ficou mudo, você não vai dizer se aceita?
- Perai.
Ele levantou da cama, e voltou com um saco, me colocou sentado e colocou o saco na minha mão.
Então, ele respirou fundo.
- Te amo, Charlie, é lógico que eu quero namorar com você.
E foi assim que aquela noite terminou com Erik acariciando minhas costas enquanto esperava eu vomitar tudo no saco que ele tinha me dado, até meu estômago acalmar.
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