Eu? - Eu?

Me entristeço ao refletir sobre o engano. Sinto-me cada vez mais ingênua, como se eu não merecesse a verdade. No meu peito, uma ponta de mágoa é evocada e todo aquele embolo logo sobe para a minha garganta, mas me apresso a engolir todos aqueles sentimentos.
Será que precisarei passar por tudo isso para ser alguém? Será que na minha vez será igual? Será que partilharei de memórias similares?
Por um momento paro e respiro fundo. Naquele instante era como se só houvesse no mundo eu e minhas células responsáveis por fazer eu respirar. Quero gritar, chacoalhar, esvoaçar, mas não o faço. Não sinto um propósito para isso. Tenho receio de me acharem mais e mais louca. Minha barriga geme, e é por fome. Agradeço, pois agora isso é algo que eu posso focar meus pensamentos e não os deixar livres para criar cada vez maiores minhocas. Dou alguns passos e paro. Sei o sabor de algumas coisas, outras apenas imagino como elas se sairiam no meu paladar (gosto de fazer esse exercício tortuoso), mas será que experimento a liberdade? 
Me abaixo em cócoras, depois me levanto, passo as mãos no meu rosto e sou novamente afogada em pensamentos agitados. Não queria, tentei fugir dessa situação, mas foi inevitável. Minhas pálidas e gélidas mãos percorrem meu rosto de cima a baixo, esfregando meus olhos e chegando ao meu cabelo, como em um sinal de extremo cansaço. 
Concluo: acho que não. Acho que a liberdade toma tempo, acho que viver é como uma busca dela. Não sei se alguém consegue sentir ela plenamente, pois sentir é buscar, e se alguém busca algo e porque não o encontrou. Talvez eu seja muito nova, talvez ela ainda virá, com os passar dos anos, como uma amiga que se tornará cada vez mais íntima. Ou não. Ou eu não sou digna. Alguma mulher é digna? A liberdade permeia a feminilidade? Ser mulher é contrastante com esse conceito abstrato.
Tenho o súbito anseio de dividir minhas angústias com mais alguém, e estou pronta para seguir rumo a esse caminho, porém reluto. Vale a pena alimentar meus pensamentos? Será que a divisão tudo isso será mais leve ou mais pesado? Não quero me acabar em lágrimas sem um sentido claro. Vou me atentar a algo maior. Tenho clareza que vale a pena alimentar esse bicho da fome que habita meu estômago.