A única coisa que parecia estranha à Magnus naquele momento era ele não saber como havia chegado ali. Discreto e elegante, aquele era o tipo de lugar que o estilista frequentaria depois de um dia estressante, até mesmo a bebida apoiada no balcão era de sua preferência. Mas não havia mais ninguém, antes que pudesse se levantar para averiguar, Asmodeus se aproximou e Magnus entendeu o que estava acontecendo.
- Estava bom demais para ser verdade.
- Posso me sentar? - Seu pai parecia bem, como em todas as vezes que o via.
- Você aceitaria um não como resposta? - Magnus pegou o copo e bebeu quase metade do líquido âmbar.
- Não gosta de conversar com seu velho pai? - O homem puxou um banco ao lado do filho e sentou, um copo cheio surgiu nas mãos dele segundos depois.
Aquilo não mais surpreendia Magnus.
- Ultimamente, - Se virou e finalmente encarou o pai. - Não.
O dourado dos olhos dele lhe era espantoso de tão familiar.
- Achou que conseguiria fugir de mim se enfiando na cama do enfermeiro? - Asmodeus riu e bebericou o líquido transparente.
Não havia maldade nas palavras, apenas um divertimento infantil.
- Já que parece saber tudo sobre mim, sim, eu queria dormir pelo menos um pouco à noite. É pedir demais?!
- Você sempre foi assim - Asmodeus balançou o copo e observou a bebida acompanhar o movimento. - Sempre utilizou subterfúgios para não ter que encarar a vida como ela é.
- Só você pode conjurar coisas ou…
- Sabe Magnus, não me importo de aparecer nos seus sonhos. Acho até divertido.
- Tudo bem. - Magnus desistiu de tentar desviar do assunto e prestou atenção no pai. - O que você quer de mim? Como me livro de você?
- Ah - Asmodeus estalou a língua com um sorriso. - Não posso lhe garantir que vai se livrar de mim, mas se entender o que quero dizer as coisas podem ficar mais fáceis.
- Não é difícil entender o que você quer me dizer, quase sempre é a mesma coisa: Que eu sou uma pessoa desprezível.
- Não é o que eu quero que pense. - Magnus estendeu o copo ao ver uma garrafa de Uísque na mão de Asmodeus.
- Não tem se esforçado muito para demonstrar o contrário. - Observou com desinteresse o homem depositar o conteúdo da garrafa em seu copo.
Asmodeus sorriu.
- Tenho esperanças que você faça alguma coisa com as minhas palavras quando acordar.
- O que eu posso fazer?! - Magnus o olhou exasperado. - Agora que resolvi abrir mão de tudo por Alexander, ele não me quer.
- Talvez você precise apenas persuadi-lo.
- Alec não quer magoar mamãe, também não quer que ela se decepcione comigo. Ele perdeu a mãe e não deseja isso para ninguém… - Magnus suspirou. - É complicado.
- E o que você quer? - A mão de Asmodeus no ombro de Magnus fez com que ele fitasse os olhos dourados do pai.
- Eu quero ele, sinto que posso finalmente ser feliz, mas não quero perder a minha mãe.
- Não se pode ter tudo na vida, Magnus, vai precisar escolher.
- Se eu contar e ela não aceitar, Alexander nunca vai me perdoar.
- E se você não contar nunca vai saber.
- O que eu faço? - Magnus mordeu o lábio em apreensão e buscou no rosto de Asmodeus uma solução para o seu problema.
- É aqui que paramos. - O homem se afastou. - Não posso interferir dessa forma, você tem que tomar suas próprias decisões.
- Eu odeio quando alguém faz todo um discurso motivacional e não dá uma solução no final.
- Vou te dar uma ajudinha. - Asmodeus sorriu e piscou um dos olhos.
Magnus o encarou, ansioso e esperançoso, mas tudo o que recebeu foi um peteleco que o fez despertar.
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A primeira coisa que ocorreu a Alec assim que abriu os olhos foi que Magnus ainda o abraçava, a ação em si fez com que o enfermeiro lembrasse de quando se encontravam durante as viagens de Sorrel. Pensou também que embora ninguém esperasse por Magnus em casa, ele ia embora antes do amanhecer. O simples pensamento fez com que Alec fechasse as mãos em punho e seus olhos, ainda inchados, enchessem de água. Antes que pudesse afastar Magnus de forma nada gentil o sentiu se remexer e acordar sobressaltado. Perceber que o ex amante estava tendo mais um pesadelo fez toda a raiva evaporar.
- Estava sonhando de novo? - Não se virou ao perguntar.
- Sim. - Magnus se afastou.
- Achei que estava conseguindo dormir aqui comigo.
- Eu estou. Não acordei sequer uma vez durante a noite.
- E os pesadelos? - Alec finalmente se virou, as lágrimas haviam sido substituídas por preocupação.
- Estou aprendendo a lidar. - Magnus sorriu e pareceu um daqueles sorrisos que os médicos usam para acalmar seus pacientes.
- Quer falar a respeito? - Alec sentou na cama ficando próximo a Magnus.
- Não precisa se preocupar com isso, Alexander, eu estou bem. Vou voltar para o meu quarto antes que todos acordem. - Magnus roubou um selinho de Alec antes de levantar da cama.
Enquanto observava o ex caminhar para fora do quarto Alec pensou em quão frustrante aquele homem era. Mesmo quando o ignorava e sumia e Magnus o procurava, ele não se esforçava tanto para trazê-lo de volta, geralmente um jantar acompanhado de um bom vinho e cálidas promessas sensuais resolviam. Agora Alec não sabia lidar com os sentimentos que Magnus dizia ter e as promessas que ele fazia.
Antes que pudesse acompanhar Josephine até o quarto dela Alec foi abordado por um Mark eufórico.
- Eu tenho algo para lhe dizer. - O loiro o puxou até a cozinha.
- Eu realmente não posso falar agora. - Alec se apressou em explicar.
- Vai ser rápido. - As mãos do loiro repousaram nos quadris do enfermeiro.
- Tudo bem. - Alec sorriu.
- Eu…
- Minha senhora requisita a presença dos dois. - Mark foi interrompido por um Ragnor extremamente formal.
- Já estamos indo. - Alec se afastou sutilmente do paisagista.
Os três seguiram em silêncio pelas escadas até o quarto de Josephine que depois de algumas batidas de Ragnor, consentiu a entrada.
- Interrompi alguma coisa? - Sem desviar a atenção do que estava fazendo Josephine perguntou ainda na poltrona que estava sentada. Uma estranha satisfação se apossou de Alec ao perceber que ela coloria o livro que havia lhe dado.
- Tenho a impressão que sim, senhora. - Ragnor quebrou o silêncio enquanto fechava a porta do quarto.
- Não interrompeu nada. - Alec olhou feio para o mordomo.
- Pensa da mesma forma, Mark? - Os olhos verdes não se desviaram dos desenhos, ainda que os ouvidos estivessem atentos à conversa.
- Creio que temos o mesmo objetivo aqui, senhora.
Alec olhou de um para o outro, confuso.
O que estava acontecendo ali?
Antes que ele pudesse perguntar Josephine se pronunciou novamente.
- Sim, nós temos, mas… - A patroa finalmente desviou os olhos do livro e focou nos funcionários. - Tem algo a mais que quero esclarecer.
- O que seria? - Mark se aproximou em um gesto de pura curiosidade. Alec apenas esperou já que não sabia do que aquilo tudo se tratava.
Batidas ecoaram na porta antes que Josephine pudesse explicar. Ragnor se adiantou para abri-la.
- Isso vai ser interessante. - Ele comentou antes de dar passagem para Pietra.
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- Saudade? - Magnus sorriu ao sentar de frente para a morena.
- Muita. - Ela desviou os olhos azuis do copo de café que segurava.
- Do que mais sente falta?
- De você esquentando a cama. E você?
- Não há nada que eu sinta falta. - Magnus acrescentou com um riso de escárnio.
- Engraçadinho. - Sorrel estreitou os olhos e riu logo em seguida.
- Sinto falta de assistir filme com você, e das nossas conversas. - Magnus pegou o copo de isopor da noiva e bebericou o líquido quente.
A modelo apenas concordou com um aceno.
- Como vão as coisas na casa da sua mãe?
- Bem, mamãe está se adaptando à nova dosagem do remédio.
- E Alec? Como vão as coisas entre vocês?
- Complicadas, ele diz que não quer magoar mamãe, por isso não podemos ficar juntos.
- Apesar de entender, ainda acho que vocês deveriam tentar.
- Eu já disse, mas ele não quer me ouvir. - Magnus ainda tomava o café distraidamente.
- Posso? - Sorrel apontou o copo e riu.
- Sim, mas só um pouco. - Magnus devolveu a bebida dela com um sorriso.
- O que pretende fazer a respeito?
- Ainda não sei; alguma ideia?
- Fala com a sua mãe. - Antes que Sorrel pudesse beber um segundo gole Magnus tirou o copo da mão dela.
- Se eu falar e ela odiar nós dois Alec nunca vai me perdoar.
- Então vocês nunca vão saber?
- Alec prefere assim. Ele se sente culpado por toda essa situação.
- E você?
- Eu estou dividido entre perder minha mãe e o homem por quem estou apaixonado. Se der mais sorte, posso perder os dois.
- Você finalmente percebeu que está apaixonado. - Sorrel bateu palmas animadamente. - Parabéns.
- Seria mais fácil se eu não estivesse. - Magnus resmungou. - Dá tanto trabalho.
A modelo riu.
- É bom, não é?
- É interessante, mas também faz com que sejamos idiotas.
- Faz parte. - Sorrel pegou o copo quase vazio das mãos de Magnus.
- Uma coisa me preocupa. - Magnus cruzou os dedos e observou a noiva.
- O quê?
- Sua irmã.
- Por quê? - Ela terminou com a bebida e colocou o copo de lado.
- Os dois estavam trancados sozinhos em um quarto ontem; nada de bom pode vim disso.
- Você não está exagerando? Quer dizer, Alec é gay, certo?
- Não é necessariamente com isso que estou preocupado.
- Com o que então?
- Com a sua irmã em si, ela é encrenca.
- Você não tem que se preocupar com ela, Alec sabe se cuidar.
- Sim, ele sabe. - Magnus sorriu e observou o relógio em seu pulso. - Preciso ir, já estou atrasado.
- Eu também preciso resolver algumas coisas antes dos meus pais chegarem. - Sorrel levantou.
- É uma pena seu pai não gostar de mim. - Magnus também levantou.
- Não é que ele não goste de você, é só que…
- Ele não gosta de ninguém que se aproxima das filhas dele.
- Exato.
Os dois deixaram a pequena e discreta Starbucks que havia perto do apartamento que dividiam e saíram para a rua.
- Eu te ligo para marcarmos algo. - Magnus se virou para a noiva.
- Tudo bem. Me mantenha informada. - Sorrel riu e selou os lábios nos de Magnus brevemente em despedida.
- Ok.
- Alguns segundos depois cada um seguiu para um lado.
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- O que você está fazendo aqui? - Alec observou a loira entrar no quarto e sentar em uma das poltronas como se estivesse em casa.
- Oi para você também. - Pietra passou os olhos pelo quarto com um leve desdém.
- Essa inconveniente jovenzinha - Josephine começou - Abordou ontem uma questão que até então não havia me ocorrido.
O sangue de Alec gelou e ele não sentiu mais suas pernas.
-Isso não está acontecendo.
Alec queria falar, mas o pânico o deixou mudo.
Ele apenas encarou Pietra que riu de maneira travessa.
- Percebi que tenho sido egoísta com você, Alexander. - Josephine continuou e depois de um tempo absorvendo as palavras Alec exclamou:
- O quê?! - Ele se virou para a patroa tão confuso quanto aliviado.
- A senhorita Blanc me procurou para que eu o dispensasse por um dia. Ela alegou, de maneira muito sutil, devo acrescentar, que você parecia um prisioneiro e que até mesmo eles tomam banho de sol com mais liberdade.
Alec olhou, incrédulo, para a mulher sentada confortavelmente na poltrona. Pietra apenas observava as longas unhas pintadas de verde, elas combinavam com o cropped verde neon sem alças que ela usava naquele dia. A única peça discreta era a calça preta de cintura alta. As sandálias de salto alto eram inegavelmente caras e as jóias, definitivamente não eram as mesmas do dia anterior.
- Não dê ouvidos a ela. - Alec se voltou para Josephine. - Eu não me importo de não sair.
- Você é jovem, Alexander, saia e se divirta um pouco. Estou lhe dispensando oficialmente.
Ragnor e Mark apenas observavam tudo em um silêncio cheio de expectativas.
- Tudo bem, amanhã eu volto às minhas funções.
- Nada disso, não quero você trabalhando para mim até a próxima semana.
- Mas… quem vai cuidar de você? - Alec perguntou um tanto chocado.
- Já contratei outra pessoa. - Josephine riu minimamente.
- Você está me trocando?! - Alec cruzou os braços. - Eu exijo saber quem é. Saiba, dona Jo, que eu só saio daqui depois de uma rigorosa inspeção. Não vou lhe deixar nas mãos de um desconhecido qualquer.
- Ragnor - Josephine acenou discretamente e o mordomo se aproximou. - Pode ir buscá-la, por favor.
- Sim, senhora.
Alec não ficou muito tempo em silêncio depois que Ragnor saiu.
- É uma enfermeira? - Alec ergueu uma sobrancelha, ainda de braços cruzados. - Vou precisar de no mínimo duas horas para informá-la a respeito do seu caso e dos seus remédios, obviamente que preciso observar se ela sabe ministrar as medicações corretamente, ou se sabe lidar com situações de emergência…
- E é você que vai me treinar?
Alec estava tão concentrado em sua lista de exigências que não reconheceu imediatamente o tom zombeteiro de Catarina.
- Cat?! O que está fazendo aqui? - Ele exclamou assim que olhou para a amiga, parada à porta.
- Caso não saiba, eu também sou enfermeira. - Catarina se aproximou e o abraçou rapidamente. Alec estava tão surpreso que não correspondeu.
- É você quem vai cuidar da Jo?
- Sim, algum problema?
- Não!! Mas é claro que não. - Alec a abraçou. - Você não faz ideia do quanto estou feliz com isso.
- Acredito em você. - Catarina retribuiu o abraço e riu.
- Estou quase chorando com o reencontro dos amiguinhos, mas felizmente, eu não tenho o dia todo. - Pietra levantou da poltrona onde estava sentada e se aproximou dos enfermeiros.
- Quem é? - Catarina questionou em um tom nada amigável.
- Uma das cunhadas de Magnus. - Alec se afastou da amiga.
- E o que ela quer com você? - Catarina encarou Pietra da cabeça aos pés.
- Vamos, Alexander, eu não tenho o dia todo. - A loira ignorou a enfermeira como se ela não fosse digna de sua atenção.
Alec olhou de uma para a outra, atordoado.
- Eu…
- Antes que você se decida, Alexander, devo informá-lo que Mark também me pediu ontem para sair com você, um pouco depois da senhorita Blanc, mas pediu. - Josephine confessou de maneira entretida, como quase nunca falava.
- Vocês dois querem sair comigo?! - Alec olhou para os dois loiros.
- Sim, e você vai ter que escolher um de nós dois. - Pietra direcionou um olhar totalmente inquisidor a Alec.
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