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História EmMUSAS - The Lost Canvas - Uma faísca


Escrita por: guerrakkya

Notas do Autor


Olá, queridxs leitorxs!
Depois de mais cinco dias, cá estou, postando um capítulo enorme pra vocês - juro que tentei encurtá-lo, mas não teve como! Espero que não seja cansativo pra vocês. Pra mim, foi divertido escrevê-lo e ele é meio que um especial Clio x El Cid.
Queria MUITO que vocês comentassem dando opiniões sobre esse início de jantar deles, pois tenho dois tipos de plano pra Clio e, dependendo do que comentarem, escolherei um deles! Nesse cap, vamos ver como eles meio que desenrolam alguma coisa heheheh
Nenhuma música me inspirou exatamente, portanto sem referência musical. Mas o momento será especial :)

Fazendo drama: to sentindo saudades de algumas leitoras dando suas ótimas opiniões :3

Enfim, boa leitura!

Capítulo 24 - Uma faísca


Capítulo 24

Clio sentiu o corpo estremecer ao pensar que não fazia ideia de como se arrumar para o encontro. Encontro. Mexeu a cabeça em reprovação ao pensamento, nada foi dito sobre ser um encontro, apenas foi convidada para jantar com o cavaleiro de capricórnio; por mais que os sinais do corpo dele demonstrassem algo diferente. De qualquer forma, não tinha tempo para pensar em tal palavra, tinha apenas para escolher uma maldita roupa, agradável o suficiente, para não decepcioná-lo no lugar – o qual ela não sabia também. Clio não gostava da falta de informação, mas, nesse caso, esse ponto pareceu convidativo, como se ele quisesse fazer surpresa. Ou talvez ele esqueceu de informar, já que não era de falar muito. Ah, ela odiava essa falta de definição também! Calíope parecia totalmente certa ao falar sobre sua falta de controle, mas não daria esse gostinho de admitir à irmã.

Se bem que não era para ela que tinha que admitir alguma coisa.

Clio percebeu a demora de seus atos em frente à penteadeira. Há quanto tempo estava ali pensando nisso tudo? Mal tocou no armário para escolher a roupa, apenas permaneceu pensando nela. Nesse caso, levantou-se e se dirigiu ao móvel; seria mais fácil decidir se estivesse de frente para as opções, óbvio. Por que não pensou nisso antes?

Numa das camas do quarto, Terpsícore também pensava, mas na nova amiga que tinha encontrado. Talvez o termo “amiga” fosse forte demais para defini-la, já que criaram um pequeno vínculo e em pouco tempo. No entanto, foi o bastante para Yuzuriha se oferecer para ajudar a musa – fato que passava o tempo todo na mente dela. Pensou no quanto seria interessante ser firme e segura quanto a amazona, coisa que nunca teria passado em sua mente se não fosse necessário. Sim, Defteros conseguiu transformá-la em um pote de medo, mas agora não havia apenas isso...

Mágoa. Terpsícore estava magoada. Ficou assim depois que viu a cena desgostosa de Defteros com uma amazona qualquer e isso não parava de pulsar em sua mente. Nunca sentiu isso antes em relação a alguém; aliás, nunca sentiu sequer o mínimo sentimento de carinho que havia admito que tinha por ele. Sim, no meio das sombras e dos beijos, algo diferente surgiu, algo que se escondeu novamente assim que foi reparado por ela. Agora não poderia procurá-lo, pois, provavelmente, Clio o assustou e ele preferiu investir nas amazonas – se já não fazia antes. Mas era compreensível; depois que Terps conheceu Yuzuriha, percebeu como as amazonas são admiráveis. Permitiu-se vê-las treinarem um pouco na arena e constatou a utilidade de tanta firmeza. E se tentasse aprender a lutar assim como Athena? Podia ser uma musa, mas ainda corria perigo. E, talvez, o cavaleiro de gêmeos gostasse.

Terpsícore apertou os olhos com o pensamento. Não adiantaria saber lutar e não saber se impor – como Yuzuriha havia dito.

- Bom, eu ia perguntar se você estava arrumando o armário, mas como sei que nada em sua vida requer um ato desses porque nada é desorganizado, pergunto: o que está fazendo? – Tália entrou sem ser notada e estranhou Clio mexendo nos vestidos.

- Por incrível que pareça, estou indecisa quanto a o que vestir para sair. – Clio revelou, incomodada. Estava tão bom com Terpsícore quietinha no canto...

Tália riu.

- A senhorita vai a um encontro com quem? – perguntou, contendo outro riso, e ouviu Clio bufar.

- Não é encontro, é apenas um jantar! – zangada.

Tália riu mais ainda, nunca tinha visto a irmã em tais condições: vermelha e brava.

- Ela vai a um encontro, só não tem coragem de admitir. – Terpsícore falou baixo, mas alto o suficiente para ser escutada.

- Pelo menos vou a um encontro com alguém decente, não atrás de um animal. – Clio soltou, porém se arrependeu segundos depois. Não era de provocar, muito menos de atiçar o sofrimento das irmãs. O que estava acontecendo?

- Arrá! Então admite que é um encontro! – Tália disse, após ver a faísca nos olhos de Clio. Sabia que o clima entre ela e Terps ficou tenso, só não imaginou que fosse tanto.

- Não, não admito. Nada foi dito sobre ser um encontro, ele apenas me convidou para jantar e eu aceitei como forma de agradecê-lo por ter me ajudado com a inconveniência de outro cavaleiro. – projetou o que tinha em mente, mesmo sabendo que não foi exatamente isso.

- Assim... Não que eu esteja afirmando que concordo com Calíope, porque não concordo – Tália levantou os braços e mostrou a palma das mãos. -, mas, talvez, se você admitir, consiga se acalmar.

- Me acalmar? – Clio se virou para a irmã.

- Sim, está nervosa.

- Nervosa? Isso é ridículo, Tália. Estou perfeitamente tranquila. – disse, tentando recuperar a postura e fazendo Tália rir novamente. – E você? Já admitiu o que sente? – Clio levantou a sobrancelha e sorriu de canto.

A musa da comédia logo parou de rir e a da dança passou a prestar mais atenção.

- Ainda não, mas to esperando você especificar o que devo admitir porque, até agora, não tenho nada para isso. – ironizou Tália.

- Desde quando passamos a mentir tanto entre nós? – Terpsícore falou mais para si mesma do que para as irmãs.

- Engraçado você perguntar, pois foi você quem começou, lembra? – Clio voltou a escolher a roupa, não queria iniciar a próxima briga.

- Cuidado com o que vocês vão fazer, Clio, pois é capaz de Terpsícore ir até a décima casa brigar com o cavaleiro de capricórnio. – Tália não resistiu ao comentário e riu escandalosamente. Não quis ofender as irmãs, mas foi inevitável.

Clio bufou de raiva ao ouvir a fala da irmã, mas antes que pudesse responder à altura, o menos esperado aconteceu: Terpsícore começou a rir do mesmo jeito que Tália.

- HAHAHAHAHAHAHA seria hilário. – Tália constatou, fazendo Terps rir ainda mais.

- Seria impossível. – Clio cortou – Terpsícore não sabe se impor. – e sorriu triunfante.

Terps parou de rir, mas manteve o sorriso fechado no rosto, e Tália a observou, esperando resposta.

- É questão de tempo. – disse a loira, para mais uma surpresa.

Clio e Tália franziram a testa.

- O que está aprontando, Terpsícore? – Clio perguntou, séria, e pegou um vestido lilás.

- Essa cor não é interessante para ir a um encontro noturno, melhor usar aquele azul escuro. – Terpsícore respondeu, ignorando a pergunta.

Clio mordeu o lábio para conter a raiva que sentiu por ser ignorada, mas responder a irmã não levaria a nada e não queria estragar o sentimento agradável que se instaurou após o convite de El Cid. Além disso, Terpsícore tinha razão quanto à cor do vestido, o azul realmente era melhor.

- Olá! – a voz amena de Urânia preencheu o ambiente. – O que estão fazendo? Alguém viu Melpomene?

- Mas olha quem apareceu! O Cavaleiro de Sagitário já foi dormir? – Tália, novamente, não resistiu à graça.

- Não sei, passei a tarde com Athena. – Urânia deu de ombros e sorriu de canto; Tália bufou, frustrada.

- Mel deve estar com Redka, elas andam muito próximas. – respondeu a musa da comédia, sentando-se na cama de Clio.

- Próximas até demais. Ela vai todo o dia à loja de flores. – Clio disse, com um quê de desconfiança.

- Que bom, parece que Redka faz bem a ela. – Urânia sorriu e se virou para a irmã que se arrumava. – E você? Vai a um encontro?

Tália soltou outra gargalhada, Terpsícore conteve um riso, Clio fechou a cara e Urânia ficou sem entender.

- Não é um encontro! – exclamou a terceira.

- Qual é o problema de ser um encontro, pelo amor e a paz da Terra?! – Tália brincou, mas realmente queria saber.

- Nenhum! Só que não é! – Clio fechou os punhos.

- Cuidado, Clio, vai amassar o vestido. – Terpsícore comentou com graça.

- Ugh, vocês estão impossíveis! – a musa da história falou, seguindo para o banheiro, onde teria paz para se arrumar.

- O que foi isso? – Urânia ainda sem entender.

- Clio em seu inferno astral. – Tália disse, divertida, e se deitou na cama, tocando na barriga que doía pelas risadas.

- Não existe isso para nós, Tália. – revidou a morena.

- Eu sei, mas, sério, a partir de agora, passei a duvidar disso.

Urânia se permitiu rir de como Tália falou isso, assim como Terpsícore.

- De qualquer forma, se virem Mel, digam a ela para me procurar no quarto, por favor. – Urânia pediu e saiu depois que as irmãs assentiram.

Um silêncio incômodo surgiu no quarto. Tália observou Terps fitar o teto, parecia que a irmã estava longe dali, ou talvez quisesse evitá-la por causa do conflito com o cavaleiro de gêmeos.

- Quer conversar? – arriscou a musa da comédia.

- Não.

- Está chateada comigo?

- Não.

- Sabe falar outra coisa?

- Sei.

- Ah, certo. Estava só checando.

Pelo visto, Terpsícore se fechou para isso por um tempo, e não seria Tália quem a provocaria para o contrário. Pelo menos, não ainda. Apesar de se preocupar com a irmã menor, ela sabia que Terps queria se isolar e respeitaria a vontade, ainda mais após refletir sobre as palavras da irmã gêmea (Melpomene) sobre a questão de Terpsícore aprender aos poucos por si só. Fazia total sentido, de fato; até porque a irmã menor precisava realmente crescer e se impor, mas não o faria com tanta repressão por parte das irmãs. Entretanto, Tália foi mordida pelo inseto da curiosidade após a irmã falar que era questão de tempo até se impor...

- Enfim. – disse mais para si do que para Terps e se levantou para sair. – Boa noite, Terps. Espero que não guarde rancor de mim.

- Não guardo, só quero ficar em paz um pouco. – Terpsícore respondeu, sem emoção alguma.

- Entendi, mas me procure quando quiser ir à cachoeira, por favor.

Terps viu o sorriso de Tália murchar – algo que não combinava com ela – e se sentiu um pouco mal. A irmã sempre esteve ao seu lado e, por mais que tivesse divergido na opinião sobre Defteros, ajudou-a em muita coisa. E Tália tinha esse traço protetor muito forte devido a o que aconteceu com ela e Melpomene, há muito tempo... Dolorosa lembrança que marcou eternamente e fez as nove musas compartilharem da dor.

- Certo. – disse a loira, por fim. – Procuro sim, Tália.

E ali estava o sorriso que todas gostavam.

- Ótimo! – Tália sorriu. – BOA SORTE NO ENCONTRO, CLIO. – berrou.

- Não é um encontro! – a voz de Clio, abafada pela porta do banheiro, foi ouvida pelas duas no quarto.

Terpsícore deixou um risinho escapar, para o agrado de Tália, que mandou um beijo para ela e saiu.

Quando Clio saiu do banheiro, deu uma girada de corpo para que a irmã pudesse analisá-la por completo. O vestido azul royal não era como os que costumava usar, este possuía um laço da mesma cor no busto e caía até os pés da musa, os quais calçavam uma sandália de cor marrom, com tiras de couro; o coque alto no cabelo também não era de costume, apenas a pequena franja continuava para o lado, sem cair nos olhos amarelados. Nada de maquiagem, apenas uma cor melhorada na lateral da bochecha.

- Acho melhor tirar o colar. – foi o comentário de Terpsícore. Os ombros de Clio caíram em frustração.

- Não tiramos o colar, Terps. – respondeu com obviedade e fitou o colo pelo espelho. – Mas está destoando, realmente.

- Não se preocupe, está bonita, Clio. – falou sincera e num tom agradável. Por mais chateada que estivesse com a irmã, não queria brigar. – Está digna de um encontro com o cavaleiro de capricórnio.

- Não é um... Ah, deixe. – Clio suspirou.

- Não entendo sua cisma com isso, não há problema se for um encontro e você sabe disso. Mas se lhe incomoda tanto assim essa palavra, então retiro e desejo apenas uma boa noite.

Clio estranhou a compreensão da irmã; esperava uma leve provocação, mas parece que nem o comentário anterior teve tal intenção. Realmente, não haveria problema se fosse um encontro, só que não era... Ou era? Não pensou muito nas intenções do cavaleiro quando aceitou o convite, mas, no fundo, se fosse chamada para um encontro, não recusaria do mesmo jeito. El Cid era agradável e cavalheiro e, por mais que tivesse um jeito peculiar de se socializar, oferecia boa companhia.

- Acho que você deve definir o que é isso antes de sair, assim poderá agir dentro do que definiu. – Terps opinou, após ver a indecisão estampada no rosto da irmã.

- Entendo, acho que está certa. – Clio cansou. – Então, deseje-me bom encontro.

Terpsícore abriu um sorriso radiante, o que fez Clio fazer o mesmo. Pouco depois, a segunda partiu para sua noite. As duas não falaram, mas sentiram a cumplicidade no olhar uma da outra, sinal de que os ares mudaram para melhor, finalmente.

~

Calíope confirmou para si mesma: aquelas almofadas alaranjadas e o tapete macio, de uma cor mista entre vermelho e amarelo, deixavam o canto exotérico, ao lado do altar, muito aconchegante. A musa não mediu formalidades ao se deitar em três almofadas depois que Asmita fez o gesto para que o fizesse. Deliciosamente relaxada, ela fitou o teto daquele cômodo, enquanto ele prestava atenção no belo som de sua respiração.

Ele não vestia a armadura, e sim um kurta pajama* branco e com detalhes dourados nas bordas que enfatizava seu charme. Deitado ao lado dela, controlou a imensa vontade de tocá-la e continuaria assim até que ela lhe desse abertura, pois não parou de pensar no estado aflito dela antes de sair da cachoeira.

- Estou cansada, cavaleiro, acho melhor subir. – Calíope cortou o silêncio com má vontade e voz ofegante.

- E qual o problema de adormecer aqui? – em contraste, a voz dele saiu controlada e calma.

- Todos. Depois você vai me acusar de abuso de hospitalidade, tenho certeza.

- Não poderia fazer isso se lhe convidasse formalmente. – ele sorriu.

- E nem pense em convidar, só depois que suas servas trocarem o aroma do incenso. Dormir seria uma tarefa difícil com o mesmo cheiro enjoativo de sempre. – ela ousou na crítica, já não recebia mais tão bem o aroma da sexta casa porque ele nunca mudava. Qual era a cisma das servas com esse cheiro?

- Meus incensos são desagradáveis?

- Não sei, só conheço um: o de sempre.

Asmita se permitiu rir de leve e se virou de frente para a musa.

- Entendo. Apesar de aguçar o sentido do olfato, não me envolvo tanto já que é um aroma tão pessoal, por isso mal o percebo nessas circunstâncias. Admito que prefiro o que emana de seus cabelos, Calíope.

Ah, como era verdade. Ele mal conseguia pensar direito quando o aroma doce dela invadia suas narinas e desembaralhava as frases em sua mente. Por vezes, quis tê-la por perto ao meditar pelo simples fato de a presença ser agradabilíssima.

- O que botaram no chá para você andar mais romântico? – ela se virou de frente para ele e observou cada detalhe do rosto sereno do virginiano. Assim como ele, reprimiu a vontade de usar as mãos.

- O mesmo que colocaram para você andar mais amena. – revidou, extraindo um resmungo de Calíope.

- Está insinuando, de novo, que sou efusiva?!

- Já passei da fase de insinuar o que vejo em você. – novamente, a voz dele saiu serena, ignorando e entrando em contraste com o tom irritado dela.

- Não parece, sinto que toda frase sua possui insinuações.

- De quais tipos?

- Prefiro não arriscar uma resposta. Responda-me você, sábio cavaleiro de virgem. – uma ironia leve acompanhou a última frase.

- Você está agitada, o que andou aprontando?

- Nada que lhe interesse ainda.

- Sinto que está nervosa, porém não por si mesma... Preocupação com as irmãs, Calíope?

- Claro que não.

- Inverdade. Você se preocupa até demais, mas insiste em demonstrar o contrário, o que não é muito inteligente, caso queira saber.

- Dispenso essa análise, Asmita.

Ele sorriu.

- Gosto quando me chama pelo nome. – comentou, feliz. Calíope fingiu ignorar, porém suas bochechas enrubescidas diziam o contrário. - Diga-me o porquê de você esconder esse sentimento que tem pelas suas irmãs... Você é a mais velha de todas, sei que se importa muito mais do que elas.

Calíope manteve silêncio. Pensou imediatamente nas irmãs ao se sentir acanhada pela análise do virginiano, agora entendeu como elas se sentiram quando ela fez o mesmo. No entanto, as relações eram diferentes; ela conhecia muito bem as irmãs para jogar-lhes a verdade, mas Asmita teria de tomar cuidado.

- Tudo bem, não insistirei, mas é justo que você também encare a verdade quando cobra que elas façam isso. – Asmita concluiu. Forçar alguém a fazer algo era o primeiro passo para o distanciamento.

- Você não entenderia.

- Se você me ajudar será possível. – dessa vez, não resistiu em tocar no antebraço da musa e acariciou-o com delicadeza.

- Não hoje. – arrepiada com o toque, deixou-se relaxar. Asmita não insistiria nisso também, percebeu a vontade dela de encerrar o assunto, então que assim fosse.

Lentamente, ele enroscou o braço na cintura da musa e a puxou para si, de forma que suas respirações se entrelaçassem igualmente. Calíope tinha um aroma viciante, que atraía o outro perigosamente e sem avisar; um aroma que, no momento menos esperado, atacava os sentidos de forma que apenas a imagem dela se projetasse na mente. Era assim que ele se sentia perto dela.

Um afago no cabelo e um beijo na testa marcaram o início dos carinhos trocados por Asmita, ela foi no embalo e, em resposta, encostou os lábios nos dele. Calíope sabia que, momento ou outro, eles desenvolveriam a conversa daquela forma, pois nenhum dos dois conseguia ficar muito tempo sem isso desde o segundo beijo que tiveram. O interessante era a instabilidade dos beijos com o passar do tempo; uns eram mais doces, outros mais ousados ou famintos, também tinham os que se limitavam a um sentimento de nostalgia... Mas todos possuíam entrega por ambas as partes.

- Calíope, tenho um pedido muito importante para lhe fazer. – entre carinhos, Asmita disse.

- Dependendo do pedido, exigirei algo em troca. – respondeu ela, precisamente. Ele sorriu com a sagacidade.

- Acho justo. – ajeitou-se na almofada e trouxe o rosto da musa para o seu peito, no intuito de acariciá-la melhor. Claramente, ela cooperou com a intenção e repousou o braço fino no peito dele. – Canta para mim?

Calíope estremeceu, ele nunca havia pedido algo sim, sequer havia tocado no assunto. Asmita riu quando sentiu a musa pular levemente com o conteúdo da pergunta; sempre teve vontade de fazê-la, desde que ouviu a musa falar sua representação pela primeira vez, na Sala do Grande Mestre. Com certeza, uma das virtudes da musa era seu canto, por mais desconhecido que fosse para ele.

- Está pensando no que quer em troca? – perguntou ele, após um silêncio notável.

- Também. Por que isso agora?

- Porque demorei demais. Por favor, encare o pedido como a melhor das minhas ousadias. – esperto, usufruiu de um tom mais grave na voz, fazendo a musa estremecer novamente ao falar em seu ouvido.

Calíope sentiu a consequência entre as pernas.

- Então... – ela procurava as palavras enquanto Asmita roçava o lábio inferior em seu ouvido. – Já sei o que quero em troca.

- E o que seria tão almejado assim que pudesse ser parâmetro de troca para ouvir seu canto? – um silêncio se fez e Asmita logo riu com a dedução. – Pedirei para que uma das servas troque o incenso amanhã cedo.

- Ótimo. – ela sorriu, triunfante. E iniciou um dos mais belos cantos do Universo.

Asmita finalmente confirmou o que pensou desde o momento em que a conheceu: Calíope era uma musa extremamente sensível - fato inegável expressado em seu canto; parecia descrever todos os sentimentos existentes quando soprava os vários sons de sua belíssima voz. O canto era tão potente que evidenciava o poder divino por trás e esclarecia a verdadeira força que tinha diante dos vícios e virtudes humanos. De repente, ser o homem mais próximo de deus pareceu algo mínimo, pois, naquele momento, ele sentiu que estava mais próxima de uma deusa. Sim, Calíope não parecia apenas musa.

~

O dia chegava nas suas vinte horas, introduzindo a noite silenciosa do Santuário juntamente com um céu repleto de estrelas, onde as constelações se exibiam brilhantemente. Coberta por um ar refrescante, a noite fez seu convite. Na casa de Capricórnio, El Cid procurava fôlego após ter corrido tanto pela casa à procura de suas calças sociais; ninguém conhecia esse seu lado, mas ele se animava quando algo diferente balançava sua rotina, e esse encontro era esse algo do dia. Quando finalmente colocou o perfume – que indicou o término de sua arrumação -, sentiu uma presença conhecida em sua casa, mas não era para ser assim.

- O que está fazendo aqui? – perguntou, surpreso; logo se arrependeu ao ver que Clio o olhava, confusa. – Quer dizer, eu devia lhe buscar e...

Não conseguiu falar mais nada após perceber o visual da musa. Clio estava absolutamente estonteante naquele vestido azul – cor que acabou quase se tornando a favorita do capricorniano depois disso – e com os cabelos presos ao alto, exibindo o pescoço decorado pelo colar de sempre. Na expressão dela, um rubro foi percebido na região das bochechas, dando um charme a mais. Absolutamente linda.

- El Cid?

- Clio, desculpe-me... Está muito bela. – comentou, constrangido e corado, virando o rosto para não ser visto dessa forma.

- Obrigada. – ela sorriu e o admirou. – Digo o mesmo de você.

- Certo, hãn... – coçou a nuca, denunciando o nervosismo. – Vamos? – ela assentiu.

Por um momento, El Cid se manteve parado, sem saber se oferecia o braço para ela ou se simplesmente a conduzia para a saída; não pensou muito, agiu por impulso e tocou nas costas da musa induzindo-a para seguir em frente com ele – o que foi estranho para os dois. A situação era cômica de certa forma, Clio pelo menos achou.

Aquele contato era estranho, mas já era algo. El Cid cuidava para que a mão não descesse sem querer e acabou se mantendo duro todo o tempo que conduziu Clio até a saída da Casa de Capricórnio. Ela percebeu, mas não sabia se ria, se permanecia na ordem, se o desfiava a ser menos tímido. Talvez a noite resolvesse.

No primeiro degrau da descida, assustaram-se ao ver Melpomene subindo com pressa.

- Mel! – chamou Clio, assim que a irmã passou por ela. El Cid retirou a mão das costas que tocava.

- Oi? – Mel parecia conter uma animação misturada com tensão. Clio franziu a testa. – Clio, por favor, fale logo, estou cansada. – disfarçou.

- Está tudo bem? Está agitada.

- Estou bem, só quero chegar logo no quarto. – suspirou e fez a irmã intensificar a franzida.

De repente, Clio parou; algo estava errado. A energia de Mel estava totalmente distorcida, densa, pesada e quase irreconhecível. Algo emanava do corpo dela e incentivava a ficar longe, alertando sutilmente um perigo. A áurea também estava mudada, porém não se via traços de tristeza ou algo do tipo no rosto de Mel. Algo estava muito errado.

- Poderia me dar licença? – perguntou a musa da tragédia, docemente. – Pare de me analisar, Clio. Isso assusta.

Mel não esperou mais respostas, virou-se para a Casa seguinte e subiu com a mesma pressa. Queria chegar logo, mas não em seu quarto, e sim na última casa. Queria vê-lo e senti-lo novamente; cada minuto longe parecia eterno – sim, era nesse grau de exagero que ela se sentia inserida. Pela primeira vez, provou ser possível contornar sua sina, mas ainda faltava algo para que isso se completasse definitivamente. Não aumentou as doses do veneno à toa.

- Você sentiu isso? – Clio perguntou para El Cid com um ar de incredulidade. Ele assentiu, sério; sentira a densidade da energia assim como ela, mas preferiu não comentar. – O que foi isso? Droga, não consegui identificar!

- Clio. – ele se aproximou e segurou os ombros desnudos dela com delicadeza. Ela observou seu olhar mais tenro. – Por favor, deixe suas preocupações de lado apenas essa noite.

O olhar dele. Sim, o olhar... Havia algo diferente, algo que acalmou minimamente a tensão de Clio, mas que ela ignorou após assentir. Os dois decidiram seguir o caminho em silêncio. Ele sabia que ela pensava na irmã, por isso pegou o tempo do silêncio para pensar numa forma de fazê-la se distrair. Bom, era questão de tempo; isso se resolveria assim que ela conhecesse certa pessoa.

Assim que adentraram a Vila, Clio sentiu uma sensação prazerosa; fazia alguns dias que não descia para o lugar, então ficou feliz ao sentir o acolhimento clássico. Algumas pessoas preenchiam espaços das ruas, outras conversavam e bebiam em tavernas, alguns pequenos restaurantes apresentavam movimento; no geral, o clima estava agradável. Clio esperava a palavra do cavaleiro sobre o local onde jantariam, mas ele apenas a guiava por entre as ruas levemente agitadas. A iluminação baixa misturada com a luz da lua poetizava o clima de Rodório a ponto de incentivar pensamentos românticos; dignos de encontros... Clio chacoalhou a cabeça, reprovando-se. Ela até podia encarar como um encontro, porém nada foi dito por parte dele.

- O que houve? – perguntou ele ao vê-la mexendo a cabeça.

- Nada! Apenas admirando o lugar.

- Você aprecia a Vila tanto assim? – a voz saiu tímida.

- Você não? – ela devolveu, docemente. El Cid não resistiu sorrir de canto.

- Chegamos. – disse ele, parando em frente a um pequeno restaurante. Pequeno mesmo.

Clio suspirou ao ver a adorável casinha de dois andares, sendo o de baixo usado como o espaço alimentício. A iluminação baixa juntamente com as mesinhas de madeira expostas tanto dentro como ao redor da casa davam um charme impecável para o local. Sem falar que estavam numa área mais alta da Vila, onde se via a extensão de seu território logo à frente. Uma jantar com uma bela vista se o fizessem do lado de fora.

- Cid! – uma voz feminina meio grave gritou, fazendo os dois virarem a cabeça.

Uma mulher baixinha e rechonchuda apareceu de braços abertos e com muita animação no rosto; vestia um avental branco meio encardido e tinha a testa um pouco suada; seus cabelos castanhos e cacheados chegavam no ombro e se encontravam um pouco arrepiados. A mulher não hesitou em abraçar El Cid, mas com cuidado para não tocá-lo – o que intrigou Clio um pouco.

- Queria dar o abraço que merece, mas já viu né, querido. – apontou para si mesma, insinuando seu estado. – Nem um porco fica que nem eu quando entro naquela cozinha. – ela riu com vontade e limpou a testa com um paninho marrom que tirou de um dos bolsos do avental.

- Dora, boa noite. Como vai? – perguntou formalmente, mas com uma voz mais doce e um leve sorriso.

- Do mesmo jeito, né, filho? Manca e bem alimentada. – soltou outra risada e tocou no braço dele. – E você? Tão magrinho... Não me diz que decidiu parar de treinar só para avançar aqueles moleques inconsequentes!

- Nada disso, Dora, está equivocada. – ele se permitiu sorrir um pouco mais. A mulher virou o rosto e checou Clio de cima para baixo.

- E essa linda moça, quem é?

- Perdoe minha falta de educação. – ele se virou para Clio. – Dora, essa é Clio. Clio, essa é Aldora.

- Dona desta humilde bodega. – ela estendeu a mão para Clio, que pegou amavelmente e sorriu.

- Prazer em conhecê-la, Aldora. – a musa cumprimentou.

- Chame de Dora, querida. – virou-se para El Cid. – Educadinha ela, né? – e sorriu, arrancando uma risada de Clio. – Ó, gostei, sabe rir.

El Cid corou profundamente. Às vezes, Dora parecia uma mãe aprovando o par de um filho. Bom, ela era o mais próximo de o que poderia chamar de mãe algum dia; não só ele, mas outros moradores de Rodório e do Santuário.

- Gosta de vinho, querida? Aqui nós fazemos um caseiro que já é famoso. Não quero me gabar, mas todo o dia eu tenho que ficar socada na cozinha preparando vinho pra esses beberrões desocupados. Eu os amo, claro, me trazem dinheiro e me divertem, mas cansa um pouco, sabe? Temos um vinho que é com mel, da cor desses teus olhos aí. – falou ela, animada, enquanto apertava a mão de Clio com carinho.

- Gosto muito! – respondeu sorrindo. Não tinha como negar a simpatia de Dora. Virou-se para El Cid, que observava com um olhar diferente a cena. – Agora entendi o motivo da pergunta.

- Ehh... Sim, de fato observei seu gosto por vinhos. – ele disse, visivelmente encabulado.

- Hmm, agora se tornou observador, Cid? – provocou a mulher, com um sorriso malicioso. – Escolheu muito bem quem observar, querido.

Vermelho era pouco para definir a cor que brotou no rosto do capricorniano. Clio não fugiu disso também. Ele pigarreou, fazendo Dora soltar uma risada.

- Pois bem, tenho o lugar perfeito para vocês. Sigam-me, sim? – pediu ela, seguindo para a mesa perto da pequena cerca que limitava a parte alta daquela área. – Pronto, vista perfeita para vocês. Melhor lugar impossível! Até me impressiona estar vago, hum...

Clio e El Cid se sentaram um de frente para o outro na pequena mesa de madeira. Realmente, a vista era ideal para o momento e contava com a presença da lua cheia. Uma rápida troca de olhares foi tida pelos dois, seguida de uma corada – o que não passou despercebido por Dora, que reconheceu a deixa.

- Bom, o de sempre, Cid? Sugiro uma Moussaka* de batata com abobrinha recheada para depois da primeira taça. Que tal, queridos?

- Clio? – El Cid a olhou, esperando resposta.

- Parece ótimo. – respondeu ela, graciosamente.

- Então, assim será. Aguardem um momento que trarei os vinhos. O de sempre, Cid? – perguntou novamente. Ele apenas assentiu e Dora se retirou.

Quando ele voltou seu rosto para Clio, a viu com o queixo apoiado nas mãos entrelaçadas e olhos direcionados a ele. Odiou-se por corar novamente.

- Com que frequência você vem aqui? – perguntou ela, sugestivamente. Uma das sobrancelhas estava arqueada. Ele engoliu seco, um pouco perdido na pergunta.

- Como?

- “O de sempre, Cid”? – ela se permitiu imitar Dora e riu em seguida. A risada de Clio despertou-o do deleite de vê-la em sua frente.

- Ah, sim. – sorriu de canto e coçou o pescoço, desviando o olhar. – Vinha mais antes, mas... Com a Guerra Santa mais próxima, esses momentos de lazer estão cada vez mais raros.

- E você está gastando um deles comigo. – ela não resistiu, por mais que estranhasse o próprio comportamento. Sentia-se um pouco na obrigação de amenizar o clima e tirar a tensão do cavaleiro.

- Eu não colocaria dessa maneira. – respondeu mais preocupado. Seria absurdo se ela achasse que era um incômodo. – Na verdade, considero como uma investida num momento que pode ser agradável. – a frase saiu com muito esforço.

- Que pode ser? Não está sendo ainda? – perguntou ela, calmamente, observando cada sinal dele.

- N-Não. Quer dizer... É sempre agradável ter sua companhia. – engoliu seco e fitou o luar novamente. Dessa vez, quem corou com o comentário foi ela.

- Digo o mesmo.

Um silêncio desconfortável tomou os minutos seguintes. Pela primeira vez, Clio não soube como controlar a situação; nunca esteve num encontro antes, portanto tentou agir naturalmente, mas a tensão de El Cid a incomodava bastante. Não queria passar o resto da noite assim, teria de tomar iniciativa de conversa caso ele continuasse assim. El Cid, por outro lado, pensava em como agradá-la, mas tampouco esteve em um encontro com alguém como ela. Geralmente, suas relações envolviam apenas casualidades.

Dora finalmente trouxe as duas taças de vinho e esperou Clio provar para se retirar.

- Hmmm. – a musa murmurou em satisfação. – Tão saboroso, Dora. É compreensível que seja tão requisitado.

- Claro, eu não serviria coisa ruim para você, querida. Ainda mais sendo a acompante do querido Cid. – deu um tapinha no ombro do capricorniano e manteve a mão ali, oferecendo um sorriso amável. Ele quase engasgou com o vinho.

- Dora, acho que tem algo queimando... – ele a fitou, desesperado. Ela fungou.

- Acho que não. – respondeu ela, que, de início, não compreendeu o olhar, mas depois que viu a cor do rosto dele, saiu imediatamente.

Após dar um mínimo sorriso amarelo para Clio, ele tomou mais um gole, prolongando o silêncio. Mas ela não deixaria mais assim.

- Gostei dela! – comentou.

- Fala demais, mas é uma pessoa muito querida. – ele comentou de volta.

- Qual é a história dela?

De primeira, ele estranhou a pergunta, mas rapidamente se lembrou do costume de Clio de analisar as pessoas e compreender suas entrelinhas. Claro que havia curiosidade ali, mas ela parecia realmente intrigada com o jeito de Dora.

- Ela tem um astral muito bom e bonito. Além de passar uma segurança forte. – Clio disse.

- Não conseguiu isso facilmente, porém. – El Cid voltou a ser seco e aparentou certo incômodo.

- Não precisamos falar dela se lhe incomoda. Vi como ela é uma pessoa querida para você. Parecem bem próximos.

- Não é isso. Dora sofreu muito para chegar onde chegou e ser da forma que é. Foi casada com um interesseiro do pior tipo, sem caráter algum. - suspirou, procurando se concentrar. - Ele fugiu com a pequena quantia financeira que ela tinha e ainda a traiu com uma vizinha que ela considerava amiga. Eu era mais jovem nessa época e já frequentava esse local, acabei vivenciando tudo isso com ela. Não apenas eu... Ver uma pessoa tão boa ser devastada dessa forma foi injusto demais. – ele fechou o punho em cima da mesa.

- E como ela deu a volta nisso? – Clio se segurou no que queria fazer e manteve a voz calma.

- Nós, seus amigos de Rodório e do Santuário, ajudamos. Pagamos mais do que o preço que ela cobrava pelas comidas e bebidas apenas para ajudá-la a recuperar o prejuízo e comprar os ingredientes para continuar com o restaurante. – ele prendeu a respiração, contendo a raiva. – Foi... Difícil vê-la assim, ainda mais quando rejeitava toda a ajuda. Mas no fim a convencemos de que ela não conseguiria sozinha. Sabe qual foi a resposta dela? – Clio fez que não. – Ela disse que, desde que conheceu cada amigo que fez, soube que não conseguiria viver sem eles. E, claro, seria difícil viver sem ela. Hoje percebo que ela se reergueu mais por nós do que por ela. Como vê, ela se orgulha de ter tantas pessoas dando valor a o que faz. Muitos cavaleiros não têm o tamanho da satisfação que ela tem para com o que faz.

Clio, após percebê-lo em silêncio, entendeu que o relato chegara ao fim. Nunca o tinha visto falar tanto e com tanta emoção reprimida. Descobrir o lado sensível de El Cid, nem que fosse um pequeno fragmento, foi o bastante para fazê-la tocar no punho fechado dele com sua mão delicada e pequena. O toque o despertou e pareceu deixá-lo calmo novamente; ele não resistiu em olhá-la com intensidade. Definitivamente, uma faísca os surpreendeu naquela troca de olhares.

- Ela é realmente uma mulher guerreira e tem muita sorte por ter pessoas como você por perto. – disse a musa, carinhosamente, enquanto o polegar acariciava a mão já aberta dele.

- Eu diria que nós é que temos sorte por tê-la por perto, Clio. – ele sorriu, sem graça, e ela devolveu.

- Ela parece ser bem protetora. – os dois riram suavemente. As mãos continuavam na carícia.

- Já botou muitas donzelas para correr. – comentou ele, com um quê de divertimento. Seu olhar parecia nostálgico.

Clio automaticamente se lembrou do que Kárdia insinuou sobre El Cid ter uma “donzela querida” o esperando na Vila. Não deixou de se sentir um pouco estranha com a lembrança, talvez porque um incômodo mal vindo apareceu. El Cid percebeu a leve franzida de testa dela.

- E botou a sua para correr? – ela perguntou calmamente, no intuito de não mostrar tanto interesse.

- Que donzela?

- A que Kárdia citou mais cedo...

- Ele se enganou. – foi direto e seco. Maldito escorpiano.

- Seria um problema se ela nos visse aqui, certo? – Clio não se sentiu satisfeita.

- Clio. – ele prendeu a mão dela que acariciava e a fez olhar em seus olhos. – Não há donzela alguma.

- Tudo bem, eu acredito. – ela sorriu de boca fechada e ele suspirou, aliviado.

- Já que tocou... No assunto de hoje cedo... Bom, você disse que não era um dos seus melhores dias. Seria inconveniente lhe perguntar o motivo disso?

- Eu só estava chateada com o que aconteceu entre eu e Terpsícore. Um pouco preocupada também... – disse normalmente, desfrutando do toque das mãos. – Mas acho que isso mudou. – um pequeno sorriso brotou no canto de sua boca e seus olhos seguiram a lua.

Os dois bebericaram o vinho, já pensando em providenciar mais uma taça. Clio sabia que, provavelmente, El Cid relaxaria melhor com a bebida. O vinho tinha disso: aflorava suas sensibilidades mais recatadas e possibilitava a sensação aveludada do toque. Não havia um vinho que não pudesse amenizar algo – ou salientar; a intenção que ele causaria dependeria da pessoa. E, num encontro, nada era mais ideal que isso.

Entretanto, Clio não sabia realmente o que estavam tendo e se sentia descontraída o suficiente para fazer a pergunta.

- El Cid, o que é isso que estamos fazendo?

Ele engoliu seco, não preparado para tal pergunta. Antes de falar qualquer coisa, tomou mais um gole.

- Em que sentido? – perguntou, tão seco quanto sua engolida. Clio suspirou.

- Isso é um encontro?

Certo, ele compreendia a necessidade dela de querer as informações mais claras possíveis, mas ela poderia tentar fazer que nem ele: deixar fluir. Era a primeira vez que saía com alguém daquela forma, portanto procurou ajuda na naturalidade.

- Eu não... – engoliu seco novamente. – O que você acha?

- Não, El Cid. Fale-me você, quero saber qual foi sua intenção quando me convidou para jantar. – ela foi mais firme, mas não o olhou com seriedade.

Ele a fitou, respirou fundo e bebeu mais um gole do vinho; percebeu que era o último.

- Minha intenção foi chamá-la para jantar porque aprecio sua companhia e... – parou, mas Clio o incentivou com a cabeça – Na verdade, só não considero um encontro porque acho que não sou digno de tal oportunidade.

Clio não evitou rir da resposta.

- E se fosse um encontro, seria diferente do que estamos fazendo? – perguntou, divertida. Queria desesperadamente tirar aquela ideia absurda da cabeça dele.

- Não!

- Não? Então, poderíamos dizer que estamos num encontro? – ela continuou sorrindo, vendo-o se confundir cada vez mais. – Como seria a dignidade ideal de alguém para sair comigo?

- Você é uma divindade, Clio.

- E você é um dos cavaleiros mais poderosos que existem e defende um dos princípios mais belos que poderia existir nesse mundo. Como não poderia ser digno de sair com alguém mesmo sendo uma divindade?

Ele não respondeu, mas a ouviu comentar baixinho “valorize-se, El Cid”. Ou então foi imaginação.

- Quer saber o que acho? – ela perguntou, ele assentiu, sem tirar os olhos dela. – Acho que estamos num encontro e que você deveria se abrir para isso, como eu estou fazendo.

- Entendo. – a resposta dele desencadeou outra risada graciosa da musa. Ele não ficou ofendido; pelo contrário, adorou ouvir aquele som e acabou se permitindo rir também.

- Estou vendo isso mesmo? – a voz animada de Dora interrompeu. – Querido Cid está rindo? – o volume aumentou, denunciando sua emoção. Ela segurava uma bandeja de madeira com os pratos pedidos e mais duas taças de vinho. – Sabe, Clio, é muito raro ver esse homem rir. Não sei que feitiço você tem para submetê-lo a isso, quase achei que ele encarava a felicidade como um pecado. Eu, hein. – ela sorria brilhantemente enquanto ajeitava a mesa e trocava as taças. – Acertei em trazer mais vinho, hãn? Pelo visto, Clio é que nem você; não poderia ter arranjado alguém melhor, Cid.

Novamente, o vermelho tomou conta do rosto do capricorniano.

Após Dora se retirar, os dois tomaram o tempo para se deliciarem com o prato, o qual recebeu elogios inumeráveis por parte da musa. Ele apenas assentiu para cada um deles, já que conhecia bem o que compunha as opções alimentícias do local. Entretanto, quase deixou a comida esfriar por causa de seu foco na bela musa que demonstrava satisfação. Seria possível ela estar realmente se sentindo bem em sua presença tão inanimada? Logo ela, tão delicada e graciosa em cada gesto que fazia, desde pegar o talher a limpar a boca com o guardanapo; tão serena, porém segura. Nem reparou no sorriso que surgiu no próprio rosto, mas ela sim.

- Vai esfriar. – ela disse, tirando-o de seus pensamentos.

- Está com frio? – perguntou ele, preocupado.

- Não, sua comida vai esfriar. – ela riu.

Assim que terminaram de comer, retornaram ao vinho. Era perceptível que o clima tinha amenizado entre eles, estava até mais convidativo para a conversa. De repente, Clio levantou a taça em direção a ele.

- Que tal um brinde por esse encontro? – ela propôs, feliz. Ah, como se sentia tranquila...

Ele fez o mesmo e o som agudo das taças se encontrando anunciou o ato. Os dois sorriram, ele mais tímido, ela mais desinibida, e bebericaram a bebida.

- Oh, que bonito! – uma voz irônica meramente conhecida por Clio e totalmente conhecia por El Cid cortou a poesia do momento. Os dois viraram-se imediatamente para ver a dona.

- Boa noite, Cléo. – cumprimentou El Cid, inegavelmente incomodado.


Notas Finais


* kurta pajama = vestimenta indiana.
* Moussaka de batata = prato típico grego

E então? O que vocês têm pra me dizer sobre esse ~possível~ casalzinho? Que diabo tá rolando na mente da Clio?
E pra quem espera Alba x Mel, os coraçõezinhos baterão no próximo!

Beijos, espero que gostem!


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