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História Friendzone - A Gatinha Mansa


Escrita por: arrascaa

Capítulo 1 - A Gatinha Mansa


 

 

Se você não pode mudar o seu destino, mude a sua atitude. —  Amy Tan

 

Sakura podia vociferar para o mundo, com orgulho e peito inflado, que sobreviveu ao primeiro semestre da universidade. Finalizou os seis os primeiros meses do início da caminhada rumo ao seu sonho. Era uma longa jornada, mas se permitia alegrar-se com pequenas vitórias de um processo que será árduo.

O êxtase de terminar o semestre calouro era gigantesco. No dia em que aconteceu. Agora que pisava novamente os pés para dar o pontapé inicial na nova etapa, o desânimo a dominava consideravelmente.

Não que não gostasse da rotina universitária, muito menos era ingrata por poder estudar em um lugar que a proporcionava tudo que precisaria para realiza seu sonho, somente sabia que provavelmente seriam mais seis meses iguais aos de antes. E definitivamente não desejava isso. Queria algo diferente.

A faculdade era um lugar superestimado. Os filmes hollywoodianos serviam apenas para criar falsas expetativas nos jovens de ensino médio. Um tom de esperança para os que falharam miseravelmente em socializar nessa época. Festas de alto nível de promiscuidade, teor alcoólico quase cem por cento, drogas sintéticas, fraternidades segregacionistas e doenças sexualmente transmissíveis aos montes não a enganaram. Entrou com o intuito de se tornar uma profissional invejável, capaz de ajudar o próximo sempre que possível. 

Não era como se fosse uma santa imaculada. Teve seus momentos de libertinagem durante a vida. Apreciou por muito tempo experimentar coisas desconhecidas. No atual contexto, simplesmente passavam de passatempos rasos. Em seu âmago, desejava por profundidade. Poderia ser tolice ansiar por relações amorosas complexas, não efêmeras, quem a culparia? Bauman? Que ele ficasse com as ideias dele de modernidade e amor líquido no túmulo dele. Sakura ainda era uma romântica. Ou nem tanto assim. Era assim com uma única pessoa.

Suspirou, ao passar pelo portão principal de entrada. Possuía plena convicção do ser humano que a fez mudar a forma de pensamento. E ele possuía nome e sobrenome. Era ele o motivo da sua completa frustração diária. Sentia-se satisfeita em tudo na vida, menos amorosamente. Ali se encontrava seu ponto fraco. Voltar a ser livre sentimentalmente se mostrava uma opção mil vezes mais agradável do que se submeter a ser movida por um sentimento tão inconstante. Uma pena não poder ser uma escolha mais. Estava fadada a sofrer silenciosamente por outro alguém, enquanto sonhava construir uma relação irreal entre ambos.

— Meu Deus, o inferno começa novamente! — Ino dramatiza, ao entrar logo atrás da amiga.

— Não é para tanto assim, porca.

— Para você, que é super nerd, testuda. — Caminhavam lado a lado, alheias a muvuca rotineira ao seu redor. — Para mortais como eu, é um desastre.

Sakura apenas se permitiu revirar os olhos. A amiga realmente conseguia ser bastante dramática quando queria. A amiga falava como se fosse uma porta ambulante, quando na verdade, era tão inteligente quanto ela. Só tinham níveis de esforços consideravelmente diferentes. Ino conseguia ser bem preguiçosa quando queria. 

As duas se conheciam desde que se entendiam por gente. Isso remontava há uns longos anos de amizade. Sequer se gostaram ao primeiro contato. As personalidades semelhantemente fortes e explosivas fez com que levassem bom tempo até construírem um relacionamento amistoso, no mínimo.

No entanto, de alguma forma, conseguiram conciliar a falta de papas na língua, gênios fortes e sinceridade ao extremo em uma amizade que perduraria até aquele presente momento.

—  Pelo menos continuaremos a ter algumas matérias em comum.

— Agora preciso me preocupar em passar apenas em outras cinquenta. — Deu uma pausa para guardar as chaves do carro na bolsa. — Você sabe testuda, suas anotações e resumos salvam qualquer um.

A condição social da de fios róseos não era tão favorável como a da melhor amiga. Os pais ajudavam a pagar as contas do apê em forma de retribuir a aprovação. Fora isso, tinha que se virar por conta própria. Trabalhava como monitora e professora particular quando possível, para garantir dinheiro extra. Agradecia aos céus por Ino ter recebido um carro como presente e ter sempre a carona do dia para a faculdade. 

E talvez por acaso, cursavam matérias similares. Sakura estava no curso de medicina, enquanto Ino no de enfermagem. Eram ambas movidas por uma paixão: ajudar o próximo.

Sakura, além disso, sofria de um sério complexo de perfeição. Não se contentava com pouco. Ou era tudo, ou tudo. Somente aceitava ser a melhor. Aluna, médica, amiga, filha. O complexo dela por grandiosidade era uma faca de dois gumes, pois muitas vezes a atormentava, mas também garantia muitos privilégios na vida. A inteligência era uma de suas melhores qualidades, ficando atrás apenas da sua ótima capacidade de comunicação. Possuía uma oratória e dicção dignas de inveja. Além de sempre ter uma resposta na ponta da língua. Participou de clubes de debate a vida inteira. Poderia colocar até mesmo Michelle Obama no chinelo. Pelo menos já havia tido um sonho que realizava esse feito.

— Deixa de ser reclamona, porca. Até parece uma velha rabugenta. — Faltava pouco para chegarem ao prédio de saúde da faculdade. — Se continuar assim, começarão a aparecer rugas. — Provocou com um sorriso maldoso.

Ino era fissurada em dermatologia e em ter uma pele impecável. O banheiro dela era repleto de cremes das mais variadas marcas, cores e composições. Chegava a ser assustador.

— Diga isso novamente que eu faço algodão doce desse seu cabelo. — Fuzilou-a com o seu falso olhar mortal.

A rosada deu língua em resposta.

— Eu pensava que adorava os happy hours de meio de semestre.

— Sim, mas as coisas boas do mundo têm um custo altíssimo. 

— Não vai ser tão ruim assim, anda logo antes que a sua pele comece a ficar flácida de tanto estresse desnecessário. — Puxou-a pelo braço, pois não queria se atrasar logo no primeiro dia.

A menina prezava pela reputação impecável com todos os professores. Afinal, quem dispensa ser a queridinha? 

— Careta. — Murmurou a menina arrastada e recebeu um beliscão em troca.

Quem as visse lidando dessa forma uma com a outra, juraria que se matariam em menos de vinte e quatro horas. Não que essa vontade nunca passasse pela cabeça de nenhuma. Contudo, o amor vencia no final.

Quase sempre.

*~*~*

Finalmente o sinal do último tempo soava por todas as milhares de salas da Universade de Konoha. Se encarasse por mais um minuto a cara do professor de infectologia, seria capaz de enfiar o apagador pela goela do velho. Era a pior aula de todas. Ou metade da turma cabulava aquele horário, ou dormia mesmo. Sem contar o fato de ser antes do intervalo do almoço. A barriga criava vida própria e fazia um monólogo, protestando por comida, urgentemente.

A rosada mal terminou de arrumar os materiais e sair de sua classe, quando foi praticamente atropelada por uma cabeleira loira. Uma das desvantagens de o prédio dos cursos de saúde ser compartilhado.

— Testuda! Você não vai acreditar! — Ino quase berrou no seu ouvido.

— O quê? Você conseguiu ir ao shopping e não comprar uma peça de roupa? — Perguntou sarcástica, enquanto ambas caminhavam pelos corredores lotados. Ou tentavam.

— Idiota. Sabe que isso é impossível. — Puxou dois papéis brilhantes e dourados da mochila, com um sorriso vitorioso nos lábios. — Adivinha quem conseguiu convites para a festa mais bombástica de volta às aulas?

A mais extrovertida constantemente tentava arrastar a menos para festas malucas de fraternidades e de uma galera bem estranha do campus. Usava a desculpa que precisavam socializar e pararem de ser umas zé ninguém naquele lugar. O argumento era o fato de serem lindas, gostosas e inteligentes demais para não serem reconhecidas. Queria ver qual era a nova que a amiga conseguiu. Sempre era capaz de surpreender.

— Porca, eu já te falei que não curto essas paradas alternativas e hippies que você arranja. — Suspirou, cansada. — Não é nada legal ter que recusar um baseado a cada cinco minutos.

— Como se maconha fosse a pior coisa do mundo, Virgem Maria. — Devolveu, vendo de canto um revirar de olhos. — Não é nada do que estamos acostumadas. Toma, apenas leia. — Estendeu um dos papeizinhos decorados.

— Acho que tem dedo das meninas nisso. Menos da Hinata, obviamente. 

— Você acha?

Agora as duas já se encontravam andando pelos gramados do campus gigantesco, rumo aos restaurantes. Pegou o papel à contra gosto, lendo-o. À medida que os olhos passavam pelo objeto, a surpresa era bem clara na expressão da rosada.

— Tá brincando? Akatsuki não é aquela fraternidade dos garotos mais populares, pegadores e encrenqueiros desse lugar? A maioria já está quase se formando. Nem morta que vou nisso. Deve ser a suruba rolando solta. — Empurrou o convite de volta.

Os boatos sobre eles iam de ruins a horrivelmente inacreditáveis. Eram verdadeiros filhinhos de papai, que se achavam os bad boys e donos do mundo. Se as garotas já lambiam o chão dos bonitinhos que tinham por aí, daqueles ali, elas só faltavam abrir as pernas com uma encarada. Imagine uma festa do nível desse tipo de gente. Definitivamente não iria.

— Você quis dizer a fraternidade dos garotos mais irresistivelmente sexys, gostosos e desejados desse lugar? Exatamente pela putaria que temos que ir! — A loira exclamou, um pouco mais alto que o normal, atraindo olhares até as duas.

— Fala baixo, sua porca escandalosa. — Sakura apertou o braço de Ino, sentindo-se envergonhada. — Prefiro mil vezes ir nas festas marijuana que você arranja.

— Ô testuda, essa é a sua oportunidade! Você não quer finalmente sair da friendzone? Com certeza o Sasuke vai estar lá! O irmão mais velho dele é um membro e ele nunca perderia a chance de ser o galinha que é. 

Golpe baixo. A amiga estava usando os seus sentimentos e a frustração em relação ao Uchiha mais novo para poder convencê-la a ir. O pior de tudo que cada palavra que saiu da boca da maluca era verdade. E a convenceu. Pelo menos momentaneamente. Ainda poderia mudar de ideia quando estivesse mais racional e não movida pelo coração traidor, pensando somente em Sasuke. Só preferia ter evitado a parte do cafajeste que o melhor amigo conseguia ser.

— Droga, esqueço que o que você tem de louca tem de manipuladora.

Era impressionante que em menos de cinco horas, Ino conseguira ingressos para uma festa, para cada uma do grupo de amigas. Para ser sincera, era assustador. Ino era sociável de um nível que não deveria ser comum. Fazia amizade até com um poste, se precisasse ou desejasse. Possuía suspeitas de que ela tinha uma conta secreta em alguma camada oculta da internet. Ou participava de grupos estranhos no Facebook. Nunca saberia nem queria saber.

— Para de lerdeza que precisamos combinar tudo com as garotas. — Pegou-a pelo braço.

 

E agora a arrastada por aí era Sakura.

*~*~*

— Super estou lá já. — Tenten admirava o seu convite, como se fosse o melhor presente de sua vida.

— Não sei se é uma boa ideia. — Hinata mostrou-se a mais sensata de todas, como sempre, pensou Sakura.

— Claro, você não tem coragem nem de falar com o asno do Naruto, imagina ir para uma festa dessas. — Temari revidou, afiada.

O rosto de Hinata queimou instantenamemte com o comentário.

Sakura sentiu e sempre sentia empatia pela situação da amiga, afinal, era a que mais conseguia compreender o medo da rejeição que a Hyuuga possuía. Naruto era o seu melhor amigo de anos juntamente com Sasuke, e com certeza conquistá-lo era uma missão bem difícil, ainda mais para uma garota tímida e recatada como a Hinata.

Conheceram-se das maneiras mais aleatórias possíveis. Hinata era a ajudante de biblioteca e Sakura a conheceu por ser uma visistante nata, e logo criaram um laço muito interessante. Ino conheceu as outras duas loucas varridas nas festas em que ia. Agora eram um bizarro grupo de cinco amigas completamente diferentes que não se desgrudavam para nada.

— Ei, não fala assim só por ela ter dito algo bem lógico. — Sakura tentou defendê-la.

— Óbvio que você diz isso. Também é outra que não conta logo que é louca pelo anti-social do Sasuke. — Debochou Temari.

Ficou vermelha como um tomate. Contudo, era de raiva, diferentemente da vergonha da Hyuuga. Não gostava de como diminuíam o que sentia ainda mais que Temari tinha essa mania de ser ácida e sincerona demais. Antes que pudesse retrucar, Ino repentinamente bate seu copo de suco detox na mesa, chamando a atenção de todas. Quando ela fazia isso, todas se calavam.

— Eu tenho uma ideia! Tá todo mundo cansado desse lenga-lenga de vocês duas! Então vocês vão se declarar, chamar eles pra saírem, tanto faz, qualquer atitude decente de uma mulher do século XXI. Ou vocês vão ter que lavar meu banheiro até o fim da graduação. 

— Eu nem moro com vocês, Ino! — Hinata reclamou, indignada.

— Que seja, você iria lá só pra lavar!

— Isso é a maior loucura que eu ouvi, e olha que sou sua amiga há anos. — Sakura protestou, sem acreditar que aquilo era realmente para ser levado a sério.

— Loucura é você ser apaixonada desde o ensino médio por esse menino que não percebeu até hoje o jeito que você baba nele. Ou finge que não. — A Sabaku solta, sincera como sempre. — Acho super justo.

— Também, a vida é curta demais para vocês ficaram sofrendo pelos cantos sabe? Se der certo, vai ser lindo. Se vocês levarem um fora, e daí? Estamos na universidade, amanhã vocês arranjam outro. — Tenten opinou, com seu clássico discurso de aproveitar a vida.

Sakura não julgava as amigas por tentarem fazê-la desencanar logo do Uchiha. Deveria ser uma encheção de saco ouvi-la suspirar quando ele chegava; reclamar de todas as vezes que ele pegava outra na sua frente; chorar quando isso acontecia porque estava sensível e outras tantas ocasiões. Até achava plausível se livrar desse peso que carregava nos ombros. Soltar o que sua garganta ansiava por proferir. Mesmo que provavelmente indicasse o fim da amizade dos dois pela falta de reciprocidade. A ideia de se declarar passava, cada vez mais, como a melhor entre todas. Pelo bem da sua saúde mental. Pelo bem do resto da sua vida universitária. Precisava fazer isso por si mesma, mas vinha prolongando esse momento há séculos.

Não que fosse uma covarde ou algo do tipo. Na verdade, era corajosa em todos os aspectos da sua vida, com exceção daquele em específico. Perdeu a virgindade em um banheiro com um desconhecido no semestre passado que havia conhecido numa festa. Já havia experimentado uns três tipos de drogas diferentes graças à Ino. Adorava motos e andar sobre elas. Queria pular de paraquedas um dia. Puxava saco de professores sem pestanejar. Mandava qualquer um tomar naquele lugar se fosse necessário. Uma vez mandou até uma velha que falou mal da cor do seu cabelo no supermercado. Sakura era capaz de fazer tudo para ter o que queria. Sempre foi assim.

No entanto, Sasuke era a pedra no seu sapato. O seu pai costumava dizer que ela era como uma leoa, insaciável e feroz, disposta a qualquer coisa pela seu bem-estar e daqueles ao seu redor. Com o melhor amigo, assemelhava-se a uma gatinha mansa. Sakura chegou até a gaguejar em dadas situações com ele. Ela nunca gaguejava. Nunca mesmo. Lembra do papo de dicção perfeita? Era impressionante o quanto ele a afetava. O seu cérebro simplesmente desligava, como se seus neurônios tivessem ido passear e só voltassem quando estivesse longe de Sasuke. Agia como uma clássica e clichê boba apaixonada.

Queria ser uma leoa com ele também.

Estava cansada de ser a gatinha mansa.

Aquela ideia poderia ser o empurrão necessário para lhe dar a coragem de agir.

— Eu estou dentro. — Hinata finalmente se pronunciou e chocou todas as presentes.

Entre o grupo, ela era a mais ingênua e tímida. Surpreendeu a todos ter se interessado pelo garoto mais pervertido e extrovertido que conheciam. E agora ao aceitar a proposta antes mesmo da Haruno.

Droga, pensou a rosada.

Se até Hinata havia aceitado, não tinha escolha.

— Que escolha eu tenho a não ser aceitar? — Sakura acabou cedendo.

E as vibrações e gritos histéricos não poderiam ser maiores na mesa. 

Ela sempre passava vergonha com aquelas doidas varridas.

Mas não seria maior que a vergonha que passaria naquela sexta-feira.

*~*~*

— Isso vai ser um desastre! — Sakura lamentou, jogando-se no sofá do seu apartamento.

Encarava o quadro de escolar que utilizava para dar as suas aulas e monitorias com total desesperança. Nele, estavam listados os prós e contras de se declarar para Sasuke. Havia passado a tarde discutindo com Ino e Naruto sobre cada um dos pontos escritos a sua frente.

Ino segurava, ao lado da tabela, como uma verdadeira professora, um dos pinceis, o azul. Ela era a responsável por escrever os aspectos favoráveis, enquanto Naruto se jogou ao seu lado, largando em algum canto o pincel vermelho, responsável pelos aspectos desfavoráveis.

— Testuda, deixa de ser pessimista e racional demais. Eu já falei que essa situação você não pode ser a Sakura nerd de sempre, você precisa seguir os seus instintos.

— E eu já disse que meus instintos dizem que eu definitivamente não deveria fazer isso.

— O teu cu que eles tão dizendo isso! Na verdade é o seu lado medroso que treme as pernas quando o Sasuke chega perto de você. — Ino era sutil como um cavalo.

— Olha, o lado dos prós têm muitos mais pontos, não tem para onde correr. — Naruto se manifestou.

Era quinta-feira, o dia anterior ao grande momento da sua vida. Havia convidado Naruto para almoçar na sua casa depois das aulas, e ele, como o bom esfomeado que se alimentava muito mal, aceitou sem pestanejar. Aproveitou a situação para contar da ideia da declaração, sem dizer a parte de Hinata, claro. A ideia era justamente aproveitar que Naruto também era melhor amigo de Sasuke, e o conhecia como ninguém, para ter uma opinião sensata, e também tentar descobrir como ele poderia reagir a uma declaração da Hyuuga. Era como matar dois coelhos em uma pedrada só.

— Sim, mas o aspecto negativo perder a amizade dele para sempre  vale por uns cinco positivos.

Uma das principiais razões de nunca ter contado ao Sasuke que era apaixonada por ele era o medo da rejeição. Sua auto-estima não estava preparada para sofrer um baque como aquele. Mas o principal motivo, sem sombra de dúvidas, era o medo de perdê-lo. 

Sakura amava-o, mas não apenas no sentido amoroso do termo. Eram melhores amigos há anos, construíram uma relação única. Era a única garota que conseguira se aproximar do rapaz, conhecê-lo. Ele sempre fora muito recluso e na dele, mas não com Sakura. Ele desabafava sobre seus medos, anseios, problemas e sonhos com ela. 

Compartilharam muitos momentos especiais juntos. Não conseguia imaginar-se sem tê-lo ao seu lado. A possibilidade era dolorosamente angustiante. Tanto que, para ela, preferia sacrificar suas emoções, guardando-as para si, ao invés de correr o risco de estragar uma amizade que tanto lutou para conquistar e estabelecer do jeitinho que gostava. Ainda se lembrava com ricos detalhes do dia que se conheceram.

Fazia algumas semanas desde que Sakura havia se mudado para a nova escola. Conseguira uma bolsa de estudos a uma prova bem feita. Mal sabia que sua vida acadêmica se resumiria a isso. Descontos.

A mãe dizia que uma inteligência assim não poderia ser desperdiçada, então lá estava ela matriculada no melhor e mais caro colégio de Konoha, a pacata e admirada cidade do interior.

Iniciar o ensino médio em um local completamente novo podia ser um tanto aterrorizador. Mais ainda por não conhecer ninguém.

Não podia dizer que havia se dado bem de primeira. A maioria dos outros adolescentes olhava-a uma forma bem estranha, mas tentava não se importar. Sabia que era por causa da origem mais humilde, as roupas simples e provavelmente por causa da testa que mais parecia um outdoor. Adolescentes sabiam ser maldosos quando queriam, e não hesitaram em ser com Sakura.

Mesmo assim, mantinha-se positiva e otimista. Iria fazer amigos. Ino era de sua turma, porém faltaria o primeiro mês inteiro de aula devido a uma viagem de negócios ultra importante de família. Seria um baita mês árduo. A melhor amiga sempre a fazia socializar. Era a sua melhor forma de entrada em qualquer ambiente. Sentia falta, mas ela logo voltaria.

Tudo era uma questão de tempo. Continuava sendo simpática e educada, independente de como fosse vista ou do que diziam sobre si. Aos poucos, cativá-los-ia.

Por enquanto, viveria como uma loba solitária.

Estavam no intervalo, após uma aula bastante cansativa. Naquele dia em especial, não estava com um humor muito bom. No meio da noite, escutou uma briga entre os pais e depois disso não conseguiu mais dormir. Aguentar os olhares e os cochichos cotidianos era fora de questão. Então foi para o seu esconderijo secreto.

No último andar da escola, ficava as salas de artes e de laboratório de ciências e informática, mas no fim do corredor, depois de passar pela sala dos funcionários da limpeza, havia uma escada velha e enferrujada e uma janela que levava para o telhado. O bom era que ficava apontada para os fundos da escola. As chances de alguém a ver subindo ali eram mínimas, já que só havia mato e mais mato naquela direção.

Havia descoberto aquele lugar por pura coincidência e agora o aderira como a válvula de escape pessoal.

Não passava de um local onde muitas folhas secas e mortas se acumulavam, tendo em vista as enormes copas de árvores próximas ao redor.

Sem muita dificuldade, subiu, tomando cuidado onde pisava. E para seu azar ou sorte, quase perdeu o equilíbrio quando avistou outra pessoa ali.

Era de estatura mediana, assim como ela. Então uma pontada de alívio por não ser um adulto a atingiu. O garoto de cabelos extremamente negros e compridos abraçava as próprias pernas, com a cabeça entre elas. Aparentemente, não havia sido notada. À medida que se aproximava, podia jurar ouvir fungadas. As mãos apertavam fortemente o tecido da calça. Pelo visto o menino misterioso não estava nada bem.

Ainda se recuperando do choque e da surpresa de encontrar outro ser no seu esconderijo, sentou-se ao seu lado, mantendo uma distância que respeitasse o espaço pessoal dele, sabendo que ele havia finalmente percebido a sua presença.

Agora ela teria que dividir o segredo com outra pessoa, pelo visto.

Levantou o rosto, completamente inchado e encharcado. Passou as palmas da mão na tentativa de disfarçar o seu estado de vulnerabilidade e finalmente a encarou.

Eram os olhos mais bonitos que já vira em toda sua vida. E essa frase valia para ambos.

Na realidade, o garoto em si era o mais bonito que já havia tido o prazer de ver. E sabia exatamente quem era. Nenhuma das meninas da sala parava de falar sobre ele, de sua beleza, de sua inteligência e de como era fechado, sério e não parecia ter nenhum interesse em namorar, deixando-as bastante desapontadas.

Não conseguia antes entender bem, pois era a inexperiência em pessoa. Nunca teve muita vontade de chegar muito perto do sexo oposto, quem dirá namorar. Estava mais interessada em assistir novos filmes e desenhos, descobrir bandas e músicos novos, seus livros e quadrinhos e aprender matérias desconhecidas. Ela era viciada em saber mais sobre o mundo. A inocência era mesmo uma benção.

Já o vira de relance poucas vezes, pois era como um fantasma. Aparecia nas aulas, não falava quase nada, apenas quando professores o chamavam e nem dava bola para os suspiros apaixonados das colegas de classe.

A menina havia o achado bem estranho, sinceramente.

Entretanto, vendo-o ali sem todo o muro que o menino parecia construir em volta de si, em um momento de fragilidade, ela o viu de verdade. Entendeu, finalmente, porque tantas meninas eram apaixonadas por ele. Ele era injustamente bonito. A beleza dele chegava a ser excessivamente injusta com os outros garotos. Os fios longos, sedosos e escuros, caíam sobre os ombros, em harmonia com a coloração tão negra quanto dos seus olhos, profundos e instigantes. A pele era branca, quase pálida. Era um constraste instigante de cores. 

Não disseram nada por longos minutos, apenas ficaram em um silêncio confortável, olhando para a paisagem a sua frente. Estudavam no período da manhã e o céu estava límpido. O azul os cobria como um manto acolhedor. 

Ele havia parado de chorar.

— Você gosta de doces? — Ousou perguntar, quebrando repentinamente a barreira que havia surgido entre eles.

Não perguntou se ele estava bem. Não perguntou o porquê dele estar chorando. Só descobriria muito tempo depois.

— Não, muito, para ser sincero. — Respondeu aparentando estar mais estável.

— Deve ter algo de errado com você então.

— Concordo.

Naquele exato momento, surgiu a amizade que marcaria a sua vida para sempre.

Ah, mal sabia o quanto iria muito além disso.

— Sasuke não deixaria de ser seu amigo por você ser apaixonada por ele, Sakura. — Naruto argumentou, sabendo que a amiga pensava dessa forma, tirando-a de seus devaneios.

— Você deveria saber como ele odeia e sempre odiou as meninas que eram apaixonadas nele, não queria me tornar uma delas. 

Aquela era uma das lembranças mais frescas e marcantes na sua cabeça, embora tenha acontecido há um bom tempo. Estava nostálgica especialmente aquele dia. Precisava relembrar do passado para poder decidir o seu futuro.

Sasuke estava irritado. Sakura percebia isso pelos seus ombros tensos e pela fina linha que seus lábios formavam quando estava estressado com alguma coisa. Era nítido. Agora a pergunta era: com o quê?

— Sasuke, tudo bem? — Aproximou-se, e se sentou no banco ao seu lado.

Estavam em uma parte afastada da escola, poucas pessoas frequentavam as quadras de esportes ao fim da aula. Todos estavam mais preocupados em finalmente se livrarem das aulas e irem para casa.

Ele a olhou e ela viu nos seus olhos uma raiva que não via há muito tempo.

— Não, não está. —  Ele puxou a mochila e a pendurou, caindo uma chuva de papéis coloridos e decorados entre eles.  —  Eu não aguento mais isso, Sakura, elas estão me enlouquecendo.

De primeira, ela não havia entendido o que ele quis dizer com aquilo.

— Elas quem? 

— As meninas dessa escola! Por alguma razão que eu não sei, elas acham que eu sou um clichê adolescente ou algo do tipo, o cara perfeito para elas, e passam o tempo todo me enviando cartinhas, bilhetes, cochichando quando eu passo, dando risadinhas e outras até vem se declarar para mim, dizendo que me amam. Mas eu não faço nem ideia nem do nome delas! Como podem dizer algo assim se nem me conhecem?

Sakura finalmente entendeu que ele se referia ao conhecido fã clube dele. Até as meninas dos anos mais novos e a frente faziam parte. Era uma enorme diversidade de idade, aparências e personalidades entre as que se diziam apaixonadas por ele. O seu tom de voz indicava que realmente estava indignado. Sakura internamente quis rir. Como ele era burrinho. E ainda achava ruim ser desejado por várias garotas.

—  Sasuke, não sei se você percebeu, ou tem um espelho em casa, mas eu diria que é um menino que chama atenção pela aparência. — Ele levantou a sobrancelha, curioso pela amiga dizer algo assim na lata. — Idiota, não fique se achando, estou sendo racional. — Ele deu um sorriso mínimo, um muito bonito, diria Sakura, e parecia estar mais relaxado.  — As meninas na nossa idade não costumam ser assim, elas te acham bonito, se sentem atraídas e acham que isso é estar apaixonada. Somos rodeadas desses filmes bobos que nos iludem, então por isso que algumas agem impulsivamente.

— Mas é insuportável, de verdade, eu não aguento mais ver a cara delas de choro e decepção depois que eu digo que nem as conheço quando se declaram! Eu as odeio, todas elas, que se dizem apaixonadas. Esse é meu veredito.

— Você acabou de decretar ódio a quase todas as meninas da escola, tirando as lésbicas e as que têm namorado, sabe disso, né? — Sakura finalmente se permitiu rir da situação.

— E tirando você também, espertinha. 

A risada da garota se transformou no sorriso mais amarelo e falso do mundo com o que acabara de ouvir.

— Claro, eu também. — Repetiu, sentindo o gosto amargo das palavras à medida que as soltava no ar.

— Tem um lado bom nisso, pelo menos consegui ser melhor amigo de uma das únicas garotas que não é apaixonada por mim. — Disse orgulhoso a encarando.

Aquela frase foi como um soco no seu estômago. O bolo que se formou na sua garganta era tão intragável que era incapaz de dizer uma palavra. Apenas o empurrou de lado, para disfarçar e deu uma risada sem graça.

Teve uma certeza aquele dia.

Nunca se declararia para ele.

— Mas você é uma dessas meninas, o problema é que não aceita isso. — Ino soltou sem se importar com o impacto das palavras que proferiu, fazendo-a voltar à realidade.

Ela estava absolutamente certa.

Era até consideravelmente insuportável como os amigos a conheciam.

Sakura tentava afundar o mais profundamente possível os sentimentos conflitantes que possuía pelo melhor amigo e negar a todo momento que era mais uma no fã clube dele. Ainda mais considerando o quanto ele desprezava qualquer uma que fizesse parte. Ela não queria ser odiada. Queria ser a garota que conseguia fisgar o coração dele. Mas a verdade era que ela era parte do fã clube. Também era apaixonada por Sasuke, como todas as outras. Não podia esconder essa verdade de si mesma. Mas não era uma qualquer. Não era mais uma entre tantas. Era diferente. Deveria confiar no próprio taco.

— Certo, vamos fazer isso.

Amanhã, a gatinha mansa se tornaria leoa.


Notas Finais


Tudo bem, pessoal?
Decidi escrever somente nas notas finais para não atrapalhar na leitura inicial do capítulo.
A ideia dessa fanfic é algo que desenvolvo há um bom tempo. Sempre quis escrever um triângulo amoroso entre os três, e adoro a temática de amor entre amigos, e também namoro falso. Então juntei tudo num combo só de muito clichê, espero que tenham se interessado e gostado do primeiro capítulo.
Já deixo avisado que vai ser uma fanfic em aberto, então sim, não faço ideia de quem ela vai ficar no final. Vai ter momentos de ambos os casais, então se vocês odeia um dos dois, recomendo parar por aqui.
Mas para você que ama um triângulo amoroso e dois machos correndo atrás da protagonista, muito barraco e momentos calientes, aproveite!
Nos vemos no próximo!
Não esqueçam de comentar o que acharam, vai ser muito legal ouvir a opinião de vocês e vou tentar ao máximo responder!


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