História Encantado - O príncipe enjaulado

O brilho dos flashes era capaz de cegar qualquer pessoa que estivesse diante daqueles fotógrafos empolgados. A solteirice do homem e da mulher mais desejados do momento estaria, enfim, perto de acabar?

Lan XiChen posava ao lado da belíssima atriz Liu Mingyan para orgulho de Lan Qiren que já pensava nos futuros netos. O sorriso sempre gentil do homem era de conhecimento do público, bem como a sua fortuna, e inegável beleza que se traduziam em um conjunto que fazia qualquer pessoa suspirar.

O homem caminhava sobre o tapete vermelho acompanhando a mulher que era para ser a única estrela da noite. Ela era a protagonista do drama de sucesso da temporada e seria premiada por isso. Ele figurava tão somente ali por ser um dos patrocinadores e melhor amigo desta.

Contudo, Lan XiChen sabia que perdeu a batalha para ele mesmo. 

Liu Mingyan era a melhor amiga do homem desde o colégio e se lembrava saudosa do período que o seu querido amigo resplandecia ao lado de Nie MingJue e todos os planos que fizeram.

Haviam conversado bastante antes da fatídica noite e ele se comprometeu a sempre dar notícias para a amiga, mas no dia seguinte, qual não foi a sua surpresa ao encontrar Lan XiChen com os cabelos cortados na altura da nuca e com um sorriso gentil congelado na face.

Ela havia presenciado o dia em que Nie MingJue simplesmente havia enrolado os longos fios de XiChen na sua mão direita e dito que era a coisa mais bonita dentre todas as coisas maravilhosas em Lan XiChen. Só perdia para os brilhantes olhos azuis.

A moça chorou todas as lágrimas que o amigo não ousaria mais derramar e prometeu ficar ao seu lado.

Isso não a impediu de ascender no universo das artes como uma atriz de sucesso mesmo sem se envolver em qualquer aventura amorosa. Não por outra razão o público foi a loucura ao perceber que ela entrava acompanhada de XiChen, já que era costumeiro que ela chegasse sozinha.

Mas a questão era que Lan XiChen se afundava cada vez mais em uma severa depressão que apenas ela suspeitava, mas se sentia paranoica em demasia em sequer pensar que havia chegado a esse ponto.

Desde que Lan Wangji se mostrara plenamente capaz de seguir a vida por conta própria, criando um filho inclusive, a pequena luz que ainda havia na vida de XiChen além do irmão, o Lan mais velho começou a sentir que nada mais na vida fazia mais sentido ou importava.

Todos seguiam as suas vidas e ele sentia que estava cada vez mais deixado de lado.

A gota d'água havia sido quando em uma viagem para o exterior acessou o Instagram e, tal como um homem buscando água no deserto, procurou pelo Nie e encontrou uma foto do homem, mais belo do que nunca, ao lado de uma mulher segurando um lindo bebê.

Ele parecia tão feliz, era a percepção de XiChen, o que ele havia tentado fazer tirando aquela possibilidade de alegria do seu amado?

Liu Mingyan encontrou o amigo no quarto do hotel afogando as lágrimas que não conseguiu segurar em uma garrafa de uísque. A garota ainda tentou mostrar que a mulher era claramente a versão feminina de XiChen, mas o Lan não conseguia ouvir mais nada sobre o homem que tanto havia amado.

Isso havia acontecido há anos.

E agora estavam ali diante de todos sendo o próprio epítome do que um casal deveria parecer.

A noite estava resplandecente e Liu Mingyan havia convidado XiChen em um ato quase desesperado para que ele soubesse o quanto era querido pelas pessoas, mesmo estando ao lado dela, mas a visão da mulher, não por maldade, era um tanto superficial sobre o que ele estava sentindo em seu cerne.

Ele a amava tal como uma irmã, então já havia deixado tudo planejado de antemão. Seus principais herdeiros seriam seu irmão e sobrinho, mas a produtora da família Lan seria dada a Liu Mingyan.

XiChen planejava deixar a melhor amiga ter a noite dos sonhos recebendo todas as honrarias que tinha direito e, após deixa-la em casa, se lançaria do píer mais afastado de Hong Kong e morreria afogado.

Já havia deixado sua secretária avisada que deveria enviar para Lan Qiren um link que o permitiria acessar o vídeo no qual XiChen expressava seus últimos desejos e dava adeus para todos.

A mulher posava ao lado do amigo sorrindo extasiada por ostentar ao redor do pescoço um colar de diamantes que havia ganhado de presente do Lan e havia pertencido a mãe deste.

Que ninguém nunca dissesse que Liu Mingyan nunca foi amada, contudo, não era suficiente para XiChen querer ficar.

Não era suficiente para ele querer existir.

E que não dissessem que foi o fim com Nie MingJue que acarretou isso. Não! Isso foi apenas uma parte. Tudo era apenas uma vida reluzente que prendia o Lan atrás de barras de ouro cravejadas de diamantes.

Você precisa ser perfeito.

Você precisa ser um exemplo.

Você precisa nos liderar.

Nunca mostre fraqueza.

Nunca confie.

Nunca chore.

E no fim, o que todos estavam dizendo era, nunca viva.

Então ele faria mais esse favor para todos.

Basicamente ninguém conseguia identificar a depressão que o principal Lan estava afundado. Ele era muito bom em disfarçar. Tão bom que o disfarce o confundiu e ele passou a pensar que era ele mesmo.

Seu humor deprimido era maquiado com o constante sorriso gentil que aprendeu a manter em seu rosto como um acessório; sua perda de interesse em tudo, inclusive na alimentação, se perdia em meio a rotina que seguia de forma automática para não preocupar ninguém; dormia muito pouco e gastava as horas de insônia trabalhando ou, nos piores dias, vendo as fotos de tempos mais felizes enquanto chorava abandonado em seu quarto na suntuosa mansão.

Como se tudo isso não bastasse, culpava-se todos os dias por coisas que estavam além da sua capacidade. Seus pensamentos mais sombrios diziam que os pais haviam morrido em castigo antecipado por ele ser uma aberração; que se o seu irmão descobrisse que um dia iria fugir de casa com um homem iria odiá-lo; que não era suficiente e nunca havia sido.

Tudo o desgastava, nada o fazia realmente querer se atentar, nada o chamava a atenção exceto a ideia de acabar com tudo aquilo e encontrar paz.

Antes que se tornasse insuportável a cobrança para que contraísse matrimônio e arrastasse uma mulher, provavelmente Liu Mingyan, para a sua vida em tons de cinza e fadada a destruição, era melhor acabar com tudo de uma vez.

E naquela noite, sabendo o que o esperava, Lan XiChen decidiu que estaria de corpo inteiro para sua querida amiga e ela realmente acreditou que havia conseguido puxá-lo do abismo no qual estava, mal sabendo que ele já havia se lançado por livre e espontânea vontade.

E assim, depois de todos os aplausos e luzes brilhantes, a noite acabou e XiChen fez questão de ser o chofer perfeito.

- Você sabe que eu amo você, não sabe? – Disse a bela mulher enquanto abraçava apertado o homem bem maior que ela como se quisesse manter os caquinhos juntos. Aqueles pedacinhos que ela acreditava que havia conseguido remendar em sua ingenuidade.

- Eu sei que sim. – Disse ele de volta e, sorrindo verdadeiramente, disse. – E eu amo você.

Ela não entendeu porque sentiu lágrimas banhando seus olhos enquanto o carro de luxo guiado pelo Lan o levava para cada vez mais longe.

E ali estava Lan XiChen naquela parte abandonada do píer. Descalço e empolgado com a ideia de se ver livre de tudo aquilo. Um pequeno passo e estaria dentro da água gelada. Se não morresse por conta do afogamento, seria a hipotermia a levá-lo daquele mundo.

Tudo havia ficado resolvido. Ele sabia que seu irmão sentiria a sua falta e seu sobrinho também. Seu próprio tio iria surtar, mas, era um sentimento honesto, ele não estava se importando muito com isso.

O frio era bem vindo para fazer companhia e, para a sua surpresa, naquela parte da cidade algumas nuvens começavam a se formar no horizonte. Um pequeno barco, quase uma miragem, preguiçosamente acompanhava o nascer do sol em alguns quilômetros de distância.

Talvez alguém encontrasse seu carro e fizesse um bom proveito dele. Sua carteira tinha dinheiro e havia ficado o seu relógio sobre o capô do automóvel. Quem quisesse poderia se esbaldar naquilo.

Bom. O momento havia chegado.

O que ele não esperava era presenciar o maior absurdo da sua vida.

Foi tudo muito rápido.

Um raio roxo cruzou o céu e explodiu próximo o bastante de Lan XiChen para deixar seus ouvidos zumbindo. A área que ele estava era um campo aberto e, não sendo o bastante a situação, um animal, não, um cachorro de pelo alvo e manchas pretas estava deitado inerte no lugar.

O Lan odiava a sua vida, mas adorava animais.

Deixando de lado momentaneamente a sua decisão de tirar a sua vida, correu para socorrer o bichinho e ficou impressionado que o animal tivesse apenas uma pata virada em um ângulo estranho. Nem mesmo o pelo estava chamuscado.

Tocando gentilmente na cabeça do cachorro, percebeu que o animal abria os olhos devagar.

XiChen não era especialista em cães, mas até ele sabia que animais não podiam ter um olhar tão inteligente assim e, muito menos, existiam huskys siberianos de olhos violetas.