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História Coroa Inumana - Monstros na Hereditariedade


Escrita por: Nmotivos

Notas do Autor


Betado por @Srta__Wu
Banner por @Evv

Capítulo 4 - Monstros na Hereditariedade


Fanfic / Fanfiction Coroa Inumana - Monstros na Hereditariedade

— Você já tinha vindo ao jardim antes? — indagou Lucy.

— Não. Não realmente.

O dia estava ensolarado e as folhas pareciam verdes e revigoradas após uma semana de chuva. Lucy havia decidido caminhar pelo jardim naquele dia, parecia enfastiada das lições matinais de sua tutora e das horas intermináveis na costureira. Os guardas andavam pelos corredores, longe o suficiente para respeitar a intimidade dela, perto o bastante para salvá-la se Natsu decidisse arrancar sua cabeça.

Ele não poderia imaginar algo mais ridículo. 

— Seu cabelo está crescendo — comentou ela. 

Natsu apertou as mãos nos punhos, evitando a vontade de tocar na própria cabeça. Ele passava tempo demais com ela agora e havia se dado conta de que sua aparência poderia parecer um pouco assustadora, então parou de raspar os fios da cabeça. Eles haviam crescido rápido. 

— Está bonito. — disse ela baixinho.

Ele sorriu.

— Nós ainda vamos treinar hoje. Não tente me enganar. 

— Não faço a mínima ideia do que está falando. — disse ela, inocente.

— Mentirosa — Ele a olhou de soslaio — Vamos treinar assim que voltar para o quarto.

Ela grunhiu.

— Que tola eu fui. Achar que eu podia te distrair — disse inocentemente.

— Ah, não. Você conseguiu me distrair — disse ele, olhando para o céu — Ao menos, por um tempo.

Ela apertou o guarda-sol. Lucy parecia uma pintura em amarelo, brilhante como aquarela. 

— Gostaria de sair para a cidade. 

— É proibido. Sinto muito. — disse ele — Desde que os rebeldes quase te sequestraram, a guarda está mais precavida. 

— O rei de Lity chega hoje em Fiore — disse ela. — Junto com os…

— Junto com o gado para ser colhido. — completou ele.

— Eu sinto muito — Ela encolheu os ombros, com pesar.

— É, eu também. 

O vento soprou a bandeira de Fiore — uma bela rosa vermelha bordada no tecido. Ele sentiu as chamas se acomodarem nas pontas dos seus dedos, mas a coleira aqueceu. As chamas recuaram. 

— Ela te incomoda demais? — indagou Lucy. 

— A vida toda.

— Com quantos anos você veio parar aqui? 

— Dez, se eu me lembro bem.

— Você era uma criança — disse ela, olhando para a paisagem — Eu queria ter…— suspirou.

— Você não poderia ter feito nada, princesa — disse ele com sinceridade — Não era mais velha do que eu, suponho. 

— Não. Eu queria ter o poder de mudar isso — Crispou os lábios — Mas nessa época, eu pensava em encher minha boca de doces e brincar com bonecas. 

— Parece divertido. 

— E era. Até não ser mais. 

— Você parece ter tido uma infância agradável — disse Natsu. 

— Foi, na medida do possível. Sempre tive tudo em mãos, mas eu era um pouco sozinha. Eu mal via meu pai. 

Natsu não conseguia imaginar o rei brincando de bonecas com a filha, parecia fora da realidade. A menos que os bonecos com quem brincavam estivessem dentro da Colheita.

— E a sua mãe? 

— Foi transformada. Um selvagem a atacou — disse ela, balançando as mãos ao notar sua expressão — não precisa se preocupar, eu nem me lembro dela. 

— Deve ter sido difícil.

— Não, realmente — respondeu com um suspiro — Não posso sentir o luto por alguém que não conheci. Mas acho que teria sido bom ter uma mãe. Às vezes, eu imaginava-a brincando no jardim comigo. 

Natsu nunca havia pensado tão objetivamente nos seus pais desde aquele momento. Sabia que ele tinha vindo de alguém, mas preferia não pensar que eles o tinham abandonado no orfanato. Provavelmente moravam na mesma cidade — a qual fora incinerada por ele. 

— Está ficando tarde. Você deveria subir para se arrumar.

Ela observou montanhas de flores serem descarregadas dentro do castelo. Os funcionários trabalhavam com fervor por todo o jardim. Uma festa de boas-vindas para God Serena aconteceria naquela noite, mas Lucy não estava particularmente animada.

— Você vai?

— Eu não sou pessoa física, Lucy — Ele sorriu, como quem traga uma verdade amarga — Mas estarei lá para te proteger, como seu inumano.

— Vou pedir para que enviem algo bonito para você usar — Ela piscou — Não quero que destoe de mim. 

Ele riu, mostrando os dentes.

— Vá logo, antes que eu mude de ideia e treinemos hoje. 

Ela pulou de alegria, puxando-o para dentro do castelo. Ele riu, levemente insultado.

Os dias haviam entrado em uma rotina. De manhã, as tarefas de Natsu eram acompanhadas das aulas de Lucy e à tarde eles treinavam a canalização do seu poder. Ela havia mudado, mesmo que imperceptível para os olhos humanos, estava mais concentrada e seu equilíbrio balanceado, apesar de ainda não conseguir manifestar suas habilidades. Eles tentaram pegar alguns objetivos que poderiam ser a chave do problema sem sucesso — óculos, pentes, garfos.

A Sangria aconteceria na semana seguinte e o plano de fugir do castelo se tornava cada vez mais substancial. O príncipe de Lity havia chegado com dois navios abarrotados de inumanos e se apresentaria à Corte que parecia prestes a entrar em combustão com o tamanho da frota lityana. O rei estava mais do que satisfeito em ver suas novas aquisições. Algumas das unidades foram distribuídas para outras cidades de imediato, ainda assim, a maioria continuou concentrada na Capital de Fiore para participar da Sangria.

Depois do pôr do sol, os sons começaram a ressoar até a torre 2. Os quatro homens em trajes escuros e vermelhos esperavam sentados na sala de interações, quando Cana surgiu em um vestido verde abacate.  

Natsu mordeu o interior da bochecha. Os ombros de Gajeel vibraram, engolindo uma risada. Rogue a encarou com um olhar cético. A inumana ficou vermelha de raiva.

— Calem a boca!

Foi o suficiente para Gajeel jogar a cabeça para trás e gargalhar. Baldo abriu um sorriso suave. O homem mais alto da sala se levantou, aproximando-se. 

— Para a ocasião, você não acha que está muito madura? 

O olhar dela foi matador.

— Eu vou pisar em seus pés com meus saltos, Gajeel, e juro que vão cortar o aço. 

O inumano levantou as mãos, rendido. Rogue ajudou a morena vestida de legume a descer os degraus entre o seu quarto e a sala.

— Por que está vestindo isso? — perguntou ele, com delicadeza.

— Foi o que a bruaca Vermilion escolheu para mim. Deveria ver as outras peças que chegaram hoje de manhã.

— São piores?— disse Natsu, com as sobrancelhas arqueadas, cheias de surpresa. Assim que a frase deixou sua boca, soube que não fez a melhor seleção de palavras. 

— Ela fez de propósito — Cana jogou o cabelo comprido e ondulado para o ombro. — Só porque sou mais bonita que a filha dela. O que posso fazer se nasci com uma estrutura óssea perfeita?

Rogue sorriu, concordando com a cabeça. 

— Se tirarmos essas flores gigantes, poderia ficar um pouco mais apresentável — Ele analisou o vestido. — Gajeel, pegue a sua tesourinha de unha.

— É pra já! — O gigante de aço saiu em um pulo.

— Apesar de tudo, o corte do vestido é bonito — acrescentou Natsu, aproximando-se.

— Mas olhe para todo esse tule por baixo, a costureira parece ter costurado quilos de tecido desnecessário aqui. 

Ninguém na sala duvidou que tivesse sido exatamente isso que aconteceu.

— Você pode cortar e esconder com um cinto do próprio tecido. — sugeriu Baldo.

Jenny surgiu na sala em um vestido rosa cintilante. Em sua mão, uma taça de champanhe borbulhava. Ela tinha um sorriso mecânico no rosto.

— Já deveriam estar lá embaixo, logo os convidados estarão che… — Ela parou, olhando para a aberração verde — Oh, querida, o que houve?

Cana parecia prestes a desabar em lágrimas ou cuspir lava pela boca, não sabiam ao certo uma vez que todos pareciam com muito medo de encará-la.

— A lady Vermilion quer que eu passe vergonha. Não há qualquer outro motivo racional para isso — exclamou, com a voz cheia de ódio.

— Oh! — Jenny bebeu um gole da bebida borbulhante. — Parece exatamente isso.

"Cristo, alguém poderia calar essa mulher? ", pensou Rogue.

Gajeel apareceu não só com uma tesoura, mas um pote delas. Rogue iniciou o trabalho rapidamente, cortando o tecido desnecessário e o descartando enquanto Natsu tirava as flores na camada superficial da roupa. 

— Pronto — disse rogue assim que terminou. — Não vai passar vergonha.

Jenny bateu palmas, vibrante.

— Quem poderia imaginar que vocês tinham esse talento escondido? — exprimiu ela, olhando para a nova roupa.

Cana enrolou os braços ao redor de Rogue, depois olhou para os outros rapazes.

— Obrigada, meninos.

— Por favor, não conte para as pessoas da unidade que eu tenho uma coleção de costura — pediu Gajeel.

A inumana das cartas sorriu.

 

~|~

 

O salão de festas fora ricamente decorado. Muros inteiros revestidos com flores brancas, vermelhas e amarelas com requinte e mesas planejadas e abastecidas por todo o espaço. Os convidados dos reis chegavam aos montes com suas roupas finas e bordadas, bebericando dos seus cálices e trocando futilidades. 

Natsu caminhou pelo salão sozinho, enquanto o resto da sua equipe aguardavam na sala de espera a entrada do Rei e família real — a qual evidentemente não incluía Lucy, pois esta estava acenando para ele. Ele a observou de longe, apreciando-a. A princesa estava dentro de um vestido vinho deslumbrante, com o cabelo preso em um coque adornado por pérolas. 

— Você fica diferente de terno. Quase não o reconheci — Ela disse, observando-o; os olhos perdidos abaixo do seu pescoço. — Cai bem em você.

— Pode me obrigar a usá-lo quando quiser. 

— Vou me lembrar disso. — A princesa disse, com o olhar vagamente distante. 

— Aconteceu algo?

— Houve um ataque hoje de manhã em uma aldeia militarizada. Os rebeldes tomaram tudo — disse Lucy, mordendo o lábio — Meu pai está nervoso com os rebeldes. Ele perdeu várias unidades.

Natsu colocou as mãos nos bolsos, infeliz com o termo objetivo. Haviam dois tipos de rebeldes: os inumanos que conseguiam fugir das caçadas dos agentes e o povo comum incomodado com o gerenciamento do rei.

— Os rebeldes estão mais agressivos. Recebemos muitas ameaças para que esse evento não aconteça. — continuou, apreensiva.

— Acha que podem tentar invadir? — Levantou as sobrancelhas.

Ela não conseguiu responder. 

As portas do interior do salão abriram, o rei apareceu em suas roupas padrões. Natsu teve poucas oportunidades para observar Jude Heartfilia, em virtude de Lucy praticamente evitá-lo no castelo — em todos os raros momentos de convivência, ele encontrava espaço para insultá-la. O rei era parecido com o filho mais velho, os mesmos cabelos, olhos discriminantes e postura inflexível.

Em seguida, seus dois filhos entraram e Michele, de braços entrelaçados ao seu noivo, em um familiar vestido azul que caia perfeitamente em suas medidas. Baldo, Rogue, Gajeel e Cana andavam a passos de distância do grupo real. Houve uma salva de palmas e reverências. Natsu virou o rosto imediatamente para Lucy; se ela estava surpresa, então não demonstrou.

— Aquele não era o seu vestido?

Os fotógrafos fizeram uma festa de imagens em frente à família real. Alguns fotografavam apenas Michelle enquanto ela fazia poses para as câmeras, muitos elogios e comentários foram tecidos à medida que desfilou pelo salão como uma princesa.  

— Era, sim. — disse com a voz dura. 

A música recomeçou, apenas para todos se dispersarem mais uma vez.

— Ela está linda mesmo. — comentou uma nobre.

— O vestido é espetacular — disse outra mulher que a acompanhava.

— Está tudo bem, Natsu, não precisa me olhar assim — disse Lucy, cruzando os braços. — Se ela gostou mais do meu vestido que o vestido de casamento dela, não posso fazer nada. 

O inumano sorriu, prendendo uma risada, apesar de saber que ela forçou uma piada. Ela era impressionante. 

— Lucy! — exclamou Michelle, logo atrás dela estava a Trida Vermilion.

Cana as acompanhava como uma sombra.

— Deus, o que fiz? — Lucy falou baixinho. A princesa abriu um sorriso largo para a futura cunhada — Michelle!

— A festa está linda! — elogiou Trida. 

— É um trabalho de equipe impressionante, realmente. — comentou Lucy. 

— É impressionante mesmo. Por falar nisso, adorei seu vestido, princesa. É... — Michelle dá uma olhada em Lucy— despojado.

Cana levantou uma sobrancelha, uma faca nas costas seria menos ofensiva. No entanto, Lucy abriu um sorriso grato e teatral.

— Obrigada. Vejo que se permitiu pegar um dos meus vestidos. 

— Ah, isso? — Ela alisou o tecido azul, como se não fosse nada demais. — Estava na sala de costura quando o vi e pensei, por que não experimentar? E ficou tão bonito em mim e sabe como o príncipe adora me ver em vestidos bonitos. 

— Todos a elogiaram — A mãe se gabou. — Ninguém poderia ficar melhor nessa roupa que a minha pequena menina.

— Ah, mamãe, pare — A filha deu uma risadinha sem graça. — O vestido também ficou lindo em você, Lucy. 

— Engraçado. Achei que deixou o traseiro da sua filha grande demais — Lucy entornou o copo de champanhe e se inclinou para frente. — Veja, me parece um pouco vulgar. 

A princesa saiu antes de ouvir uma resposta, a reação segundo o que Cana diria para Natsu depois foi hilária. Ela parou somente quando alcançou a mesa de doces. Respirou fundo.

— Princesa — disse Natsu, abismado. — É minha heroína.

Lucy soltou uma risadinha estressada. Tinha perdido completamente a compostura. Ela tocou na testa, sentindo-se quente e suada.

— Como podem ser tão malvadas?

— Não sei, estava prestando atenção no volume do traseiro da lady Vermilion — disse com ironia — Ela pareceu mal-intencionada para você?

Ela cutucou sua costela, rindo. 

— Com licença — disse uma voz atrás dos dois. — Posso ter o prazer de convidá-la para uma dança?

A princesa virou a cabeça para o homem.

"E ela corou?", pensou Natsu. 

Os fios laranjas, como as folhas na estação de outono, o rosto dele era bonito e, pelo sotaque, parecia estrangeiro. Lucy cedeu sua mão a ele. 

— Será um prazer — disse ela, sorrindo amavelmente. 

Natsu levantou a sobrancelha, não querendo admitir o sentimento desagradável em seu estômago. Lucy foi levada ao centro do salão, iniciando uma dança formidável com o cavalheiro. Aquela era a realidade da princesa: bailes encantados, homens a guiando em danças e, num futuro não muito distante, ela estaria casada com um deles e teria filhos.

Nada que ele pudesse dar a ela, era um caminho distante do que ele planejava trilhar — completo de sangue, morte e guerra. Era o momento de se separar dela, e Natsu sabia. Logo a Sangria chegaria e ele precisava dar adeus. 

Ele só desejava que a princesa estivesse bem longe quando a guerra eclodisse. 

 

~|~

 

Gajeel observou a pequena mulher sentar-se em um canto do salão. Ela vestia um vestido estampado marrom que destacava seus braços e pescoço. Os cachos escuros desciam em cascata em um penteado meio preso. Levy fitou, desanimada, a sua bebida quente. Talvez ela estivesse ficando com muito calor. O salão estava lotado e o ar tornava-se cada vez mais denso. Foi uma má ideia sair do seu laboratório. Estava planejando passar a noite observando dois ratos iniciarem o coito, mas a secretária Kelly achou deprimente demais e arrastou-a para o salão de festas. 

É claro que a noite de Kelly seria mais interessante que o intercurso dos roedores, uma vez que iniciara um papo com um dos guardas havia mais de meia hora. No entanto, Levy não tinha as mesmas expectativas e completar a pesquisa dos ratinhos era o mais próximo de sexo que ela poderia alcançar. Os outros cientistas sentavam numa mesa designada a eles, o nome de Levy estava impresso em um dos papeizinhos da mesa, entretanto preferia vender sua alma a sentar um minuto com aquele bando de urubus carniceiros. Eles riam feito animais e Levy não podia deixar de ter a sensação de que riam dela.

— Doutora McGarden — comprimentou Gajeel.

Levy levantou os olhos e encontrou um homem absurdamente bonito. Um homem absurdamente bonito parecido com o inumano que apareceu em seu laboratório, semanas atrás.

— Gajeel! — ela disse, rápido demais.

Ele abriu um sorriso brilhante, cheio de dentes.

— Se lembra de mim — respondeu alegre.

— Memória fotográfica — Rápido demais, de novo!

Deus, ela estava sem fôlego. Ele continuou a observá-la, por acaso também estava babando? A moça passou a mão na boca, parecia nervosa demais. ‘’Nenhuma umidade’’, pensou para seu alívio. Ele pegou a mão frouxa, calçada com luva, e beijou-lhe com delicadeza os nós dos seus dedos. Com tanta delicadeza, na verdade, Levy achou engraçado para seu tamanho.

— É adorável. 

Levy deu uma risadinha de sarcasmo. 

— É um adjetivo um tanto incomum para mim. 

— Creio que seja sempre mal interpretada.

— Sim, é claro. — Do que estavam falando mesmo? Ela não conseguia parar de encarar os olhos vermelhos dele. 

Ela pensou se isso o permitia ver melhor no escuro. Quem sabe depois da festa ela o levasse para um exame oftalmológico? Ou simplesmente o guiasse para o lado de fora do castelo para perguntar quanto ele via. O aspecto dele mais chamativo eram seus cabelos, geralmente soltos em uma juba preta densa. Hoje estava contido em uma trança muito bem feita, dando a ele um ar sofisticado.

— Então, o que acha? — ele perguntou.

"Hm?", ela piscou, confusa. "O que ele estava falando?"

— Como?

— Eu a convidei para uma dança. Depois a convidei para me acompanhar até a Torre 2 para eu sugar seu sangue, efetivamente. Você concordou com coragem.

Levy jogou a cabeça para trás e deu uma gargalhada. Não era o tipo de reação que ele estava esperando, mas não era das piores. Quando ela voltou a fitá-lo, viu divertimento em seus olhos.

— Terminou? — Levantou as sobrancelhas.

— Isso era para me assustar? O grande senhor da genética que nos livre de vampiros em nosso baile.

— É uma mulher muito perspicaz. 

— Por acaso planeja dormir em um caixão à noite?

— Quem disse que eu durmo? — Ele conversou com um sorriso de escárnio. 

— E sabe dançar?

— Claro, é um dos requisitos para sobreviver à Colheita. 

— Imagino — disse ela, mais séria dessa vez. Os cientistas pareciam atentos à conversa dos dois, por isso se sentiu corajosa para dizer. — Que tal aquela dança?

Ele não demorou muito a conduzi-la entre os outros pares. A diferença de tamanho era gritante, mas fora compensada com a agilidade certa.

— Então, está nesse ramo há quanto tempo?

— A minha vida toda, na verdade — Ela franziu o cenho. — Eu nasci aqui dentro e cresci com vários cientistas à minha volta. 

— Eles não parecem gostar de você. — declarou Gajeel, fitando a mesa de homens. 

— Não, também não faço questão de suas companhias. 

A doutora cravou os olhos no rosto do homem. Pequenas e maciças áreas de metal decoravam sua face masculina polida. Pontos escuros salpicavam sua íris vermelha, ela se sentia desnorteada — centenas de pensamentos passavam por sua cabeça.

— No que está pensando? — Gajeel perguntou, curioso.

— Nas marcas do seu rosto. Foi um trabalho do doutor McGarden, não foi? 

O corpo do inumano retesou, e Levy se amaldiçoou por sua grande boca.   

— Sim — simplesmente disse. 

— Oh. — Ela queria perguntar mais, mas não queria manter um ar pesado.

Eles dançavam uma segunda música, sem intervalos. Os músicos tocavam alegremente e Levy parecia sentir dificuldade em manter o ritmo rápido enquanto conversavam — para falar a verdade, tampouco Gajeel —, dessa maneira se balançavam de um lado para o outro como dois pinguins. 

O inumano pensou na pergunta da doutora, receoso. Ela sentia repulsa de seu rosto? Achava-o repugnante? Por que infernos se importava? E por que ela tocou nesse assunto? 

O doutor McGarden não era um dos seus temas de conversa favoritos por razões bastante óbvias. Imaginava que Levy, conhecendo-o, não perguntaria sobre algo assim, aparentemente havia causado o efeito inverso. Parecia interessada demais no trabalho de Frankenstein do pai. Diria a ela o que seu pai fez? A dor que ele causou, não somente a Gajeel, mas inúmeros outros meninos que não sobreviveram, que se tornaram agressivos e selvagens. 

— Tá, pergunte — resmungou. — Quase vejo fumaça sair dos seus ouvidos.

— Não é uma pergunta — murmurou. — Eu… acho que meu pai não concluiu você. Eu preciso de alguns exames. Você deveria ser capaz de esconder esses pontos metálicos. 

Ele parou de dançar, os olhos opacos, sem vida. Abriu a boca, mas nenhuma palavra foi formada, um nó bloqueava sua garganta. E saiu da pista, deixando-a sozinha. Sem explicações, bem, Levy podia imaginar algumas.

— Gajeel? — A menina o viu desaparecendo na multidão. 

Uma explosão de gargalhadas se fez no grupo de cientistas. Levy sentiu vontade de metralhar suas cabeças ridículas. Ela resolveu se retirar, sentindo-se humilhada e cansada em direção ao seu laboratório.

 

~|~

 

— É um guarda de God Serena? — perguntou Lucy, não realmente surpresa.

Leo, o homem que convidou Lucy para uma dança, sorriu.

— Digamos que sim — As palavras pareciam completas de um significado não captado pela princesa. — Mas não devo ter muito valor para o príncipe.

— Deve achar que tenho pouco valor para me convidar para uma dança, então. 

Natsu, que ouvia a conversa com seus ouvidos sensíveis, franziu o cenho. Ela estava flertando com o homem?

— Esta deve ser a maior das minhas honras, princesa, venho me beliscando desde o momento em que pus os olhos em sua imagem. Achei estar sonhando.

‘’O homem poderia ser menos forçado’’, pensou Natsu. No entanto, vLucy pareceu gostar de sua resposta.

— Espero que seja o melhor dos seus sonhos.

— Sem dúvida é.

— E desejo melhoras ao seu braço. 

— Nunca invejei tanto um membro de meu corpo. — Leo inclinou levemente a cabeça, como se estivesse lhe contando um segredo.

— Que não seja um hábito — ela pregou. 

Um lampejo de humor brilhou nos olhos verde-esmeralda dele. A dança parou para a surpresa da princesa, a música ainda não havia terminado. Leo se curvou para uma figura atrás de Lucy.

— Vossa Majestade. — Um calafrio desceu pela espinha da princesa.

O rei franziu o cenho, como se sua consciência do homem à sua frente fosse incomoda. 

— E você é? — disse ele, inflexível.

— Sou comandante da frota Hyacinthe, que desembarcou em seu reino com cento e quinze unidades, Majestade — o homem se apresentou cordialmente. — Meu nome é Leonardo Berserker.

— Ah, sim, Sor Berserker — O pai da garota pareceu menos alheio na presença do homem. — É um prazer tê-lo em meu castelo.

— O prazer é todo meu. — Leo se curvou mais uma vez.

— Poderia nos dar licença? Gostaria de conversar com minha filha — disse num tom morno.

Sob um medo crescente, a menina o fitou implorando para que ficasse. Leo sorriu, curvando-se mais uma vez e afastando-se. O ar esvaziou os pulmões da garota. ‘’Talvez fosse mais fácil para ele virar as costas e partir’’, disse a si mesma. Ela se curvou e o encarou com os olhos neutros — o rei detestava quando era condescendente. Ele odiava tudo que ela fazia. Os dois pararam de andar assim que se distanciaram suficientemente dos outros convidados. 

— Está envergonhando a família — bombardeou, a mão segurando o braço da princesa.

Lucy piscou, atordoada.

— O-o que eu fiz? 

— Foi insolente com lady Vermilion, a noiva do seu irmão! Gargalhou com uma unidade em plena comemoração com meu principal aliado, como ousa chamar atenção para você num momento crucial como este?

— Eu não quis…

— Eu sei que fica o dia todo com essa unidade fazendo Deus sabe o quê. Os empregados comentam. Negligencia suas atividades como princesa e ainda pede justificativas para eu não escondê-la do resto do mundo.

— Eu não negligencio minhas atividades — ela conseguiu dizer.

Os olhos do rei Jude estavam pretos de ódio, o rosto rosa como um porco.

— Você é tão inútil quanto sua mãe! Tão desesperada por atenção que vive pondo tudo a perder. É petulante, presunçosa e indecente. 

— Pai, por favor, não fale assim da mamãe. — A garganta estava por um fio. 

Os olhos dele eram julgadores, capazes de cegar e Lucy se sentia miserável. Ela repassou os acontecimentos da noite, tentando se recordar desses momentos — fora indecente? Não se lembrava de uma memória em que fosse pouco polida. Ainda assim, sentia a mente enevoada. Fora muito grossa com Michelle? Estava gargalhando muito alto com Natsu?

— O inumano está dispensado de seus serviços — disse duro. Os joelhos de Lucy só não falharam pelo choque que a mantinha rígida como uma pedra.

— Vá para o seu quarto. E não saia de lá, me entendeu? — Ele a soltou, então alisou sua roupa. — Preciso resolver os problemas que me trouxe.

O rei esperou que ela fosse embora com o rabo entre as pernas. Lucy andou devagar durante o tempo que Jude podia alcançá-la com o olhar — mantendo a dignidade, ou o que restou dela —, depois aumentou o ritmo, até finalmente correr para o seu quarto. O rosto encharcado, uma mistura inquietante de suor e lágrimas. 

Ela não conseguia pensar em nada senão em vergonha.

Sua vida consistia em treinamento inútil. Ela havia estudado todos os enfadonhas mandamentos de etiqueta e aprendido e decorado cada língua e bandeira, aprendeu política, matemática e filosofia.

Poderia descobrir as leis da terra e ainda seria inútil. 

Ela poderia estudar com todos os maiores mestres. E Natsu podia treiná-la até seu corpo chegar ao limite. Nada disso significava coisa alguma, pois Lucy Heartfilia era inferior a uma unidade. 

E certamente não assumiria o trono, independente dos seus irmãos abdicarem dele. A princesa não tinha um trono, ou uma coroa, ou mesmo uma corte. Era uma vergonha; isso martelou em sua cabeça, insuportável e torturante.

Lucy ouviu ele entrar no quarto, não precisava virar a cabeça para saber quem era. A loira enxugou as lágrimas com os polegares e limpou-os em seu vestido, dando ao rosado a melhor tentativa de um aceno de cabeça civilizado.

Natsu se agachou, perto da princesa, e tocou-lhe o rosto num gesto de amizade. Jamais em público, é claro, e raramente quando estavam sozinhos, ele se permitia tocá-la de forma carinhosa. Costumava ser um mestre em disfarçar os seus sentimentos, mas não estava preparado para vê-la assim naquela noite; sensível e quebradiça. Além disso, sentia-se cansado de evitá-la.

E, de alguma forma, aquilo foi mais do que ele pôde tolerar. Vê-la em conflito em virtude do pai, o rosto derretendo em lágrimas por palavras ofensivas, isso o despedaçava. Não tinha a menor ideia do que ela esperava ouvir, o que ele precisava falar para diminuir sua dor. 

— Lucy, por favor, não chore — ele pediu, os ombros pesando em culpa. 

A loira lhe entregou um olhar despedaçado; as enormes orbes jaspe de tirar o fôlego estavam apagadas naquela noite. 

— Ajude-me a levantar — ela pediu, levantando os braços. 

Ele segurou seus punhos, puxando-a para cima delicadamente. Lá estava ele. Perto, mais próximo do que era permitido. Talvez foi o calor do momento, ou os sentimentos acomulados em todos esses dias — a princesa o abraçou. Agarrou-se a ele como um farol, apoiando a cabeça em seu peito e desmanchando-se em seus braços. Natsu pousou as mãos na base se suas costas, seu corpo a incendiando com seu calor inebriante. Eles permaneceram assim por um bom tempo. O único som audível eram os soluços que pouco a pouco se acalmaram, até ela não emitir som algum. 

— Natsu? — sussurrou. 

Ele estava ciente que ela ouvia seus batimentos, lentos e fortes. Ela estava muito ciente sobre o corpo dele, na verdade. 

Lucy não conseguiu afastar os olhos do seu rosto — as sobrancelhas franzidas, os olhos negros hesitantes e aprazíveis. Também não conseguiu se impedir de umedecer os lábios, e quando as mãos dele subiram da sua coluna para seu rosto, deixando um rastro de calor pela sua pele, ela não encontrou voz para protestar. Talvez tenha até inclinado o rosto para a frente, algo dentro dela reconhecendo o desejo dele, acariciando o momento solitário entre os dois.

Natsu tocou em uma mecha solta e a prendeu contra a orelha dela. Entreabriu os lábios, cerrados por incerteza e os olhos presos a ela. Ele a observou, como se quisesse memorizar seu rosto.

— Eu tenho que ir. 

Os braços de Natsu se distanciaram com a decisão tomada. Ele não era bom para ela. Lucy acenou com a cabeça, sentindo-se estúpida. Ela sentiu a luz fria do quarto iluminar sua nuca quando ele abriu a porta e o breu quando finalmente foi embora.




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