Mello
Saí do quarto de Nate ainda com o orgulho nas alturas, mas logo quando a ficha caiu comecei a me sentir cada vez pior.
Fui direto para o aposento de hóspedes, me jogando na cama que estávamos dividindo durante esses dias.
Por quê...?!
Eu não queria que Roger, Matt, Tim... qualquer um soubesse até termos uma relação definida. Seria basicamente "Oi, esse é o Near, meu peguete"?! Não! Não quero isso! Quero ter algo mais com ele antes, quero ter certeza do que somos. Embora ache que ele jamais consideraria ter nada comigo depois de agora.
Por que meus impulsos precisam falar tão alto...? Poderia apenas ter ficado em silêncio, evitando que o problema piorasse, mas estava com raiva pela forma como estava agindo. Sei que eu não era o certo ali, mas mesmo assim, não imaginava que ele pudesse voltar a se portar com tamanha frieza comigo.
Rolei até o lado da cômoda, pegando meu celular e os fones. 'A Little Death' começou a tocar, fazendo-me lembrar daquele dia, da sensação quente de sua cabeça apoiada em meu ombro, de como ele havia ficado envergonhado ao ouvir a letra da música...
Então me lembrei de quando fomos ao Mint&Latte com Matt; havia sido a primeira vez em que segurei sua mão fria. No que ele está pensando agora...? O que está sentindo...? Nate...
(...)
Eram 02:43h quando conferi as horas, não conseguia dormir quando os acontecimentos recentes voltavam à cabeça. Nunca cheguei a ter problemas assim. Prometo não rir mais de Matt quando o mesmo vier chorar em meu ombro por causa de alguém que o magoou.
Se pudesse voltar no tempo, voltaria até o minuto exato em que Near me chamou para deitar-me com ele, e teria ido, sem pensar em Roger, Matt... em nenhum desses otários! Apenas em Nate e eu. Mas agora o estrago já fora feito, e teria que arcar com as consequências de minhas palavras.
Revirei mais uma vez na cama, olhando para o travesseiro que o outro usava. Será que...
Peguei o material macio, afundando meu rosto ali. Sim, tinha o cheirinho dele. Apertei a almofada contra o peito e me virei para o lado, inalando aquele aroma suave de sabonete e sais de banho de essência de lavanda. Amanhã teríamos que nos esbarrar novamente, pensar nisso fazia meu estômago se embrulhar. Abri a gaveta da cômoda, pegando uma barra de chocolate e a abrindo.
É, parece que irei passar a noite abraçado com um travesseiro enquanto afogo as mágoas em chocolate. Alguém traga a Lana Del Rey para o meu sofrimento ficar completo.
(...)
Após checar as horas e ver que eram aproximadamente cinco da manhã, fiquei olhando para a janela da varanda, esperando o sol nascer. Era um dos prazeres que amava desde a infância: Sentir o ar frio matinal enquanto via os raios de sol despontarem.
Meus ombros estavam tensos devido à noite mal dormida, e o quarto estava uma bagunça com todas aquelas embalagens de chocolate, somando quatro ao total. Eu não queria... não conseguiria encarar Near nos olhos depois de ontem. Argh, o que fazer...?!
Olhei para a janela mais uma vez. Eu estava acordado e, provavelmente, ele não...
Peguei meu celular, digitando para Matt.
"Ontem decidimos que apenas eu irei conferir os resultados hoje. Avise a Roger por mim."
Aquilo era por uma boa causa.
Apenas escovei os dentes, lavei o rosto e arrumei um pouco o cabelo, fazendo o mesmo procedimento que fiz da vez em que fui ao parque.
O que será que ele pensará quando acordar e descobrir que fui sem ele...? Espero não estar piorando ainda mais as coisas, mas creio que ambos precisamos de um tempo para repensar tudo, repensar nossa... relação.
Sentir a brisa gelada da manhã era reconfortante. Ao meu redor, via algumas pessoas começarem a abrir seus comércios; uma moça de cabelos alaranjados abria as portas da sua floricultura; um homem baixinho de bigode arrumava as mesas externas da sua cafeteria, cujo o aroma de café começava a se alastrar. Passei por um dos assentos, notando alguém familiar.
— Misora-san! – Chamei a moça, que estava sentada com um muffin em um pratinho à sua frente.
Ele virou seu rosto para mim e se levantou em seguida, arrumando o cachecol vermelho ao redor do pescoço.
— Bom dia. - Disse. – Eu estava tomando café. Me notificaram sobre os resultados, estava indo conferir.
— Ah, eu também.
— Onde está Near...?
Ah, não... estava torcendo para que não perguntasse sobre ele...
— Near...? Near está... ocupado. – Forcei um sorrisinho.
— Tudo bem então... Já que estamos indo para o mesmo lugar, iria se importar se eu lhe acompanhar?
Ah, maravilha... agora eu talvez não consiga mais assaltar uma loja de chocolates pra tentar me sentir melhor! Essas pessoas e seu maldito hábito de tentarem ser simpáticas... tsc...
— Claro. – Forcei um sorriso ainda maior, sentindo meus dentes rangerem.
Ela se pôs a caminhar ao meu lado, paramos daqui a alguns metros e pedimos um táxi, e sendo sincero, nunca em toda a minha vida manti um silêncio tão constrangedor com alguém. Ela não dizia nada, e eu é que não puxaria assunto, estava sem a mínima vontade de fazer qualquer coisa, iria apenas pegar os resultados e voltar, sem mais nem menos.
Senti o carro parar alguns minutos depois. O lado bom de tudo aquilo era dividir o valor a ser pago. Fomos até a porta, sendo recebidos por um outro especialista, que nos conduziu até a sala.
— Bom dia! – Tim falou, sorridente.
Ah, pronto! O lado ruim de se estar numa bad profunda, é que quando alguém esboça o menor sinal de felicidade, sinto como se o otário estivesse desrespeitando a minha tristeza.
— E aí. – Falei um tanto desanimado. Misora respondeu com um "bom dia" baixo.
— Onde estão Near e o menino Matt...? – Indagou.
— Jogando. – Respondi praticamente sem pensar, franzindo os lábios como se dissesse "Por favor, não pergunte mais nada".
Ele assentiu e se dirigiu até a bancada de inox, já com suas luvas de látex.
— Muito bem. – Colocou algumas imagens da cena sobre a bancada.
A sala onde a marcação do corpo foi feita estava praticamente limpa, não fossem as manchas de sangue. Reparei em algo.
— Tim, você acha que com a perda de sangue que sofreu, ela teria chegado ao outro lado da sala...?
— Ao outro lado? Não, pelas investigações feitas com o Luminol, o primeiro vestígio de sangue estava a pelo menos vários metros de distância da outra extremidade da sala, o corpo estava na metade do caminho, digamos assim.
Interessante...
Apontei o dedo para algo que havia visto, e ele deu um zoom.
— Viram isso?Era uma mancha de sangue no canto da parede, do lado oposto ao que os primeiros rastros de sangue foram descobertos.
Ele abriu mais os olhos.
— O padrão é semelhante ao de dedos, olha! Estava ao lado da... – Conferi na planta baixa. – ...saída dos fundos. Se aquilo tiver sido feito pelo responsável, faria sentido ter deixado quando ia sair.
— Sim, exatamente, Mello. – Falou, franzindo um pouco o cenho. – Podemos considerar isso! Bom trabalho!
Sorri. Era um passo mais à frente para deduzir que foi realmente assassinato. Pensei em perguntar se haviam analisado os padrões de cortes mais uma vez, mas me recordei que não deveria falar sobre essas análises com ninguém que não fossem Matt, Near, Roger, L e eu, então esperei Misora deixar a sala.
— Então, os padrões. – Ele começou quando a mulher saiu da sala, fechando a porta atrás de si. – Indicam que ele possa favorecer a mão direita.
Sorrimos. Estava praticamente provado que aquilo fora um homicídio, e tínhamos uma pequena porcentagem de certeza de que o culpado era o mesmo do crimes anteriores.
— Não encontraram um crachá no pescoço dela, não é? – Indaguei.
— Não, não encontramos. – Ele suspirou.
— Então por que ela foi morta? Arquivamos as provas contra ela, indicando como possível suspeita. Por que ele a matou? Poderia limpar a própria barra se estivesse viva.
Estava falando mais comigo mesmo do que com o especialista.
— Ela não tinha um crachá, então não era apoiadora... por que teria sido morta...?!
Não conseguia formular uma boa teoria, Near não está aqui para me ajudar, e jamais falaria com aquele emo otário, nem que isso custasse a minha vida!
Restava apenas Misora-san...
Acho melhor preparar os relatórios primeiro, talvez Near consiga pensar em algo quando ler as informações. Pelo menos contava com a boa vontade dele, não sabia nem ao menos se ouviria uma palavra minha, mas era por uma causa maior; uma causa bem maior do que a raiva que devia estar sentindo por mim agora.
Liguei para Matt, e despistadamente perguntei sobre o baixinho, o outro respondeu que não sabia, já que havia acabado de sair com Roger. Então ele está sozinho em casa. Agora é que não conseguiria ir até lá mesmo. Suspirei, guardando o celular.
Talvez devesse esperar que retornassem para reivindicar uma reunião... Sim, faria isso, mas por enquanto, iria para casa ler os relatórios novamente.
Me despedi de Tim e Misora, pegando as pastas e passando pela porta.Só então me veio à cabeça que até em meu próprio quarto teria de aguentar as lembranças de Near, incluindo a da primeira vez em que o beijei.
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